Mitogênese escrita por Braga Primeiro


Capítulo 8
Capítulo VIII


Notas iniciais do capítulo

Perdão pela demora, mas pelo menos cá está mais um capítulo! Espero que apreciem.



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Capítulo 8

            Este prédio cinza e sem graça por fora é por dentro uma confusão de corredores e insanas confluências de energia sutil. Meu senso de direção humano está completamente inutilizado e minha visão divina bloqueada por tantos fluxos misteriosos. O jeito, então, é andar, abrindo todas as portas e verificar todos os caminhos até achar o general e o doutor.

            O som de minhas pegadas pegajosas no chão me deixa um pouco enjoado, mas é um pequeno preço a pagar pelo poder de alcançar meu objetivo.

            Quase todas as salas estão completamente vazias com exceção de uma cadeira, sempre no centro. Quando não, são escritórios apilhados de papéis onde também não encontrei ninguém.

            Finalmente chego a um salão onde parece ter alguém; muito familiar essa pessoa me é, mas tenho certeza de que nunca o vi antes.

            - Olá, Tyscvaisha. Você parece um pouco diferente; o azul não lhe caiu bem. – olhando para o mundo sutil e reconhecendo aquela voz... – Eu disse que voltaria.

            - Ah não! Eu não tenho tempo para perder com você, Mefistófeles!

            - Você está arrogante demais, “Zheng”. Acha que eu sou só uma distração? Não. Na verdade, olhe bem para o chão deste lugar.

            Só agora reparei que por todo o piso, especialmente perto do demônio, há vários pedaços brancos do que parecem ossos. Como se lesse minha mente, ele falou:

            - Sim, são restos de ossos; são restos dos corpos que eu peguei desta vez. Claro que no processo não sobrou muito mais do que esses fragmentos, pois este meu novo corpo é menos belo, mas é muito mais adequado para te destruir!

            - Não que eu me importe com essa escória que você matou – e eu realmente não daria um olhar de pena para os miseráveis – Mas achei que você fosse um cachorrinho deles.

            - Demônios são leais apenas até quando nos interessa. Antes eu só queria corpos sem esforço. Agora eu só quero vingança contra você. As consequências que se danem, eu sou quero te torturar até destruir tua sanidade!

            Isso me soa familiar, porém não é hora de me preocupar com isso.

            - Eu te derrotei uma vez; desta não vai ser diferente.

            Ele não respondeu nem um “veremos” antes de avançar contra mim; já eu não esperei que ele me tocasse para reagir. Eu sabia o que aquele toque queria dizer.

            Brandi a naginata em um corte horizontal que mirava a barriga dele e que o teria destripado caso tivesse atingido, entretanto a única coisa cortada foi uma fumaça preta. Imediatamente percebi que ele estava na verdade à minha direita e prestes a tocar minha omoplata. Graças à agilidade e percepção extra que esta forma me oferece, pude me impulsionar na direção contrária a tempo.

            Tudo acontecia numa velocidade difícil de raciocinar. Era sensível que meu cérebro humano apenas entendia metade do que acontecia, enquanto minha mente divina tinha de controlar diretamente o corpo para nós não morrêssemos. Pelo jeito Mefistófeles não sofria com a mesma falta de sincronia, embora sua agilidade ainda não fosse a mesma que a minha.

            Após desviar de outra investida igual a anterior, aproveitei o tempo em que ele se recuperava da frenagem brusca para me impulsionar de volta àquela direção e finalmente atingi-lo com um golpe que deveria tê-lo decapitado, mas que pelo menos decepou suas duas mãos postas em posição defensiva.

            - Primeiro as mãos. E agora, o que você quer perder? – disse sarcasticamente.

            - Ha! Acha que me importo com isso? – ele sorria enquanto falava – Mãos! Voltem!

            Novas mãos, ligeiramente diferentes das anteriores, brotaram no lugar onde ficavam as antigas. O processo foi tão asqueroso que vomitei.

            - Ahhh... Parece que temos um deus de estômago fraco aqui!

            - Não enche. Você realmente é pior do que qualquer monstro.

            - Claro! Alguns monstros são deuses. Não é a toa que são tão inúteis. Eu sou um dos demônios mais temidos no ocidente! Meu fluxo de medo é um dos maiores do mundo... Sabe por quê? Claro que não! Mas eu explico: é porque todo o medo do escuro que os humanos covardes tem vem para mim...

            - Grande bosta.

            Isso o irritou bastante, provavelmente ele esperava que eu fosse ficar espantado e que dissesse algo como “Ó, estou enfrentando alguém realmente forte!”, mas a quantidade de fluxo só serve para a manifestação terrena, o que não importa numa luta entre deuses, ou seja, ele continua sendo o monstro irritante que é. Ele fala dos deuses... Porém é tão arrogante quanto um.

            - Você vai me pagar, garoto! – e nos levou para aquele lugar escuro em que lutamos da última vez.

            - Eu já sei como sair daqui; aliás, acho que já adiei demais a tua derrota!

            DOR!!!

            - AHHHH!!! – grito ao perceber que uma grande área da carne de minhas costelas havia sido arrancada.

            Não ouvi nenhum deboche, na verdade, não sinto mais nada. Nada. Nem meu corpo consigo ver, apenas sinto a dor na lateral.

            - Ó, Grande Tys, senhor dos céus, demônio das nuvens, guardião da lança de luz, invoca o raio que será a perdição do meu inimigo! – oro.

            - Não. – respondo contra minha própria vontade.

            Ao dar um passo para traz devido a uma súbita tontura, lembrei porque neguei minha oração: eu ainda não havia limpado a naginata de todo o sangue que derramei. Ou seja, estou...

            - AHHHH!!!

            Minha coxa direita!!! Ele levou mais um pedaço meu!

            Mais gritos e mais nacos de minha carne sendo arrancados. Diferentemente do pedaço das costelas, os outros são todos muito menores, causando menos estrago apesar da mesma dor.

            Sinto-me me separando do corpo de Zheng... Acho que ele já começa a morrer. Não quero morrer ainda. Tenho de levar minha vingança até os culpados...

            Não, acho que não é só por isso.

            Zhong é mais do que apenas meu ancestral, meu amigo. Se eu deixar Zheng morrer... Ele morre também.

            - Alguém... me ajuda por favor... – sussurro entre delírios causados pela dor.

            Escuto apenas uma gargalhada distante.

            - É, Zhong, esta existência, esta vida foi boa enquanto durou... espero que não fique com raiva de mim... obrigado por tudo.

.

.

.

            - Não te despeças tão levianamente assim, Tys! E é porque desejavas lutar pela morte daquelas pessoas... Decepcionante. – escuto bem próximo de mim num tom sarcástico.

            - Você! Não interfira! – provavelmente é a voz de Mefistófeles.

            - Tys – chamou-me, ignorando o demônio – Eu andei refletindo sobre algo... Repita o que eu disser. – e cochichou algo em minha orelha meio decepada.

            - Ó... Guia Zhong, mestre de minha família, ancestral querido e poderoso... Protege-me contra todos os meus inimigos com tua lança!

            - Sim, meu parente, proteger é meu dever. – ele respondeu.

            De repente minha percepção está de volta e vejo o que se passa: meu ancestral perfura Mefistófeles com uma sequência de golpes perfurantes absolutamente insana em velocidade.

            Não entendo como meu amigo pôde enxergar quando eu não pude, mas uma ideia me bate agora: o escuro é algo que assusta apenas os humanos, logo as ilusões desse demônio são para humanos; eu sou um, mas não o deus doméstico.

            Consigo ver o demônio tentando se regenerar como fez com as mãos, mas em algum momento antes de minha visão voltar, ele deve ter entrado num ciclo vicioso. Penso isso porque ele normalmente teria velocidade para desviar da maioria daqueles ataques, mas ao invés disso ele está parado apenas se regenerando e eu deduzo que ele se regenere melhor quando está parado, ou seja, alguma hora Zhong conseguiu desferir os primeiros golpes que o fizeram parar para se regenerar e então meu ancestral não esperou para ver o que acontecia e partiu novamente para cima; nesse momento Mefistófeles deve ter tido de escolher entre desviar e levar alguns golpes que não se curariam ou ficar parado, refazendo-se tanto quanto se danificava.

            - Sabes que eu já venci, não é?! – gritou meu protetor.

            - Não brinque comigo! – o maldito ofegava.

            - Claro que estou certo! Veja! Não vejo mais nada se refazendo! – vi pela primeira vez naquela luta um sorriso no rosto de Zhong.

            Então a escolha do inimigo realmente foi a errada, pois ele apenas poderia se regenerar até “gastar” toda a carne que tinha absorvido, e foi nisso que Zhong investiu!

            Agora não resta mais do que uma cabeça ligada fragilmente a um monte de carne sangrenta picada. Como golpe final, o demônio tem a cabeça empalada pela lança.

            - VITÓRIA! – grita meu amigo.

            Sem jurar nenhuma vingança desta vez, a nuvem demoníaca vermelha vai embora enquanto nós comemoramos esta vitória sofrida. 


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