A campainha tocou, já era tarde.

-Quem é? –Gritei, com preguiça de levantar do sofá. Eu estava com um shorts e uma regata, um cobertor e o ventilador ligado. Foda-se a lógica. Passava uma maratona de Friends na TV.

-Josh.

 Sorri para o nada. Me levantei e abri a porta. Fui tomada pelos seus braços assim que ela se abriu. Ain que abraço bom.

-E ai, chato. Tudo bem contigo? –Falei, ainda sendo esmagada contra seu corpo.

-Tudo baixinha, e contigo?

 Fiz uma careta pelo “baixinha”.

-To bem. –Nos afastamos e eu fechei a porta. O informei rapidamente da maratona e nós nos sentamos no sofá. Minhas pernas estendidas sobre as pernas dele.

-Não entendo. Coberta e ventilador? Isso é tipo uma menopausa antecipada? –Mostrou a língua.

 Ri.

-To com frio mais to com calor.

-Você é do contra, Ines. –Revirou os olhos. –Tem pipoca?

 Com Joshua não existiam cerimônias. Ele falava e, ponto, era aquilo. A seco. O que mais me incomodava no mundo era exatamente isso, o fato de ele sempre falar o que queria... Por que ele não dizia que me queria? Éramos aquele tipo de “amigos empacados”, aquela amizade que tem tudo pra ser algo mais, mas precisa de um empurrãozinho da coragem.

 Suspirei com o meu próprio pensamento.

-Ham? –Perguntei, quando ele passou a mão sobre meus olhos.

-Perguntei se tem pipoca.

-Tem, espera um pouco. –Me levantei e fui até a cozinha preparar a pipoca... na verdade 3 minutos no microondas bastaram.

 Observei o pacote girando no microondas enquanto pensava em nosso ultimo beijo. Não, beijo não. Selinho. Nunca passara disso, e isso era tão frustrante.

-O negocio ta esgoelando que a pipoca ta pronta faz tempo. Você ta meio dormindo hoje. –Joshua falou ao meu lado, me fazendo dar um pulo.

-Droga, Josh. Quer me matar? – Coloquei a mão sobre o coração acelerado.

 O susto se torna automaticamente maior quando a pessoa em quem você estava pensando surge do nada, faz com que você tenha a necessidade de apagar seus pensamentos—obrigatoriamente, quase sempre sem sucesso—com medo que a pessoa as leia, ou descubra. Pelo menos eu pensava assim.

-Sabe, quem deve teme.

-Quem te disse isso? –franzi a testa enquanto tirava o pacote do microondas e levava a pipoca para o balde.

-Minha vó. –Rimos.

 Voltamos para o sofá e para a nossa posição inicial. Cada um de um lado do sofá, ele sentado e eu deitada, minhas pernas estendidas sobre as dele.

-Como vai a vida?

-Fui assaltado semana passada, depois te passo meu numero novo. –Fez careta. –Só levaram meu celular. E você?

-Estou saindo da semana de provas. Acho que vem bomba.

 Assistimos ao seriado. Apesar de querer estar mais perto, eu gostava daquilo, gostava do nosso relacionamento meio termo.

-No que esta pensando? –Já tinha se passado algum tempo desde que nós tínhamos falado pela ultima vez, me assustei um pouco quando uma voz falou em português.

-Ham... dever, tenho dever de física. Acabei de me lembrar. Por que?

-Eu posso te ajudar, se quiser. –Respondeu. A quem ele queria enganar? Ele era péssimo em física.

-Ta bom. –Corri até o meu quarto e voltei com a mochila. Abri o caderno e o livro sobre a mesa, fiz o dever enquanto Josh fazia caretas.

 A lição não estava tão complicada, com a ajuda do livro e das pequenas observações que anotei no caderno fiz tudo bem rápido. Olhei para o relógio, vinte minutos.

 Durante esses vinte minutos Joshua mandou mensagem, olhou os livros com uma careta de “não entendo sas porcarias”, foi ao banheiro, comeu pipoca, deu risada do seriado, comeu mais pipoca, se interessou pelo novo comercial de perfume, me prometeu um cachorro, foi no banheiro de novo, bebeu 3 copos de refrigerante, tagarelou como um maluco, fez piadinhas e rabiscou uma folha. Ou seja, ele fez de tudo, só não me ajudou com o dever.

-Acabou. –Não era uma pergunta, ele comemorava. –Mas acho melhor eu ir embora. Seus pais já devem estar chegando, né? Sei que eles não vão se incomodar...

-Não vão. –Suspirei. –Ok.

 Nos despedimos e ele foi embora.

 De Novo ficamos juntos e nada aconteceu. Me joguei no sofá imaginando como seria se tudo tivesse acontecido do jeito que eu queria, adormeci ali mesmo. Acordei as 3 da manha e fui para o meu quarto, meus pais nem tiveram o trabalho de me acordar. Me ignoraram.

 Após mais 3 horas—que me pareceram minutos—o despertador tocou e eu me levantei.

 Acordar as 6 da manha é tipo luta-diária-do-bem, apesar de ser revoltante. Me arrumei da melhor forma possível e me dirigi para a escola. Entrei na sala e me sentei perto da Dayana e da Daniela.

-O dever de física, me passa. –Dani pediu.

-Bom dia pra você também. –Revirei os olhos e entreguei meu caderno.

-Ham... Pera, o que é isso?

Eu poderia ser o único.  Joshua.

-Um papel... Joshua. Ele tava la em casa ontem...-Sorri como uma boba.

 Ouvi um “awn” prolongado e alto ao meu lado e elas faziam biquinho.

-Que fofo vocês.

-Dani!

-Ain gente... –Day não terminou a frase.

 Revirei os olhos e sorri.

 Assim que terminou o meu horário sai e liguei para ele ainda do portão da escola.

-Gostou?

-Besta. –Sorri.

-Sabia que ia gostar.- Ouvi seu riso abafado.

-Foi... gentil.

-Agradece logo. –Ele disse atrás de mim. Me virei e o abracei.

-Hey, o que você ta fazendo aqui?

-Vim buscar vocês. –Vi Day, Dani e o Thai atrás dele.

-A onde nós vamos? –Perguntou o Thai.

-Lanchonete. –Respondeu, sem tirar os olhos de mim.

 Joshua estava visivelmente incomodado com algo, estava quieto e pensativo. Ele estava sentado ao meu lado, Day na ponta,  Dani e Thai a nossa frente, os três tagarelavam sem parar.

-Hey...- Cochichei. Joshua respondeu com um “Hum?”- Ta bem?

 Sabe, eu tinha ódio mortal daquele sorriso. Aquele sorriso debochado que só o Josh sabia dar, que fazia conjunto com aquele tipinho. Aquele tipinho do sorriso debochado que me fazia sorrir junto dele, sem motivos aparentes.

-Estou mais do que bem. –Me surpreendeu com um selinho. Estávamos perto o suficiente pra isso acontecer, mas eu não esperava. A conversa na nossa mesa parou, senti minhas bochechas esquentarem.

-Acho que nós temos que ir... –Dani falou, quebrando o silencio.

-Concordo, ir... ir. –Day respondeu, meia desconcertada, tentando parecer que a decisão já estava tomada.

-Mas eu acabei de pedir mais batatas. –Thai reclamou. –Ai Ai... ta bom, sem batatas. Tchau.

 Os três se levantaram, nos deram tchau e saíram.

 Eu queria ficar sozinha com Josh, mas ao mesmo tempo estava tremendo... de medo e ansiedade. Mil borboletas brincavam dentro do meu estomago.

-Gosto de você. –sorriu.

 Baixei a cabeça um pouco, mas ele a ergueu.

-Também gosto de você, Josh.

-Gosto muito de você, Ines. Muito.

-Isso é complica...- Ele me interrompeu. Me interrompeu com um beijo.

 Se eu não esperava um selinho, imagina um beijo. O beijei de volta, o beijo mais carinhoso e maravilhoso da minha vida.

-A gente descomplica...