Wake Me Up escrita por Rhyenx Seiryu


Capítulo 48
Só Mais Uma História Sobre Monstros


Notas iniciais do capítulo

Rélow Pipous!
Como vocês estão? Faz tempo que não dou às caras aqui, né? Vocês já devem estar acostumados com a minha ausência, mas espero eu que ainda sintam falta da fanfic kkk
Queria dedicar esse capítulo a duas maravilhosas leitoras dessa história. A primeira é a Cris, que está esperando um lindo bebê (que cute-cute, que Deus abençoe e dê a vocês dois muita saúde =*) e a segunda é a Kha-Chan, que me deu muito apoio pra terminar esse capítulo, me puxou muito as orelhas e me incentivou demais (basicamente, você é minha fada madrinha das fanfics, obrigadinha =*).
Agora, sem mais delongas, vamos ao capítulo. Espero que gostem.
Boa leitura!



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A casa da família Hamilton era grande. Não tão grande quanto uma mansão hollywoodiana – com todos aqueles cômodos que os artistas sequer usariam durante a vida –, mas grande o suficiente para se destacar das demais casas da região, que já não eram pequenas, e se tornar uma construção impressionante.

Sua arquitetura fazia Rebecca se lembrar dos castelos que ela via em filmes de época, com seu estilo vitoriano e seus muros feitos de pedra, além do portão preto de finas barras feitas de ferro, da pequena estrada que conduzia à porta de entrada da casa e do extenso jardim que, no verão, deveria reluzir com um gramado verde e bem cuidado e dezenas de pequenos pinheiros e outras árvores frutíferas, mas que, agora, estava desfolhado e coberto de neve. Havia, inclusive, uma fonte de água luminosa, daquelas com uma escultura da deusa Afrodite no centro, da qual a água já não jorrava mais porque havia se congelado devido ao clima frio.

Aquela era, sem dúvida, uma residência muito bonita, que seguia muito bem o estilo clássico das construções inglesas e, sendo filha de dois empresários do ramo imobiliário, Rebecca mal podia esperar para ver como aquela casa era por dentro, mas Aaron, por sua vez, não parecia tão animado assim.

Ela tinha quase certeza de que, enquanto sua mente apenas se perguntava se a casa teria uma daquelas escadas em caracol com degraus de mármore branco ou um belo lustre de cristal no teto do hall de entrada, Aaron só estava relembrando os momentos que passara ali na infância. Certamente, quando ele olhava para aquele gramado coberto de neve, a primeira recordação que passava por sua cabeça era a de seu cachorro, Screapy, correndo por ali atrás de uma bolinha ou de um frisbee e Rebecca não duvidava que as circunstâncias da morte de seu amigo canino também se faziam presentes em sua memória.

— Você está bem? – Ela perguntou, acariciando a mão dele sobre o volante, enquanto ele dirigia pela propriedade no mais completo silêncio. Aaron assentiu, mas não disse nada e Rebecca decidiu que seria melhor deixá-lo digerir todas aquelas lembranças antes que eles chegassem à porta de entrada da casa, algo que não demorou muito a acontecer.

Apenas alguns instantes depois, eles se viram estacionando o carro diante da pequena escadaria principal, onde um Christopher sorridente os aguardava praticamente saltitando ao lado de uma Briana Hamilton que não conseguia ocultar seu nervosismo por ter o filho mais velho de volta em casa e de um Joseph, que parecia tão indiferente a presença dos dois ali que era como se nem os estivesse vendo.

— Você veio! – Christopher desceu a pequena escadaria como um raio, quase escorregando no último degrau e, antes mesmo que Aaron tivesse terminado de sair do carro direito, ele já estava em seus braços, abraçando-o como se não tivesse a intenção de soltá-lo nunca mais. – Eu fiquei com medo de você não vir. Ainda não enfeitei a árvore porque estava te esperando, mas confesso que quase não dormi a noite pensando que você, talvez, não fosse aparecer.

— E você acha que eu perderia a oportunidade de passar esse Natal com o meu irmão favorito? – Aaron retrucou, tão sorridente quanto Christopher e, mesmo sabendo que sim, que ele quase havia deixado passar essa oportunidade, Rebecca se calou e deixou que os dois se cumprimentassem como se Aaron jamais tivesse cogitado não vir. Christopher não precisava saber desse detalhe.

— Seu irmão favorito? – O garoto deu-lhe um leve soco no ombro, sem deixar de sorrir em nenhum momento. – Eu sou o seu único irmão!

— Por isso mesmo. – Aaron apertou uma das bochechas rosadas dele, fazendo com que ele se contorcesse todo para se livrar do toque.

— Hey, Bee! – Christopher correu até o outro lado do carro e, assim como tinha feito com Aaron, o garoto a envolveu em um forte abraço, cheio de carinho. – Estou feliz em te ver.

— Estou feliz em te ver também. – Rebecca retribuiu ao seu abraço e depois se inclinou para pegar o pacote colorido que havia guardado no banco de trás do carro. – Isto é para você, mas só pode abrir à meia-noite.

O sorriso no rosto de Christopher se alargou.

— Eu tenho algo para você também. – Ele contou em tom de confissão. – E também tenho algo para o Aaron.

— Tenho certeza de que ele amará. – Ela cochichou e os dois soltaram risadinhas cúmplices que fizeram com que Aaron os olhasse com ares de suspeita.

— É melhor você entrarem. – Christopher praticamente os puxou pela mão, sem nem esperar que eles pegassem suas malas. – Nós acendemos a lareira e eu fiz chocolate quente. Não quero me gabar, mas ficou muito bom.

— Espera, eu preciso…

— Pode deixar. – Briana se pronunciou abrindo a porta devagar. – Eu peço ao Phillipe para levar a bagagem de vocês lá para dentro e para estacionar o carro em nossa garagem. Vamos, entrem. Está frio aqui fora e vocês fizeram uma viagem longa.

Ela manteve a porta aberta e Christopher não esperou pela resposta dos dois antes de voltar a puxá-los para dentro de casa, cujo hall de entrada era bem parecido com o que Rebecca imaginara. Realmente havia um belo e grandioso lustre de cristal sobre suas cabeças e o chão era feito de mármore branco com desenhos de rosas negras espalhados por aqui e por ali, assim como a escada, que não era uma escada em caracol, mas que era tão bonita quanto as escadarias que ela via nos filmes e que a faziam se imaginar como uma Cinderela da era moderna, descendo por ali em algum baile de gala.

Do lado oposto à escada, já havia um grande pinheiro de Natal, que ainda aguardava por seus enfeites coloridos, mas em cuja base já repousavam alguns presentes de tamanhos diversos. Ao lado da árvore, estava a lareira da qual Christopher havia falado, com chamas avermelhadas e convidativas crepitando em seu interior e, diante dela, um belo tapete felpudo e poltronas de design elegante e aparência confortável.

— Podem pendurar os casacos aqui. – Briana indicou alguns ganchos ao lado da porta, onde já havia dois casacos pendurados e Aaron e Rebecca penduraram os seus ali, enquanto um homem, que Rebecca julgou ser o tal Phillipe, passou por eles carregando suas bagagens em direção ao andar superior.

— A sua casa é linda, Sra. Hamilton. – Rebecca se apressou em elogiar, não apenas por educação, mas também por realmente achar a residência maravilhosa.

— Obrigada. – Ela sorriu, constrangida. – Vocês podem se sentar perto da lareira. O Christopher deve estar voltando com suas canecas de chocolate quente. Ele encontrou essa receita na internet e estava doido para que vocês a experimentassem.

— O Christopher é um garoto muito gentil.

— Sim. Ele é. – Briana assentiu, afetada e, então, seu olhar se voltou para Aaron a quem ela ainda não havia cumprimentado e que, também, não parecia lá muito disposto a cumprimentá-la. – As estradas estavam muito ruins? – Ela perguntou como quem não quer nada. – Com toda essa neve, deve ter sido difícil chegar aqui.

— Já dirigi com climas piores. – Aaron deu de ombros, mas seus olhos verdes, em vez de se concentrarem na mãe, estavam focados em Joseph, que estava parado do outro lado do cômodo como um fantasma, inteiramente vestido de preto.

— Porque ainda estão de pé? – Christopher questionou, voltando da cozinha com duas canecas fumegantes de chocolate, que ele depositou sobre a mesinha de centro. – Vamos, sentem-se. Eu vou à cozinha buscar os marshmallows e volto em um instante. – Então ele sumiu de novo, cantarolando alguma música que Rebecca não conseguiu identificar.

Ela pensou em esperar que Aaron se sentasse, antes de segui-lo até uma das poltronas, mas como ele não se moveu, ela tomou a dianteira e escolheu uma poltrona e uma caneca de chocolate para si. Aaron se sentou ao seu lado, ainda com seus olhos cravados em Joseph, mas se ele percebeu que Aaron o encarava, não demonstrou. Estava muito entretido, observando os detalhes de um dos quadros da parede.

— Como o Christopher está? – Aaron finalmente perguntou, pegando tanto Briana quanto Rebecca de surpresa, já que ela estava quase acreditando que ele passaria o feriado todo evitando dialogar com a mãe.

— Ele está melhor. – Briana sentou-se em das cadeiras próxima e cruzou as mãos sobre o colo. – Tem tomado os medicamentos e não teve outras convulsões desde então. Os médicos disseram que ele poderá fazer a cirurgia em breve.

— Ele está lidando bem com tudo isso?

Um sorriso triste se apoderou do rosto da mulher e ela colocou uma mecha do cabelo preto atrás da orelha.

— O Christopher está tranquilo. É a nossa reação que o preocupa, por isso, eu tento fingir que não estou com medo quando estou perto dele. Ele tem se mostrado um garoto muito forte nas últimas semanas.

— Ele realmente é. – Aaron concordou e Rebecca também assentiu, enquanto tomava um gole de seu chocolate quente e quase suspirava por causa do sabor delicioso da bebida. Ela decididamente queria raptar Christopher e obrigá-lo a cozinhar para ela todos os dias.

— Ah, não! Vocês nem esperaram pelos marshmallows! – Christopher reclamou, parando na entrada do aposento com um saco de mini marshmallows recém-aberto nas mãos. – Estragaram a minha obra de arte, sabiam?

— A culpa é toda sua. – Rebecca respondeu com um sorriso travesso ao qual ele retribuiu quase imediatamente. – Isso está tão gostoso que nós não conseguimos esperar.

— Ah, eu sei. – Christopher revirou os olhos, convencido. – Eu sou muito bom nisso, não é? Aposto que nem a Starbucks faz algo assim.

— Decididamente você é o melhor. – Rebecca garantiu e ele correu até ela para lhe entregar os marshmallows, insistindo que eles acentuavam ainda mais o sabor da bebida e que ela deveria experimentar.

O resto da manhã foi gasto em conversas amenas. Briana os interrogou a respeito de coisas como o dia a dia na universidade, seu convívio com os amigos, festas que frequentaram durante o semestre e sobre como os dois haviam se conhecido e outros detalhes básicos do relacionamento deles que, surpreendentemente, Rebecca se sentiu animada por compartilhar. Assuntos como relações familiares e coisas desse tipo ficaram fora da pauta, algo pelo qual Rebecca agradeceu  porque, embora sua família não tivesse tantos problemas quanto a de Aaron, havia alguns desentendimentos sobre os quais ela não estava disposta a falar, como a homossexualidade de Ty e a dificuldade de seus pais em aceitarem tal coisa.

Fazia mais de um mês que eles haviam discutido e, só agora, ambas as partes haviam se acalmado o suficiente para aceitarem passar o Natal juntos e ver como tudo isso funcionaria. Rebecca esperava que seus pais e irmãos mais velhos tivessem a oportunidade de conhecer Mikhail como ela o havia conhecido e que vissem o quão maravilhoso ele era e, também, esperava que Ty desse uma chance a eles de se acostumarem com isso, porque seu irmão sabia ser bastante cabeça dura às vezes. Mas se as coisas se acertariam entre eles ou não, ela só descobriria depois.

Pouco antes do almoço, Rebecca decidiu que precisava tomar um banho e trocar de roupa e Briana se ofereceu para levá-la até o quarto, enquanto Christopher e Aaron se divertiam com a decoração da árvore-de-natal. Eles pareciam duas crianças bobas. Haviam dividido a árvore pela metade e estavam competindo para ver quem terminaria de enfeitar sua parte primeiro, enquanto brigavam pelos enfeites mais coloridos e brilhantes. Joseph, por sua vez, havia escapulido dali há algum tempo, sem sequer avisar que estava saindo, mas como ele, sequer, havia se dado o trabalho de cumprimentá-los na chegada, Rebecca não estranhou sua fuga silenciosa.

Ela acompanhou Briana até o andar superior, enquanto esta lhe explicava do que se tratavam os cômodos pelos quais passavam e, quando chegaram ao fim do corredor, Briana abriu as portas de um dos quartos, onde as bagagens de Rebecca já estavam e sinalizou para que ela entrasse.

— As coisas do Aaron estão no antigo quarto dele, aqui ao lado. – Explicou. – Eu não sabia em que nível o relacionamento de vocês estava, então, pedi que os colocassem em quartos separados, mas posso pedir para organizarem uma das suítes de casal caso vocês… prefiram assim. – Briana concluiu e Rebecca não pode impedir que suas bochechas corassem de vergonha, porque o complemento daquela frase bem poderia ser substituído por um “caso vocês pretendam fazer sexo enquanto estão aqui”.

— Não. O quarto está ótimo. – Rebecca respondeu com um sorriso constrangido. – Não precisa se incomodar.

— Tudo bem, então. Vamos esperá-la lá embaixo para o almoço. Espero que goste de camarão.

— Sim. Eu gosto. Obrigada. – Rebecca adentrou no aposento e foi direto para sua mala escolher uma roupa apropriada. Esperou ouvir o “clic” da porta quando Briana saísse do quarto, mas como isso não aconteceu ela ergueu o olhar e se deparou com a mãe de Aaron ainda parada ali, encarando-a. – A senhora precisa de alguma coisa? – Se atreveu a perguntar e Briana negou com a cabeça, parecendo envergonhada.

— Não. Não, me desculpe. Eu não queria deixá-la desconfortável. – Ela se virou para sair do quarto, mas, depois, pareceu pensar melhor e deu meia volta. – Na verdade, Rebecca, eu queria agradecê-la. – Disse por fim. – Eu não… Eu não fui uma boa mãe para o Aaron, entende? Fiz vista grossa para muitas das coisas que ele viveu aqui e sei que ele ainda se ressente disso. Talvez ele nunca me perdoe pelo que eu o deixei sofrer. – Ela baixou o olhar, triste. – Não achei que, algum dia, ele voltaria para essa casa e acho que ele não estaria aqui se não fosse por você, então, eu só queria dizer… muito obrigada.

Rebecca a encarou por alguns segundos, sem palavras. Queria dizer a Briana que estava tudo bem e que ela não precisava agradecer por nada, mas, em vez disso, ela se viu colocando-se de pé e cruzando o quarto até a mulher, de quem segurou as mãos entre as suas.

— O Aaron te ama. – Rebecca disse sem saber de onde haviam surgido aquelas palavras. – Se ele se ressente tanto é porque ele a ama e porque o seu silêncio o machucou mais que qualquer surra que ele tenha levado aqui. Ele não mantém distância porque está com raiva. Ele mantém distância porque não quer se decepcionar de novo, então, tudo o que eu peço é que a senhora não o machuque. Só peço que, hoje, a senhora o faça ver que você o ama tanto quanto ele a ama e que jamais o colocaria em segundo plano na sua vida de novo. Mostre a ele que se importa e tenho certeza de que ele perdoará tudo isso. Ele só quer a mãe dele de volta.

Ela nem viu quando Briana soltou suas mãos e a envolveu em um abraço apertado, mas pode sentir as lágrimas da mulher umedecendo uma parte de seu cabelo, então, sem jeito, retribuiu ao abraço dela, dando-lhe alguns tapinhas nas costas.

— Está tudo bem. – Tentou confortá-la da melhor maneira que pode. – Ele está em casa agora. Vocês se resolverão. É só dar tempo ao tempo.

— Obrigada. – Briana finalmente se afastou dela e enxugou os olhos com as costas das mãos. Sua voz quase tão baixa quanto um sussurro. – De verdade, obrigada por trazê-lo aqui.

— Não precisa agradecer. – Rebecca sorriu para ela e estava feliz por fazer parte de algo que ela esperava que terminasse com uma bela reconciliação entre mãe e filho. – Acho melhor eu ir tomar o meu banho antes que eu atrase todo o almoço.

— Ah, sim. – Briana também sorriu. – Estaremos lá embaixo, à sua espera. – Então, ela acenou em despedida e saiu do quarto, fechando a porta.

Rebecca apressou-se em escolher uma roupa e, depois, seguiu para o chuveiro, onde tomou um banho quente, apreciando a sensação da água sobre sua pele. Quando saiu do banho, Aaron estava sentado em sua cama, encarando as portas de madeira que davam para a varanda, distraidamente.

— Jesus, Aaron! Você me assustou. – Rebecca sorriu e se aproximou para depositar um beijo em sua bochecha. – O que está fazendo aqui? Achei que terminaria de decorar a árvore com o Christopher.

— Terminarei. Mas deixamos para decorar o restante dela depois do almoço.

— Entendo. – Ela o observou por um instante e, então, se sentou na cama ao lado dele. – Você está bem?

Ele deu de ombros.

— Eu ainda não sei. Na verdade estou meio dividido. Estar aqui com o Christopher me alegra, mas todo o resto… Ainda estou me acostumando.

— Sei que é difícil. São muitas lembranças, não é? E, talvez, a maior parte delas não seja boa, mas pense assim: agora que você está aqui, pode criar novas lembranças e tornar essa casa mais agradável de se recordar quando voltarmos para Oxford.

— Você acha?

— Vou te contar uma história. – Rebecca sorriu para ele, totalmente ciente de que ainda estava de toalha e agradecendo pelo quarto contar com um ótimo sistema de aquecedor. – Quando eu era criança, meus pais me mandavam para um acampamento de verão todos os anos. Por dois anos eu achei aquele lugar horrível. As meninas não eram legais comigo, me excluíam das brincadeiras e festas do pijama e estavam sempre implicando comigo, então, sempre que eu pensava no acampamento eu só o via como um lugar horrível para onde eu odiava voltar. Mas no meu terceiro ano ali, eu conheci três novas garotas e elas eram as melhores amigas que eu podia imaginar. Nos divertimos tanto que durante o resto do ano eu mal pude esperar para que o verão chegasse e eu pudesse voltar para o acampamento para vê-las. Acho que, talvez, um acampamento de verão com garotas de malvadas de oito anos não se compare ao que você viveu aqui, mas a lição é a mesma, Aaron. Você pode tornar esse lugar melhor agora, se realmente quiser e se dispor a tentar.

Aaron a encarou por tanto tempo que Rebecca quase pensou que o tivesse ofendido com sua comparação entre a vida dele e seu acampamento, mas, antes que ela pudesse pensar em começar a pedir desculpas, Aaron tomou seu rosto entre as mãos e a beijou, profundamente, agradecido por ela sempre ter a coisa certa a dizer para fazê-lo se sentir melhor e mais confiante.

— Desculpem-me por invadir o ninho de amor dos pombinhos, mas a Briana me pediu para chamá-los para o almoço. – A voz grave de Joseph retumbou pelo quarto e Rebecca se afastou de Aaron rapidamente, verificando se sua toalha cobria tudo que precisava ser coberto. – Não se preocupe, eu não vi nada e, mesmo que eu tivesse visto, não há nada aí que possa ser considerado uma novidade para os meus olhos. – Ele saiu do quarto e fechou a porta, tão rápida e silenciosamente quanto a havia aberto e Rebecca respirou fundo, enquanto segurava o pulso de Aaron, tentando evitar que ele fosse atrás de Joseph, muito embora ele não tivesse movido um único músculo.

— Ele sempre foi assim? – Ela se atreveu a perguntar após um instante, sem saber se referia-se a mania que Joseph tinha de aparecer nos lugares de repente ou a sua sinceridade brutal e total falta de empatia por outros seres humanos.

— Ele não costumava pedir desculpas antes. – Aaron deu de ombros, muito mais sereno do que Rebecca poderia esperar e aquilo a deixou boquiaberta.

— O que aconteceu? Meia hora antes, lá embaixo, você o estava encarando como se quisesse matá-lo. Agora, você parece… tranquilo.

Aaron se colocou de pé e segurou as mãos dela, beijando os nós de seus dedos.

— Minha namorada me disse que talvez o acampamento não seja tão ruim esse ano se eu estiver disposto a me concentrar nos bons momentos e enterrar os péssimos no passado, onde eles devem ficar. – Ele abriu um leve sorriso para ela. – E, pode não parecer, mas ela é bem inteligente, então, talvez seja bom eu começar a ouvir os conselhos que ela me dá.

— Ótimo. Mas como assim “pode não parecer”? – Rebecca franziu a testa e o sorriso no rosto de Aaron se alargou.

— Sabe, vestida apenas com essa toalha e sem os óculos, você se parece mais com uma coelhinha sexy da Playboy que com a nerd que realmente é.

— Nerd? Ora seu… Saia já do meu quarto. – Rebecca apontou para a porta, enraivecida. – E você está proibido de voltar aqui essa noite.

Aaron levou a mão ao peito e fingiu estar em choque.

Proibido? Onde está o seu espírito natalino, Bee?

— Não sei. Você já procurou na mansão da Playboy? – Ela o provocou. – Vamos! Saia logo daqui, seu cafajeste. – Deu-lhe um leve tapa e o empurrou até a porta do quarto e Aaron saiu dali parecendo muito mais contente e relaxado do que estivera em qualquer momento desde que eles haviam chegado à Londres.

Quando Rebecca se juntou a eles para o almoço, todos estavam reunidos ao redor da mesa quase como se fossem uma família feliz. Christopher era o centro das atenções, falando sobre seu ano escolar, seus amigos, paqueras e as coisas interessantes que tinha feito. Tanto Aaron quanto Briana o observavam como se absorvessem cada uma de suas palavras, com olhares repletos de admiração e carinho e sorrisos meio bobos no rosto e, até Joseph que, geralmente, era relapso e sem emoções, parecia prestar atenção aos relatos de Christopher, embora o que se passava por sua cabeça naquele momento fosse um mistério que Rebecca não se sentia capaz de desvendar.

— Hey, Bee! Achei que tinha se esquecido de nós. – Christopher a cumprimentou quando ela se aproximou. – Sente-se aqui. – Ele deu dois tapinhas no assento ao seu lado, que ficava entre ele e Aaron.

— Desculpe por fazê-los esperar tanto. Demorei um pouco mais do que devia no banho.

— Tudo bem, eu não morri de fome ainda. – Christopher riu. – Está perdoada.

— Obrigada por sua grande misericórdia, Milorde. – Ela fingiu uma reverência e, à igual maneira, Christopher acenou em sua direção com a pose pomposa de um grande rei.

O almoço correu da melhor maneira possível. Houve muita conversa e muita risada, inclusive entre Aaron e Briana, o que fez Rebecca se alegrar por ver que ambos estavam cooperando para tornar aquela data especial como deveria ser. A comida estava saborosa, embora a ceia de Natal prometesse muito mais e ninguém lançou olhares tortos a ninguém o que a deixou confortável e animada, pois, quando chegou a Londres, ela ainda tinha certas dúvidas de que aquela visita pudesse funcionar de fato, mas aquele almoço em família havia reacendido suas esperanças de que tudo correria bem.

Já de barriga cheia e exausta após ter viajado por mais de quatro horas para chegar ali, Rebecca decidiu voltar para seu quarto e dormir pelo restante da tarde. Aaron prometeu a ela que tiraria algumas horas para descansar também, assim que ele e Christopher terminassem de enfeitar a árvore-de-natal e não foi nenhuma surpresa que, com aquele clima amistoso cercando-a, ela tenha dormido como um bebê durante horas e tenha tido ótimos sonhos, embora não conseguisse se lembrar de nenhum deles após ser bruscamente acordada por seu despertador.

— Não acredito que dormi tanto. – Murmurou para si mesma, ao olhar o relógio em seu celular, ainda vesga de sono. Tinha ativado o despertador para as oito e meia, mas no recanto mais profundo de sua mente ela não achou que dormiria tudo isso. Havia se enganado e muito, mas estava feliz. Pelo menos tinha descansado o suficiente para permanecer de pé até a meia-noite.

Sem demora, se apressou em tomar outro banho e se arrumar para a ceia de natal, pois fora de seu quarto, a casa parecia vibrar com os preparativos para o jantar. Ela ouviu a voz animada de Christopher ressoando pelo andar inferior da casa e a risada escandalosa de Aaron seguindo-a e também sorriu. Aquele seria um ótimo natal. Tudo estava indo muito bem até ali, por isso, quando desceu para encontrá-los, Rebecca decidiu que primeiro telefonaria para Margareth e para seus próprios pais e lhes desejaria um feliz natal. Procurou, então, por um lugar calmo e silencioso, longe das músicas que Christopher e Aaron estavam se alternando para colocar no Home Theater e acabou se instalando na varanda dos fundos da casa, de onde podia observar o quintal coberto de neve que parecia reluzir sob a luz prata da lua.

A primeira pessoa para quem telefonou foi para Margareth, que estava muito contente cercada por seus filhos e netos e que ficou ainda mais contente ao saber que Rebecca estava se divertindo com a família de Aaron e que Ty havia, finalmente, decidido visitar os pais. Depois, Rebecca ligou para sua casa – um telefonema que durou quase quarenta e cinco minutos – porque teve de falar com seus pais, com cada um de seus irmãos mais velhos, com Mikhail, com sua cunhada e com seu pequeno sobrinho Louis e ainda teve que ouvir a mãe dizer, por vários minutos, o quanto sentia saudade e o quanto era doloroso vê-la passar seu primeiro natal longe da família.

— Eu sei, mãe. Mas eu precisava vir. – Rebecca se desculpou pelo que lhe pareceu a décima segunda vez. – Era importante para o Aaron, então, é importante para mim também.

— Eu entendo, querida. Você é uma mulher agora. – A emoção na voz de sua mãe era palpável. – Estou tão feliz por você, mas não posso evitar sentir falta, Becca.

— Eu também sinto a sua. – Rebecca recostou-se na coluna da varanda, suspirando. – Sinto falta de todos vocês, mas preciso desligar agora, mãe. Não posso passar o natal inteiro no celular. – Ela riu. – Seria falta de educação

— Eu entendo. – Sua mãe concordou, mas ainda assim não parecia satisfeita por ter de desligar. – Vejo você nas férias?

— Sem dúvidas, mãe. Amo vocês.

— Nós também te amamos, querida. Feliz Natal.

— Feliz Natal, mãe. – Rebecca desejou e, finalmente, desligou o telefone, já sentindo a orelha meio dormente após tanto tempo com o aparelho encostado ali.

— Mãe superprotetora? – Joseph questionou saindo de trás das portas abertas da varanda, fazendo-a se sobressaltar e quase derrubar o celular no belo piso de mármore do local.

— Por Deus, Joseph! Você deveria vir com um sino. – Rebecca reclamou, tentando fazer o coração voltar ao ritmo normal. – Ninguém nunca te disse que você pode matar alguém chegando assim de surpresa?

— Talvez eu não te surpreendesse tanto se você prestasse mais atenção ao seu redor. – Ele cruzou os braços e se recostou, casualmente, na coluna ao lado dela. – Você parece estar sempre no mundo da lua, sabe? Não é minha culpa se você não me vê chegando.

— Sim. É sua culpa quando você fica parado atrás das portas, espionando a conversa dos outros.

— Eu não te espionei. – Joseph ergueu um dedo para ela. – Eu queria usar a varanda, mas você a monopolizou por quase uma hora. O que eu poderia fazer?

— Que tal encontrar outra varanda? – Rebecca sugeriu, encarando-o com certo rancor. Ela sabia bem que confrontar um psicopata, estando sozinha com ele, não era a melhor ideia que um ser humano podia ter, mas o fato dele ter escutado sua conversa e de tê-la assustado daquela forma a deixava irritada o suficiente para que ela se esquecesse desses detalhes.

— Brava, hum? – Um sorrisinho surgiu no canto da boca de Joseph como se aquilo fosse a coisa mais divertida que ele já havia presenciado. – À primeira vista, ninguém diz que você pode ser algo além de uma garotinha boba.

— Uma garotinha boba?

— É, sabe? – Ele apontou para ela sem muito entusiasmo. – Bem, pelo menos foi isso que eu pensei da primeira vez em que te vi lá no hospital. Aparência legalzinha, pessoa entediante.

— Como é que é? – Rebecca o encarou, mas ele apenas deu de ombros como se não tivesse dito nada demais. – Quer saber? Eu já terminei aqui, Joseph. Pode ficar com a sua varanda. – Ela retrucou e passou por ele, mas não pode ir muito longe porque sentiu sua mão pesada segurá-la pelo antebraço.

— Qual a sensação? – Ele questionou e, pela primeira vez naquela noite, um vestígio de medo percorreu o corpo de Rebecca, mas ela se esforçou para não deixar transparecer.

— A sensação de ter você segurando o meu braço? Bem, você é só mais um…

— Não. – Joseph a interrompeu, virando-se para olhá-la no fundo dos olhos. – A sensação de se estar apaixonado. Qual é?

— O que? – Rebecca o encarou boquiaberta por um instante, sem saber bem o que responder.

Não sabia porque aquilo lhe interessava, já que duvidava que amor e outros sentimentos significassem alguma coisa para ele, mas ele parecia realmente interessado na resposta, então, ela se forçou a respirar fundo e pensar em uma explicação para lhe dar.

— Bem, é como… pular de um prédio. – Se viu respondendo, ao passo em que Joseph franziu o cenho, parecendo perdido com sua resposta vaga. – Eu sei, eu sei. Não faz muito sentido, mas estar apaixonado é assim. Sabe, quando você gosta mesmo de alguém, você… se doa. Você abre o seu coração e o coloca inteiramente nas mãos de outra pessoa. É basicamente como pular de um prédio sem saber se terá uma rede de proteção lá embaixo ou não. Você se entrega, entende? Você fecha os seus olhos e simplesmente pula. Se arrisca e confia e… pode ser que aquela pessoa que você ama esteja lá para te segurar no fim das contas ou pode ser que você caia de cara no asfalto, mas estar apaixonado é isso: simplesmente subir na torre mais alta e se jogar.

— E isso é bom? – Joseph perguntou como se duvidasse que estar tão vulnerável assim pudesse ser, de alguma forma, agradável.

— Na verdade, é assustador. – Rebecca confidenciou. – Mas o amor e a vida são assim mesmo. Você só torce para dar certo.

Joseph a encarou como se estivesse ponderando suas palavras e, quando pareceu finalmente ter chegado a um veredito, soltou seu antebraço devagar e se afastou, seguindo até o parapeito da varanda onde se recostou sobre os cotovelos e permaneceu encarando a paisagem fria e branca a sua frente. Rebecca, por sua vez, até pensou em deixá-lo sozinho e voltar para o conforto e para o calor que a aguardavam dentro da casa, mas a psicóloga que havia em si a impediu. Sem entender bem o porquê, ela se viu dando meia volta e parando na varanda ao lado de Joseph, basicamente na mesma posição que ele.

— Você acha que está apaixonado por alguém? – Ela se atreveu a perguntar, surpreendendo-se quando um riso baixo escapou dos lábios dele.

— Eu não me apaixono. – Ele respondeu com sinceridade. – Eu nem mesmo sei o que é isso. Na verdade, eu não sei bem o que é nada. Na clínica onde o meu pai me colocou, os médicos disseram que a minha cabeça não funciona direito, sabe? Eu não consigo sentir como vocês, eu só replico o sentimento, mas é tudo falso. De alguma forma, eu sou como um espelho. Vocês agem, eu imito. É o mais perto que vou chegar de gostar de alguém.

— Então, porque a curiosidade?

— Exatamente porque eu não sei como é estar apaixonado. – Ele a olhou de lado. – Eu vi você e o A.J. no almoço hoje. Vocês pareciam… sei lá, felizes ou bobos, depende de como você interprete. Mas aquilo parecia ser bom, então, eu… eu só queria entender o porquê.

— E você entendeu?

Joseph se virou completamente para ela e olhou-a de cima a baixo, demoradamente, fazendo-a se sentir mais exposta do que jamais se sentira na vida. Era como se ele a estivesse estudando, como se tentasse enxergar através de sua pele, no recanto mais profundo de sua alma e tentasse desvendar o que a tornava quem ela era. Da forma como Rebecca o enxergava, ela se sentia como um dos pequenos sapos de suas aulas de biologia no colégio e, Joseph, era aquele adolescente curioso que mal podia esperar para abri-la com um bisturi e ver como ela funcionava por dentro. Era aterrorizante, mas, ao mesmo tempo, era admirável.

— Não. – Ele finalmente respondeu, voltando a encarar a paisagem gelada lá fora. – Não entendi nada.

Rebecca assentiu para ele, não tão surpresa com sua resposta quanto deveria. Para alguém que não conseguia sentir tais coisas, sua explicação sobre o amor certamente tinha sido algo muito confuso e irracional, afinal, quem pularia de um prédio confiando apenas que haveria outro alguém lá embaixo para segurá-lo? Era insano. Mas pessoas apaixonadas compreenderiam.

— Qual foi a clínica onde você se tratou? – Ela perguntou antes que pudesse impedir a si mesma de fazê-lo. Talvez Joseph não quisesse compartilhar tais coisas, talvez reavivar as lembranças desse período o fizesse ter um ataque de fúria, mas agora era tarde demais para engolir as palavras de volta, então, ela só esperou, prendendo a respiração.

— Bethlem Royal. – Joseph respondeu de maneira calma e desinteressada. – Sabia que, na antiguidade, eles colocavam os pacientes expostos em jaulas para que as pessoas pudessem observá-los e cutucá-los com varas?

— Sim. Eu li um artigo a respeito. – Rebecca confirmou. – É o hospital psiquiátrico mais antigo do mundo ainda em funcionamento e, infelizmente, os hospitais psiquiátricos daquela época não tinham boas histórias para contar.

— Algumas pessoas dizem que o Bethlem é assombrado.

— E ele é? – Ela perguntou nem tanto por curiosidade, já que era muito cética para acreditar em tais histórias, mas, sim, para que Joseph continuasse falando, pois achava interessante a forma como ele via o mundo e a vida no geral.

— Os monstros mais perigosos que vi por lá foram as pessoas como eu. – Joseph respondeu sem rodeios. – E, agora, eu estou aqui nessa casa e há facas bem afiadas na cozinha. – Ele a encarou com seriedade e o peso de suas palavras fez com que Rebecca quisesse se afastar imediatamente, mas ela mal deu um passo atrás antes dele a segurar pelo pulso e a prender ali, com firmeza. – O que é mais assustador para você, Rebecca? Ver luzes piscando e coisas se movendo sem ninguém tocá-las ou a possibilidade de eu invadir o seu quarto essa noite e cortar a sua garganta enquanto você dorme?

Suas palavras fizeram Rebecca respirar fundo e engolir em seco e, se fosse biologicamente possível, ela poderia jurar que seu sangue havia se congelado em suas veias, mas, ainda assim, ela tentou manter a calma, enquanto sua mente girava a procura de algo inteligente para dizer, algo que desse a ela tempo suficiente para achar uma forma de se soltar das mãos dele e sair da varanda sem fazer um escândalo, pois não queria gritar e estragar a festa de natal com a qual Christopher tanto sonhara antes mesmo que ela tivesse começado. No entanto, não conseguia pensar em nada que fosse bom o bastante. Basicamente, ela mal conseguia raciocinar encarando os olhos azuis cruéis e gelados dele.

— Você não tem porque fazer isso, Joseph. – Balbuciou sem muita confiança. – Eu não represento nenhuma ameaça para você e…

— Você tem razão. – Joseph concordou, ainda segurando-a firmemente pelo pulso. – Eu não tenho motivos para te machucar e sei que isso só me traria problemas, mas às vezes eu fico imaginando… – Ele traçou uma linha suave no pescoço dela com o dedo indicador e, depois, subiu, acariciando um lado de seu rosto. – Sei que está aqui comigo porque acha que eu daria um estudo de caso interessante, Rebecca. Eu entendo. Sei que cursa psicologia e você não é a primeira pessoa que conheço a pensar assim, mas se quer mesmo saber como a minha mente funciona, eu posso te contar. – Ele aproximou seu rosto do dela e, por um instante, Rebecca temeu que ele fosse beijá-la a força, mas ele apenas encostou os lábios em sua orelha e sussurrou: – Ser como eu também é como pular de um prédio às vezes, mas, no meu caso, não pular significa seguir as regras e, pular, significa ignorá-las e seguir os meus próprios desejos.

“Todos os dias, sem exceção, eu preciso lembrar a mim mesmo do porquê eu não devo ferir ninguém, do porquê eu não devo fazer algo terrível… Então, você não pode se distrair comigo, Rebecca. Nem agora, nem nunca. Enquanto conversávamos, talvez você tenha baixado sua guarda e pensado, ainda que por um instante, que eu não sou tão perigoso assim e que poderíamos ser amigos se você se aproximasse de mim do jeito certo, mas nós não podemos. Sou muito bom em ler as pessoas e sei que você acha que, se conseguiu despertar a parte boa do A.J., talvez possa fazer algo parecido comigo, mas você não pode. Nos últimos cinco minutos, eu pensei em dez maneiras diferentes de te machucar, pensei em dez lugares para onde eu poderia te levar e onde ninguém te encontraria, pensei em dez partes do seu corpo que eu gostaria de ver sangrar e pensei, até mesmo, em dez posições sexuais diferentes nas quais eu poderia te colocar sem muito esforço. Não tenho motivos para fazer isso com você, é um fato. Mas não confie em mim, Rebecca. Não baixe a guarda comigo de novo, porque eu mudo de ideia muito rápido. – Joseph concluiu segurando o rosto dela entre as mãos, antes de depositar um beijo tão suave em sua testa, que o toque se assemelhou a sensação de ser tocada pelas asas de uma borboleta.”

Ele lançou um último olhar a ela e, quando finalmente a soltou e saiu da varanda com passos ritmados e silenciosos, Rebecca teve que se apoiar em uma das colunas ali porque o discurso dele a deixou tremendo. De fato, por um instante, enquanto conversavam, ela chegou a se perguntar se ele seria assim tão mal, se talvez tudo o que faltava a ele não era apenas um pouco de carinho e afeto e se ele a deixaria se aproximar o bastante caso ela demonstrasse que se importava o suficiente, mas as coisas que passaram pela cabeça dele, no mesmo espaço de tempo, não poderiam ser mais diferentes.

Ela sabia que psicopatas enxergavam as pessoas como peças em um tabuleiro de xadrez, sacrificando aquelas que eram necessárias para fazê-los ganhar um jogo e sabia que, embora a psicopatia não fosse uma doença tão incurável quanto se pressupunha e houvesse a possibilidade de atenuar um comportamento psicopata com seções regulares de psicologia e medicamentos controlados, era muito difícil conseguir bons resultados na prática. Mesmo assim, ela tinha ficado ali, com Joseph, imaginando que uma simples conversa franca o tornaria mais humano e, agora, ela entendia bem porque tantas pessoas morriam sem nem imaginar o risco que tinham corrido antes. Quando se tratava de psicopatas, era fácil se deixar levar por sua falsa amabilidade.

— Bee? – Aaron parou na entrada da varanda, encarando-a com uma expressão confusa e um tanto preocupada. – Você está bem?

Rebecca logo percebeu que devia estar tão pálida quanto a neve lá fora e fria à igual maneira, então, tratou de se recompor e estampar um sorriso falso nos lábios, porque não queria que ele percebesse o quanto estava abalada. Essa noite ela, certamente, não dormiria em paz e, muito provavelmente, procuraria abrigo no quarto e nos braços de Aaron, não importa o que Briana pudesse pensar a respeito, mas, até lá, ela se manteria firme e não estragaria o Natal dos garotos com suas confissões assustadas. Seu estômago, no entanto, ainda estava se revirando de medo e a última coisa em que ela pensou ao olhar para a belíssima mesa de jantar, na qual Joseph já estava sentado, observando-a com sua expressão desinteressada de sempre, foi na comida apetitosa que a aguardava. A primeira, no entanto, foi nas facas que ali estavam.


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Notas finais do capítulo

Uhhh, então, espero que tenham gostado do capítulo. Tivemos nosso reencontro com o Christopher e toda a sua fofura e esse momentinho macabro entre Joseph e Rebecca... Mais alguém aí sentiu um friozinho de medo ou foi só a nossa Bee kkk
Próximo capítulo ainda tem muuuuita coisa para acontecer nesse jantar de natal, então, espero vocês lá.
Beijokas e até breve.