Wake Me Up escrita por Rhyenx Seiryu


Capítulo 30
O Que Os Olhos Não Veem


Notas iniciais do capítulo

EU ESTOU ATRASADA!
Eu sei, mas infelizmente só consegui terminar o capítulo agora então eu espero que vocês me desculpem por não ter postado na sexta-feira (eu disse sexta mesmo?) como prometi.
Esse é um capítulo que vocês já conhecem, mas com uma surpresinha no final. Espero que gostem.
Boa leitura.



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Aaron dirigiu por pouco mais de duas horas, mas, para ele, foi como uma eternidade. A cada curva que fazia, era como se as palavras duras de Rebecca estivessem se solidificando em sua mente e, embora ele soubesse que as merecia, não conseguia evitar que elas o atingissem.

De inicio, tudo o que fez ao sair do estacionamento do St. Hildas, foi dirigir a esmo pelas estradas ao sul de Oxford, ocasionalmente esmurrando o volante de seu carro sempre que as palavras de Rebecca inundavam sua cabeça, mas conforme o tempo foi passando, foi como se uma luz tivesse se acendido ao longo do caminho, guiando-o de volta para o único lugar onde ele pensou que jamais iria em busca de conforto: o Cemitério Highgate.

Fazia quase sete anos que Aaron não ia a Londres e voltar à cidade onde ele havia sido criado e onde sua mãe e seu padrasto ainda moravam o deixava nervoso, mas nada disso se comparava ao que ele sentiu quando estacionou seu carro em uma das vagas em frente ao grande portão negro que cercava o cemitério onde seu pai havia sido sepultado dezesseis anos antes.

Aaron jamais pensou que voltaria a atravessar aqueles portões e, após comprar um pequeno buquê de flores – e pensar em dar meia volta e ir embora pelo menos dez vezes –, finalmente reuniu toda a coragem que tinha e entrou no cemitério, parando antes de alcançar a primeira fileira de lápides e olhando ao redor, confuso.

A última vez que estivera ali, Aaron tinha apenas seis anos e, para uma criança, era difícil se concentrar em gravar o caminho por onde passava ao invés de se concentrar na aparência assustadora dos túmulos e das grandes estátuas de anjos que havia ao seu redor. Além disso, o Cemitério Highgate havia crescido e passado por algumas mudanças naqueles dezesseis anos, por isso, ele teve certa dificuldade para se situar.

Tudo de que se lembrava era que o túmulo de seu pai ficava ao lado de um grande bordo vermelho e, como havia dezenas de árvores iguais aquela espalhadas pelo cemitério, Aaron precisou andar a esmo por quase vinte minutos até, finalmente, encontrar uma grande lápide de granito, já quase encoberta pelo mato e bastante deteriorada pelo tempo, onde o nome Anthony D. Greed estava escrito em letras maiúsculas logo acima dos dizeres “Filho e Pai Amado”.

Aaron arrancou um pouco do mato que havia ali, depositou o buquê de flores com cuidado sobre a sepultura e, por um momento, apenas a encarou em silêncio. Ele não sabia bem como agir diante daquela situação, pois sua mãe sempre fizera questão de ensiná-lo a pensar na morte como o ponto final de uma estrada e, tal fato, fez com ele passasse a ver as manifestações de luto como atitudes idiotas e sem sentido.

Porém, agora que estava ali, diante do túmulo de seu pai, Aaron não pode deixar de desejar que tudo o que sua mãe lhe ensinara a respeito da morte estivesse errado e que, em algum lugar e de alguma forma, seu pai ainda estivesse olhando para ele e lhe escutando.

– Oi, pai. – Aaron finalmente disse, depois de passar alguns minutos em uma batalha interna contra a parte de si que ainda achava que falar com os mortos era uma idiotice – Desculpe por não ter vindo te visitar antes. Não sei se você sabe, mas minha mãe nunca me deixou vir aqui quando eu era criança e, quando eu tive idade suficiente para vir sozinho, eu não tive coragem. Para ser bem sincero, eu tenho um pouco de medo desse lugar, sabe? Ele me traz lembranças ruins e, eu sei que já se passaram dezesseis anos, mas eu ainda não aprendi a lidar com elas.

Uma rajada de vento atravessou o cemitério, lançando algumas folhas amareladas no rosto de Aaron e ele as afastou de lá rapidamente e olhou para cima. O céu estava nublado e, apesar de a temperatura estar por volta dos 17°, a incessante ventania, característica do outono inglês, fazia a sensação térmica ficar bem mais baixa.

– Sabe – Aaron continuou, desviando sua atenção do céu para a lápide de seu pai novamente –, eu passei muito tempo desejando que você pudesse me explicar porque fez aquilo. Quando você morreu, as pessoas falaram muitas coisas sobre você e criaram muitas suposições sobre o seu suicídio, mas eu nunca me importei com o que elas diziam. Eu sempre desejei poder ouvir os motivos da sua boca e, muitas vezes, eu me perguntava se você teria me deixado uma carta ou algo assim. – Aaron confessou em voz baixa – A verdade, pai, é que era doloroso pensar que você apenas tinha desistido de mim e, por isso, eu ficava fantasiando que algum dia eu encontraria uma mensagem sua, me explicando tudo e dizendo que me amava e que não queria ter me deixado, mas... Depois de alguns anos eu percebi que essa mensagem só existia realmente nas minhas fantasias de criança.

Aaron parou e respirou fundo. Sentia que estava prestes a começar a chorar e queria evitar tal coisa. Há alguns anos ele havia jurado que nunca mais iria chorar, mas estava falhando e ter de voltar atrás em sua própria palavra o deixava frustrado, pois confiança em si mesmo era a única coisa que ele ainda tinha e, pouco a pouco, ele estava perdendo isso também.

– Eu sei que as coisas estavam difíceis para você. – Aaron prosseguiu quando se sentiu mais seguro – Eu tinha apenas seis anos, mas eu via como você estava, pai. Sei que estava sendo complicado lidar com toda aquela situação e que você estava cansado, mas... você nem sequer pensou em como as suas decisões me afetariam? Eu era só uma criança e a única lembrança que eu tenho do meu aniversário de seis anos é a do seu sangue se espalhando pelo chão da sala. Isso não é justo!

Aaron parou novamente e levou as mãos ao rosto, que já estava completamente molhado por causa das lágrimas. Ele sequer tinha percebido que havia começado a chorar, mas não se surpreendeu. Desde a fatídica visita que Erick havia lhe feito, ele vinha se sentindo constantemente à beira das lágrimas e, de certa forma, já sabia que não conseguiria segurá-las por muito tempo. Além do mais, Aaron havia guardado aqueles sentimentos por tantos anos que sentia que já estava mesmo na hora de deixá-los vir à tona.

– Acho que você nem sabe quanto tempo eu passei sem conseguir dormir direito depois que você morreu, não é? – ele continuou tentando, inutilmente, conter as lágrimas que escorriam de forma incessante por seu rosto – As primeiras semanas foram as mais difíceis. Sempre que eu fechava os meus olhos eu via aquela cena se repetir dentro da minha cabeça e, mesmo depois de alguns anos, eu ainda acordava no meio da noite, ouvindo o barulho do tiro e aquilo me assustava, mas eu não podia chorar. Eu não podia chorar porque se o Erick me ouvisse chorando, ele me batia. Então, eu engolia o choro e tentava dormir de novo... mas eu não conseguia, pai.

Aaron respirou fundo e, mais uma vez, tentou enxugar as lágrimas que escorriam por seus olhos, pois, da forma que estava, ele quase não conseguia enxergar a lápide a sua frente. Tudo parecia estar borrado.

– Eu só queria que você tivesse sido um pouco mais forte. – ele continuou – Queria que tivesse pensado em todas as consequências antes de fazer o que fez, porque aí, talvez, você teria percebido que eu precisava de você comigo, pai. Eu precisava que você me ensinasse a ser um homem e precisava que me desse bronca quando eu merecesse. Precisava de todas aquelas pequenas coisas, como receber conselhos sobre garotas ou ter a minha primeira aula de direção com você. – ele respirou fundo – São coisas bobas e que muitas pessoas acham desnecessárias, mas eu precisava disso e você tirou tudo isso de mim. Quando apertou aquele gatilho você acabou com a sua vida e com a minha, pois, de certa forma, eu também morri naquele dia.

Aaron engoliu em seco e fixou o olhar nas árvores a sua frente sem realmente enxergá-las. Por mais que amasse o pai, havia certas mágoas em seu coração que nem mesmo todo esse amor seria capaz de curar.

– Eu passei por momentos muito ruins sem você. – ele continuou, sentando-se próximo ao túmulo de seu pai – Todas as datas comemorativas eram um inferno para mim. Aliás, elas ainda são, mas é incrível como o tempo tem a capacidade de fazer com que nos acostumemos com a dor de tal forma que ela se torne, não apenas algo suportável, mas também familiar. Quase como se fosse uma velha amiga, sabe?

Ele enxugou o restante das lágrimas em seu rosto e começou a arrancar o mato que havia ao redor da sepultura. Suas folhas eram grandes e ásperas e abriam pequenos cortes na palma de sua mão quando ele as puxava com muita força, mas ele não se importava. Apesar de os cortes arderem um pouco, não eram nada se comparados a todas as surras que Erick já havia lhe dado em sua vida.

– E, por falar em amigos... – Aaron disse quando finalmente conseguiu parar de chorar por completo – Eu conheci uma garota esse semestre. Ela se chama Rebecca e, cá entre nós, ela é muito chata. – ele abriu um sorriso triste – Ela é aquele tipo de garota certinha, que insiste em ver o melhor das pessoas e que tem potencial para ser um daqueles embaixadores da ONU, que ainda acreditam que é possível alcançar a paz mundial, sabe? Às vezes eu tenho vontade de agarrá-la pelos ombros, sacudi-la e dizer: “Ei, garota! Acorda! O mundo não é feito de algodão doce.”, mas... aí eu percebo que é exatamente isso o que eu gosto nela, entende? A Rebecca é tudo o que eu não sou.

Aaron pausou e esfregou as mãos uma na outra para aliviar o ardor causado pelos pequenos cortes que havia nelas.

– Eu não sei como foi quando você e a mamãe se conheceram. – ele prosseguiu – Ela não falava sobre você e eu também não perguntava. Eu até tentei perguntar uma vez, mas ela gritou comigo e, depois disso, eu parei de fazer perguntas. Acho que falar sobre você a irritava, mas isso não tem importância agora, pois eu não vim aqui falar sobre ela. – ele suspirou – Bem... Na verdade, eu nem sei exatamente porque vim até aqui. Acho que eu só precisava dar um tempo de tudo. Desabafar um pouco. Tem muita coisa dentro da minha cabeça e acho que, se eu não colocar todas elas para fora agora, eu vou acabar enlouquecendo.

Ele fechou os olhos e apertou a ponte do nariz para manter a calma.

– A garota de quem eu falei... – recomeçou devagar – Ela tem um irmão. O nome dele é Ty e ele é meu colega de quarto na universidade. Ele é um cara legal, mas... eu fiz algumas coisas ruins para ele. – Aaron fez uma careta – Agora, a Rebecca descobriu tudo e está furiosa comigo. Eu não me importava com isso antes, mas agora é diferente. Sei lá. Quando ela disse que eu era um ser humano desprezível, isso... doeu mais que levar um tapa.

Aaron suspirou e se colocou de pé.

– Eu não sei como funciona essa história de gostar de alguém. Na verdade, eu nem sei se eu realmente gosto da Rebecca porque, cá entre nós, ela me tira do sério. – ele franziu a testa enquanto pensava – A questão é que ela não é como as outras garotas que eu conheço, entende? As garotas com quem eu me envolvo, geralmente, agem como se eu fosse o cara mais legal do mundo, já a Rebecca... – Aaron revirou os olhos e riu – ela sempre faz com que eu me sinta um completo idiota e, por mais estranho que isso possa parecer, eu gosto disso. Parece que, diferente das outras pessoas, ela consegue enxergar quem eu realmente sou e, não, quem eu demonstro ser, sabe? Acho que ninguém nunca olhou para mim assim. Ninguém nunca me viu de verdade.

Aaron chutou uma pequena pedra aos seus pés e deu outra olhada no céu que parecia ficar mais nublado a cada segundo, indicando que ele deveria encerrar aquela visita logo, caso não quisesse dirigir de volta para Oxford em meio a uma tempestade.

– Bem – ele prosseguiu espreguiçando-se –, eu só queria desabafar um pouco. Na verdade, acho que não importa se eu gosto da Rebecca ou não, porque agora ela me odeia e, mesmo que não odiasse, eu não acredito que, algum dia, eu poderia ter qualquer tipo de relacionamento com alguém. Quero dizer, eu não sou esse tipo de cara. Acho que... Acho que eu nunca vou ser.

Ele suspirou e abriu um sorriso triste. Highgate era, para ele, como uma ponte entre o que era confortável e o que havia no submundo de seus sentimentos e, até aquele momento, ele nunca tivera coragem de atravessá-la. Porém, agora que a havia atravessado, estava satisfeito por tê-lo feito.

Voltar ao Cemitério de Highgate naquele dia tinha sido doloroso, mas também tinha sido libertador. Havia muitas mágoas e medos dentro de Aaron que ele precisava colocar para fora e, mesmo que a conversa que tivera com seu pai tivesse sido unilateral, ela já havia sido suficiente para retirar um pouco do peso que ele carregava sobre os ombros.

O clarão de um raio cortou os céus e Aaron tapou os ouvidos e fez uma careta em antecipação ao barulho estrondoso do trovão que estava por vir.

– Acho que está na hora de eu ir. – ele disse com um sorriso – Foi bom ter vindo aqui hoje e eu prometo que voltarei outras vezes para te visitar, ok?

Aaron se virou para ir embora, mas, antes de dar um só passo, lembrou-se de que ainda havia algo que queria dizer ao pai e, então, se voltou novamente para a lápide de granito que se erguia a sua frente.

– Eu só queria que você soubesse que eu te amo e que, seja lá onde você esteja agora, eu desejo que você esteja em paz. – ele concluiu e, então, se afastou seguindo em direção a saída do cemitério enquanto a tempestade começava a desabar sobre Londres.

Dirigir no meio da chuva e enfrentando ventos que açoitavam as copas das árvores quase como se quisessem arrancá-las do chão não foi nada agradável, mas depois de quase três horas de viagem ele chegou ao estacionamento da Trinity College e, de lá, praticamente voou para seu dormitório, mas ainda assim não conseguiu evitar que suas roupas ficassem encharcadas.

Sua porta estava trancada e seu quarto estava completamente escuro quando ele entrou, um sinal claro de que Ty não estava ali, mas o que Aaron realmente não esperava era encontrar Mikhail sentado em sua cama quando acendeu a luz.

– Ai, meu Deus! – ele quase pulou para trás, mas conseguiu se conter antes que isso acontecesse e, simplesmente, levou a mão peito e respirou fundo – Puta que pariu, cara! Você quase me matou de susto. Que merda você tá fazendo aqui?

– Eu estava esperando por você. – Mikhail respondeu calmamente – Porque não termina de entrar e fecha a porta?

– Cadê o Ty? – Aaron relanceou os olhos na direção do banheiro, mas o cômodo estava completamente escuro, então, era bastante improvável que Ty estivesse ali dentro.

– Ele está no meu dormitório. – Mikhail se colocou de pé – Não quer voltar para cá e até pensou em abandonar a universidade. Por sua causa, é claro. Ele me contou o que você fez com a foto.

– Olha, cara... – Aaron começou a se explicar, mas Mikhail venceu a distância entre eles com três passos rápidos e o segurou pela gola da camiseta, jogando-o contra a porta, com tanta força, que a fez se fechar com um baque estrondoso.

– Eu não gosto de você, Greed. – ele disse em um tom grave e ameaçador – Nunca gostei e todas as vezes em que você fez o Ty chorar eu prometi a mim mesmo que te daria uma surra da qual você jamais se esqueceria.

– Pega leve. – Aaron ergueu as mãos, suando frio – Eu nunca pensei em mostrar aquela foto para os pais dele, tá? Eu só queria...

– Você brincou com a gente por mais de um ano. – Mikhail voltou a empurrá-lo contra a porta, fazendo o contrair o rosto em uma leve careta de dor – Fez da vida do Ty um inferno e curtiu com a minha cara mais vezes do que eu considero saudável, Greed. Eu podia te arrebentar agora, sabia? Podia fazer você engolir cada uma das palavras que você me disse juntamente com os seus dentes, mas eu não vou. – Mikhail o soltou e se afastou um passo – Apesar de eu querer muito. – ele completou e Aaron baixou as mãos e olhou para ele, confuso.

Por um instante, pensou que levaria a maior surra de sua vida, mas, ao invés disso, Mikhail tinha recuado e, agora, estava parado diante dele, encarando-o com uma expressão tão calma que era quase como se ele nem tivesse ameaçado agredi-lo apenas alguns segundos antes.

– Você tem transtorno bipolar, é? – Aaron perguntou, indeciso entre ficar com raiva pela forma como Mikhail estava agindo ou aliviado por ele não ter decidido fazê-lo engolir os próprios dentes – Sério, cara. Você não é normal.

– O Ty me contou que você o defendeu dos garotos que tentaram agredi-lo na segunda-feira. – Mikhail explicou – Se não fosse por você, ele provavelmente estaria no hospital agora, então, obrigado.

– Não sei o que ele te contou, mas com certeza não é a verdade. – Aaron bufou, sentindo-se ainda mais incomodado com a situação e se afastou da porta, seguindo até sua cômoda do outro lado do quarto – Eu não fiz isso por ele. Só não estava com paciência para lidar com as piadinhas do Derek Wright. O cara é um otário.

– Não o conheci antes de você arrebentar o nariz dele numa parede, mas imagino que ele seja mesmo. Aliás, essa é outra coisa pela qual preciso te agradecer. Desde que você massacrou esse cara ninguém mais se atreveu a mexer com o Ty. Acho que você assustou todo mundo.

– Que se foda. – Aaron deu de ombros, sem se importar.

– Outra coisa que eu vim te falar foi que fui à reitoria hoje. – Mikhail prosseguiu – Depois que o Ty me contou que você tinha excluído a foto há quase um ano, eu fui procurar o reitor para te denunciar e fazê-lo retirar da ficha do Ty todas as advertências que ele já tinha levado por você, mas acabei descobrindo uma coisa super interessante: o Ty não tem advertência nenhuma no histórico dele. Você sabia disso?

Aaron retirou a blusa molhada que estava usando, mas não disse nada, então, Mikhail se aproximou dele.

– O reitor me contou que você assumiu a culpa por todas elas.

– Não faço ideia do que você está falando. – Aaron virou as costas para ele, mas Mikhail apenas revirou os olhos.

– Eu não acredito em você, Aaron. Aliás, eu estou começando a achar que, na verdade, você não é o ser humano horrível que nos fez acreditar que fosse.

– Isso é um elogio? Pois eu estou tão emocionado que acho até que vou vomitar.

– Eu vi o seu histórico. – Mikhail disse de repente e Aaron olhou para ele, irritado – O que foi? – ele sorriu ao ver seu olhar raivoso – Você acha que é o único aqui que pode ter contatos na secretaria, é?

– O que é que você quer comigo afinal de contas?! – Aaron esbravejou, largando sua camiseta molhada no chão – Você entra no meu dormitório, me ameaça e depois começa com esse papinho ridículo, cara. Que porra você quer? E eu espero que você não diga sexo, porque você não faz o meu tipo, tá legal?

A gargalhada que Mikhail soltou ecoou tão alta pelo dormitório que Aaron teve quase certeza de que o alojamento inteiro pode ouvi-la.

– Você é uma piada, sabia? – Mikhail disse ainda sorrindo – Não é porque eu sou gay que eu quero transar com todos os homens que eu vejo na minha frente, Aaron. Eu tenho tanto interesse em você quanto em um poste.

– Dane-se. – Aaron cruzou os braços diante do peito e o encarou – O que é que você veio fazer aqui?

– Vim conversar. – Mikhail deu de ombros – Tentar te entender, porque eu ainda não consegui e, como eu disse antes, eu vi o seu histórico. Jamais imaginei que essa fosse a sua segunda graduação, Aaron. Aliás, eu também fiquei muito surpreso quando descobri que a primeira graduação que você fez foi em Serviço Social. Quero dizer, que tipo de chantagista frio e cruel faz uma graduação em Serviço Social?

– O tipo que está se segurando muito para não chutar a sua bunda para fora daqui.

– E você tem boas notas também. – Mikhail continuou como se ele não tivesse dito nada – Suas médias são basicamente oito e nove. E, no início, eu pensei que isso era por causa dos trabalhos que o Ty fazia para você, mas aí eu cheguei aqui, dei uma olhada nas suas coisas e... BANG! – Mikhail puxou uma das gavetas da cômoda de Aaron e tirou de lá uma pasta repleta de trabalhos escolares antigos que jogou sobre a cama – Você não entregou nenhum dos trabalhos que o Ty fez para você, Aaron. Sabe o que isso significa?

– Que você é curioso e intrometido pra caralho? – Aaron o provocou, mas Mikhail ignorou aquilo.

– Significa que você obrigou o Ty a fazer os seus trabalhos apenas por que podia. – ele respondeu – Você é inteligente, Aaron. Mesmo que quase não vá aulas, no fim das contas, você quase sempre gabarita as provas, mas você age como se fosse um estudante medíocre, que não se interessa por nada e todo mundo acredita nisso. Eu mesmo acreditava nisso antes de ver o seu histórico hoje, mas agora eu sei que essa não é a verdade, então, o que mais você esconde aí dentro, hein? O que mais há na sua caixinha de surpresas que você não deixa que o restante do mundo veja?

Aproveitando que a gaveta estava aberta, Aaron capturou uma camiseta qualquer ali dentro e a vestiu, rapidamente, antes de se desviar de Mikhail e seguir para a porta.

– Faça um favor para mim e avise ao seu namorado que ele pode voltar para o dormitório quando quiser. – disse enquanto saía do quarto – Vou passar aqui amanhã de manhã e recolher as minhas coisas. Agora, se você não for dormir aqui esta noite, sugiro que tranque a porta depois que sair. Tenho certeza que você tem a chave, não é?

Aaron bateu a porta atrás de si e Mikhail ficou encarando o quarto vazio por alguns instantes. Havia passado muito tempo sozinho ali dentro, pensando se deveria ou não se vingar de Aaron por tudo de ruim que ele havia feito com Ty, mas, agora, achava que tinha tomado a decisão correta ao resolver deixar toda aquela história para lá.

Estava mais que na cara que Aaron já tinha problemas maiores e Mikhail tinha quase certeza de que nenhuma dor física que pudesse infligir a ele seria maior que a dor emocional que ele, provavelmente, já estava sentindo.

Aaron Greed era uma incógnita e suas atitudes grosseiras e provocativas, certamente, só serviam para camuflar as cicatrizes que ele escondia dentro de si, mas não cabia a Mikhail tentar ajudá-lo. Sua boa ação do dia ele já tinha feito e ela consistia, justamente, em ter deixado que Aaron saísse daquele dormitório sem a ajuda de uma maca.

Qualquer coisa além disso não era mais um problema seu.


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Notas finais do capítulo

Ohoho! Muitas pequenas surpresinhas nesse capítulo, hein? Espero que tenham gostado e, assim que possível, eu apareço aqui com o próximo capítulo que também vai reservar uma surpresinha para vocês.
Beijos e até o próximo.



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