PÉ – PÉ – PÉ

Sem nem mesmo ver que horas eram e ainda mais dormindo do que acordada, alcancei meu despertador no criado mudo e o joguei pela janela sem pensar duas vezes. Abri um leve sorriso ao ouvir um completo silêncio novamente e novamente afundei minha cara no travesseiro para encarar mais algum tempo de sono. Mas sabem como é, como tudo que é bom dura pouco, meu celular começou a despertar no minuto seguinte! Mas dessa vez não o taquei pela janela porque né, é meu celular e custou caro! Desliguei o despertador e fui me arrastando até o banheiro.

Ao me olhar no espelho, levei um susto: eu estava parecendo um zumbi! Se alguém entrasse no banheiro naquele mesmo momento provavelmente iria sair correndo procurando algo para se proteger de mim! Mas não é para pouco, meu cabelo estava completamente bagunçado, olheiras profundas contornavam meus olhos, sem falar na minha cara de quem tinha sido atropelada. Eu não devia ter dormido tão tarde ontem.

Tomei um banho rápido, só pra acordar, o que não deu muito certo, porque estou meio que dormindo ainda...

Não sou o tipo de garota que se arruma toda para ir ao colégio, mas hoje uma maquiagem era indispensável para esconder essas olheiras assustadoras. Em menos de cinco minutos já estava pronta para ir ao colégio. Olhei em meu celular de novo e caramba, já são quase 7:00! Estou quase atrasada!

– Bom dia Hime! – nossa empregada, Virgo, me cumprimentou. – O que faz por aqui ainda? A senhoria está atrasada. – Ao terminar de falar de falar, entregou-me um pacote que imagino que haja um lanche dentro.

Virgo é nossa empregada desde que me entendo por gente. Sempre a considerei como uma irmã mais velha, não apenas uma simples empregada. Quando mamãe morreu, ela me deu um apoio considerável, chegando a ser como uma segunda mãe para mim. Eu a adoro muito, espero que papai consiga um novo emprego logo, não sei por quanto tempo conseguirei sustentar-nos e não quero ter que demitir Virgo.

– Quase atrasada, na verdade e obrigada. - corrigi sem graça. – Até mais tarde, Virgo!

– Tenha um bom dia, Hime!

Realmente espero que sim, o azar tem me perseguido muito ultimamente.

[...]

Meu atraso desta manhã havia me feito esquecer completamente da notícia que me fora dada por Lisanna... Até eu chegar ao colégio. Não sei por quanto tempo fiquei parada em frente aos portões, mas sei que se eu não entrasse logo, eles se fechariam na minha frente. Mas e se Sting estivesse lá? E se me reconhecesse? O que eu faria? O que ele faria? Minhas pernas começaram a bambear e uma súbita vontade de fugir dali se apossou de mim.

– Lucy? O que está fazendo aqui? – uma voz ofegante atrás de mim se pronunciou – Os portões já vão fechar, vamos logo! – o pequeno ser chamado Levy me arrastou para dentro do colégio.

Paramos em frente à nossa sala, não me sentia pronta para encará-lo, caso estivesse lá, então, me aproveitando do fato de que o professor Macao ainda não estava na sala, disse à Levy que iria ao banheiro e que logo mais voltava.

– Você está bem, Lu-chan? Está meio estranha hoje. - Levy hesitava na frente da porta.

– Estou sim, só dormi mal noite passada, vou só passar uma água no meu rosto, não se preocupe. – falei já indo em direção ao banheiro.

– Se você diz... – e entrou na sala.

Droga, estou deixando na cara demais que não estou bem! Preciso me esforçar muito mais na minha atuação, não posso deixar que saibam de minha breve história com Sting, não quero preocupar ninguém com isso! Calma Lucy! Respira fundo, e volte pra sala, já está mais que atrasada, mais tarde você resolve esse problema.

E com esse pensamento, me direcionei para a saída do banheiro feminino, porém, a porta se abriu com tudo e um corpo veio correndo em minha direção, esbarrando em mim e como o chão estava levemente escorregadio, consequentemente nos jogando no chão.

– Ei, por que não olha por onde an... – não pude completar minha pergunta após abrir os olhos e descobrir quem era o caminhão que havia me atropelado. – AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH!!!!!!!

– AAAAAAAAAAAAAAAHHH!!! LUCY???? O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO NO BANHEIRO MASCULINO??? – perguntou o ser cor de rosa ainda em cima de mim.

– ESSE É O BANHEIRO FEMININO, SEU IDIOTA, SAI DE CIMA DE MIM!!! – berrei completamente vermelha.

Então ele olhou em volta, e percebendo que não havia nenhum mictório ou algo do tipo, ficou mais vermelho que os cabelos de Erza, se é que isso é possível.

– Er... Banheiro errado. – falou simplesmente, com o cabelo cobrindo os olhos, mas ainda dava pra ver o quanto estava vermelho. Eu não devia estar muito diferente dele, afinal, ele ainda estava em cima de mim. E afinal, o que ele estava fazendo aqui na Fairy Tail?

De repente a porta é aberta, surpreendendo a mim e a Natsu, que por acaso, ainda estava em cima de mim! E pra ajudar, a pessoa que havia acabado de entrar no banheiro não era nada mais, nada menos que Lisanna Strauss! Ótimo, agora que ela nos viu assim, minha vida vai virar um inferno! Mas espera... Por que a expressão em seu rosto é uma mistura de susto e raiva?

– Nat-kun, meu amor, o que está fazendo no banheiro feminino? Ainda mais em cima da Lucy? – pronunciou meu nome com nojo. Então seu rosto começou a ficar vermelho e a expressão de susto sumiu, deixando apenas a de raiva em seu lugar, espera aí, “Nat-kun”? , “meu amor”? Será que... – O que você fez com meu namorado, Heartphilia?

– Não é nada do que está pensando, Lisanna. – Respondi totalmente constrangida com a situação. Por quê Natsu ainda está em cima de mim??

– Você está tentando roubar meu namorado, sua vadia? – falou com acidez, pronta para voar em meu pescoço.

– Ela está certa, Lisanna, não é nada do que está pensando. – se pronunciou Natsu pela primeira vez, e finalmente se levantando. – Eu apenas entrei no banheiro errado por engano, escorreguei e esbarrei na Lucy. – mas ainda assim, ele ainda tinha o cabelo rosado nos olhos, me impedindo de ver sua expressão, mas seu rosto ainda estava corado.

– Bom, se você diz, Nat-kun – me lançou um olhar desconfiado – Vou acreditar. – ela olhou para ele, por fim, enlaçando seu pescoço e lhe dando um beijo. Então, ela me lançou um olhar gelado. – Nos vemos mais tarde, Lucy.

[...]

– Heartphilia, está atrasada! – falou o professor Macao, assim que entrei na sala. Meu rosto já estava corado devido ao acidente de agora a pouco, então agora, devia estar mais ainda! – Sente-se.

– Desculpe professor, não vai mais acontecer.

Assim que me sentei, um aviãozinho de papel pousou em minha mesa. Ao abri-lo, reconheci de cara a caligrafia. Levy. “O que aconteceu, Lucy? Você nunca se atrasa!”

“No intervalo te conto” respondi e joguei em sua carteira... Que por acaso ficava do lado da minha! Por quê estamos nos falando por aviãozinho de papel mesmo?

Dei uma boa olhada na sala depois disso. Pelo visto, eu tinha acabado de perder a apresentação dos novos alunos, pois vejo três rostos diferentes na sala, dois deles já conhecidos por mim: Natsu e Gray. A outra pessoa era uma garota de cabelos azulados que não estava com a melhor cara do mundo. Eu hein, espero não ter problemas com aquela garota. Mas enfim, entre tantos rostos, nada de Sting. Senti todo meu corpo relaxar. Ufa, devia ser apenas um boato mesmo. Viu só, Lucy? Você não tinha com o que se preocupar, estava sofrendo atoa. E com esse pensamento, comecei a prestar atenção na aula de história.

[...]

– E foi isso. – terminei de narrar o acidente trágico do banheiro de antes da aula.

– Então é a Lisanna a namorada do Natsu? Que decepção!

– Também não esperava por essa, pensei que ela fosse me matar no banheiro depois de ter visto o namorado em cima de mim, e vermelho daquele jeito por sinal.

– Esperava o que, Lu-chan, com esse botão faltando na sua blusa, mostrando mais ainda seu decote?

– O QUE???????????? – olhei para minha blusa E ESTAVA MESMO FALTANDO UM BOTÃO! E eu não trouxe nenhuma blusa para pôr por cima! Ai que vergonha!! Então era por isso mesmo que Natsu estava tão vermelho e não saía de cima de mim, que pervertido!

– HAHAHAHAHA, estou indo na cantina, Lu-chan, vai querer alguma coisa?

– Não precisa, Virgo me mandou um lanche.

– Ok, já venho! – falou correndo para a fila antes que a mesma aumentasse.

Sentei-me em um banquinho que havia próximo dali e peguei a maçã que estava no pacote que Virgo me deu. Mas assim que dei a primeira mordida, uma voz falou próxima ao meu ouvido.

– Ora ora, vejam se não é a Blondie, Lucy Heartphilia!

Meu corpo inteiro travou e deixei a maçã cair de minha mão, por um segundo senti meu coração falhar. Não, isso não está acontecendo. Isso não pode estar acontecendo! Então não eram apenas boatos? Virei-me lentamente para confirmar de que minha mente não estava apenas brincando comigo. E não estava. Acho que ele pode ler o medo em meus olhos, o que não era pouco, porque eu estava apavorada!

– Blondie – começou num tom brincalhão. – Fala sério, estou aqui, nervoso por ser meu primeiro dia no colégio, ainda mais por estar atrasado e você nem diz oi? Isso é jeito de me tratar?

Continuei encarando-o totalmente incapaz de falar. Eu não podia seguir aquele impulso que tive antes de entrar no colégio, pois estava em meio a várias pessoas, e seria impossível evitar os boatos caso uma garota saísse correndo, derrubando tudo o que encontrava pela frente e gritando por causa de um garoto, o que é terrivelmente desagradável.

Então fiz o que qualquer pessoa aparentemente normal faria: passar reto e fingir que nem o vi e que não era comigo que ele estava falando, mas parece que ele não gostou de eu bancar a indiferente. A próxima coisa que percebi foi que sua mão havia agarrado meu braço. Claro que eu poderia ter puxado meu braço e lhe dado um soco, mas naquele momento eu estava tão apavorada que não encontrava força nenhuma para isso. Espero que ele não perceba que estou tremendo, o que vai ser difícil, porque estou tremendo mais que gelatina em um terremoto.

– Me solta. - falei encontrando minha voz, que por um milagre, saiu firme, viva as aulas fracassadas de teatro!

– Lucy - Ele agora estava com um sorriso malicioso e havia abandonado o apelido repugnante que uma vez ele havia me dado. Seu olhar se direcionou para o lugar onde devia estar um botão da minha blusa. Tratei de ajeitar minha roupa imediatamente - Qual é o problema? Você não parece estar muito feliz em me ver. Não estava com saudades?

Claro que eu não estou feliz em te ver! E obviamente não estava com saudades!

– O que faz aqui? – sussurrei mais para mim mesma do que para ele. Ele apertava meu braço com uma força assustadora. Após isso sua mão ficou mais frouxa. Com certeza as marcas de seus dedos ficariam no meu braço, mas não quero pensar nisso agora.

– Não é tão difícil assim conseguir uma dupla nacionalidade pro seu país, sabia? Mas o que foi Blondie? Por que esse mau humor? Qual é, você não era assim, faz quanto tempo mesmo? Desde quando está com raiva de mim?

– Não sei... Talvez desde o momento em que você tentou me matar? – lancei lhe um olhar irritado.

– Por que está dizendo isto? Eu nunca tentei te matar, Blondie. - Ele desviou o olhar, envergonhado. Vem com essa. Esse seu rostinho bonito e sedutor não me engana mais.

– Ah. Claro.

– Verdade Lucy. Não é o que você está pensando, eu só... Eu só não queria aceitar que tinha perdido.

Encarei-o. Não importa o que ele diga, o que ele fez não tem perdão! E agora ele me fala que foi falta de esportividade? VAI ENGANAR UMA MORÉIA!

– E o que você perdeu, Sting? - Falei seu nome com nojo. - Você não perdeu nada.

– Tem certeza, Blondie? - seu olhar cravou no meu. - Olha, não fique assim, já é passado, não podemos começar de novo?

– Não, não podemos. E fique longe de mim.

– Lu-chan! – uma voz gritou ao longe. Era Levy com seu lanche, correndo em nossa direção.

– Levy-chan! Vamos para a sala? Aqui fora está muito abafado. – falei indo em direção à minha amiga, desviando do imbecil que se encontrava à minha frente.

– Não vai me apresentar ao seu amigo, Lu-chan? – Levy fez uma cara estranha, possivelmente tentando entender meu desespero. Mas antes que eu pudesse dizer não e arrastá-la para a sala, ele foi mais rápido.

– Sting Eucliffe, ao seu dispor. – e estendeu sua mão para Levy.

– Levy McGarden. – a apertou de volta. – Não me lembro da Lu-chan ter comentado sobre você.

– É mesmo? – perguntou com certo interesse. – Eu e Lucy somos velhos amigos.

– Conhecidos. – o corrigi.

Levy notou meu desconforto com a situação e tentou desviar o assunto.

– Que legal, Sting. Lucy, me acompanha até o banheiro?

– Claro! – respondi de cara, deixando um Sting aparentemente confuso para trás.

– O que está acontecendo, Lu-chan? – sussurrou enquanto pegávamos o caminho para o banheiro.

– É apenas um cara que conheci uma vez e não me dei bem com ele, por favor, vamos mudar de assunto? Não gosto de me lembrar disso.

– Ok. – falou para não me zangar, mas sei que por dentro, Levy estava morrendo de curiosidade para saber mais. – O que achou da aula do Macao? Sinceramente, eu achei um saco... – e continuou falando.

Apesar de eu ter reencontrado meu pior pesadelo, meu dia não foi de todo ruim. Após a aula, espalhei alguns cartazes pela cidade oferecendo meu novo serviço de babá e logo em seguida fui cumprir meu turno no Kurt Café.

Ao chegar em casa, havia uma mensagem gravada na minha secretária eletrônica. “Olá, Lucy Heartphilia? Sou Grandine Marvell, vi seu anúncio de serviço de babá e não sabe o quanto fiquei aliviada! Tenho um trabalho para você, poderia cuidar de minha filha amanhã? Pago 150 por dia, em período noturno. Não precisarei para todas as noites, mas admito que estou precisando deste serviço com certa urgência. Você teria disponibilidade? Assim que receber este recado, poderia retornar a ligação? Obrigada.”

É, parece que minha sorte está finalmente começando a mudar. E para comemorar, fui ao apartamento de Loki para comer fondue e ver filme, como combinado no dia anterior. Claro que não contei a ele sobre o emprego, acredito que uma hora ou outra ele vá descobrir sozinho, mas por enquanto não quero que ele questione meus motivos. Dentro deste pesadelo que minha vida estava começando a se tornar, era bom ver que algo pelo menos estava dando certo.