Ao abrir os olhos pela primeira vez em dias, a luz ofuscante do hospital queimou seus olhos como fogo. Gerard precisou de alguns minutos para adaptar sua visão ao novo mundo em que se encontrava. Estava no céu? Não. O inferno poderia ser tão branco? Definitivamente não. Reconheceu uma forma vaga ao seu lado na cama, no começo apenas um vulto e aos poucos foi se tornando um rosto conhecido. Era o seu irmão, Mikey. Pelo sorriso estampado no rosto do irmão, isso significava de que ele não estava morto. E que também não estava no céu.

- graças a Deus! Eu pensei que você nunca acordaria! – Mikey parou um pouco. – Ops, foi brincadeira viu? – ele riu.

Gerard tentou rir também, mas percebeu que rir doía. Doía o corpo inteiro. Ele ainda não estava perfeito. Mas estava vivo.

- Mikey... – Gerard conseguiu dizer depois de algum esforço.

- não fale nada. O médico disse que você poderia sentir dor ao acordar. Depois de tanto tempo dormindo neh...

- quanto...

- hoje faz uma semana do dia do transplante. Correu tudo bem e até agora você tem melhorado significantemente. Os médicos estão espantados! Você é muito forte, cara!

Gerard tentou se mexer na cama e sentiu a mesma pontada no peito. Então se lembrou que ainda não sabia o que tinha acontecido direito. Ele só lembrava-se de estar em casa, conversando com Frank e sentindo uma forte dor no coração...

- então... deu certo... – ele disse, a voz saindo ainda fraca, mas com um sorriso se abrindo no rosto.

- certo?? Foi perfeito! Não podia ter havido coincidência maior. No mesmo dia morreu um cara aqui nesse mesmo hospital e ele era doador. Eu ouvi dizer que a noiva dele autorizou a doação e agora o coração dele está em você. Não é uma grande coincidência?

- como você...

- er... nada como ter uma enfermeira fã de MCR, não é? – ele soltou uma risadinha.

Depois de pensar um pouco, uma sensação de tristeza percorreu o corpo de Gerard ao ouvir aquela história. Era pra ele estar feliz, não era? Mas quem era o doador? E sua noiva, como estaria agora?

- eu... preciso... saber... quem...

- quem o quê?

- o doador...

- quem foi o doador? O hospital não diz. É uma lei aí que impede o cara de saber o passado do doador. Eles não podem dizer nem o nome da pessoa. Se pudessem, mamãe já teria ido agradecer pessoalmente à família do cara.

O pensamento de Gerard estava longe. Algo o dizia que precisava encontrar alguém próximo a seu doador. Quem deveria agradecer pessoalmente era ele, mais ninguém. Ele precisava dizer que cuidaria bem daquele coração. Dessa vez, até o fim de seus dias.

*****

Lorraine preparava um café para sua irmã que estava lá para ver como ela estava sobrevivendo nesses últimos dias. Uma semana havia se passado, mas parecia ter sido ontem que tudo aconteceu. As memórias de Richard antes de sair de casa ainda a perturbavam. Ela não devia tê-lo deixado ir trabalhar.

- eu não devia ter deixado... – tremendo, Lorraine derramou café na mesa e sua irmã a ajudou a limpar.

- minha irmãzinha, você precisa seguir em frente. Não foi culpa sua.

- eu senti, Jessy. Eu sabia que ia acontecer algo muito ruim. – as lágrimas brotavam cada vez mais rápido. – eu fui a culpada. Ele não podia sair daquela casa.

- quantas vezes terei que dizer até você acreditar? Você não é nenhuma médium pra descobrir a hora da morte de ninguém! Deus tem um plano para todos nós. Só Ele sabe quando devemos partir.

- não coloque Deus na história! Se Ele soubesse como eu ficaria não teria deixado-o partir daquela forma!! Ele não merecia, Jessy! Richard era um homem bom!

- Lorraine, não culpe Deus. Ele sabe o que faz. Você só precisa descansar e verá que a vida segue seu rumo e não há nada que você faça para mudar isso. Se aconteceu essa tragédia é porque tinha que acontecer. Não se machuque mais por isso, ok?

As duas se abraçaram forte e Lorraine desabou em lágrimas. A dor era forte demais e saber que nunca mais teria seu noivo de volta só piorava as coisas.