Catalina E A Caixinha De Segredos escrita por Lilah


Capítulo 2
1º Capítulo: A mudança


Notas iniciais do capítulo

Este gigante extraordinário
Estava perturbando suas ideias.
Parecia conduzi-la em direção a mistérios
Para além de sua compreensão.
O BGA, Road Dahl.



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  Mal o sol havia nascido Catalina já estava de pé. Não porque gostaria – afinal, era domingo, e ela estava de férias – mas porque tinha sido obrigada. Ela sabia que esse dia chegaria, mas não que ele viria tão depressa, hoje era o dia da grande mudança. − Antes de continuar uma coisa precisa estar clara: Catalina era totalmente contra essa mudança, então ela estava livre de qualquer suspeita, ela não tinha nada a ver com o que estava prestes a acontecer. Agora posso seguir com a narrativa. – Catalina terminou de arrumar as malas, de má vontade, e se encaminhou para a cozinha, onde teve um café da manhã nada agradável:

− Bom dia filha – Falou Júlio, seu pai. Catalina não tinha mãe.  – Está pronta para partirmos daqui a pouco? – Ele esperou durante um momento, mas não obteve resposta.

  Catalina levantou-se, virou as costas e seguiu para a sala de estar.

  E o diálogo assim acabou.

  De volta para seu quarto, Catalina fez o que poucas vezes fazia, não seria de se estranhar se nenhuma outra criança fizesse isso, mas vindo dela, chegava até a preocupar. Ela chorou. No começo, foi só um sentimento que fazia doer o lado esquerdo do peito. Um sentimento se saudade. Em seguida uma lágrima, que deu origem a outra, e a mais outra, e mais outra, que se amontoaram no pequeno olho da garota, o qual não resistiu e expulsou as lágrimas uma a uma. Ela sentou- se na cama e abraçou o travesseiro, onde escondeu o rosto com vergonha. 

  E lá ficou soluçando baixinho com medo de que alguém a ouvisse. Mas a maçaneta logo girou e a porta se abriu primeiro em uma fresta, depois, totalmente e por ela passou Thiago, seu primo. Particularmente, ela não gostava de pessoas grandes, mas seu primo era alguém especial. Ela achava que ele era o único que a entendia:

− Vamos, vai ser divertido. – Ele sentou-se ao seu lado – Você vai ver, tem um quarto enorme para você, e também um jardim, com lindas flores, de todas as cores.

  Ele falava tudo de uma forma que ficava até mais legal, ou melhor, menos chata, a ideia se mudar.

− Mas, eu não quero sair daqui, eu gosto desse lugar, e da minha escola, e dos meus amigos – Ela fez uma tentativa inútil de parar de chorar. Thiago abraçou-a e secou suas lágrimas, e ela o abraçou também:

− Eu prometo que você vai ter uma escola bem melhor, e vai fazer muitos amigos. Eu prometo também que vou cuidar de você, nunca vou deixar ninguém lhe fazer mal. 

− Jura Thiago? – Ela falou levantando o rosto

− Juro sim. – Fez uma pausa – Sabe de uma coisa? Eu também não queria me mudar quando tinha mais ou menos a sua idade...

− Você também se mudou pra um lugar diferente?

− Sim. Eu pensava igual a você, achava que ia ser horrível, mas foi bom. E eu descobri que ás vezes a gente precisa mudar alguns hábitos para que a vida melhore e continue melhorando.

− E você se mudou para onde? –

− Para cá. Eu não sei se você sabe, mas nem sempre eu vivi aqui nessa casa com o tio Júlio, eu tive uma mãe e um pai, e um irmãozinho, mas eles não podiam mais cuidar de mim.

− Por quê? 

 − Porque eles não tinham dinheiro suficiente para cuidar de mim e do bebê, então, me mandaram para cá, onde vivia até hoje, que passarei a viver, junto com você e o tio, em ume nova casa.

− Mas e a sua família, onde eles estão?

− Em algum lugar por aí, eu falo com eles ás vezes, mas nem sinto mais tanta falta. Agora, que tal você terminar de arrumar? E outra coisa, a casa é bem grande, então podemos brincar de exploradores, e ver se encontramos um tesouro escondido! – Ele disse com um ar entusiasmado.

− Tudo bem, mas só se eu puder ser a líder, e ficar com todo o tesouro! – Ela falou sorrindo.

  Thiago deixou o quarto, mas ainda espiou pela porta semicerrada sua pequena prima pentear os cabelos de frente para o espelho anexo na parede.

  Thiago e Catalina já se encontravam na sala, as malas postas de lado, foi quando ouviram a buzina, e souberam que era hora de partir.

  O caminho foi mais curto do que parecia, talvez porque todos estivessem distraídos. Em um intervalo de mais ou menos duas horas e meia, já estavam no portão da frente da casa. Catalina observou que ele era grande, não simplesmente grande, mas Grande mesmo, com G maiúsculo. O portão era todo cheio de grades, de modo que era possível ver o quintal da casa onde havia um belo gramado com algumas flores, que indicavam o início da primavera. E além do gramado, via-se a faixada da casa. Mesmo não querendo Catalina admitiu que ela fosse uma bela casa, na verdade mais parecia um castelo.

  Eles adentraram no local, Thiago e Júlio carregando as malas e Catalina sua pequena mochila, que abrigava alguns livros. Catalina amava ler. Desde pequena ela sempre gostou de ouvir histórias, Thiago ou seu pai liam para ela ao pé da cama, e quando ela aprendeu a ler, ela mesma fazia isso. Suas histórias preferidas eram “A pequena vendedora de fósforos”, de Hans Christian Andersen e “O rouxinol e a rosa”, de Oscar Wilde. Ela também gostava de Alice no País das maravilhas, de Lewis Carroll e O BGA, de Road Dahl. Enfim, todos esses livros que tem uma ligação estranha com a fantasia atraiam a pequena Catalina. 

  Após ser instalada em seus aposentos, Catalina resolveu explorar melhor o local que agora seria seu cantinho. Seu quarto, ao que parecia, era o maior cômodo da casa depois da sala de estar. Tinha um enorme armário de madeira sem tintura, que devia ser muito antigo, e ainda assim estava muito bem conservado, havia também duas luminárias, uma de cada lado do quarto, e um lustre no meio, com várias lampadazinhas de cristal. Do lado direito tinha uma penteadeira de madeira, com um espelho que tinha uma moldura dourada. Sua cama, que era grande o bastante para quatro Catalinas juntas, era feita do mesmo material que os outros móveis e ainda havia uma pequena estante com cinco compartimentos: “Isso é perfeito para eu guardar meus livros!” Pensou Catalina. 

  Ainda havia uma porta, a qual ela deduziu ser o banheiro, mas este, ela não estava tão curiosa em conhecer.

  Em seguida colocou seus livros na pequena estante, arrumou suas roupas no armário e saiu em busca de algo o que fazer. 

  Ela notou que toda a casa era de madeira, e lembrou-se que seu pai havia dito que aquilo arquitetura do século XVIII e XIX, e até agora se perguntava o porquê de seu pai querer mudar-se para um museu pré-histórico. Seu quarto era no andar superior, o que fez com que a pequena fosse obrigada a descer uma enorme escadaria de madeira, o corrimão tinha detalhes dourados, bem como o espelho da penteadeira no quarto de Catalina, e os degraus faziam certo barulho quando se pisava sobre eles. A sala não possuía nenhum móvel, a não ser um enorme relógio antigo de pêndulo e uma mesinha de madeira com um candelabro de prata de sete braços em cima, o que fazia com que sobrasse muito espaço no cômodo.

  A cozinha, também grande demais, não tinha nada de especial, um armário acoplado na parede, e algum tipo de fogão a lenha. A sala de jantar possuía apenas uma exagerada mesa com oito cadeiras. Esses eram os principais cômodos da casa, havia ainda outros quatro quartos, − um de seu pai, um de Thiago e dois de hóspedes – e três portas que estavam trancadas e provavelmente eram quartinhos de bagunça.

  O lado exterior era muito mais bonito que o interior.  Na frente da casa tinha uma varanda com uma pequena escada de três degraus que levava para o jardim, este possuía uma mesinha branca ornamentada com duas cadeiras também trabalhadas em ornamentos.

  Nos fundos havia um laguinho artificial, rodeado por árvores e arbustos floridos. Em uma das árvores tinha um balanço, que parecia não ser usado durante muito tempo. Então, ouviu-se um grito, anunciando o fim da expedição até o presente momento:

− Catalina! – Júlio chamou-a – Venha almoçar.

− Já estou indo papai, a propósito, o que teremos no almoço? – Perguntou a pequena curiosa, correndo em direção ao homem parado em frente à porta.

− Adivinha – Ele falou com ela já ao seu lado – Pizza.

− Oba! Amo pizza! – E os dois entraram na casa nova, que a cada instante que se passava, começava a se tornar mais acolhedora.

 Os três se encontravam na sala de jantar quando a campainha tocou. Júlio atendeu a porta, e voltou com duas pizzas e uma Coca-Cola na mão. Eles se serviram com as mãos mesmo, já que ainda não tinham arrumado tudo nos seus devidos lugares:

− Vamos precisar de uma empregada – Comentou Júlio

Thiago concordou com a cabeça

− Catalina, você gostou do seu quarto? – 

− Sim papai, é bem grande, e tem uma estante para eu poder colocar meus livros, mas eu ainda preferiria continuar no meu antigo quartinho menor ele era menos assustador. – Falou de cabeça baixa

− Você quer o outro quarto menor? – Perguntou Júlio

− Não. O meu tem um lustre, muito bonito. – Ela observou

− Mas, então – Thiago disse, percebendo que o assunto do quarto estava mesmo encerrado – Seu pai vai amanhã fazer sua matrícula em uma nova escola, não é mesmo tio Júlio?

− Sim, e aposto que você vai amar essa escola, eles tem uma biblioteca enorme.

− Jura? – A garotinha parecia mais animada agora – E quando começam as aulas pai? 

− Na semana que vem. – 

− Que legal! – Disse comendo seu último pedaço e pizza 

− Catalina, lembra que nós iriamos explorar a casa juntos? – Thiago lembrou

− Desculpe Thiago, eu já fiz isso sozinha.

− Verdade? E o que achou da casa? – Perguntou seu pai curioso

− Achei-a grande, e velha também, mas o balanço do quintal é um bocado bonito!

− Sabia que gostaria sua mãe também amava balanços. – Júlio disse em meio a um devaneio. Eles evitavam falar sobre a mãe de Catalina, ao que parecia, ela desapareceu sem deixar sinal. 

Ninguém mais falou durante certo tempo, até Catalina fazer uma pequena – e importante – observação:

− Papai, eu também vi três portas que estavam trancadas. Uma do lado do seu quarto, uma no cantinho embaixo da escada, e uma no cantinho da sala.

− A que está do lado do meu quarto leva ao sótão, e a do canto da sala, ao porão, e a outra, julgo eu, pode ser um quartinho de bagunça. – Júlio respondeu

− É, foi o que pensei – Disse, levantando-se em seguida – Com licença.

E subiu as escadas barulhentas até chegar a seu quarto.

  Enquanto isso, Thiago havia acabado de entrar em seu quarto. O garoto, de apenas quinze anos de idade estava à procura da sua identidade. Ele se olhou no grande espelho preso na porta do seu armário. Estatura média, pele clara, cabelos negros e lisos que lhe caiam sobre os olhos verdes. Isso era o que ele via, mas será que esse reflexo realmente refletia a alma dele?

   Ele teve uma infância muito difícil, morava na Barra da Tijuca, Rio de janeiro. Não estudava porque seu pai, que era carpinteiro, tinha medo de sue filho sair para estudar e não voltar nunca mais. Sua mãe era doméstica, ele ia junto com ela para o trabalho, mais era desprezado pelos patrões da mãe. 

  Quando seu irmão mais novo nasceu, ele soube que não havia mais lugar para ele naquela família. Quando tinha apenas oito anos, seu pai o chamou para conversar. Disse que o dinheiro não estava rendendo, e que ele teria que ficar um tempo morando com o tio e sua namorada em São Paulo. Ele não pode fazer objeções e foi.

  A vida nova era totalmente diferente. Agora ele estudava, e na melhor escola da cidade, tinha todos os brinquedos que queria e podia fazer o que quisesse, ele estava sendo feliz pela primeira vez na vida. Mas um dia, sua tia disse que estava grávida e ele achou que mais uma vez seria trocado. Mas não foi ele continuou tendo tudo o que tinha e quando o bebê nasceu a única coisa que teve que dividir, foi a atenção, mas ele não se importou, ainda tinha uma família. Quando ele fez dez anos, sua tia sumiu. Ninguém soube o que tinha acontecido com ela, e ele sofreu, não tanto por si, mas pela filhinha, a pequena Catalina, que cresceria sem mãe. E prometeu a si próprio que cuidaria daquela bebezinha para sempre, que nunca deixaria ninguém machuca-la. E foi o que fez e iria continuar fazendo.

  Ele virou o rosto, não queria mais ficar frente a frente com aquelas lembranças. Saiu em busca de algo útil para fazer. 

  Explorou a casa, e também amou o jardim, parecia um local perfeito para filmes de contos de fadas. As únicas coisas que o deixou intrigado foram as três portas trancadas.  Depois de tanto procurar, encontro as chaves para o sótão e para o porão, mas a da terceira porta, ele não achou em lugar nenhum.

A noite chegou depressa, e trouxe a chuva consigo. Os raios e trovoes ameaçavam colocar a casa abaixo:

− Estou com medo papai – Falou Catalina

− Não se preocupe filha, eu não vou deixar nada acontecer com o Thiago e com você, agora é hora de dormir, já está tarde.

− Esta bem, boa noite papai, boa noite Thiago.

− Boa noite filha – Seu pai falou lhe dando um beijo na testa

− Boa noite pequena – Thiago disse sorrindo

E ela saltitou pelos degraus, olhando uma vez para trás para acenar aos dois.

Catalina acabava de fechar a segunda janela do quarto quando um relâmpago iluminou todo o aposento. 

− Que susto! – Disse consigo mesma, logo em seguida se escondeu em baixo das cobertas e fechou os olhos, tomando o cuidado de deixar uma luminária acesa.

Ela tentou dormir, mas não conseguiu. Apertou os olhos com toda a força, e mesmo assim o sono não vinha, resolveu então ler algo. Encaminhou-se até sua estante e escolheu o livro que lia atualmente “As reinações de Narizinho” de Monteiro Lobato.

“... O salão parecia um céu bem aberto. Em vez de lâmpadas, viam-se pendurados no teto buquês de raios de sol colhidos pela manhã. Flores em quantidade, trazidas e arrumadas por beija flores. Tantas pérolas soltas no chão que até se tornava difícil andar. Não houve ostra que não trouxesse a sua perola, para pendurá-la num galhinho de coral ou...”.

Plac.

Todas as luzes se apagaram.

O coraçãozinho da garota disparou. Ela tinha medo do escuro, e do silêncio, às vezes também. Essas horas Júlio e Thiago já deveriam estar dormindo. “O que farei agora?” Pensou Catalina: Grito para acordar papai e Thiago, ou fico quietinha e espero a luz voltar? Vou ficar quietinha, quem sabe assim consigo dormir. Mas e se a luz não voltar? O que hei de fazer?  Seus pensamentos ficaram nessa confusão durante um bom tempo, a pequena não conseguia se decidir em relação á isso, e acabou por dormir com a cara no livro que estava em suas mãos.

Uns diziam: Como é bela, essa garota que acompanha o príncipe! Deve ser fada! –Outros falavam: Não, é princesa, a mais bela de todas! – E assim todos admiravam a companheira do príncipe, em seu vestido rosa com estrelas douradas. Eles caminhavam por um salão muito bem enfeitado, o mais belo de todos que ela já havia visto na vida. O príncipe conversava com a garota, quando ela se queixou: Sai daqui! –E fez um movimento brusco com as mãos em direção ao nariz. –O que foi? – O príncipe perguntou, e ela respondeu: É uma mosca chata que fica fazendo cocegas em meu nariz... Sai mosca, sai daqui...

− Mosca, vai embora, sai daqui. – Catalina falou, bocejando e abrindo os olhos – Oba! A luz voltou! – Disse, percebendo uma iluminação de frente para seus olhos. Mas logo seu semblante se modificou. Aquilo que ela sentia no nariz, não era uma mosca fazendo cocegas, e a luz que ela viu não era uma luz normal, pelo menos não das que ficam paradas. Ela se movia por todos os cantos com uma velocidade incrível e soltava um brilhinho por onde passava. A pequena procurou por todos os lados algo que pudesse refletir aquele brilho, mas não encontrou. A luz estava viva! 

Ela até se beliscou para ver se estava sonhando, mas não estava. Levantou-se em um salto, sem tirar os olhos da luzinha, que ia de um lado a outro do quarto se parar. Catalina pensou: “Será que é o que estou pensando?” E tentou chamar a luz como se esta fosse um animal de estimação:

− Ei, você que está sujando todo o meu quarto com esse pozinho esquisito, venha aqui agora, e me diga quem é. – Sua voz não era mais que um sussurro, e ainda assim soou autoritária − Vamos, diga logo!

Mas não obteve resposta, ao invés de dizer algo, a luz saiu por debaixo da porta, com Catalina em seu encalço. Ela estava descalça, o que evitou barulhos, pois a luz ia cada vez mais depressa e a garotinha também. Foi quando o que não podia acontecer, aconteceu. Aquele brilhinho voou por cima dos degraus da escada, e Catalina ponderou antes de descer. Ela queria muito continuar seguindo a luzinha, mas se descesse as escadas poderia acordar seu pai e seu primo. E foi quando ela fez uma das escolhas que decidiria seu destino. Colocou o pé no primeiro degrau e foi atrás do brilho, que por um estranho motivo tinha esperado oscilando em frente à escada como se já soubesse o que a pequena decidiria. Logo que Catalina começou a descer aqueles degraus barulhentos, o brilhinho também recomeçou a voar. Ele andou por quase toda a casa. Passou pela cozinha, pela sala de jantar, pela sala de estar e finalmente parou. Adivinha aonde? Na frente da porta de madeira que ficava no cantinho da escada! E lá ficou diante daquele enorme mistério − que se você olhasse de perto iria conseguir ver desenhos gravados com delicados traços − esperando Catalina, que chegou arfando depois de tanto ter andado. Quando percebeu que a garotinha tinha chegado, a luzinha paralisou e permitiu que a menina se aproximasse o máximo possível dela, até achar que poderia toca-la, mas quando Catalina levantou o braço, a luzinha adentrou na pela porta, fazendo com que a mão da menina se fechasse no breu.

− Que droga! – Disse ela em baixo tom, ficara novamente na escuridão, e olhou, sem saber se diretamente ou não para aquela gigante que tanto a intrigava. – O que será que você esconde porta? Eu sei que há um segredo aí dentro, e eu vou descobrir! – E logo em seguida, ouviu um som muito suave vindo de dentro da porta, como se essa estivesse lhe respondendo. Catalina achou – mais uma vez – que aquilo estava estranho demais. O que poderia ser aquele estranho brilho que a guiou até ali para depois desaparecer? Ela tinha uma suspeita, mas se deixasse alguém saber disso, provavelmente, seria levada ao hospício. 

  E foi enquanto pensava nisso que viu uma finíssima luz sair de dentro da fechadura, essa luz era mais fraca que da outra, mas mesmo assim, cintilava profundamente. A luz saiu e entrou, e novamente fez isso, como se brincasse de esconder com alguém que estava detrás da porta. Em um momento, quando a luzinha estava do lado de dentro, Catalina aproveitou para olhar através da fechadura. 

  De inicio nada viu apenas a escuridão, mas aos poucos a sala foi clareando e objetos começaram a surgir. Uma mesa, um armarinho no canto, uma prateleira com livros velhos, uma árvore... Espere um pouco, uma árvore? Isso mesmo, uma grande e verde árvore brotava do chão daquela estranha sala, e depois, luzinhas de todos os tamanhos foram aparecendo, uma a uma. Em seguida, uns anõezinhos apareceram com um PUF!   E se amontoaram ao redor da árvore, do fundo da sala uma suave melodia começou a tocar e os anõezinhos começaram a dançar. 

  Ela afastou-se assustada. Algo naquilo lhe era familiar. Aquelas coisas que surgiram de repente... Ela sentia como se já tivesse acontecido antes. Olhou novamente pela fechadura e viu os seres pequeninos acenando para ela, fazendo um sinal para que entrasse e dançasse junto com eles. Ela ia tentar.

  Segurou firme a maçaneta, suas mãos estavam geladas, ela girou a maçaneta e CLIC. A porta se abriu. O coração de Catalina acelerou tanto que era possível ouvi-lo no silêncio total. Ela empurrou a porta, só um tantinho assim, ficou com medo. Empurrou mais um pouquinho e...

  Plac. 

A luz voltou e tudo desapareceu.

  Catalina piscou duas vezes para ver se a luz tinha voltado mesmo, e tinha. Ela não queira que isso tivesse acontecido, está certo de que ela odiava escuridão, mas agora a garota queria que o breu encobrisse novamente sua casa, ela queria voltar a ver aqueles seres que pareciam tão amigáveis, queria entrar por aquela porta e ir para um mundo magico. Tudo isso ela queria, mas não podia – pelo menos por enquanto – porque se ela embarcasse agora poderia desaparecer para sempre naquela dimensão, ou mesmo... Bem, ela poderia até morrer.

  Tentou mais uma vez abrir a porta, mas sem resultados. Toda a magia se acabara no momento em que as lâmpadas se acenderam. Então, vendo que nada daquilo voltaria, ela pôs-se a subir as escadas, e cada vez que ela colocava seus pezinhos sobre as enormes barreiras de madeira um estrondo ecoava pela casa. E tanto barulho fez que acordou Thiago, este já estava descendo as escadas e como a menina estava subindo acabou que eles deram um encontrão:

 − Ai! – Disse a garota, que ia despencar degraus abaixo se o primo não a estivesse segurado.

− O que você está fazendo aqui á esta hora Catalina? – Thiago parecia furioso – Porque você não está dormindo? Pode me explicar?

− Mesmo que eu falasse você não ia acreditar – Ela disse, quase não ligando para a bronca, ainda estava muito chateada por pensar que algo que ela sempre acreditou pudesse realmente existir. E percebendo isso, Thiago mudou o tom de voz.

− O que foi pequena, porque está com essa cara, porque você acha que eu não acreditaria?

− Porque ninguém acreditaria. 

− Quer experimentar me contar, vai que eu acabo acreditando não é?

−Jura? – E antes que ele pudesse responder, ela já estava carregando ele escada acima, em direção a seu quarto. Quando lá chegaram, Catalina sentou em sua cama e Thiago ao seu lado – Vou começar. Eu estava fechando as janelas do meu quarto... – E explicou tintim por tintim a ele.

  Quando terminou o garoto parou pensativo:

− Mas, você tem certeza de que isso aconteceu? Tem certeza de que não foi coisa da sua imaginação? 

− Eu sabia que você não acreditaria – Falou desapontada, e uma lágrima escorreu do seu olho esquerdo. Aquela garotinha podia ser pequena, mas seus sentimentos eram de alguém que realmente sabe o que é sentir. Quem sabe ela não fosse tão pequena assim

− Não é isso, é que eu também achei aquela porta muito estranha, e tentei de tudo para abrir, mas nada adiantou. É por isso que eu estou perguntando, como você pôde simplesmente ter girado a maçaneta e BUM, a porta abriu? Isso é bem estranho. Eu já havia ouvido falar que por essas bandas existiram seres mágicos, mas nunca dei crédito, apesar de sempre ter acreditado em magica. Você sabia Catalina, que eu acredito em magica? 

− Não. Pra mim, você só falava dessas coisas para eu não ficar triste. É difícil acreditar que alguém acredita realmente na magia

− É, e eu acredito. Porque a magia existe para todos que tem ela guardada em seus corações. Mas agora está tarde demais para discutirmos isso, que tal deixar essa conversa para amanhã? Vamos dormir agora, ok?

− Mas eu não tenho sono.

− Pode deixar, eu dou um jeito nisso rapidinho – E com um rápido movimento tirou algo do bolso. Uma gaita. Levou-a aos lábios e um som suave e agradável começou a invadir os ouvidos da garotinha, que logo sentiu os olhos pesar-lhe sobre as pálpebras e bocejou. Instantes depois, ela já estava dormindo ao som da gaita que continuava a toar pelo quarto.

  Quando se convenceu de que ela realmente não acordaria tão cedo, ele abandonou o quarto e desceu as escadas, indo estar de frente para a porta, que parecia leva-lo a crer que não era loucura dele acreditar que a magia podia se esconder em qualquer lugar.

  Mal o sol havia nascido Catalina já estava de pé. Não porque gostaria – afinal, era domingo, e ela estava de férias – mas porque tinha sido obrigada. Ela sabia que esse dia chegaria, mas não que ele viria tão depressa, hoje era o dia da grande mudança. − Antes de continuar uma coisa precisa estar clara: Catalina era totalmente contra essa mudança, então ela estava livre de qualquer suspeita, ela não tinha nada a ver com o que estava prestes a acontecer. Agora posso seguir com a narrativa. – Catalina terminou de arrumar as malas, de má vontade, e se encaminhou para a cozinha, onde teve um café da manhã nada agradável:

− Bom dia filha – Falou Júlio, seu pai. Catalina não tinha mãe.  – Está pronta para partirmos daqui a pouco? – Ele esperou durante um momento, mas não obteve resposta.

  Catalina levantou-se, virou as costas e seguiu para a sala de estar.

  E o diálogo assim acabou.

  De volta para seu quarto, Catalina fez o que poucas vezes fazia, não seria de se estranhar se nenhuma outra criança fizesse isso, mas vindo dela, chegava até a preocupar. Ela chorou. No começo, foi só um sentimento que fazia doer o lado esquerdo do peito. Um sentimento se saudade. Em seguida uma lágrima, que deu origem a outra, e a mais outra, e mais outra, que se amontoaram no pequeno olho da garota, o qual não resistiu e expulsou as lágrimas uma a uma. Ela sentou- se na cama e abraçou o travesseiro, onde escondeu o rosto com vergonha. 

  E lá ficou soluçando baixinho com medo de que alguém a ouvisse. Mas a maçaneta logo girou e a porta se abriu primeiro em uma fresta, depois, totalmente e por ela passou Thiago, seu primo. Particularmente, ela não gostava de pessoas grandes, mas seu primo era alguém especial. Ela achava que ele era o único que a entendia:

− Vamos, vai ser divertido. – Ele sentou-se ao seu lado – Você vai ver, tem um quarto enorme para você, e também um jardim, com lindas flores, de todas as cores.

  Ele falava tudo de uma forma que ficava até mais legal, ou melhor, menos chata, a ideia se mudar.

− Mas, eu não quero sair daqui, eu gosto desse lugar, e da minha escola, e dos meus amigos – Ela fez uma tentativa inútil de parar de chorar. Thiago abraçou-a e secou suas lágrimas, e ela o abraçou também:

− Eu prometo que você vai ter uma escola bem melhor, e vai fazer muitos amigos. Eu prometo também que vou cuidar de você, nunca vou deixar ninguém lhe fazer mal. 

− Jura Thiago? – Ela falou levantando o rosto

− Juro sim. – Fez uma pausa – Sabe de uma coisa? Eu também não queria me mudar quando tinha mais ou menos a sua idade...

− Você também se mudou pra um lugar diferente?

− Sim. Eu pensava igual a você, achava que ia ser horrível, mas foi bom. E eu descobri que ás vezes a gente precisa mudar alguns hábitos para que a vida melhore e continue melhorando.

− E você se mudou para onde? –

− Para cá. Eu não sei se você sabe, mas nem sempre eu vivi aqui nessa casa com o tio Júlio, eu tive uma mãe e um pai, e um irmãozinho, mas eles não podiam mais cuidar de mim.

− Por quê? 

 − Porque eles não tinham dinheiro suficiente para cuidar de mim e do bebê, então, me mandaram para cá, onde vivia até hoje, que passarei a viver, junto com você e o tio, em ume nova casa.

− Mas e a sua família, onde eles estão?

− Em algum lugar por aí, eu falo com eles ás vezes, mas nem sinto mais tanta falta. Agora, que tal você terminar de arrumar? E outra coisa, a casa é bem grande, então podemos brincar de exploradores, e ver se encontramos um tesouro escondido! – Ele disse com um ar entusiasmado.

− Tudo bem, mas só se eu puder ser a líder, e ficar com todo o tesouro! – Ela falou sorrindo.

  Thiago deixou o quarto, mas ainda espiou pela porta semicerrada sua pequena prima pentear os cabelos de frente para o espelho anexo na parede.

  Thiago e Catalina já se encontravam na sala, as malas postas de lado, foi quando ouviram a buzina, e souberam que era hora de partir.

  O caminho foi mais curto do que parecia, talvez porque todos estivessem distraídos. Em um intervalo de mais ou menos duas horas e meia, já estavam no portão da frente da casa. Catalina observou que ele era grande, não simplesmente grande, mas Grande mesmo, com G maiúsculo. O portão era todo cheio de grades, de modo que era possível ver o quintal da casa onde havia um belo gramado com algumas flores, que indicavam o início da primavera. E além do gramado, via-se a faixada da casa. Mesmo não querendo Catalina admitiu que ela fosse uma bela casa, na verdade mais parecia um castelo.

  Eles adentraram no local, Thiago e Júlio carregando as malas e Catalina sua pequena mochila, que abrigava alguns livros. Catalina amava ler. Desde pequena ela sempre gostou de ouvir histórias, Thiago ou seu pai liam para ela ao pé da cama, e quando ela aprendeu a ler, ela mesma fazia isso. Suas histórias preferidas eram “A pequena vendedora de fósforos”, de Hans Christian Andersen e “O rouxinol e a rosa”, de Oscar Wilde. Ela também gostava de Alice no País das maravilhas, de Lewis Carroll e O BGA, de Road Dahl. Enfim, todos esses livros que tem uma ligação estranha com a fantasia atraiam a pequena Catalina. 

  Após ser instalada em seus aposentos, Catalina resolveu explorar melhor o local que agora seria seu cantinho. Seu quarto, ao que parecia, era o maior cômodo da casa depois da sala de estar. Tinha um enorme armário de madeira sem tintura, que devia ser muito antigo, e ainda assim estava muito bem conservado, havia também duas luminárias, uma de cada lado do quarto, e um lustre no meio, com várias lampadazinhas de cristal. Do lado direito tinha uma penteadeira de madeira, com um espelho que tinha uma moldura dourada. Sua cama, que era grande o bastante para quatro Catalinas juntas, era feita do mesmo material que os outros móveis e ainda havia uma pequena estante com cinco compartimentos: “Isso é perfeito para eu guardar meus livros!” Pensou Catalina. 

  Ainda havia uma porta, a qual ela deduziu ser o banheiro, mas este, ela não estava tão curiosa em conhecer.

  Em seguida colocou seus livros na pequena estante, arrumou suas roupas no armário e saiu em busca de algo o que fazer. 

  Ela notou que toda a casa era de madeira, e lembrou-se que seu pai havia dito que aquilo arquitetura do século XVIII e XIX, e até agora se perguntava o porquê de seu pai querer mudar-se para um museu pré-histórico. Seu quarto era no andar superior, o que fez com que a pequena fosse obrigada a descer uma enorme escadaria de madeira, o corrimão tinha detalhes dourados, bem como o espelho da penteadeira no quarto de Catalina, e os degraus faziam certo barulho quando se pisava sobre eles. A sala não possuía nenhum móvel, a não ser um enorme relógio antigo de pêndulo e uma mesinha de madeira com um candelabro de prata de sete braços em cima, o que fazia com que sobrasse muito espaço no cômodo.

  A cozinha, também grande demais, não tinha nada de especial, um armário acoplado na parede, e algum tipo de fogão a lenha. A sala de jantar possuía apenas uma exagerada mesa com oito cadeiras. Esses eram os principais cômodos da casa, havia ainda outros quatro quartos, − um de seu pai, um de Thiago e dois de hóspedes – e três portas que estavam trancadas e provavelmente eram quartinhos de bagunça.

  O lado exterior era muito mais bonito que o interior.  Na frente da casa tinha uma varanda com uma pequena escada de três degraus que levava para o jardim, este possuía uma mesinha branca ornamentada com duas cadeiras também trabalhadas em ornamentos.

  Nos fundos havia um laguinho artificial, rodeado por árvores e arbustos floridos. Em uma das árvores tinha um balanço, que parecia não ser usado durante muito tempo. Então, ouviu-se um grito, anunciando o fim da expedição até o presente momento:

− Catalina! – Júlio chamou-a – Venha almoçar.

− Já estou indo papai, a propósito, o que teremos no almoço? – Perguntou a pequena curiosa, correndo em direção ao homem parado em frente à porta.

− Adivinha – Ele falou com ela já ao seu lado – Pizza.

− Oba! Amo pizza! – E os dois entraram na casa nova, que a cada instante que se passava, começava a se tornar mais acolhedora.

 Os três se encontravam na sala de jantar quando a campainha tocou. Júlio atendeu a porta, e voltou com duas pizzas e uma Coca-Cola na mão. Eles se serviram com as mãos mesmo, já que ainda não tinham arrumado tudo nos seus devidos lugares:

− Vamos precisar de uma empregada – Comentou Júlio

Thiago concordou com a cabeça

− Catalina, você gostou do seu quarto? – 

− Sim papai, é bem grande, e tem uma estante para eu poder colocar meus livros, mas eu ainda preferiria continuar no meu antigo quartinho menor ele era menos assustador. – Falou de cabeça baixa

− Você quer o outro quarto menor? – Perguntou Júlio

− Não. O meu tem um lustre, muito bonito. – Ela observou

− Mas, então – Thiago disse, percebendo que o assunto do quarto estava mesmo encerrado – Seu pai vai amanhã fazer sua matrícula em uma nova escola, não é mesmo tio Júlio?

− Sim, e aposto que você vai amar essa escola, eles tem uma biblioteca enorme.

− Jura? – A garotinha parecia mais animada agora – E quando começam as aulas pai? 

− Na semana que vem. – 

− Que legal! – Disse comendo seu último pedaço e pizza 

− Catalina, lembra que nós iriamos explorar a casa juntos? – Thiago lembrou

− Desculpe Thiago, eu já fiz isso sozinha.

− Verdade? E o que achou da casa? – Perguntou seu pai curioso

− Achei-a grande, e velha também, mas o balanço do quintal é um bocado bonito!

− Sabia que gostaria sua mãe também amava balanços. – Júlio disse em meio a um devaneio. Eles evitavam falar sobre a mãe de Catalina, ao que parecia, ela desapareceu sem deixar sinal. 

Ninguém mais falou durante certo tempo, até Catalina fazer uma pequena – e importante – observação:

− Papai, eu também vi três portas que estavam trancadas. Uma do lado do seu quarto, uma no cantinho embaixo da escada, e uma no cantinho da sala.

− A que está do lado do meu quarto leva ao sótão, e a do canto da sala, ao porão, e a outra, julgo eu, pode ser um quartinho de bagunça. – Júlio respondeu

− É, foi o que pensei – Disse, levantando-se em seguida – Com licença.

E subiu as escadas barulhentas até chegar a seu quarto.

  Enquanto isso, Thiago havia acabado de entrar em seu quarto. O garoto, de apenas quinze anos de idade estava à procura da sua identidade. Ele se olhou no grande espelho preso na porta do seu armário. Estatura média, pele clara, cabelos negros e lisos que lhe caiam sobre os olhos verdes. Isso era o que ele via, mas será que esse reflexo realmente refletia a alma dele?

   Ele teve uma infância muito difícil, morava na Barra da Tijuca, Rio de janeiro. Não estudava porque seu pai, que era carpinteiro, tinha medo de sue filho sair para estudar e não voltar nunca mais. Sua mãe era doméstica, ele ia junto com ela para o trabalho, mais era desprezado pelos patrões da mãe. 

  Quando seu irmão mais novo nasceu, ele soube que não havia mais lugar para ele naquela família. Quando tinha apenas oito anos, seu pai o chamou para conversar. Disse que o dinheiro não estava rendendo, e que ele teria que ficar um tempo morando com o tio e sua namorada em São Paulo. Ele não pode fazer objeções e foi.

  A vida nova era totalmente diferente. Agora ele estudava, e na melhor escola da cidade, tinha todos os brinquedos que queria e podia fazer o que quisesse, ele estava sendo feliz pela primeira vez na vida. Mas um dia, sua tia disse que estava grávida e ele achou que mais uma vez seria trocado. Mas não foi ele continuou tendo tudo o que tinha e quando o bebê nasceu a única coisa que teve que dividir, foi a atenção, mas ele não se importou, ainda tinha uma família. Quando ele fez dez anos, sua tia sumiu. Ninguém soube o que tinha acontecido com ela, e ele sofreu, não tanto por si, mas pela filhinha, a pequena Catalina, que cresceria sem mãe. E prometeu a si próprio que cuidaria daquela bebezinha para sempre, que nunca deixaria ninguém machuca-la. E foi o que fez e iria continuar fazendo.

  Ele virou o rosto, não queria mais ficar frente a frente com aquelas lembranças. Saiu em busca de algo útil para fazer. 

  Explorou a casa, e também amou o jardim, parecia um local perfeito para filmes de contos de fadas. As únicas coisas que o deixou intrigado foram as três portas trancadas.  Depois de tanto procurar, encontro as chaves para o sótão e para o porão, mas a da terceira porta, ele não achou em lugar nenhum.

A noite chegou depressa, e trouxe a chuva consigo. Os raios e trovoes ameaçavam colocar a casa abaixo:

− Estou com medo papai – Falou Catalina

− Não se preocupe filha, eu não vou deixar nada acontecer com o Thiago e com você, agora é hora de dormir, já está tarde.

− Esta bem, boa noite papai, boa noite Thiago.

− Boa noite filha – Seu pai falou lhe dando um beijo na testa

− Boa noite pequena – Thiago disse sorrindo

E ela saltitou pelos degraus, olhando uma vez para trás para acenar aos dois.

Catalina acabava de fechar a segunda janela do quarto quando um relâmpago iluminou todo o aposento. 

− Que susto! – Disse consigo mesma, logo em seguida se escondeu em baixo das cobertas e fechou os olhos, tomando o cuidado de deixar uma luminária acesa.

Ela tentou dormir, mas não conseguiu. Apertou os olhos com toda a força, e mesmo assim o sono não vinha, resolveu então ler algo. Encaminhou-se até sua estante e escolheu o livro que lia atualmente “As reinações de Narizinho” de Monteiro Lobato.

“... O salão parecia um céu bem aberto. Em vez de lâmpadas, viam-se pendurados no teto buquês de raios de sol colhidos pela manhã. Flores em quantidade, trazidas e arrumadas por beija flores. Tantas pérolas soltas no chão que até se tornava difícil andar. Não houve ostra que não trouxesse a sua perola, para pendurá-la num galhinho de coral ou...”.

Plac.

Todas as luzes se apagaram.

O coraçãozinho da garota disparou. Ela tinha medo do escuro, e do silêncio, às vezes também. Essas horas Júlio e Thiago já deveriam estar dormindo. “O que farei agora?” Pensou Catalina: Grito para acordar papai e Thiago, ou fico quietinha e espero a luz voltar? Vou ficar quietinha, quem sabe assim consigo dormir. Mas e se a luz não voltar? O que hei de fazer?  Seus pensamentos ficaram nessa confusão durante um bom tempo, a pequena não conseguia se decidir em relação á isso, e acabou por dormir com a cara no livro que estava em suas mãos.

Uns diziam: Como é bela, essa garota que acompanha o príncipe! Deve ser fada! –Outros falavam: Não, é princesa, a mais bela de todas! – E assim todos admiravam a companheira do príncipe, em seu vestido rosa com estrelas douradas. Eles caminhavam por um salão muito bem enfeitado, o mais belo de todos que ela já havia visto na vida. O príncipe conversava com a garota, quando ela se queixou: Sai daqui! –E fez um movimento brusco com as mãos em direção ao nariz. –O que foi? – O príncipe perguntou, e ela respondeu: É uma mosca chata que fica fazendo cocegas em meu nariz... Sai mosca, sai daqui...

− Mosca, vai embora, sai daqui. – Catalina falou, bocejando e abrindo os olhos – Oba! A luz voltou! – Disse, percebendo uma iluminação de frente para seus olhos. Mas logo seu semblante se modificou. Aquilo que ela sentia no nariz, não era uma mosca fazendo cocegas, e a luz que ela viu não era uma luz normal, pelo menos não das que ficam paradas. Ela se movia por todos os cantos com uma velocidade incrível e soltava um brilhinho por onde passava. A pequena procurou por todos os lados algo que pudesse refletir aquele brilho, mas não encontrou. A luz estava viva! 

Ela até se beliscou para ver se estava sonhando, mas não estava. Levantou-se em um salto, sem tirar os olhos da luzinha, que ia de um lado a outro do quarto se parar. Catalina pensou: “Será que é o que estou pensando?” E tentou chamar a luz como se esta fosse um animal de estimação:

− Ei, você que está sujando todo o meu quarto com esse pozinho esquisito, venha aqui agora, e me diga quem é. – Sua voz não era mais que um sussurro, e ainda assim soou autoritária − Vamos, diga logo!

Mas não obteve resposta, ao invés de dizer algo, a luz saiu por debaixo da porta, com Catalina em seu encalço. Ela estava descalça, o que evitou barulhos, pois a luz ia cada vez mais depressa e a garotinha também. Foi quando o que não podia acontecer, aconteceu. Aquele brilhinho voou por cima dos degraus da escada, e Catalina ponderou antes de descer. Ela queria muito continuar seguindo a luzinha, mas se descesse as escadas poderia acordar seu pai e seu primo. E foi quando ela fez uma das escolhas que decidiria seu destino. Colocou o pé no primeiro degrau e foi atrás do brilho, que por um estranho motivo tinha esperado oscilando em frente à escada como se já soubesse o que a pequena decidiria. Logo que Catalina começou a descer aqueles degraus barulhentos, o brilhinho também recomeçou a voar. Ele andou por quase toda a casa. Passou pela cozinha, pela sala de jantar, pela sala de estar e finalmente parou. Adivinha aonde? Na frente da porta de madeira que ficava no cantinho da escada! E lá ficou diante daquele enorme mistério − que se você olhasse de perto iria conseguir ver desenhos gravados com delicados traços − esperando Catalina, que chegou arfando depois de tanto ter andado. Quando percebeu que a garotinha tinha chegado, a luzinha paralisou e permitiu que a menina se aproximasse o máximo possível dela, até achar que poderia toca-la, mas quando Catalina levantou o braço, a luzinha adentrou na pela porta, fazendo com que a mão da menina se fechasse no breu.

− Que droga! – Disse ela em baixo tom, ficara novamente na escuridão, e olhou, sem saber se diretamente ou não para aquela gigante que tanto a intrigava. – O que será que você esconde porta? Eu sei que há um segredo aí dentro, e eu vou descobrir! – E logo em seguida, ouviu um som muito suave vindo de dentro da porta, como se essa estivesse lhe respondendo. Catalina achou – mais uma vez – que aquilo estava estranho demais. O que poderia ser aquele estranho brilho que a guiou até ali para depois desaparecer? Ela tinha uma suspeita, mas se deixasse alguém saber disso, provavelmente, seria levada ao hospício. 

  E foi enquanto pensava nisso que viu uma finíssima luz sair de dentro da fechadura, essa luz era mais fraca que da outra, mas mesmo assim, cintilava profundamente. A luz saiu e entrou, e novamente fez isso, como se brincasse de esconder com alguém que estava detrás da porta. Em um momento, quando a luzinha estava do lado de dentro, Catalina aproveitou para olhar através da fechadura. 

  De inicio nada viu apenas a escuridão, mas aos poucos a sala foi clareando e objetos começaram a surgir. Uma mesa, um armarinho no canto, uma prateleira com livros velhos, uma árvore... Espere um pouco, uma árvore? Isso mesmo, uma grande e verde árvore brotava do chão daquela estranha sala, e depois, luzinhas de todos os tamanhos foram aparecendo, uma a uma. Em seguida, uns anõezinhos apareceram com um PUF!   E se amontoaram ao redor da árvore, do fundo da sala uma suave melodia começou a tocar e os anõezinhos começaram a dançar. 

  Ela afastou-se assustada. Algo naquilo lhe era familiar. Aquelas coisas que surgiram de repente... Ela sentia como se já tivesse acontecido antes. Olhou novamente pela fechadura e viu os seres pequeninos acenando para ela, fazendo um sinal para que entrasse e dançasse junto com eles. Ela ia tentar.

  Segurou firme a maçaneta, suas mãos estavam geladas, ela girou a maçaneta e CLIC. A porta se abriu. O coração de Catalina acelerou tanto que era possível ouvi-lo no silêncio total. Ela empurrou a porta, só um tantinho assim, ficou com medo. Empurrou mais um pouquinho e...

  Plac. 

A luz voltou e tudo desapareceu.

  Catalina piscou duas vezes para ver se a luz tinha voltado mesmo, e tinha. Ela não queira que isso tivesse acontecido, está certo de que ela odiava escuridão, mas agora a garota queria que o breu encobrisse novamente sua casa, ela queria voltar a ver aqueles seres que pareciam tão amigáveis, queria entrar por aquela porta e ir para um mundo magico. Tudo isso ela queria, mas não podia – pelo menos por enquanto – porque se ela embarcasse agora poderia desaparecer para sempre naquela dimensão, ou mesmo... Bem, ela poderia até morrer.

  Tentou mais uma vez abrir a porta, mas sem resultados. Toda a magia se acabara no momento em que as lâmpadas se acenderam. Então, vendo que nada daquilo voltaria, ela pôs-se a subir as escadas, e cada vez que ela colocava seus pezinhos sobre as enormes barreiras de madeira um estrondo ecoava pela casa. E tanto barulho fez que acordou Thiago, este já estava descendo as escadas e como a menina estava subindo acabou que eles deram um encontrão:

 − Ai! – Disse a garota, que ia despencar degraus abaixo se o primo não a estivesse segurado.

− O que você está fazendo aqui á esta hora Catalina? – Thiago parecia furioso – Porque você não está dormindo? Pode me explicar?

− Mesmo que eu falasse você não ia acreditar – Ela disse, quase não ligando para a bronca, ainda estava muito chateada por pensar que algo que ela sempre acreditou pudesse realmente existir. E percebendo isso, Thiago mudou o tom de voz.

− O que foi pequena, porque está com essa cara, porque você acha que eu não acreditaria?

− Porque ninguém acreditaria. 

− Quer experimentar me contar, vai que eu acabo acreditando não é?

−Jura? – E antes que ele pudesse responder, ela já estava carregando ele escada acima, em direção a seu quarto. Quando lá chegaram, Catalina sentou em sua cama e Thiago ao seu lado – Vou começar. Eu estava fechando as janelas do meu quarto... – E explicou tintim por tintim a ele.

  Quando terminou o garoto parou pensativo:

− Mas, você tem certeza de que isso aconteceu? Tem certeza de que não foi coisa da sua imaginação? 

− Eu sabia que você não acreditaria – Falou desapontada, e uma lágrima escorreu do seu olho esquerdo. Aquela garotinha podia ser pequena, mas seus sentimentos eram de alguém que realmente sabe o que é sentir. Quem sabe ela não fosse tão pequena assim

− Não é isso, é que eu também achei aquela porta muito estranha, e tentei de tudo para abrir, mas nada adiantou. É por isso que eu estou perguntando, como você pôde simplesmente ter girado a maçaneta e BUM, a porta abriu? Isso é bem estranho. Eu já havia ouvido falar que por essas bandas existiram seres mágicos, mas nunca dei crédito, apesar de sempre ter acreditado em magica. Você sabia Catalina, que eu acredito em magica? 

− Não. Pra mim, você só falava dessas coisas para eu não ficar triste. É difícil acreditar que alguém acredita realmente na magia

− É, e eu acredito. Porque a magia existe para todos que tem ela guardada em seus corações. Mas agora está tarde demais para discutirmos isso, que tal deixar essa conversa para amanhã? Vamos dormir agora, ok?

− Mas eu não tenho sono.

− Pode deixar, eu dou um jeito nisso rapidinho – E com um rápido movimento tirou algo do bolso. Uma gaita. Levou-a aos lábios e um som suave e agradável começou a invadir os ouvidos da garotinha, que logo sentiu os olhos pesar-lhe sobre as pálpebras e bocejou. Instantes depois, ela já estava dormindo ao som da gaita que continuava a toar pelo quarto.

  Quando se convenceu de que ela realmente não acordaria tão cedo, ele abandonou o quarto e desceu as escadas, indo estar de frente para a porta, que parecia leva-lo a crer que não era loucura dele acreditar que a magia podia se esconder em qualquer lugar.


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