Xis escrita por aka Rla


Capítulo 3
III - Heroi




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Durante a aula de Geografia, a última da semana, Rosana chamou Jean para uma conversa.

Minha curiosidade falou mais alto e, quando dei por mim, tinha pedido pra ir ao banheiro e fui tentar ouvir a conversa que eles estavam tendo no escritório de Rosana. Encostei na porta e escutei.

-Eu não consigo fazer isso, Tia. - ouvi Jean dizer.

Tia? Mesmo?

-Por quê? Já se apaixonou por ela, foi? - voz de Rosana seguida de uma risada. Por quem Jean estava apaixonado?

-Tia, isso não tem graça. Eu tô vendo que isso vai acabar em merda. Eu vou acabar morrendo pra proteger uma garota que eu conheci a menos de um mês. E eu não estou apaixonado.

-Jean, faça um esforço. - ouvi Rosana dizer.

Eu daria tudo pra ser uma formiga ou uma mosca agora.

-Eu sei que deve ser horrível pra você, mas... você está fazendo isso por um bem maior, entende? A vida dela depende de você. Não seja tão egoísta.

-Egoísta? Estou sendo o mais altruísta possível. Nunca fiz nada do tipo pra ninguém. Nem pra Liz, e ela tá me cobrando por isso.

-Ok. Eu vou deixar o fim de semana livre pra você se acertar com a Liz e aproveitar sua vida, afinal, você também é adolescente. Mas, por favor, a proteja. Você, mais do que ninguém, sabe o risco que ela corre.

Ouvi um suspiro. Não sei dizer se era de Jean ou de Rosana.

-Eu não sei se consigo. Eu acho que ela vai morrer no próximo segundo.

-Julia dependia de alguém e você sabe o que aconteceu.

-Pára de falar da Julia! - Jean gritou. Eu dei um pulo e por muito pouco não bati na porta.

-Pára você de gritar comigo! Eu sou sua tia, não sou a Liz ou o Mateus, ok?

-Desculpa – ele disse e eu quase ouvi os olhos dele girando.

-Eu sinto muito se você está tendo problemas, mas é por uma vida, Jean. Ela corre perigo. Ela ainda mais. Faça um esforço. Quando ela desenvolver e aprender a usar seus poderes, ela não vai mais precisar de você e você volta pra sua vida normal. Menos de um ano, Jean.

Ele suspirou e eu ouvi passos. Saí correndo para o banheiro.

*

Por algum motivo, minha disposição pra ir pra casa numa sexta-feira não era das melhores. Andar me lembrava que eu tinha tomado chuva de manhã e andar de ônibus me lembrava que a passagem estava absurdamente cara e não compensava o preço por um caminho que eu poderia fazer a pé.

E, quando Cyndi me pediu pra levar a bicicleta dela pra sua casa (em frente a minha), eu vi que o universo não estava assim tão contra minha pessoa.

Na saída, Jean acenou pra mim de longe e, depois de corar (caramba! Eu nunca coro!) montei na bicicleta de Cyndi e fui em direção a minha casa.

No caminho da escola até minha casa tem a rua da escola, uma avenida movimentada (casas, lojas, pessoas, escolas e etc), uma viela (sem casas e cheia de mato) e então a minha rua. Viu, não é longe. Mas dá medo. Muito medo mesmo.

E quando dois caras mal encarados começaram a me seguir, meu subconsciente me fez pensar que eles só estava indo para o mesmo lugar que eu.

Mas quando eu virei na viela cheia da mato e um deles tentou atirar no pneu traseiro da magrela de Cyndi, eu soube que eles queriam algo comigo.

Minha primeira reação?

Entrar dentro do mato, sem trilha, sem saída, sem saber pra onde eu estava indo. Em cima de uma bicicleta que nem era minha.

Pedalar naquela velocidade em que eu estava pedalando traz sérios riscos aos seus joelhos. Mas eu continuei acelerando. E os caras continuavam à mesma distância de antes (ou mais perto?), não importando quanto eu acelerasse.

E fiquei por pelo menos quinze minutos naquele desespero. Até o pneu da frente da bicicleta prender num tronco fino caído e a bicicleta virar.

Eu dei um mortal no ar e caí no chão. Quando encostei um dedo na lateral da minha cabeça, senti o sangue escorrer. E meu joelho esquerdo estava doendo muito. Demais.

-Ah, então a princesinha finalmente está indefesa – disse um dos caras, me olhando de cima. As lágrimas de dor dos meus olhos me proibiram de ver realmente seu rosto. Só sabia que ele era careca, antes de fechar os olhos e fingir estar desmaiada pra ver se eles desapareciam.

-E então Lopes? O que fazemos com a princesinha? Queimamos ou esquartejamos? - perguntou um dos dois.

A dor do meu joelho era quase insuportável. Eu estava mordendo minha língua para não gritar de dor. Eu sentia o gosto de sangue na minha boca, mas eu não estava nem aí pra um corte na língua quando eu tinha a certeza de que meu joelho direito estava quebrado.

-Ela não está morta. Olha como ela está tensa. Ela está se controlando pra não gritar, idiota – respondeu o outro cara, que, pelo volume da voz, acho que estava perto de mim.

E quando eu me dei conta de que eles sabiam que eu não estava desmaiada, eu gritei. Gritei horrores. E chorei rios.

-Eu não consigo entender qual o problema deles, sabe... eles nem tentam usar os poderes... Hein, garota, tenta regenerar seu joelho. - o mesmo cara que falou primeiro.

-Ela só tem 17 anos, bobão, ela ainda não tem poderes. - disse o outro.

-Oh, sim...

As lágrimas vinham tão rápidas e em tanta quantidade, que a terra do mato virara lama embaixo do meu rosto.

E então, eu virei meu rosto para o lado deles.

O careca era alto e magro e o outro era gordo e baixinho. O alto inclinou a cabeça e olhou pra mim.

-Sabia que mesmo com a cara cheia de lama e sangue, você é até que bonitinha? E tem uma bunda grande, né?! Daria um ótimo sexo – ele disse.

-Vai tomar no cu – eu sussurrei.

-É uma boa ideia – eu ouvia a voz de Jean antes de vê-lo.

E então algo bem estranho aconteceu.

Jean ergueu uma sobrancelha e o magrelo voou longe, caindo em cima do cocô de algum cachorro de diarréia. O outro cara foi tentar ajudar, mas Jean fez um movimento com o braço no sentindo contrário e o gordinho deu um salto e foi parar perto de mim. Mais precisamente, em cima do meu joelho quebrado.

Meu grito foi tão pavoroso, que eu não consigo entender como ninguém na cidade ouviu. Jean ficou com a mão pra cima enquanto o gordinho estava no ar e me olhou com preocupação.

-Desculpa. Aguenta só mais um pouco, por favor – ele pediu.

Aí ele girou a mão, de forma que o gordo ficou em pé no ar. Eu sabia que Jean era quem segurava o gordinho no ar, mas meu joelho e minha cabeça doíam tanto que eu não pensei que era real.

Jean levantou um pé e soltou o gordinho. Ele caiu com as bolas espremidas na canela de Jean. Ele deu um urro de dor e caiu no chão. Jean mexeu a cabeça e jogou o gordo no outro lado do matagal.

Enquanto os caras mal encarados não se recuperavam, Jean me pegou no colo delicadamente e correu numa velocidade extremamente anormal para um ser humano, mas eu não me importei.

Eu devia uma bicicleta para Cyndi, tinha um corte fundo na testa e meu joelho estava quebrado. Jean tinha algo bem esquisito para um humano. A aproximação entre nossos corpos me deixou um pouco tonta.

E eu não estava ligando.

De alguma forma, eu sabia que ele me protegeria. De tudo.

*

Acordei de manhã com minha perna esquerda pinicando.

Num lugar branco demais e com cheiro de hospital. Infelizmente, não era só o cheiro.

-Bom dia, querida. - o rosto de minha mãe surgiu na minha frente como um daqueles palhaços que pulam da caixa quando você dá corda.

-Oi mãe. Que horas são? - perguntei.

-Faltam poucos minutos para as onze.

Eu ficara a tarde anterior inteira acordada, fazendo exames na minha cabeça, porque o corte tinha sido profundo. Mas não havia nada pra me furar naquele mato. Fui dormir (leia-se “me deram sedativos”) ontem mais ou menos meia noite, quando minha perna já estava engessada.

-Desde quando está aqui, mãe? - ela parecia absurdamente cansada. A culpa me atingiu em cheio.

-Desde que me avisaram, eram pouco depois das duas horas.

-Eu não te vi aqui ontem mãe.

-Claro, você ficou fazendo um monte de exames.

Suspirei.

As imagens da tarde anterior me deu um nó na garganta.

-Eu estou com fome – disse, antes de pensar.

-Ok, eu vou chamar uma enfermeira pra te trazer comida, mas antes, tem duas pessoas muito afim de te ver.

Quando minha mãe saiu, Cyndi e Adriana entraram no quarto, cada uma com uma cesta na mão.

-E então? Minha bicicleta tá bem? - perguntou Cyndi, fingindo procurar a bicicleta no quarto e eu ri – O que aconteceu, hein Lissa?

Contei a história, cortando a parte em que Jean levanta os carinhas com o poder da mente.

-Isso é muito estranho – disse Dri.

-Eu sei. - respondi, suspirando. E eu nem falei da parte estranha ainda...

-Toma aqui – disse Cyndi, apontando uma caixinha de uma das nossas lojas favoritas e cupcakes. - Eu perguntei para o seu médico se você podia comer outra coisa que não essa comida de hospital. Ele disse que você estava liberada pra comer um cupcake, mas só um.

Eu sorri. Cyndi era uma fofa mesmo.

-E eu trouxe um suco. De abacaxi porque o abacaxi estava mais barato. - disse Dri.

O médico veio, me fez algumas perguntas, colocou uma luz estranha nos meus olhos e disse que eu poderia ir pra casa à tarde, mas pra repousar pelo menos uma semana antes de ir pra escola com gesso. Daí Dri e Cyndi foram embora, eu almocei, minha mãe me deu banho (que coisa humilhante!) e eu fui pra casa.

Na minha cama tinha um bilhete

Melhoras. -J.”


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Notas finais do capítulo

:)



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