Depois De Sovngarde: Contos De Syria escrita por timelady13


Capítulo 2
Capítulo 1 - Whiterun


Notas iniciais do capítulo

Desculpem a demora. Com as coisas do dia a dia acabei esquecendo de atualizar a história. Em todo caso, espero que gostem =)



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Dovahkiin, hin kah fen kos bonaa (Dragonborn, seu orgulho será destruído)

Fen du hin sille ko Sovngarde (Eu devorarei suas almas em Sovngarde)

Daar Lein los dii (Esse Mundo é meu.)

Alduin... Alduin... Dinok (Alduin... Alduin... Morto)

Syria despertou violentamente, com um grito sufocado na garganta, sentada na cama. Sentia o corpo abafado, ensopado, no meio de um choque de adrenalina que a fez buscar a espada ao lado da cama, sem hesitar. Os dedo se fecharam em volta do ar, e só então ela percebeu que não havia nada ali para que pegasse - estava no quarto, em casa.

Em casa. Breezehome, pensou, voltando a realidade conforme olhava em volta. Mesa de cabeceira, velas, cadeiras... De fato estava em casa. Supunha que era assim como devia chamar agora, ao menos. Já há alguns anos não possuía uma, de modo que devia acostumar-se de novo com o conceito. Não uma casa, um lar. Ainda bruscamente, fez um movimento para se levantar, que a fez recuar um pouco, colocando a mão sobre as costelas, em dor. Olhou para si, e percebeu que o tronco inteiro estava coberto por faixas e talas, exatamente onde sentia pontadas. Havia ali algumas costelas quebradas, certamente, e se lembrava de uma queimadura tenebrosa no abdôme, vinda das chuvas de meteoros em Sovngarde. Na realidade, o corpo inteiro doía, e se fosse inteligente não tentaria olhar todos os ferimentos.

Com dificuldade, se levantou, buscando as portas do armário. Roupas, bonitas e limpas a esperavam, e estranhou a leveza delas ao se vestir. Serana lhe dissera há dias que ela havia se acostumado demais a chãos duros e armadura, e provavelmente teria mais do que um pouco de dificuldade para se acostumar a vida cotidiana - começava a achar que ela estava certa. De um modo, parecia simplesmente bom demais para ser verdade que tudo estivesse terminado, ainda que estivesse. Guerra civil, lordes vampiros, dragões de outras eras... Dali há alguns anos seria apenas uma memória ruim do povo de Skyrim, e nada mais que historias para seus filhos. Syria captou a armadura daedrica sobre o baú, e observou o pulsar vermelho por quase um minuto antes de desviar o olhar e sair.

As escadas rangeram audivelmente enquanto ela descia. Sentada à mesa, Lydia ergueu os olhos, sobressaltada, em um estado de semi alerta que mais tinha a ver com seus instintos de batalha que a visão da nórdica.

– Sinto cheiro de maçãs cozidas e pão. É manhã, sim? - Indagou, sentindo o gosto amargo na língua de quem há muito não se alimenta. Lydia lhe ofereceu um espaço à mesa, e assentiu.

– Por volta de sete da manhã. Estamos no terceiro dia de Second Seed, Fredas, minha Thane. - Lydia respondeu, respeitosamente, ainda um tanto tensa. Syria percebeu a inquietação da outra e sorriu brevemente ao se sentar.

– Acalme-se, Lydia. Não atearei fogo na casa com a Voz. - Estendeu a mão para um pedaço de pão sobre a mesa, passando em um pouco de manteiga antes de levá-lo a boca. Lydia meneou negativamente a cabeça, sentando-se logo ao seu lado. - Você disse que dormi por dois dias, então?

– Sim, e se me permite dizer... Parece muito doente, ainda. - Havia tortas, doces, bebida sobre a mesa, mas a escolhida sequer lançara um segundo olhar sobre eles. Depois de dois dias sem se alimentar, só podia concluir que ela ainda se encontrava em estado precário de recuperação, afinal qualquer outro teria atacado vorazmente a mesa.

– Não fico doente há muito tempo. Assumo que tenha novidades para me contar? Dois dias é um longo tempo.

– É verdade. Já foram enviados corvos e mensageiros por todo pais, e aparentemente haverão algumas semanas de comemoraçao. Jarl Vignar mandou organizarem a celebraçao de Whiterun, mas esperavam por você acordar.

Syria ergueu as sobrancelhas, engolindo um pedaço de pão antes de falar.

– E não houve festas nas tavernas, nada?

– Informalmente sim, mas oficialmente... Ele tambem deseja ter uma palavra contigo, privadamente, em Dragonsreach. Há também...

– Não vejo o que poderia falar a Jarl Vignar, agora que a Guerra Civil acabou.

Lydia suspirou brevemente, medindo as palavras seguintes.

– Não creio que seja sobre isso, igualmente não é da minha conta. Possivelmente algo relacionado a você, Thane, voar nas costas de um dragão há alguns dias e desaparecer. Há também Brynjolf.

Aquilo captou a atençao da Dragonborn, que baixou a mão do vinho para observar mais diretamente sua steward.

– Lembro de tê-lo visto, quando cheguei.

– Ele partiu para Riverwood ontem a noite, deixou-lhe um bilhete, para caso acordasse. - Lydia procurou em um bolso escondido sob o cinto da espada, e dali tirou um bilhete dobrado em duas partes. Syria limpou a mão com a qual comia, abriu o pergaminho e o leu silenciosamente.

Lass, assuntos da Guilda me levaram à Riverwood. Retornarei à Whiterun em um dia, e poderemos falar pessoalmente. Que Nocturnal a guie pelas sombras. Brynjolf.

Não era o que Syria chamaria de um bilhete explicativo, mas vindo de quem vinha, era o esperado. Deixou o pergaminho sobre a mesa, passando alguns segundos de reflexão até se levantar da mesa.

– Creio que isso seja tudo?

– Sim, minha Thane. Há algo mais que eu possa fazer?

Syria a olhou, exibindo um sorriso mínimo. No caminho até a porta, pousou a mão no ombro da morena, e disse em voz amena:

– Imagino que os ultimos dois dias você tenha passado expulsando pessoas das janelas da casa, então faça um favor pessoal a mim, e descanse para as comemorações.

Lydia era como um cão: dedicada e fiel, mas passava a maior parte do tempo naquela tensão alarmada de mais cedo, e merecia um pouco de descanso. Assim, Syria caminhou para fora da casa, sem armadura, sem espada, nada.

Ainda era cedo. Algumas pessoas começavam a sair das casas para iniciar o dia comercial, havendo pouco movimento nas ruas de Whiterun. Sem olhar para os lados, Syria foi caminhando rua acima, em direção ao mercado. O Drunken Huntsman estava fechado, viu Belethor passar pelos fundos da loja, e um ou outro passante que não a reconheceram sem armadura. Ao chegar no mercado, viu os comerciantes montarem as tendas, e a primeira pessoa que a viu foi Fralia Gray-Mane, cumprimentando-a em voz alta. Isso fez com que os outros se virassem para saudá-la também, quase imediatamente. Syria os cumprimentou de volta, parando para comer uma maçã verde enquanto eles a agradeciam.

Era como se tivesse, em algum momento, tido escolha. Se pudesse, teria permanecido em Markarth o resto da vida, mas eles agiam como se fosse uma heroína altruísta, e não alguém pego num destino indesejado. Sentia-se desconfortavel com aquilo, como se recebesse elogios que não eram seus. Havia muitos heróis em Skyrim, herois verdadeiros que escolheram a luta e o sacrifício, sem nenhum tipo de sangue especial. Ela não era um deles.

Quando conseguiu, desviou-se deles, mas aí ja outras pessoas se aproximavam, pediam historias, detalhes, bençãos. Syria estava longe de ser uma divindade, mas sequer parecia importar. Em pouco, estava cercada pelos habitantes matutinos de Whiterun, até mesmo os guardas a pararam para cumprimentos. Ficou quase uma hora nessa função, até ser capaz de subir todas as escadas, atravessar a árvore Gildergreen e de novo subir até Jorrvaskr. Empurrou a porta, e encontrou Njada Stonearm, Vilkas, Farkas, e finalmente Aela, em volta da mesa, fazendo o desjejum.

Por um momento, todos os olhares se voltaram a ela. Caiu um silêncio, que foi, em segundos, preenchido pelos vivas dos Companions. Farkas e Aela se levantaram e vieram abraçá-la, e Syria percebeu-se mais aliviada. Agora estava num ambiente de amigos, que estavam mais felizes por ela do que pela heroína de Skyrim.

– Pensamos que tinha morrido ao por os pés na cidade. Mas não seria fácil assim, eu disse - Farkas deu-lhe um aperto no ombro, ao que Aela respondeu.

– Disse coisa alguma, seu tolo. Vejo que permanece capaz como sempre, Irmã. - Aela lhe sorriu, abraçando-a com mais cuidado do que a brutalidade de Farkas. - Vamos fazer o desjejum e caçar, o que acha?

– O Jarl nos contratou para caçarmos para a festança. Está preparada para voltar ao trabalho?

– Será hoje a noite? - Syria indagou, as sobrancelhas erguidas.

– Agora que acordou, sim. Estou certo de que ele já sabe. - Completou, por fim, Farkas.

– Traga o arco, e não o martelo de guerra. - Instruiu Aela, num tom que quase parecia estar caçoando dela. Pareciam todos honestamente aliviados de vê-la, com exceçao de Njada, que a olhava a distância com o mesmo mau humor característico.

Syria não tinha intenção alguma de ver o Jarl para falarem do que quer que fosse. Estava acabado, e assuntos acabados deveriam ser deixados no passado. Passar o dia caçando lhe parecia algo muito mais racional que passar o dia dentro de Dragonsreach. Os ferimentos ainda doeriam, mas possuía a saúde de ferro dos nórdicos, ainda que não tivesse mais a licantropia para se curar.

– Pois bem, irei.

Quando o sol começava a se pôr, retornaram com as ultimas peças de carne. Um recruta havia cuidado de levar as carroças com os animais para Whiterun, e toda vez que voltava partia de novo com elas cheias. Por estarem nas florestas, longe das estradas, nenhum dos Companions viu o movimento real de Whiterun durante o dia - dezenas de carroças, carros de boi, charretes chegaram carregadas e partiram vazias. Um bom número de cavaleiros e viajantes das redondezas, já informados das notícias, chegaram à cidade, deixando os estábulos lotados e os portões cheios. Brynjolf estava entre eles.

Desceu do cavalo próximo aos estábulos, e sendo ele roubado, o animal saiu pelos campos desembestado. Brynjolf seguiu o caminho, mantendo-se convenientemente nas sombras, ainda que trajasse vestes comuns e, com o número de viajantes, não fosse chamar a atenção. Alcançou os portões, iluminados e abertos, nos quais diversos guardas faziam a vigia da noite festiva. Entre os que chegavam, viu diversos rostos, muitos desconhecidos, alguns conhecidos e outros que sequer deviam estar la. Passou por todos eles como se fosse um fantasma, invisível entre a multidão de corpos, sem atrair qualquer tipo de atenção Viu Breezehome, fechada e isolada por guardas na porta e nas janelas, assumindo que a Dragonborn não estaria ali já há algum tempo. Passou por detras dela, por entre as casas, vendo os moradores das cidades em algumas portas, mas a maioria ou já estava no pátio do mercado ou iria logo.

Nunca havia visto Whiterun tão viva, no entanto. Era uma cidade pequena, em comparação à outras capitais, mas bonita e organizada como Riften e outras não eram. Ainda assim, vê-la toda iluminada por tochas, decorações e barracas nas ruas trouxe um quê a mais de beleza para a cidade, que conservava sua simplicidade em meio aos vistosos arranjos da comemoraçao. Até mesmo o louco que gritava perto do templo de Kynareth havia se calado para comer um dos fumegantes espetos de coelho no mel. Definitivamente, Jarl Vignar Gray-Mane não estava poupando esforços para agradecer e agradar àquela que o colocou no trono de Balgruuf.

No pátio do mercado, rapidamente misturou-se a multidão. Alguns bêbados saiam da taverna, dando lugar a outros que tinham a mesma intenção. Aparentemente, no entanto, havia sido organizado para que a cerveja fosse liberada nas ruas, custeada pelo Jarl para o povo da cidade. Brynjolf serviu-se de um dos canecos, mesclando-se assim rapidamente entre as pessoas que celebravam. Entreouviu algumas conversas, uma específica lhe chamando a atenção.

– Ela não apareceu em Dragonsreach, estão só os nobres e o Jarl la... Feito tolos.

– Tolo é você, homem. É claro que ela está la, ou não virá aqui também.

– Quem disse que ela viria aqui?

– Quem faltaria a sua propria celebração?

Certamente, ela faltaria, se assim o desejasse. Contudo, tendo se aproximado da família Gray-Mane parecia improvavel que fosse, simplesmente, desfazer-se deles sem motivo. Se ainda não estivesse com os nobres, iria mais tarde.

Um par de horas se passaram até que as conclusões de Brynjolf se mostrassem acertadas. Vindo de Dragonsreach, ouvia várias saudações e gritos, que aumentavam progressivamente conforme Syria se aproximava. Coroada com uma tiara de ouro e esmeralda, num esbelto vestido carmesim e uma capa bordada a fios de ouro, Brynjolf momentaneamente não a reconheceu. Podia contar nos dedos de uma mão a quantidade de vezes que a vira sem armadura, e em nenhuma delas fora de forma tão bela. O ferimentto na cabeça não aparecia, e os do resto do corpo estavam encobertos por tecido, a palidez mortal desaparecera, de modo que ela parecia essencialmente saudável. Havia uma amargura nos olhos, no entanto, que pode perceber apenas ligeiramente. Havia felicidade também.

Manteve-se próximo a um grupo de pessoas que gritavam ruidosamente conforme ela caminhava até o meio do pátio. Era um andar firme, com alguns traços de constrangimento dos risos nervosos. Alguém havia trazido uma grande cadeira, muito luxuosa, que era o trono representativo, e a colocado ali no meio do pátio. Viu Syria olhar em volta ao parar ao lado da cadeira, primeiro demorando-se em um canto cego à sua direita - em busca de olhos brilhantes e amarelos -, depois sobre ele. Agora que fora visto, aproximou-se mais para frente, enquanto ela se sentava no trono. Em segundos, diversos braços ergueram a cadeira no ar, entoando uma mistura de várias canções. Qualquer bardo quereria arrancar os tímpanos com aquela confusão de letras e vozes, mas no fim todos cantavam juntos a liberdade de Skyrim, nórdicos e estrangeiros, de todas as raças.

Brynjolf observou aquilo por um momento. Era algo unico, que provavelmente não veria de novo em vida, quando todos se uniam para cantar e comemorar a vida. As vozes tremiam o chão, acordes longíquos acompanhavam o canto, tochas eram erguidas no ar, em direção a noite estrelada, o ar da vitória envolvia a todos em sua embriaguez, e cada segundo pareceu eterno. Ele mesmo sentia um calor crescer em seu peito.

O trono se movia, lentamente, meio sem rumo. Em poucos passos, um zumbido cortou o ar, e antes Syria pudesse gritar à liberdade de seu povo, sua voz silenciou com um baque oco. As costas foram empurradas com força contra o grande encosto da cadeira, e os olhos vidraram por um momento. O silêncio tomou conta de todos que estavam ao redor, incapazes de se mover, completamente estáticos observando a Dragonborn com uma flecha enterrada no peito. O trono foi levado ao chão, e como se estivesse muito longe, Brynjolf ouviu pessoas gritarem e correrem.

O sangue apareceu sem demora, escuro, manchando o vestido como um circulo crescente, que so fazia aumentar. Brynjolf ouviu mais gritos, e sombras se aproximando. Sem ver, estava aos pes do trono, com elas ao seu lado. Fechou a mão na flecha para puxá-la do peito de Syria, os gritos apenas como um som abafado e distante, o instinto acompanhando apenas as mãos que ajudavam.


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Notas finais do capítulo

Mais em breve!