Mantendo O Equilíbrio escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 13
Capítulo 13


Notas iniciais do capítulo

Como um bom carteado consegue salvar, é o que tem pro post. Conhecem o jogo de Uno?
P.S.: tem música no final do capítulo.



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Chego à porta fechada do quarto e não consigo segurar meu sorriso. As pessoas passam pelo corredor e acho que me notam, porque até um senhor andando devagar com sua bengala, sorri de volta. Com tudo andando tão bem, abro a porta e vejo uma enfermeira mexendo na fiação de soro do Vini. Alcanço seu olhar e sorrio mais uma vez.

- Milena?

Murilo. Ainda na porta, viro para trás e vejo meu irmão se aproximando. Mais atrás consigo ver o médico daquele dia caminhando com Djane. Peço mentalmente que os exames estejam bons e me dou de cara com um Murilo bem feliz... drasticamente, mudo de pensamento: se ele conseguiu o telefone da enfermeira mesmo, vai ser um pouco difícil de empurrá-lo pra Dani.

- Hey, se perdeu, foi?

- Nada. Tava falando com a Mônica.

- Quem?

- A enfermeira. Então, esse é o quarto?

Nessa hora, a enfermeira que estava no quarto chega onde estávamos e antes de sair, ela nos diz, inocentemente e gentil:

- Pode entrar, ele está a sua espera. Sabe que ele não gosta de ficar sozinho, hein.

Murilo faz aquela cara de “é mesmo?”, sinalizando bem com suas sobrancelhas e olhos abertos, enchendo o peito de ar em deboche irônico, finalizando com um aquela velha pose de colocar a mão na cintura... Ai como eu sofro com um desses no meu pé. Me viro de volta para a porta e aceno para Vini, entrando devagar com meu irmão logo atrás de mim.

- Olha quem veio te ver.

- Seu namorado?

- Deus me livre ter ISSO como meu namorado.

- Epa! Eu tô ouvindo. Sou decente, tá!

- Estou confuso.

Não sei dizer se ele estava de graça comigo, porque ainda era visível seu sorriso. Paro em frente sua cama segurando minha bolsa, que batia no meu joelho, e do nada me lembro daquela visita em que brigamos. O que esses homens têm quando nos olham com outros caras? Até parece que sou oferecida ou algo assim. Balanço a cabeça em negação para afastar isso da minha mente. Estamos em um momento de paz.

- Esse é meu irmão, Murilo.

- Aquele que você falou que estava doente? Que você tinha brigado?

- Aham. Ele já está bem melhor, nem febre teve mais. Já fizemos as pazes também.

- E aí, cara? Minha irmã me contou a história. Por causa de você que ela me trouxe pra cá semana passada, dar uma passagem na emergência. Diria mais que ela me arrastou.

- Ah, sim, ele era seu paciente?

- Hã, essa história ela não me disse. Milena?

- Abafa, é uma piadinha interna sem-graça. Mas sim, foi esse pestinha que nos interrompeu naquele dia e me cansou cuidando dele. E ele ainda é mal agradecido.

~;~

- Não, a Milena tá roubando, não vale.

- Que não vale o quê, não tenho culpa se você tá perdendo.

Conseguimos um jogo de Uno com Diogo que ia sair de folga após checar o soro do Vini. Foi pouco depois de entrarmos no quarto que ele apareceu e Murilo comentou que se tivessem o avisado ele teria trazido algum jogo de cartas, então Diogo disse que tinha um no seu armário de trabalho. Prometi apenas uma partida por causa do horário. Apesar de ter permissão para ficar até mais tarde, não queria me cansar muito e nem interferir no descanso de Vini.

A disputa está entre mim e Diogo, ambos com duas cartas para finalizar, Vini com três e Murilo com sete. Isso, sete! Novamente ele traz aquele bico dele frustrado por estar perdendo. Vejo minha chance perto de chegar:

- UNO! Só falta uma e acabo com vocês.

- UNO. Isso é o que vamos ver!

Vini estava bem concentrado nas suas três cartas, encostado nos travesseiros de sua cama. Com a mesa móvel de alimentação improvisamos um espaço para jogar, ficando em roda. Eu, na poltrona, claro, fiquei à vontade bem próxima da cama depois que Diogo se ofereceu para movê-la de onde ficava. De fim, ele ficou do outro lado de Vini, próximo à mesinha que mantinha as flores de sempre, e Murilo ficou de frente à cama, encostado e quase debruçado na grade de proteção – tínhamos que nos manter distantes para não vermos as cartas uns dos outros. Se bem conheço meu irmão, ele adora uma roubalheira, mas mantenho o olho nos outros dois porque esses eu não conheço as estratégias... principalmente Diogo que estava a apenas uma carta como eu para ganhar. Esperando Vini pensar na sua próxima jogada para me impedir de ganhar, concentrada ou fingida de concentrada, me achei pensando na melhora dele.

Pra quem passa o dia “sozinho”, vendo Tv, as paredes, enfermeiros entrando e saindo, contando gotas de soro cair – será que ele conta mesmo? Quem não conta até dormir? – ele anda muito bem. Normalmente quem sofre um acidente como o dele e fica em coma, dificilmente acorda e quando tem essa benção, algumas sequelas ainda os prendem. Muitos ficam bastante debilitados, demoram a falar, a se mexer ou mesmo a andar. E cá posso olhar para Vinícius e perceber suas sobrancelhas pensadoras tentando contar e adivinhar cartas. Desde o momento que o conheci e conversamos, ele se mostrou muito atento, como se tivesse acordado de um sono de 8h normais. É muito milagre mesmo... Fungo um pouco distraída e atraio a atenção deles sem querer:

- O que foi?

- Ih, deve ser nada, só ela tentando nos distrair pra ganhar. Essa aí apronta de tudo, conheço a peça quando quer enrolar.

Rio pela gracinha. Na mesma hora abro a bolsa ao lado e pego meu estojo de canetas. Elas podem até falhar a tinta depois, mas pra provar meu ponto de vista jogando o objeto nele, ainda que seja silencioso, vale a pena. Pior é que ele me faz parecer tão má. Com o sorrisão inocente do meu irmão depois de dizer seu típico “ai, isso dói”, Vini joga uma carta e é justamente do tipo que eu precisava.

- VENCI!

- Eu disse que ela tava enganando!

Eu sei que ele nunca vai acreditar que isso foi uma daquelas coincidências. Fecha a cara todo emburrado e cruza os braços pra enfatizar sua indignação. Dou de ombros e finalizo nossa visita:

- Bom, vamos indo né, tem gente que tem que descansar...

- Ah, não, tá muito cedo... Eu já dormi tanto. Fiquem mais um pouco, faz tempo que não fico de conversa com ninguém.

- E quem disse que eu falei de você, mocinho?

Levanto com uma cara bem cínica e faço a pose do Murilo com a mão na cintura, com mais graça, claro. Diogo não fala nada e só ri enquanto arrumava as cartas na caixinha de papel que tinha. Pego meu estojo que meu irmão não fez gentileza de catar do chão e fecho minha bolsa, deixando tudo arrumado junto com meu material da faculdade. Diogo vai colocando sua mochila de trabalho nas costas e Murilo chega à porta me esperando para ir embora.

- Ok, eu falava de você, mas tenho que levar essa “coisa” pra casa antes que invente uma de suas e o Diogo, bom, ele deve estar cansado de tanto plantão.

Murilo retruca da porta:

- Viu como ela me trata?

- Viu como ele já começou o drama? E nem tem mais gelatinas na lanchonete pra distraí-lo.

Aponto com o dedão para trás pra enfatizar. A menção sobre gelatina chamou a atenção de Diogo.

- Pelo jeito já tenho uma concorrente aqui no hospital, ninguém comprava tanta gelatina quanto eu. Nem pra deixar uma pra mim, né? Eu ia passar lá agora, mas agora que você disse...

- Se eu soubesse...

- Cara, se ela não deixou eu comer a última, imagina você.

- Eu teria guardado, oras!

Viro para a coisa que aguardava na porta e dou língua. Eu teria deixado, claro, gelatina para o enfermeiro bonito. Digo, Diogo. Sou solidária.

- Pra ele você guardaria, né? Pois deixa, deixa. Eu que sou o dramático, né?

Murilo, sempre Murilo.

- Então tchau pra vocês, melhor eu indo que já está tarde. Boa noite, Milena e Vini, boa noite Murilo, prazer te conhecer.

Não pude deixar de retrucar também. E melhor, com um trocadilho:

- Tchau, Diogo, prazer ganhar de você.

Acompanhei o enfermeiro bonito – faz tempo que não o chamava, quer dizer, pensava assim – até a porta e ele ficou conversando com meu irmão. Já é meu sono querendo me pegar ou Murilo estava com aquela cara de “estou de olho em você” de volta? Acho que Diogo ainda não sacou... só me restou uma coisa a fazer diante disso, que não conseguia evitar cada vez que Murilo fazia essas ceninhas: facepalm. – Não bastou o mico com o Bruno mais cedo? Revirando os olhos, encosto minimamente a porta e volto à poltrona para pegar minhas coisas, ficando de pé ao lado da cama.

Trilha indicada: Oasis – Wonderwall

http://www.youtube.com/watch?v=4W6snQAjupY

- Seu irmão é uma figura.

- É, acabo de sentir um déjà-vu... Acho que me dizem muito isso.

- Você vai voltar amanhã, né?

- Eita que ainda nem peguei minhas coisas pra sair e você já está perguntando sobre minha volta? E hoje eu vim duas vezes!

- Gosto da sua companhia, que culpa tenho?

- A de me convencer a procurar seu tio. Isso não é muito fácil, sabia? Não sei quanto tempo pode demorar... ainda mais se eu passar tardes e tardes por aqui.

Disse-lhe com tom ameno, mantendo o bom humor, querendo arrumar um jeito de abordar o assunto e só consegui essa brecha para trazê-lo agora. Espero ansiosamente por sua resposta, sem saber o que na verdade esperar. A visão que ele tem do tio ainda é um mistério pra mim já que ainda não conversamos a respeito, só sei de geral.

- Sério que você está procurando por ele?

- E não era pra procurar? Ok, vou deixar minha busca.

- NÃO, não foi isso que eu quis dizer. Eu... eu achei que você... não sei, pareceu incerta quanto a isso, achei que não fosse fazer isso...

Estranho momentaneamente sua resposta. Fica clara sua surpresa e admiração por eu me prestar a tal busca... Não era isso que ele queria? Ou ele ainda suspeita de mim de alguma forma? Suspiro em pensar na segunda opção... o que não me abala, não me deixo abalar. Ele já me deu créditos de confiança outras vezes, além de que tenho que levar em conta que, do ponto de onde ele está, tudo parece suspeito a ele. Pra ele, a mãe não era alguém pra se contar.

- E quando eu acho que é só o Murilo que duvida de mim...

- NÃO, quer dizer... Você me confunde.

- Acontece muito... mas não vem ao caso. Vou ver se consigo vir amanhã. Até porque ainda temos umas coisas pra conversar.

- Promete?

- Nas minhas condições... fica difícil prometer, sabe. Fazer esses olhinhos pedintes não te ajudam, garanto. Conviver com meu irmão já me deixaram imune. Mas vou fazer todo o possível, isso eu posso prometer.

Ainda sentado, encostado nos travesseiros, ele cruza os braços, finge uma carranca e se faz de chateado. Eu não acabei de falar que conviver com meu irmão me tirou essa sensibilidade? Solto um riso abafado e chego próximo dele para lhe abraçar. Para minha surpresa prontamente ele desfaz a falsa carranca e me abraça de volta, me segurando como se não quisesse largar.

De primeira não penso bem, fico é preocupada com ele movimentando os braços assim, de modo que poderia puxar muito os fios do soro – ainda me pergunto também porque ele ainda toma soro, mas médico é médico e eu não sou da área da saúde – tento me soltar, mas ele não me deixa sair de seu aperto.

Atada a ele me vem essa... sensação. Boa, muito boa. Então eu posso deixar de hesitar e retribuir mais o calor que ele me oferece. Apesar de nossas confusões, eu posso perceber, ele confia em mim, tenho certeza. Rio sozinha nas suas costas um tanto emocionada com isso, porque é disso que ele precisa, de alguém para “estar lá” por ele, já que era nesse seu tio que ele tirava seu grande apoio, e eu estar cobrindo essa ausência, sabendo de antemão da situação, me alegro por representar isso a ele. Me sinto tão bem de ele me dar essa vaga que chego a apertá-lo também em um agradecimento silencioso de sua atitude. Não era uma dose que só ele precisava, eu também me percebi precisando disso.

Presa a ele, faço um carinho em seus cabelos enquanto ele sussurra um “obrigado” e um desejo de que eu pudesse ficar mais. Tão confortável quanto ele, até eu me pergunto se tenho que ir mesmo. Queria eu poder ficar mais... o caso é que todos temos que descansar e, quando eu voltar, quero ter uma resposta mais definitiva sobre essa busca, que realmente significa mais do que imaginei sobre esse caso. Resignado, ele é o primeiro a se soltar e eu aos poucos faço o mesmo. Busco minhas coisas e, até o momento de chegar à porta e acenar um tchau, mantenho contato visual com ele, dividindo um sorriso pleno e singelo confirmando que ainda nos veremos.


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