Doces Lágrimas Inevitáveis escrita por Otome Pensadora


Capítulo 1
Mestre


Notas iniciais do capítulo

Eu estou voltando de uma crise, admito que cheguei a desistir de escrever, mas hoje eu estava ouvindo músicas tristes e lendo fanfics e do nada me senti com vontade de escrever esta. Boa leitura.



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 Existem muitas opções para como lidar com um problema.

 Você pode lutar, enfrenta-lo, bater de frente e resolver tudo de uma vez só.

 Você pode ignorar, se afundar em uma ilusão de perfeição e fingir que nada existe enquanto reza para esquecer...

 O que me deixa curioso, é que você escolheu fugir. Não de um problema banal, ou algum aborrecimento relacionado a outra pessoa qualquer. Você escolheu fugir de si mesmo.

 Oh, sim, eu vejo suas feridas. Seu sofrimento é tão palpável para mim que quase posso ver sangue escorrendo do lugar onde um dia houvera um coração.

 Admito que fico curioso também por você não fingir que está tudo bem, como qualquer um faria. Não força sorrisos feios, não se importa em parecer animado quando responde alguma pergunta... Ou quem sabe tenha desistido disso, pois ambos sabemos que é inútil.

 O seu problema, é o pior que poderia ter.

 Vazio; Você está vazio.

 De sentimento, de vontade, de passado, da possibilidade de um futuro melhor, de...

 Vida.

 Hmmm, tudo bem, trocarei as palavras. Você não está fugindo, você está desistindo.

 Não há qualidades de que se orgulhar, amigos para se apoiar... Eu até compreendo, mas esse não é o fim que calculei que você teria – e imagino que você também almejava algo melhor antigamente.

 Mas sua maneira de pensar também mudou, porque agora você sabe que o mundo é muito mais cruel do que qualquer pesadelo que você poderia ter debaixo de seus cobertores caros, na sua mansão luxuosa. Acho que o melhor de tudo isso é que você não é mais mimado como antes. Talvez carente, mas eu vejo a sua fome de algo para preencher seu vazio quando me ordena, Meu Mestre.

 Você conheceu a dor, muito antes do que deveria, uma dor que seria até bom nunca ter conhecido. Mas o destino é cruel, sim. Estava sendo criado para comandar, e isso você faz com maestria. Mas estava sendo criado, para ser bom. E o que eu adoro em você, é que de puro e bom você não tem mais NADA.

 Novamente trocarei as palavras, você está vazio de vida, mas cheio de impurezas.

 E quem sabe essa impureza não seja eu?

 Eu fico muito decepcionado quando percebo sua falta de vontade de continuar, embora quando você for, não haverá legado. Mas eu gravarei cada momento com você, mesmo depois de você ter ido para longe de mim. Isso deve bastar.

 Será que eu também desistiria? Se fosse um humano, sem qualquer chance de voltar atrás, sem qualquer chance de salvar aqueles que amo, sem qualquer chance de desfazer um acordo com um ser como eu. Somente depois de te conhecer é que eu me indaguei sobre o que faria se fosse um humano, Mestre. Eu nunca conheci um humano que me fizesse refletir de modo diferente.

 Eu nunca conheci um humano que me desconcertasse assim.

 O azul profundo dos seus olhos não esconde a escuridão da sua alma.

 E, mesmo tão cheio de impurezas, você continua sendo incrível, Mestre.

 Você vê através dos meus pretextos, você lê minhas expressões mesmo que eu tenha todo o cuidado de não deixar transparecer minhas emoções.

 Você acha que tem o direito de dizer que sou doentio, mesmo sendo tão ou mais louco do que eu. A insanidade invadiu o mundo inteiro, tanto o meu quanto o seu – o nosso – em níveis diferentes para cada um... Mas ambos sabemos que estamos vivendo uma vida sem nexo.

 Rotinas sem sentido, que as vezes nos dão o mínimo bem-estar que podemos nos permitir ter, mas todos nós caímos novamente perante as dores interiores ao fim do dia. Mas até que desejamos que essa hora chegue logo, pois a vida é um ciclo infinitamente doloroso e ansioso. Antes sofrer de uma vez do que sofrer a vida inteira.

 Mestre, nós partilhamos nossa dor, embora não digamos isso um ao outro. Há tantas palavras não ditas, mas que ainda assim ambos temos conhecimento.

 Mestre, eu gosto de sua maneira de pensar, não deixa de ser fria, mas não é ignorante.

 Será que se pensarmos o bastante poderemos encontrar uma solução para o fim de tanta dor? Provável que não. Mas isso vai nos manter ocupados antes do fim que sabemos que virá. Enquanto isso, eu vou observar-te enquanto dorme, vou me banquetear com suas expressões distantes, vou me embebedar do oceano dos seus olhos, vou servir-lhe com toda dedicação, mesmo sabendo que isso de nada adiantará.

 E eu perderei você.

 Nós dois sabemos disso, mas o pior de tudo é que a escolha foi nossa.

 Ei Mestre, você é forte. Por continuar levantando todas as manhãs mesmo sabendo que irá perder tudo. De uma forma ou de outra.

 Ainda que nosso contrato não seja terminado nunca, o que me faria pelo menos um pouco mais satisfeito com a realidade, ambos seremos incapazes.

 Incapazes de nos abrir para nós mesmos. Mestre, eu nunca disse que te admirava mais do que deveria.

 Eu nunca disse que meu único sorriso verdadeiro só se faz presente quando seus olhos estão fechados, assim como é o único momento em que sua expressão é angelical. Eu nunca disse que suas lágrimas são como facas intermináveis nessa pedra que chamo de coração, mas ao menos eu ainda tenho um. O seu, está despedaçado.

 Estamos ambos caminhando para um abismo sem fim, ambos rumando de cabeça erguida para uma estrada escura que nunca nos levará a nada senão a dor. Mas estamos caminhando calmamente lado a lado, saboreando as dores como se fossem taças de um bom vinho antigo, conhecido ao paladar, e não vacilamos.

 Mestre, me dê a sua mão e talvez até essa dolorosa jornada se torne algo bonito. Sim, triste e desprovida de expectativas, mas vamos cuidadosamente aproveitar nossos últimos instantes juntos.

 Esse contrato maldito, essa união que foi um erro, mas nos ensinou o mais próximo da realidade que um sentimento pode chegar, cercado de defeitos que nos matam pouco a pouco, mas juntos nós podemos terminar esse caminho com dignidade.

 Eu vejo como essa humanidade já está definhando, mas eu e você, Mestre, aceitamos nosso fim e nosso destino, e vamos aproveitar as lágrimas juntos, não?

 Mestre, eu amo você, embora também o odeie, eu o amo e quero vivo e morto, quero-o afastado e tão perto quanto possível.

 Nessa pose de mordomo, que só me permite amá-lo e servi-lo até que a morte nos una para sempre, e sempre, e sempre na dor que nos espera.


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Notas finais do capítulo

Mereço alguma atenção por essa história curta de madrugada? Não custa nada ajudar a avaliar :)



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