Christopher era somente mais um dos meninos daquela vila no meio do nada. Completaria quinze no dia seguinte. Nunca tinha dado sequer seu primeiro beijo, todos o desprezavam, todos tinham medo dele afinal, era o sétimo filho de um sétimo filho.

 Quem não conhecia a lenda que pensasse que era somente mais um garoto comum, mas na noite seguinte passaria por sua primeira transformação e depois de por ela passar jamais seria somente um garoto novamente.

 Véspera de seus 15 anos, logo ia se tornar um homem, e aqui estava, na escola, como se ele fosse um garoto comum! Sentado no fundo da sala observava seus odiados colegas de classe. Garotos que por anos o humilharam, jogaram na lama, cuspiram em sua cara! Ainda lembrava-se de quando Nick e seus amiginhos fedorentos, anos atrás, o perseguiram pela fazenda de seus pais e o espancaram ate a inconsciência, o despiram e o amarraram no suporte junto a um espantalho! Aqueles miseráveis iam pagar!

 E também a professora que apesar de se mostrar indignada ao saber do ocorrido riu em suas costas com as outras mulheres da cidade, disse até mesmo que o monstrinho merecia!

 - Ei, lobinho, lobinho, AUUU!!

 Nick sussurrou, depois de virar-se e atirar uma bolinha de papel com cuspe em sua cara. A provocação foi ignorada. O idiota não tinha mais coragem de mexer com ele desde o inicio do ano.

Chris cresceu, ganhou músculos, muito mais que qualquer um dos idiotas daquela classe, muito mais. A única coisa que o impediu de acabar com cada um deles nesse último ano foi sua família. Se não fossem os apelos de sua mãe Nick não teria mais seus nojentos dentes brancos para assoprar bolinhas de cuspe em sua cabeça, ah, não teria mesmo. 

 A professora começou a distribuir as provas de matemática.

 - Chris, precisa melhorar, se não irá repetir de ano.

Ele assentiu. Sequer ouviu o que a jararaca falara, sua cabeça estava em outro lugar. Pensava em Clara, a filha do prefeito, única na cidade que nunca o desprezara, seu primeiro e único amor.

Pensava em Clara, a mais bela garota da vila, a que o tirou de cima do espantalho, sua única amiga, uma amizade secreta, é claro, jamais a doce filha do prefeito poderia manter relações com um monstro!

 Eles se conheceram no fatídico episodio do espantalho. No meio da plantação de soja de sua família. Estava nu preso ao espantalho. Era meio dia, o sol de verão estava em seu ápice. Chorava lágrimas de desespero, de humilhação. O que fizera para ser tão odiado? Nunca fez nada! Mas os garotos da cidade responderam: Você nasceu!

 Tentou ser legal quando chegou na escola, tentou fazer amigos. Mas sempre todos o repudiavam, tinha sido assim sua vida inteira, muito antes da escola, as mães o olhavam nas missas de domingo e diziam a seus filhos: Vejam só ,é a cria de Satã!

 Mas voltando a nossa bela Clara. Ela corria, caçava borboletas, tinha dez anos, um ano mais nova que ele. E então o viu. E saiu correndo. Ele gritou.

- Não vá! Me ajude!

Ela correu. Ele chorou, achou que ela não voltaria e que riria dele na frente da cidade toda, que contaria sua desgraça a todos. Ela jamais o fez. Meia hora depois a linda garota voltava, refletindo ao sol, com uma cesta em suas mãos, suas tranças loiras balançando e uma cara de genuína preocupação. Pelo menos foi assim que Chris viu, a cena real envolvia um pouco mais de olhos vermelhos de choro, tranças despenteadas e ranho de nariz infantil, bem, mas isso não importa realmente, não é?

 Ela o tirou do suporte de espantalhos, o enrolou em uma toalha de piquenique de sua mãe, e dividiu um sanduíche com ele. Ele a amou. Desde então são melhores amigos.

Mas afinal já chega de cenas de amor infantil e de salas de aula chatas.

Então, chegou a noite de seu aniversário. O sol começou a se por, ele correu de casa, não sabia o que iria acontecer. Foi fundo na floresta da cidade até que a lua cheia chegou a seu pino. E então, foi meia noite.

 Suas roupas começaram a se rasgar, ele crescia. Sua pele humana foi dilacerada, haviam gritos e baba. A dor era lancinante, ele se contorcia no chão, seus ossos se expandiram, surgiram pelos por seu corpo, ele babou sangue pelo chão enquanto seus dentes caiam, um a um, e em seu lugar surgiam as presas de um lobisomem. Surgiram garras em seus dedos agora retorcidos, ouviam-se uivos de dor a quilômetros do local, eles chegavam até os ouvidos dos moradores da cidade.

E então a magia da lua de sangue despertou a chama do ódio no coração dos homens. E o até então puro coração da criança injustiçada foi substituído pelo instinto animal de vingança. E então a caçada começou.