Ele não podia voltar a vê-la. Tinha medo de machuca-la com seu instinto cruel. Esse pensamento dilacerava sua alma, pois se isso acontecesse...

Kid nunca se perdoaria.

Depois daquele encontro, uns dias se passaram sem sinal de bandidos ou do vampiro. Os dias se tornaram semanas, e essas se tornaram meses. Dois meses. Esse foi o tempo que a ruiva esperou, sem nunca perder a esperança de ver o ruivo novamente. Durante todo o tempo, Nami usou o colar que ele lhe dera. Era sua prova de que não fora um sonho. Infelizmente, aquilo não lhe dava a segurança de que o veria de novo. Porém, o que a mulher não sabia, era que sua espera não seria em vão.

- Nami, tudo pronto? – Nojiko questionou entrando no quarto onde a irmã se trocava. Naquele dia, o último de Junho, elas iriam à uma festa na prefeitura, comemorando o aniversário da cidade.

- Sim... – Nami respondeu melancólica.

- Sabe, se você me contasse o que está acontecendo, eu poderia ajudar... – A mulher de cabelo azulado notara o quão distante a outra parecia estar nas primeiras semanas.

- Não é nada, Nojiko. – Replicou terminando de colocar os brincos – Vamos?

- Você é quem sabe...

- Pior... É que eu não sei... Não tenho certeza, pelo menos... – Ela retrucou baixinho o suficiente para a irmã não ouvir.

As duas saíram de casa e se puseram a caminhar. A Lua lançava seus raios prateados em cima delas com imperiosa frieza e invejável calma. Nojiko usava um vestido bege que ia até os joelhos, com um decote reto. Era tomara-que-caia e possuía alguns detalhes floridos na barra num tom de escuro de marrom, e uma fita larga, também marrom, prendia o tecido e dava seu toque final. As sandálias eram beges também e de salto.

- Eu acho que esse vestido é simples demais, Nojiko.

- Eu gosto dele. Além do mais, nós só vamos até e Prefeitura, não é como se algum tipo de rainha estivesse lá.

- Tem razão. Tapou os ouvidos?

- Hã?

- Imagina o escândalo que Sanji-kun vai fazer ao entrar lá. "Minhas amadas Mellorines, seu cavaleiro do amor está aqui!", ele dirá.

- Ih, me esqueci! E agora?

- Vamos ter que tomar medidas drásticas...

- Você não vai colocar pimenta na comida dele.

- Eu já disse que da última vez foi o Usopp!

- Quem deu a ideia?

- O Ace.

- Okay, sabichona, mas quem roubou a pimenta?

-... Isso não vem ao caso. E se fosse para castiga-lo, eu poderia fazer algo pior... Algo bem pior... – Sorriu matreira, já planejando mil e uma formas de colocar o cozinheiro loiro em seu devido lugar.

- Você tá me assustando... – Elas voltaram a caminhar em silêncio, até que...

- EU ESQUECI! – A ruiva exclamou de repente, assustando a azulada, e pôs as mãos no rosto, num gesto de desespero.

- Esqueceu o quê, Nami?

- As chaves!

- E daí? Nós vamos voltar juntas, não é?

- Eu disse que só ia ficar lá por no máximo uma hora. Você é quem vai voltar no final da festa.

- Aí eu te empresto a minha...

- E se quando você chegar eu estiver dormindo? É perigoso andar de madrugada por aí, ainda mais para uma mulher bonita como você! E não me venha com "Não sou bonita", que você sabe que é! Não, não, eu vou correr em casa!

- Mas e o Ace e o Sanji? Os dois estão nos esperando mais à frente...

- Pode ir, depois alcanço vocês... Certo? – Olhou pedinte para sua irmã, que teve que concordar.

- Tudo bem, mas tome cuidado.

- Pode deixar! – Nami se virou e refez o caminho de casa com passos apressados.

- Menina maluca... – Nojiko murmurou e voltou a andar.

Nami andou com pressa até a próxima esquina e parou. Ficou em silêncio, apenas sentindo. Sentindo a presença dele. Ela sabia que certo ruivo estava ali. E queria fazer várias coisas ao mesmo tempo: Gritar com ele por causa do sumiço, tentar bater nele, mesmo não fazendo efeito, abraça-lo por finalmente ter aparecido, perguntar se havia algum motivo para ter desaparecido por dois meses e se a culpa era dela... A ruiva suspirou e, dentre todas as opções, escolheu uma que a satisfazia.

- Achei que já havíamos passado da fase de se esconder, Eustass. – Disse sem se importar com o volume da voz, afinal, a rua estava vazia. Sua voz soou fria e cortante. Estava irritada.

- Como você sabia que eu estava aqui, mulher? – A resposta não tardou a vir, hesitante assim como a pessoa que a falara. Kid saiu das sombras e parou na frente dela, temeroso e encantado.

Nami usava um vestido roxo até os tornozelos, de alças e decote quadrado, que possuía figuras douradas de estrelas e luas perto das barras e do decote. As sandálias eram também douradas. Os longos cabelos estavam presos num coque, deixando uns fios caírem livremente e ressaltarem o rosto angelical, agora contorcido numa careta de indignação e mágoa. Nos olhos, a ruiva havia passado lápis e uma sombra roxa suave. E, para terminar tudo, brincos dourados em forma de luas e a pulseira no braço esquerdo. Estava linda.

- Eu tenho cara de vidente, Eustass? Se eu soubesse, já teria contado, nem que fosse pro meu diário, vampiro estúpido! – Exclamou irritada. Depois de tanto tempo, era tudo o que ele dizia? Eustass ergueu uma sobrancelha e sorriu debochado.

- Isso tudo é estresse? Se for, você vai ficar careca rapidinho.

- Por que sumiu de repente? Por que nunca mais falou comigo? Onde esteve? E, acima de tudo, por que só apareceu agora?

- Primeiro: Eu não me lembro de ter pedido uma babá. Segundo: Não fale como se tivéssemos algum tipo de compromisso. Terceiro: Pare de falar como uma esposa ciumenta! É irritante!

- VOCÊ SABE POR QUANTO TEMPO EU ESPEREI, EUSTASS?! DOIS MESES!

- NINGUÉM MANDOU VOCÊ ESPERAR! – Eles já estavam gritando um com o outro – EU QUE NÃO! FOI DECISÃO SUA, HUMANA!

- S... SEU... – Nami tentou falar alguma coisa, porém era óbvia a razão dele. Ela suspirou e baixou a cabeça – Que ridículo... Estou discutindo com uma múmia...

- O que disse?

- Tem razão, ninguém me mandou esperar... – Levou uma das mãos ao pingente azulado, fazendo então Kid notar a presença da joia – Eu fiz isso por burrice própria... – Levantou a cabeça e sorriu de modo forçado, os olhos castanhos ainda refletindo a mágoa. Soltou o colar – Bom, então pode me deixar sem explicações... Não é da minha conta mesmo... Afinal, eu sou só uma humana... – Virou as costas para ele – Até mais, Eustass-san. Nojiko deve estar preocupada... – Começou a andar rapidamente, como se fugisse, no entanto, algo a impediu. Um par de braços fortes e gelados.

- Você... É minha humana... – Eustass sussurrou em seu ouvido. Ele a abraçava por trás, enlaçando a cintura fina por cima do tecido macio – E é por isso que devo me afastar... Você é... Tentadora... O aroma... A pele suave... O corpo formoso... O rosto angelical... Tudo me atrai, mas... Eu não quero te machucar...

- Kid...

- Eu tenho que me distanciar... Porém algo me puxa para você... Esses dois meses... Eu apenas fiquei fitando tudo por entre as janelas do castelo... E, mesmo assim, não podia evitar levar meu olhar até você... E tudo que eu quero saber é: Por quê? Por que você é assim? – Ele a puxou para si, fazendo o corpo pequeno bater conta o seu, ainda de costas.

- Então foi por isso que você foi embora? Tem medo de acabar me machucando?

- Um vampiro é um vampiro. Não se pode mudar isso.

- E se eu disser que não ligo?

- Se ficar comigo, pode acabar morta.

- Eu não me importo. Vou morrer de qualquer forma, quero viver uma última aventura.

- Você é tola, mulher. No lugar de recusar e viver, prefere se aproximar mais e correr o risco de morrer.

- Eu sou uma humana, e esse é meu instinto. Descobrir e viver o quanto eu puder, sem pensar mais de duas vezes em cada decisão. Ou melhor... Sou sua humana...

- Humana tola... – Sorriu de canto. Nami era uma humana frágil, efêmera, mortal, entretanto ele não conseguia vê-la assim. Pois ao mesmo tempo em que era determinada e astuta... Era gentil e compreensiva – Você não tinha uma festa para ir?

- Encontrei algo mais interessante.