The Last Chance escrita por theblackqueen, BloodyBunny


Capítulo 1
The Abancourt Sisters.




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Os Abancourt não tinham nada de especial à primeira vista. Eram uma família como outra qualquer. Uma família feliz. Viviam em Portland, no Oregon. Adam era o pai, professor de história, sempre se esforçou para cuidar da família, dar a ela o melhor que podia. Era um homem gentil, inteligente, sempre trazia um sorriso no rosto ao chegar do trabalho. Miranda era a mãe, ela fazia doces para vender e era uma cozinheira de mão cheia. Dona de um belo par de olhos azuis tão cristalinos quanto o céu. Era de longe a mulher mais bonita que Adam já conheceu e ele a amava. E esse amor era reciproco. Desse casamento nasceram duas lindas garotinhas. A mais velha era Marie, de cabelos castanhos como os da mãe e um par de olhos azuis tão belos quanto os dela. Três anos mais tarde nasce Annie, que assim como a mãe e a irmã, tinha olhos azuis – dessa vez um tom mais forte – e cabelos negros. E essa família tinha tudo para ter uma linda história, com tudo dando certo no final, mas isso não aconteceu.

Marie tinha acabado de completar seu décimo aniversário. Ela ainda era muito pequena, mas lembra claramente dos momentos de tristeza que passou com a doença da mãe. Fase terminal de câncer. Todos diziam – ela lembra bem – que os dias que restavam para Miranda eram poucos. E dia após dia ela viu a doença levando Miranda, sorrateira e cruel. Seu pai deixou o emprego, perdeu toda a alegria, já não era o mesmo. Então ele simplesmente sumiu. Não houve mais nenhum sinal dele. Ninguém mais o viu. Foi como se evaporasse da face da Terra. E no mesmo dia em que isso aconteceu, Miranda teve uma melhora e dentro de pouco tempo já estava bem, como se nada tivesse acontecido. Um milagre, eles diziam. Talvez fosse. Mas só quem conhecia Miranda sabia que a mulher já não era mais a mesma. Antes era cheia de vida. Antes era carinhosa e terna. Agora era fria, distante, indiferente.

Certa manhã, ainda naquele mesmo ano, Miranda acordou bem cedo, fez o café das filhas e sumiu. Sumiu sem deixar nenhuma mensagem além de uma carta escrita à mão. O conteúdo da carta era breve e sem muitas informações, o seu único pedido era que as filhas fossem levadas à Salem e entregues ao irmão de Adam, Jack, que era padre de uma pequena igreja de lá. Ainda segundo a carta, ela mesma não as levou por falta de tempo. Foi a única coisa que explicou, as duas nunca mais viram a mãe.

Jack não mediu esforços para buscar as sobrinhas. Era um grande homem de bom coração. Embora não tivesse muito, o que tinha dividia com quem assim precisasse. E foi nessa mudança brusca de vida que a personalidade das irmãs se tornaram mais visivelmente opostas. Marie era a mais dedicada, sensível as necessidades dos outros, cresceu e se acostumou a ser ativa na paroquia e ela sempre ajudava quando alguém precisava e procurava pela ajuda. Já Annie era distante, criou um mundo só dela e se encolheu na concha. Era silenciosa, não falava ou participava muito. Foi uma criança quieta, protegida por Marie, que apesar de ter só dez anos amadureceu muito rápido. Rápido demais.

Com sete anos, Annie começou a ter pesadelos. Aconteciam duas, três vezes ao mês. Marie concluiu que era pelo choque de ter perdido os pais tão cedo, pois para Annie era difícil entender o que tinha acontecido. Que seus pais tinham só sumido. Nem Marie entendia. Os pesadelos eram bem realísticos. Por várias vezes Annie acordava de madrugada chorosa, relatando sonhos com pessoas morrendo. Marie nunca desistiu de cuidar da irmã, até um ponto que perdeu todas as esperanças. Possivelmente Annie nunca melhoraria.

A adolescência foi a época mais parecida entre as duas. Por certo ângulo pelo menos. Marie se dedicou aos estudos. Annie era desligada demais para isso, a garota não tinha boa concentração. Mas ambas tiveram uma adolescência bem diferente da maioria das garotas que vivem de festas e amores de verão. Todo o problema de Annie aumentou e mesmo que aquilo doesse profundamente, a mais velha se obrigou a internar Annie quando esta tinha quinze anos. E ficou por lá durante os quatro anos da faculdade da irmã. Mas jamais ficou sozinha, Marie a visitava todas as semanas e nunca desistiu da irmã.

Marie se formou na área da medicina legal, uma legista. Annie voltou a morar com a irmã no final desse período, mas em pouco mais de dois anos as coisas voltaram a se agravar. Annie tinha o que os especialistas chamavam de psicose religiosa. Falava sobre o fim do mundo, anjos e demônios sobre a Terra. Outra vez voltou ao hospital, outra vez a preocupação com Annie tomou conta de sua irmã mais velha. Era doloroso vê-la assim. E o quadro só foi piorando. Várias vezes Marie culpou seu tio, Padre Jack, pelo estado da irmã. Marie se tornou cética, distante de qualquer tipo de ideologia religiosa. Acreditava que havia feito mal a Annie crescer em meio a sermões sobre céu, inferno e pecado.

Fora isso, a vida de Marie era boa. Trabalhava no IML da cidade, ganhava bem, tinha um pequeno apartamento em uma boa rua, as coisas em sua vida saíam relativamente bem. Pelo menos em certas questões. Tinha Charles. Esse havia sido seu pior erro, aliás. Charles foi um engano, uma parte da sua história que ela gostaria de esquecer completamente se pudesse. Charles lhe custou muitas lágrimas, lágrimas essas que ele não merecia. E muito mais do que isso, custou uma vida.

Isso nunca lhe sairia da memória.

Mas apesar de tudo, agora as coisas começavam a dar certo. Parecia que agora finalmente o passado tinha ficado para trás. Toda a dor. Todo mundo tem uma história triste. Mas o importante era seguir com suas vidas.

Não era isso, afinal, que significava viver?


20/maio/2013 – Salem, Oregon.



Naquela manhã quando acordou Marie sentiu um súbito cansaço. Aquele seria um dia difícil. Não era normal ser chamada pela administração do hospital. Ao longo do tempo em que Annie permaneceu internada jamais deu problemas, a doença não lhe fazia perigosa e agressiva. Isso só podia significar uma coisa: Annie havia piorado.


Marie bebeu o último gole de chá gelado e comeu uma torrada de pão integral, depois seguiu em direção ao IML local. Era uma passada rápida para entregar um laudo que precisavam mandar para o delegado, o envenenamento de uma garota em uma danceteria há dois dias. Marie normalmente era chamada em casos específicos, estranhos. E não tinha que se preocupar com nenhum, pelo menos não naquele dia. Depois de um almoço rápido na rua, dirigiu o seu carro – um Mercedes-Benz Smart 2010, na cor branca – até o hospital de doenças e distúrbios mentais.

— Senhorita Abancourt. — cumprimentou o doutor assim que Marie adentrou o consultório. — Boa tarde.

O homem era baixo, um pouco cheinho e careca. De queixo longo e redondo. E não era da mesma idade de Marie, era bem mais velho. Talvez beirasse aos 60 anos. Se chamava Marcell Gusman, era o melhor doutor da cidade para tratar de doenças daquele gênero. Ele por sua vez se deteve admirado por um tempo. Havia visto Marie há quase um ano – claro que ela havia visitado a irmã nesse meio tempo, mas Marcell estava viajando – e ela não havia mudado nada!

Sem dúvidas Marie era uma bela mulher. Era uma mulher de 31 anos com uma postura firme, porém delicada. Olhos azuis, um tom claro, cristalinos como as águas puras e transparentes de um rio. Cabelos castanhos um pouco abaixo dos ombros. Os modos simples, porém encantadores.

— Boa tarde doutor. — o sorriso de Marie era fraco, ela sentou-se na cadeira à frente do médico. — Eu devo dizer que fiquei um pouco surpresa com a ligação do senhor. Annie está bem?

— Sua irmã está ótima, Marie. — tratou de acalmá-la, encostou-se na cadeira e pode visualizar uma certa confusão estampada no rosto da jovem.

— Então...?

— É justamente por isso que eu liguei.

— Como? — Marie franziu a testa.

— Sua irmã Annie, ela não tem a menor necessidade de estar aqui. — explicou o médico calmamente notando o espanto de Marie. — Seu quadro é estável, ela não apresenta nenhum risco. Nem de perto se enquadra aos casos que temos aqui. Ela é inteligente, carismática. Toca piano. Ensina. Eu não vejo mesmo um motivo para que Annie permaneça aqui.

Marie sentiu seus músculos enrijecerem com o que o médico disse sobre sua irmã. Uma mescla de confusão e receio tomou conta de si.

— E a.... A confusão mental, doutor?

— Não posso dizer que sua irmã está totalmente livre dos devaneios, mas eu posso assegurar que Annie ficará melhor junto aos seus. — ele tornou a dizer em tom tranquilo enquanto analisava a garota a sua frente. — Mas se mesmo assim tem alguma dúvida, eu aconselharia ir ver a sua irmã. Falar com ela.

Marie assentiu. Desviou o olhar do perspicaz médico que já havia percebido a relutância, um verdadeiro dilema que atingiu Marie nesse momento. Era uma questão muito delicada. Não é que não quisesse Annie ao seu lado, longe disso, só temia que Annie precisasse de certas atenções que nesse momento ela não poderia dar. Ao lado da enfermeira, a mais velha das irmãs cruzou o espaço do interior daquela clínica em direção a qualquer lugar que Marie não fazia ideia.

Pararam de repente. Logo à frente uma grande porta de vidro. E por um breve momento Marie esqueceu-se do tipo de lugar que estava. Do outro lado várias pessoas estavam espalhadas pela iluminada sala com suas telas, suas tintas e seus cavaletes. Pareciam muito concentrados. Os olhos da mais velha pararam sobre a mais nova e ela sentiu um nó surgir em sua garganta. Por que sempre lhe parecia tão indefesa?

Annie era uma mulher de 28 anos agora. Não era mais uma garotinha. Dona de uma beleza meiga, doce. Ela era linda, tão linda quanto a mãe – Marie podia se lembrar – os mesmos traços delicados. O rosto redondo, os olhos muito azuis, a pele clara, os cabelos negros e levemente ondulados que iam até a metade das costas. Poucos centímetros mais baixa que Marie, bem poucos.

Lhe doía tanto não ter visto a irmã em uma vida normal e saudável. Estudando, se divertindo, sendo feliz. Apertou os lábios em uma linha fina, respirou fundo antes de se aproximar mais da porta. Como por instinto Annie lhe encarou. Ela abriu um sorriso, Marie retribuiu imediatamente, então Annie saiu da sala. Foi em direção a irmã e as duas se abraçaram fortemente.

— Maninha... Senti muita, muita saudade! — a mais velha disse enquanto ainda se abraçavam, depois se encararam e Annie murmurou um “eu também” quase inaudível, abriu um largo sorriso e Marie por fim relaxou. — Vejo que está se dedicando as artes....

— É um bom passatempo. — Annie disse em tom de comentário, se perguntava o que Marie fazia naquela clínica.

Marie normalmente a visitava duas ou três vezes por mês. Ligava antes, queria saber se Annie precisava de alguma coisa. Dessa vez não. E isso despertava em Annie certa insegurança. Podia sentir o nervosismo vindo de Marie. Era muito perceptiva. Marie suspirou e desviou seu olhar por alguns segundos para o tal salão onde sua irmã mais nova pintava há alguns minutos atrás, as pessoas lá dentro ainda seguiam sua atividade. Um estranho silencio se estendeu entre as duas, até que Marie encarou a irmã novamente.

— E as coisas por aqui, Annie? — perguntou. — E você, como se sente?

— Bem. — Annie estranhou o semblante da irmã, parecia preocupado. — Algo aconteceu, não foi?

— Não, nada importante. — Marie tratou em não transparecer os receios. — O doutor Gusman disse que você já está melhor e....

— E....? — Annie estreitou o olhar.

— Pode ir para casa.

Todo e qualquer questionamento morreu na garganta de Marie quando viu os olhos da irmã se encherem de brilho. O resto da tarde foi para Annie arrumar as malas. Enquanto isso, Marie tirava suas últimas dúvidas com o médico. Ele novamente assegurou que Annie não era do tipo esquizofrênica perigosa nem tinha tendências homicidas. Annie era estranhamente normal comparada aos outros pacientes com delírios religiosos. Apesar de defender a existência dos anjos e demônios, relatar sonhos estranhos e tudo isso, podia-se dizer que ela era equilibrada. Já não tomava medicamentos. Lia, tocava, estudava, tinha sua opinião formada sobre diversos assuntos. Ela era normal, dentro do possível.

E durante a viagem, enquanto Annie falava e falava sobre as aulas de pintura e os trabalhos que haviam feito, Marie se permitiu relaxar. Não era a irmã que lhe deixava desconfortavel. Eram as lembranças. Os relatos. Aquelas coisas na mente de Annie, coisas que ela costumava imaginar. Anjos, demônios, temas religiosos lhe deixavam nervosa. Lhe davam uma sensação que as coisas não estavam em seu controle. E estavam. Tinham que estar. Ela era cética demais para acreditar em destinos. Ela fazia o seu destino. Fim da história. Ponto final.

No final da tarde já estavam no apartamento. Era confortável. Ficava em uma ruazinha calma bem perto do IML da cidade onde Marie trabalhava. Existiam dois quartos no apartamento e apenas um banheiro. Além disso, a cozinha e a sala eram uma mesma peça dividida com um balcão de mármore. Era um espaço bem compacto, mas muito bem organizado.

As paredes da sala eram marrons – mas um tom bem claro, quase pastel – e as portas eram brancas. Já as paredes do lado da cozinha eram cobertas por uma cor de azulejo claro combinando com as cores leves dos armários. No centro da sala havia um tapete não muito grande, em tom vinho. De costas para uma janela média que dava para a rua e de frente para uma estante onde ficava a televisão e os aparelhos de áudio e vídeo havia um sofá de três lugares e nas laterais do tapete haviam duas poltronas. As poltronas e os sofás faziam parte do mesmo conjunto, feitos de madeira rustica e estofado marrom. E era ainda naquele lado que ficavam as portas dos quartos e do outro lado, a que dava para o banheiro.

— O que acha? — a mais velha perguntou enquanto o olhar de Annie viajava pelo apartamento.

— Comprou esse apartamento quando?

— Um ano, eu acho. — respondeu a mais velha caminhando até uma das portas onde Annie se instalaria. — Não é grande, mas dá para nós duas.

Annie assentiu e sorriu. Era tão bom saber que Marie finalmente tinha uma casa. Se sentia feliz pela irmã. No tempo em que as duas eram pequenas, foi muito curto o tempo em que realmente podiam dizer que tinham um lar. O que Annie conseguia lembrar era muito vago. Claro que com seis ou sete anos, Annie teve tempo de absorver muitas memórias do tempo em que morava com os pais, mas os remédios e o tratamento fizeram tornaram algumas memórias duvidosas. Annie nunca realmente lembra se tais lembranças são reais ou são parte de algum sonho. E depois que ficaram com o tio, eles viviam em uma área comutaria, não era realmente uma casa.

— Soube do nosso tio? — Annie perguntou quando Marie já estava de volta à sala. — Como ele está?

— Bem. — a resposta de Marie foi rápida, ela não queria tocar no assunto que julgava ser o causador da doença da irmã. — Quer pizza?

Annie balançou a cabeça positivamente. Seu olhar parou na estante de T V, nos porta-retratos que lá havia. Fotos das duas pequenas, da formatura de Marie, uma foto em especial chamou a atenção de Annie; era a irmã ao lado de outra garota, cabelos claros e compridos, em um tipo de sacada à noite.

— É a Britney, uma colega de trabalho. — explicou Marie ao notar o interesse da irmã na foto. — Era aniversário dela. Foi no início do mês, no dia da chuva de meteoros.

— Não foram meteoros.

— Não? — a mais velha franziu a testa.

— Foram anjos. — Annie respondeu em tom natural.

— Anjos? — Marie engoliu a seco, eis a doença de Annie se manifestando. — E porque seriam anjos?

— Eles caíram, mas eu ainda não sei por quê.

— Claro. — Marie tentou agir naturalmente.

— Você ainda não acredita? — Annie encarou a irmã.

— Eu só não sei o que criaturas como anjos fariam na Terra, se eles existem.

— Eles andam entre nós há muito tempo, mas agora é diferente. — explicou, a mais nova parecia convicta. — Eu entendo que você duvide, não têm os sonhos que eu tenho.

— Ainda são frequentes?

— Ultimamente sim. — respondeu. — Mas antes não eram. Não depois do que aconteceu. Do quase apocalipse.

— Quase? — Marie indagou confusa, nem conseguia acreditar que estava em uma conversa tão ridícula. — Como pode ser quase?

— Ele quase aconteceu. — Annie explicou. — Mas foi impedido por dois irmãos que eram as cascas dos arcanjos Miguel e Sataniel.

— Sataniel?

— O nome angelical de Lucífer.

— Naturalmente. — disse a mais velha, em seguida pigarreou levemente.

— Mas agora todos os anjos caíram. — continuou. — E querem vingança.

— Contra quem?

— Eu ainda não sei. — respondeu. — Mas sei que estão matando pessoas.

— Matando pessoas? — Marie se surpreendeu. — Não deveriam ser eles os que cuidam das pessoas?

— Eles caíram. Tudo está confuso.

— Com certeza está. — a voz de Marie soou pesada e impaciente.

Annie observou a irmã por alguns segundos.

— Eu posso provar. — disse de repente. — Onde tem papel e caneta?

— Na gaveta da estante. — respondeu apontando para a estante, confusa com a atitude da irmã.

Annie começou a rabiscar. Não demorou muito com o desenho. Em seguida ela entregou o papel para Marie que observou atentamente o que ela desenhou, e estranhou o desenho. Era o popular sinal do infinito com alguma coisa a mais em seu interior. Um símbolo estranho.

— É enoquiano. — explicou a mais nova. — Se você encontrar esse símbolo em algum corpo, saberá que os anjos assassinaram a pessoa.

Marie assentiu. Estreitou o olhar sentindo um calafrio em seu corpo. Mas a tal conversa estranha terminou ali e a mais velha agradeceu por isso. Annie foi se entretendo com a Televisão, a pizza. Marie tratou de ignorar o que a mais nova havia dito. Eram delírios. Nada mais. E a noite passou tranquilamente.

Talvez não fosse uma ideia tão ruim trazer Annie para o mundo real. Ela podia acabar melhorando ao se sociabilizar mais. Mas Marie não queria deixá-la só, pelo menos não agora. Por isso acabou ficando nervosa quando recebeu uma ligação do chefe. Um corpo havia sido transferido de Eugene, um corpo de um homem encontrado na rodovia.

— Qualquer coisa, é só me ligar. — pediu à sua vizinha.

Antes de sair voltou a espiar a irmã. Annie dormia tranquilamente.


[...]



O carro estava estacionado em frente a uma lanchonete. Um Chevy Impala 67. Havia um homem escorado na lateral do carro. Era alto, forte, os olhos tinham um tom esverdeados e os cabelos eram castanhos e compridos, pouco abaixo do queixo. Ele lia um jornal com atenção. Sua aparência era boa depois de tudo o que havia passado há pouco tempo, mas ainda estava instável. Tosses, dores, coisas que nem o irmão sabia. E por falar no irmão, o mais velho saiu de dentro da lanchonete com dois embrulhos de papel em mãos. Era mais baixo que ele, cabelos castanhos claros e olhos verdes. Dean entregou um para Sam e tratou de abrir o outro, tirando um cheeseburger e devorando-o.


O mais novo encarou o irmão.

— Que é? — disse Dean de boca cheia. — Estamos na estrada sem comer nada há seis horas, eu to cheinho de fome.

— Dean, o Cas ligou.

— Ah, e qual foi a desculpa dele por não ter aparecido no bunker? — indagou Dean.

— Quebrou a perna. — explicou Sam. — Está internado em Selma, no Alabama.

— O que ele faz no Alabama? — estranhou o mais velho. — E como assim “ele quebrou a perna”?

— Parece que ele se confundiu ao pegar o ônibus e aparentemente não sabia que ao descer uma escada correndo se corre o risco de cair. — Sam reprimiu o riso, era estranho e engraçado pensar em Castiel nessas situações.

— Ta me zoando? — Dean indagou pasmo. — Qual é, ficar com o Castiel vai ser como criar uma criança de barba e sobretudo. E alguém precisa ficar com o Kevin no bunker, ainda mais com o Crowley trancado.

— Eu já falei com o Garth. — disse Sam. — Ele vai ligar para o Kevin encontrá-lo. Está indo para o Kansas.

— E onde o Garth estava, afinal? Nós ligamos para ele e nada.

— Caçando, ele disse. — respondeu, depois voltou sua atenção ao lanche. — E eu andei lendo. Mais e mais mortes estranhas estão acontecendo. A última foi em Eugene, há duas noites. Um cara foi encontrado longe do carro, na estrada, o corpo estava fatiado.

— Acha mesmo que os anjos surtaram e estão causando essas mortes?

— Ou são os anjos, ou uma criatura que detesta religiosos. — comentou Sam em resposta ao irmão. — Todos os mortos foram padres e pastores, todos de uma forma ou de outra envolvidos com questões religiosas.

— É, mas ainda não temos provas. — questionou Dean.

— Por isso viemos à Salem. O corpo foi trazido para cá. Parece que tem uma legista especialista na cidade.

— Não adianta uma especialista, eles não sabem o que nós sabemos. — Dean abriu a porta do carro.

Os dois entraram e o Impala seguiu em direção ao IML.


[...]



Finalmente havia acabado de assinar os papeis de transferência. Marie estava sentada na sala de Willian Levi, seu chefe. E ele não se cansava de dizer que ela era a melhor para resolver esse caso. Marie Abancourt era especialista nesses casos estranhos. Ágil, inteligente. Ou talvez tais elogios eram só uma espécie de cantada. Willian era um homem sedutor, olhos negros e cabelos castanhos, forte. Recém divorciado. Era um bom partido. Mas Marie não queria sair com ninguém agora, ainda era muito recente o que havia acontecido em sua vida sentimental.


Ela saiu da sala em direção a recepção. Já tinha todas as informações. Quando finalmente chegou – antes de subir a escada que ficava na recepção e dava ao corredor onde ficava o morgue – encarou dois homens sentados nas cadeiras de espera. Um mais baixo de terno preto. O outro mais alto de terno cinza.

— Doutora Abancourt, os senhoras estão à sua espera. — avisou a secretaria.

Os dois ficaram de pé.

— Agentes Andrew e Douglas. — o mais baixo foi dizendo, em seu distintivo o nome “Josh Douglas” e no do outro “Ben Andrew”. — Agentes federais.

— Federais? — Marie se surpreendeu. — Já?

— Nós soubemos que o corpo foi transferido e viemos vê-lo. — o mais alto foi explicando.

— Nem eu tive tempo para ver. — Marie disse. — Não deveriam esperar o meu laudo?

— Nós achamos que é um caso perigoso. Um serial killer. — o mais baixo disse rapidamente. — E por isso viemos o mais rápido possível.

— Deduziram isso sem nem precisar de um laudo? — Ela franziu a testa.

— Nós somos muito eficientes. — Dean, o agente Douglas, respondeu abrindo um sorriso cínico.

— Claro. — Marie disse azeda.

Odiava federais espertinhos. Os três subiram às escadas em silencio até enfim chegarem ao estreito corredor onde, logo no final dele, havia uma porta com uma placa escrito Morgue.

— Então o homem foi fatiado? — Dean indagou enquanto Marie abria a porta.

— Você sabe, você mesmo disse que é um ótimo agente. — Ironizou.

— E você é a especialista que designaram para o caso?

— De fato já resolvi muitos crimes difíceis. — respondeu naturalmente.

— Não existem suspeitos. — comentou Sam, o agente Andrew, se metendo na troca de ironias entre a doutora e o irmão. — Por isso o IML de Eugene mandou o corpo para cá.

— Nenhum suspeito claro, pelo menos. — explicou a doutora. — Era um pastor que ia a um seminário em Bend. Religioso. Não tinha inimigos.

— Alguma marca na estrada? — Sam continuou perguntando.

Enquanto isso Marie tirou o corpo da gaveta e colocou sobre a mesa de análise.

— Nada além de sangue.

Abriram o zíper. O corpo estava ali realmente fatiado. Um dos braços separado do tronco. A cabeça foi arrancada. E o restante estava em carne viva. Dean não pode evitar torcer o nariz.

— Vamos lá agente. — brincou Marie. — Tenho certeza que já viu coisa pior.

Ela nem fazia ideia de como.

Mas de qualquer maneira, era péssimo ver um corpo daquele estado.

— As fraturas eu ainda não consigo deduzir o objeto que as causou. — ela foi dizendo, Sam seguia seus comentários e observava atentamente o corpo. — O cadáver apresenta lesões, eu diria que ele se chocou fortemente contra algo. E os cortes foram obviamente causados por uma lamina.

— Tipo uma faca de cozinha? — Dean indagou.

— Eu diria que mais grossa que esse tipo de lamina. — ela disse encarando-o, enquanto isso Sam começava a analisar o corpo. — Você disse que houveram outras mortes?

— Nas últimas semanas, sim. — o mais velho pensou bem em que informações ia dar para ela. — Louisiana, New Jersey, Colorado. Mortes de religiosos.

— Um serial killer atrás de religiosos?

— É o que tudo indica.

Sam fez sinal para o irmão e foi ver do que se tratava. Eles observavam o crânio da vítima, a cabeça separada do corpo. Sam abriu a boca do cadáver e pode ver um símbolo na língua dele. Não como uma tatuagem, era como uma marca de ferro quente, como as que fazem no gado. A expressão dos rapazes despertou a curiosidade Marie que também foi ver, dando a volta na mesa. De imediato se surpreendeu. Era o símbolo desenhado por Annie.


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