Seasons escrita por Evye


Capítulo 5
Neve


Notas iniciais do capítulo

Olááá pitelzinhos!!! E ai está, mais um capítulo!! (Bem cedinho né?!). Aproveitem!!



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Duas, três, quatro vezes. Já tinha feito e desfeito a mala quatro vezes. O amargo gosto de derrota preso nos lábios, a raiva corroendo as paredes do estômago e o triste olhar procurando refugio nas peças que jaziam espalhadas pelo piso do comodo. Suspirou, a ideia de deixar o santuário havia passado por sua cabeça tantas e tantas vezes que perdera as contas. "Eu quero ir embora...". Engoliu em seco pensando no que faria se realmente deixasse o lugar, não tinha para onde ir, nem com quem ficar; sorriu, poderia voltar a sua cidade natal, não?! De volta aquele lugar tãão agradável... Tinha certeza que seria bem recebido... "As pessoas dali me adoravam... Ou, pelo menos, adoravam meu corpo".


–Tsc... Ah, o que eu faço...


Tinha extravasado sua raiva mais cedo do que deveria, sua cabeça ameaçava uma dor quase tão poderosa quanto de uma ressaca de dias de bebedeira, seu corpo exigia uma boa noite de sono, mas sua mente... Ah, sua mente o torturava, maltratando seu próprio ego, dizendo o quanto era covarde. "Eu não sou covarde, maldição!". Ergueu-se do chão encarando a própria imagem no espelho atrás de suas malas, era definitivamente uma beleza única, a pele pálida, os cabelos ondulados (agora na altura dos ombros), as curvas que se desenhavam a partir do abdômen... Quase a personificação da luxúria, puxou a seda vinho que repousava sobre o objeto escondendo a própria imagem, não era como se odiasse a si mesmo, apenas não queria mais enxergar com frequência o que estava lhe causando tantos problemas. Olhou ao redor um tanto desolado, a decisão foi tomada há muito tempo e numa relés esperança de que tudo voltasse ao normal e fosse novamente amado persistiu em ficar ali, esperando... Sozinho, no décimo segundo templo. "Você envergonhou todos os guardiões que passaram por aqui". As palavras marcaram como uma tatuagem, poderia tentar remover o efeito mas sempre haveria a cicatriz, a ideia de que um dia esteve ali, sentia-se envergonhado e se realmente fora o pior cavaleiro de Peixes?! Balançou a cabeça negativamente tentando tirar aquele tipo de pensamento; não se reconhecia mais, era sempre tão confiante e cheio de si e agora temia o significado de palavras vinda da boca de alguém que nem o conhecia direito, irritou-se, o que diabos significava tudo o que estava acontecendo? "Diabos! Que merda aconteceu com você, heim Afrodite?! Cadê aquele poderio, aquele amor próprio?!".


A noite seguiu com o jovem pisciano em um conflito sobre o que faria, sentia que se pudesse derramaria muitas lágrimas, mas chorar era um luxo que há muito perdera... Olhou pensativo para as últimas peças de roupas que dobrava, pousou a túnica sobre seu colo observando as flores que enfeitavam o teto, "Qual foi a última vez que chorei?", não se recordava, mas tinha certeza de que havia muitos anos e desde este fato nunca mais derramou uma lágrima. Afrodite sempre teve uma ótima memória e poderia dizer com detalhes sobre lutas, sentimentos e vidas (ou mortes...) que passou em seu caminho, mas algo tão simples como recordar-se do último choro era uma missão impossível, parecia distante e surreal, como se nunca tivesse acontecido.


–Será que eu... Já chorei?


Os olhos azuis baixaram encarando o tecido transparente sobre suas pernas, divagava percorrendo todas as lembranças à procura de algo que se assemelhasse a um choro, sabia como era isso, viu diversas vezes cavaleiros chorando, "Aiolia chorou no enterro do irmão, Saori já chorou tantas vezes que...Francamente!" , revirou os olhos repassando todas as cenas que vira a deusa debulhar-se em lágrimas, geralmente causadas por alguma situação envolvendo o Pégasos, Afrodite riu, não via a hora que os dois "babacas" se acertassem de uma vez e fossem viver bem longe dele. "Ou eu posso fazer isso antes, certo?! Ah sim... Quem mais já vi chorar... Aldebaran... Eu me lembro de vê-lo chorar uma vez, por que mesmo? Pelos deuses Afrodite, você está caducando?!! Hum... Mais alguém.... Saga."


Seu estômago revirou-se novamente e seu coração pulou uma batida, havia muito rancor dentro de si, vira Saga chorar, uma única e particular vez, num momento de desespero, lembrava-se bem do olhar em pânico que o cavaleiro lhe lançava debruçado em seu colo sob sua cama agarrando suas vestes; é claro que não havia apenas pânico e desespero por ver seu mundo ruir aos poucos, havia ódio também, muito ódio.


–Ah, isso é passado, esquece, esquece...


Bateu levemente a testa contra o espelho como se aquilo pudesse apagar as memórias que agora inundavam sua mente, algumas boas outras ruins, sentiu um forte aperto na garganta e sua mão tremer levemente, nunca havia chorado (pelo menos não depois de ter consciência de seus atos), mas tinha certeza de que aquela era a sensação inicial.


–Esqueça...


~


–Hei, Máscara.


–O que foi? Encontrou alguma coisa?


–Sim, veja, deve ser isso que Atena quer.


–Papeis, tsc, que perda de tempo! Enviar dois cavaleiros de ouro para pegar papéis! Por que ela não mandou aqueles paspalhos de bronze?


–Não sei, mas, está tudo muito calmo, não?!


–Até demais... Isso está me incomodando, espanhol, vamos dar o fora daqui, esse lugar está me dando nos nervos!


–Aliás, nervos é a palavra que te define ultimamente...


–O que está insinuando?


As palavras saíram ríspidas e pausadamente como se estivessem oferecendo ao outro uma chance de reformular o que havia dito, os poderosos olhos azuis mantinham-se fixos no homem a sua frente, Shura sorria vitoriosamente, conhecia o italiano tão bem quanto poderia conhecer e sabia que toda àquela irritação recente, tinha nome. "E um belo de um corpo....".


–Você andou brigando com o peixinho, foi?


–O que você quer dizer?


–Ora, Máscara, não se faça de inocente... Sempre que vocês discutem você ficar com o humor de um cão!


–Vá a merda espanhol, a minha vida não lhe diz respeito.


Shura riu orgulhosamente, estava amando provocar o companheiro, sabia o quanto ele era facilmente irritável, caia fácil em provocações e era exatamente por esse caminho que tiraria as palavras da boca do canceriano.


–Sabe, Máscara, não sei como você tem saco para ficar bajulando alguém como o Afrodite, quer dizer, olha o jeito que ele...


–Eu não estou bajulando ninguém.


–Não é o que parece... Você corre atrás dele com o rabinho entre as pernas, sempre.


Angelo arregalou os olhos, estava em fúria, possesso de raiva, virou-se rapidamente jogando o guardião da décima casa contra a parede, as mãos fechadas em torno do pescoço do mesmo, os olhares hostis se encontraram e um estúpido sorriso surgiu na face do capricorniano que segurava com firmeza as mãos do colega que ameaçava matá-lo a qualquer instante.


–O que você disse?


–Não se faça de idiota Máscara, você ouviu muito bem. -O sorriso alargou-se ainda mais, os olhos brilhavam de excitação, estava tirando proveito para descontar toda sua frustração dos últimos tempos, a vida não estava sendo fácil para ninguém. -Você sabe muito bem do que estou falando... Ele brinca com você do mesmo jeito que um gato brinca com um novelo de lã, joga de um ao lado ao outro e quando cansa, ignora. É assim, você sabe melhor do que ninguém, desde a época em que...


As palavras nunca saíram dos lábios do capricorniano, mas em compensação seu rosto sentiu o punho do moreno voar contra seu rosto, o ato fora tão repentino que não tivera tempo nem mesmo de se defender, caiu no chão ainda rindo, a sua frente Máscara da Morte bufava de ódio, estava disposto a quebrar todos os dentes e ossos da face de Shura.


–Levante-se e repita o que disse, faça isso, e eu vou ter um ótimo motivo para acabar com essa sua raça.


–Não. -Shura levantou-se batendo na própria armadura como se tirasse o pó da mesma.- Você é o único que não enxerga, se quer continuar cego em relação a isso, é problema seu.


Deu as costas deixando o italiano tão confuso quanto no começo da conversa, não acreditava nas palavras do espanhol o que ele queria dizer com Afrodite brincar com ele?! O que ele não enxergava?! A raiva que subiu por seu corpo pedia por um homicídio.


Caminhou até a saída da mansão abandonada, Shura tinha os papéis em mãos, a face ainda marcada e os olhos verdes fixados com mistério e determinação no cavaleiro que acabava de deixar a mansão, Angelo devolveu o olhar com a mesma intensidade. Não havia mais nada a ser dito. O que aconteceria agora dependeria de ações.


"Palavras são para imbecis, isso vai acabar em socos!"


~


Os primeiros flocos de neve vieram acompanhados de uma ventania forte e gélida, Afrodite sentiu os poucos pelos de seu corpo arrepiarem-se, fechou os dedos nas alças das malas com mais força, como se assim garantisse que não desistiria da ideia, tinha decidido que iria embora, para onde? Não sabia. E sequer gostaria de saber! Não tinha certeza alguma além da que precisava sair do santuário o mais rápido, "E se possível, antes da pirralha peituda voltar!". Estava tudo correndo conforme o plano, as malas estavam prontas, portas e janelas trancadas, seus objetos que não podia carregar, muito bem guardados no closet, as rosas... Bem, esse era o único problema até aquele instante, o que faria com suas tão amadas rosas quando fosse embora?!


Caminhou até o jardim pessoal que mantinha, não temia tanto pelas rosas que levavam até o templo do grande mestre, sabia que estas ficariam bem enquanto vivesse, mas... As flores de seu jardim particular não possuíam nada de especial, exceto pela beleza diferenciada e o excessivo amor que dedicava a elas.


Agachou frente a um lírio recentemente plantado, acariciando-lhe a pétala, enganava-se quem achava que ele apenas amava as rosas, tolice... Afrodite amava todos os tipo de flores que pudesse amar, é claro que as rosas eram suas favoritas e jamais nenhuma outra flor roubaria seu coração, mas não podia negar os encantos das demais. Continuou o carinho como se cuidasse de um filho recém-nascido, ergueu os olhos encarando o jardim, o girassóis pendiam para baixo, decepcionados com a ausência do sol, as damas da noite, aguardavam a noite pacientemente, os lírios, todos reunidos próximo a Afrodite, pareciam filhotinhos junto a mãe, as hortênsias com toda a beleza e exuberância exibiam-se as abelhas que trabalhavam incansavelmente e no meio de toda a variedade de flores plantadas cuidadosamente pelo guardião do templo de peixes, encontrava-se as rosas, brancas, vermelhas, amarelas, negras, de todas as cores, odores e tamanho.


"Dizem que eu sou o cavaleiro mais belo dentre todos... Mas, se vissem esse jardim... Não há beleza maior no mundo... Me perdoe, minha querida deusa, mas nem mesmo você, que me abençoou, vence a beleza desse jardim..."


Era seu maior orgulho e o único motivo real que o fazia hesitar em sua partida, se fosse embora todas aquelas flores murchariam e morreriam, e isso era inaceitável, já havia sofrido muito quando voltou da morte e viu seu tão amado jardim destruído pelo tempo. Amaldiçoou Atena e todos os cavaleiros por terem sido tão descuidados, custava ter ao menos cuidado delas?! Em nome de sua memória, que seja!


–Estúpidos ignorantes... Eu sei queridas... Eles não sabem o valor de vocês, são todos ridículos...


–É um belo jardim.


Afrodite deu um pulo ao ouvir a voz que ecoava do portal que dava acesso ao jardim, suas mãos fecharam-se rapidamente estraçalhando a pequena pétala do lírio que acariciava.


–Ah! Não...


Mordeu o lábio em um pedido mudo de desculpas a flor que baixara o caule sutilmente, como se estivesse decepcionada com a ação de Afrodite. Havia machucado uma de suas preciosas "filhas".


–Seu idi-...


Calou-se rapidamente ao ver os fios dourados que agitavam-se ao correr do vento, os braços cruzados e o corpo parado disciplinarmente ao pé do portal. Shaka estava, naquele exato momento, parado à sua frente "olhando" seu jardim.


–O que está fazendo aqui?


O loiro ficou em silêncio, como se não tivesse escutado as palavras do sueco.


–Não acredito... Olha, já ouvi dizerem que você era cego, mas surdo é novidade! Então, se não for, poderia ter um minimo de respeito e me responder?! -Afrodite irritava-se com a indiferença do outro que continuava calado apenas mirando o horizonte... Obviamente com os olhos ainda cerrados. - Hei, estou falando com você!


–Elas estão tristes.


Afrodite arregalou os olhos, elas?! Ele poderia estar se referindo às suas flores? Encarou o jardim, percorrendo o olhar por cada espécime que vivia ali, esforçando-se para captar os sentimentos que exalavam. Shaka estava certo, como fora tão tolo para não perceber?! Baixou a cabeça encarando a pequena pétala branca que acidentalmente arrancara do pequeno lírio ao seu lado, fora tão egoísta... Insistia dizendo que havia mudado, mas pelo jeito era o mesmo, considerando o modo como agia. "Tão estúpido e egoísta ao ponto de não perceber que o próprio jardim está triste, você é o único ridículo aqui, Afrodite!".


O que quer aqui Shaka?


Shaka caminhou para perto do pisciano parando frente a uma aglomeração de Lótus que repousavam silenciosamente em um pequeno lago artificial criado especialmente para flores aquáticas, baixou-se observando a variedade de cores e espécimes que havia ali, Afrodite, atento a cada movimento do loiro, o olhava com curiosidade, ainda intrigado com a presença do cavaleiro em sua casa e curioso com sua aparente atenção as Lótus.


A brisa que se seguiu veio morna, atípica dos ventos invernais que se fazia presente até segundos atrás, acalentou o atribulado coração de peixes carregando o aroma maravilhoso que o jardim exalava, sentiu uma paz como nenhuma outra, por momentos parecia que o mundo era colorido, que não havia problemas sentindo-se como se fosse parte daquele jardim... Bem, não que não fosse...


E pela primeira vez em sua vida, deparou-se com algo inédito. Os olhos do virginiano estavam abertos. E, ainda mais incrível que isso, nada havia sido destruído ao seu redor.


Afrodite abriu a boca espantado com a cena, estaria sonhando?! Só podia ser isso! Encolheu-se contra a parede do templo olhando com espanto para o cavaleiro a frente que permanecia em silêncio analisando friamente a pobre planta.


–S-Shaka...? -Automaticamente o virginiano fechou os olhos, voltando o rosto para Afrodite como se perguntasse o que este queria. -Seus olhos... Agora a pouco, eles...


Shaka voltou o olhar para as flores à sua frente, ergueu uma das mãos tocando sutilmente a Lótus rosa que destacava-se de suas companheiras.


–Algumas coisas devem ser apreciadas também com os olhos da carne...


–Foi a única que floresceu... Me recordo de ter plantado tantas semente e ela foi a única que germinou... As azuis, vermelhas, brancas, não me deram trabalho e, engraçado... Todas se reuniram ao redor desta, como se a protegessem... Eu admiro essas flores. -Afrodite voltou o olhar ao jardim, o sorriso nos lábios e a tristeza deixada de lado por alguns momentos. -Elas me trazem paz, todas elas...


O silêncio que se seguiu aquelas palavras não poderia ter sido mais propicio, apenas o zumbido dos pequenos insetos que polonizam podia ser ouvido, até mesmo as brisas e os vento que persistiam em soprar continuamente, calaram-se, deixando que apenas o silêncio pudesse ser ouvido.


–Sabe, Afrodite, há algo interessante sobre o santuário, eu me recordo que desde o primeiro dia que cheguei aqui, quando coloquei meus pés na primeira casa e inspirei o ar, senti um peculiar aroma no ar que onde quer que eu fosse me seguia, era um odor agradável e doce. Em todos esses anos nunca deixei de sentir esse cheiro, nem um dia sequer... E até mesmo no dia que morri pude sentir o aroma que preenche todo o santuário, mas então, quando voltamos, curiosamente o cheiro que tanto me agradava havia sumido, eu o senti apenas um dia... O dia que voltamos, desde então nunca mais...


Afrodite mantinha a atenção as palavras do loiro que falava com calma e paciência em sua voz suave e branda, os dedos contornando as pétalas e caule da flor rosada que parecia se abrir cada vez mais ao toque, Afrodite sorriu sutilmente, ela gostava de Shaka...


–Hoje eu subi as seis casas com o propósito de fiscalizar os últimos templos e enquanto fazia minha caminhada, depois de dias, eu senti novamente o cheiro que me acompanhou e que acompanha a todos nós neste lugar, durante anos... E eu vi e entendi. O aroma que preenche o santuário vem daqui, do seu jardim, do seu templo, de você.


O guardião da décima segunda casa ficou espantado, seu rosto avermelhou-se tanto quanto as rosas no centro do jardim, os lábios abriram-se em um delicado "o" e as mãos apertaram suavemente a pétala que ainda segurava. Shaka voltou o olhar ao pisciano observando a bela feição espantada do outro.


–Espero continuar sentindo esse aroma e que suas flores não se entristeçam mais, seria uma pena perder o agradável cheiro que elas exalam... Tenho certeza que todos notariam.


As palavras eram simples e sem nenhum significado além dos que transmitiam, porém acalentavam o coração de Peixes como o abraço de uma mãe (não que Afrodite soubesse o que era isso, mas gostava de fantasiar que essa seria a sensação), seus lábios retorceram-se em um sorriso tímido e os olhos azuis celestes brilharam ao ver um pequeno floco neve pousar sobre a cabeça de Shaka que continuava observando a Lótus.


Era a chegada de seu último inverno.



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Notas finais do capítulo

Esse ficou consideravelmente grande em comparação aos outros, eu sei... Desculpem! x.x! Mas é que eu fui me empolgando e empolgando e escrevendo... Ai já viu!
Espero que tenham gostado!! Não deixem de comentar e expor a opinião, é muito importante para o desenvolvimento da estória u.u!!
Beijos! Até o próximo capítulo!!

Tia Evye.