Sete Chaves escrita por Hakume Uchiha


Capítulo 27
Esperança




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Resolvi não contar aos meus pais o ocorrido, já que tinha certeza de que eles enlouqueceriam com a notícia. Mas passei a noite inteira me perguntando de quem seriam aquelas vozes estranhamente conhecidas, tentando identificá-las de alguma forma, mas sem sucesso. Bem, talvez fossem alguns policiais da penitenciária que eu acabei frequentando uns dias há tempos.

Mas meu pensamento involuntariamente voltava-se de novo para Raul. Agora faltava pouco tempo – 9 meses – e eu estaria na porta o esperando sair. Ah, só Deus e eu sabem o quanto anseio por esse dia.

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Cap. 27

Hoje era um dia diferente. Diferente não, hoje era o dia – o dia em que eu finalmente terminara de pagar “a conta” do acordo com meu pai, o dia em que eu não precisaria mais me conter, o dia em que finalmente poderíamos ficar juntos. Mal podia conter minha felicidade; quando acordei e vi a grande bola vermelha marcando o dia no calendário meu rosto se abriu num sorriso largo que eu já não dava há bastante tempo.

Hoje era sexta-feira e eu tinha um trabalho para apresentar na faculdade – se não fosse por isso eu iria para a penitenciária agora mesmo, mesmo sabendo que ele só seria liberado à tarde – então eu simplesmente voltei a ser que eu era. Me arrumei sorrindo, me maquiei e até fiz um penteado bonito no cabelo; coisa que há 3 anos eu não dava tanta importância.

Mas hoje era o dia. Eu precisava estar perfeita! No café da manhã, ninguém conseguia esconder as emoções – felicidade da parte de minha mãe e do meu irmão, preocupação da parte do meu pai. Ele me olhava de soslaio enquanto me via saltitar pela cozinha, com um copo de leite em uma mão e na outra um pedaço de bolo. Eu cantarolava enquanto mastigava o alimento.

O trabalho seria apresentado na última aula e, depois de minha atuação esplêndida, eu e meus poucos amigos fomos almoçar nos restaurantes do campus. As perguntas sobre minha mudança de humor foram a bola da vez – sim, eles notaram – mas eu não estava disposta a revelar o real motivo para que a história do romance trágico viesse à tona novamente.

Às duas horas em ponto eu estava lá. Pedro estacionava enquanto balbuciou algo como “tem certeza?”. Mas eu não ouvi direito, nem estava interessada em perguntar novamente – a única coisa que eu mentalizava era Raul saindo por aquela porta e vindo correndo me abraçar. A visão do meu final feliz.

Corri até a recepção e perguntei sobre o meu detento, feliz por saber que dali a poucos segundos ele estaria comigo. O homem – que já havia me visto certas vezes ali há 3 anos – me olhava com olhos tristes e cheios de ternura, tão diferentes dos meus, que estavam transbordando de alegria. Ver Raul seria a última gota necessária para derramar.

– Você está falando do detento Raul Cortez, de 20 anos, que cumpriu 3 anos de prisão? - ele me olhava, já sabendo a resposta, mas por alguma coisa querendo perguntar de novo.

– Esse mesmo. - disse, super animada.

– Ahm... olha garota, eu tenho que te dizer que... bem... ele já não está mais aqui.

– O quê? - pergunto, sem acreditar no que ouvi.

– Ele foi liberado mais cedo, saiu há mais ou menos uma hora, sem deixar recado nem esperar por ninguém. Era para ele estar esperando... você?

– Ahm, eu não sei... - minhas sobrancelhas se unem e digo tão baixo que parece que estou falando para mim mesma. - É que... bem... acho que ele não pensou que eu poderia estar aquihoje...

– Pois é. O garotão foi embora. - disse, enquanto seu rosto melhorava a expressão – Posso te ajudar em mais alguma coisa?

– Não, obrigada, eu... eu já sei onde vou encontrá-lo.

Saio da penitenciária com um largo sorriso no rosto. Minha primeira esperança de vê-lo se foi, mas não por culpa dele. Ele nunca iria adivinhar que eu estaria lá para buscá-lo. E o único lugar do qual ele poderia estar agora era...

O galpão. Sete minutos até chegarmos lá, considerando a pressão que fiz para Pedro pisar no acelerador. Nós não podíamos nos desencontrar de novo.

A porta velha e enferrujada era a mesma de três anos atrás. Meus lábios se curvavam em vários sorrisos enquanto minha mão se ocupava em bater forte naquele metal; afim de me escutassem. Mas nada. Fiquei ali por mais cinco minutos, batendo, chamando, chutando a maldita porta. Mas que droga!

Mas de repente uma luz invadiu meu confuso cérebro, reorganizando as ideias e me fazendo sorrir de novo. Corri pro carro e pedi que Pedro pisasse fundo, mas agora pra casa. Minha casa.

Raul disse com todas as letras que quando saísse da cadeia ia me procurar. Ele não sabia que eu estava fazendo faculdade, então o único lugar no qual ele iria me procurar era na minha casa! Mas é lógico! Ele está lá me esperando!

Desço do carro na entrada de casa, olhando para os lados, procurando algum vestígio dele nas ruas. Nada. Pensei então que ele poderia estar no jardim, e saí feito uma louca correndo pela grama recém cortada, e só depois de dar a volta na casa inteira percebi que só perdi meu tempo.

Então talvez ele estivesse dentro de casa. Meus lábios se curvaram novamente ao pensar na visão daquele deus grego sentado no sofá da sala, me esperando com aqueles lindos olhos azuis de mar. Meu corpo se arrepiou com o pensamento, e num segundo eu estava abrindo de supetão a porta da sala, já preparada para me jogar em seus braços.

– Oh, graças a Deus... você voltou sozinha! - meu pai vinha em minha direção com um leve sorriso no rosto, ao olhar para o meu lado e ver nada além de vazio.

– O quê? - pergunto, absolutamente desapontada ao ver que no sofá também não há ninguém.

– Você, filha! Graças a Deus teve um senso de responsabilidade e não o trouxe até dentro de casa!

– Como assim? Eu... eu não entendo nada! - digo, e vejo minhas mãos começarem a tremer de pavor.

Alô-ou?! O garoto Lexi. Você foi vê-lo, mas não o trouxe. Isso mostra como a sua insanidade está diminuindo.

– Ele não está aqui?! - digo, sentindo o pavor sair das mãos pro resto do corpo.

– Como assim, Lexi? Do que você está falando? Você não o viu?

– Não, eu o procurei mas eu não... - e paro, ao ver como a expressão do meu pai muda completamente. Agora ele me olha com olhos de preocupação e compaixão intensa.

– Filha, eu te alertei sobre isso... - ele começa a falar, quando minha mãe e meu irmão chegam para assistir àquela cena.

– Não, não, não!!! - agora o pavor está nos olhos e me faz chorar como uma criança que se perdeu da mãe. - Isso não é possível!!! Ele... ele disse...

– Shhh, está tudo bem, meu amor... - minha mãe corre e me ampara em seus braços. - Nós estamos aqui. Somos tudo o que precisa...

– Lexi, eu sinto muito. Mas há três anos eu te alertei sobre isso. Ele não te ama, filha. Ele foi embora.

Eu grito. Não queria mais ouvir as palavras de meu pai – aparentemente corretas – mas cada uma delas parecia arrancar um pedaço do meu coração ao serem proferidas. Respiro fundo, tentando me controlar; minha cabeça está confusa e não sei o que pensar. Restrinjo-me ao abraço caloroso de minha mãe e fecho os olhos para não enfrentar a sinceridade dos do meu pai.

Aquela tarde foi dolorida. Cada hora que passava dava mais crédito à sentença do meu pai – que Raul me deixou. Mas não posso mentir pra mim mesma; eu ainda tinha esperança. É certo de que ela ia enfraquecendo a cada hora, como uma ampulheta que tinha mais areia embaixo que em cima. Porém, pelo ditado é a última que morre, e cada vez mais sentia que ela era a única parte viva que restou de mim.

Era meia-noite. Depois de olhar infinitas vezes o jardim pela janela do meu quarto em busca de algum sinal dele, me deitei e desisti. A esperança que havia em mim parece ter se reprimido em algum lugar bem no fundo, enquanto as lágrimas secavam no rosto e os olhos cansados de chorar fechavam lentamente. Eu nunca me senti tão só.

Pensei que os primeiros meses do meu projeto “vida sem Raul” fossem os mais doloridos da minha vida, mas aquele fim de semana superou tudo o que eu já havia passado. Eu que pensei que aquela ferida no coração seria finalmente curada na sexta, nunca imaginaria que um buraco inteiro seria arrancado dele durante o sábado e o domingo.

Todo o meu final de semana que tinha tudo pra ser perfeito.

Mais três dias sem Raul. Três dias que agora simbolizavam toda a vida.


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