Dias Imprevisíveis escrita por Gil Haruno


Capítulo 21
Capítulo 21 -Desafios


Notas iniciais do capítulo

Oi, pessoas!Esse capítulo vou dedicar a uma pessoa querida que recomendou a fic e que me acompanha há muito tempo!Thaaty, obrigada por está aqui flor, lendo mais esse trabalho!Beijos a todos!



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Diante do espelho, vejo as cicatrizes que foram tatuadas na minha alma ao longo tempo. Boa parte delas, não doe, e até mesmo me causam certa alegria. Mas eis aquelas que sangram todos os dias, fazendo-me crer que nunca irão sarar.’

Aquela era a primeira manhã, que passávamos juntas, que o silêncio era o verdadeiro centro das atenções.
Vez ou outra, eu levantava a cabeça a fim de observar Megan, à minha frente cutucando o wolfos com o garfo, sem nenhum sinal de apetite. Algumas vezes tentei iniciar um assunto qualquer, mas decidi que seria melhor preservar aquele silêncio absurdo, por que eu estava do mesmo jeito que ela.
De certa forma, era patético ter que contar quantas horas já tinha passado naquela manhã, desde que despertei no quarto de Ethan, e descobrir que meu sofrimento começara há pouco tempo, exatamente há quatro horas e quinze minutos. Tão pouco e eu já não sabia mais no que pensar para tirá-lo da minha cabeça.

–Ethan foi embora, não é?

Megan olhava-me curiosa, embora já soubesse a resposta que eu lhe daria.

–Foi.

–Uh. – um sorriso melancólico brotou nos lábios. –Eu sei que vocês dormiram juntos.

Minhas bochechas queimaram assim que constatei seu sorriso, um tanto malicioso. Fora curioso a maneira que ela se comportou; sem muito estardalhaço como costumava fazer.

–Só dormimos na mesma cama, mas ainda sou virgem.

Olhamo-nos curiosas e, sutilmente, escancaramos um sorriso em meio à diversão da minha recente frase.

–Eu não entendo o problema de vocês! É sério! – disse Megan, finalmente voltando à sua personalidade. –Eu tenho certeza que meu irmão não é gay! Não é possível que ele deitou na mesma cama onde você estava e se comportou como um bom samaritano!

–Acredite se quiser, mas foi assim que aconteceu. Ele pediu que eu ficasse no quarto, neguei-me a ficar desde o momento que ouvi o convite dele, mas ele queria mesmo minha companhia.

–É óbvio que o Ethan ficou terrivelmente tentado. Ele não ia te confessar que estava cheio de tesão. – sem dúvida alguma, a verdadeira Megan estava ativa. –O que houve? Por que vocês resistiram tanto?

Suspirei alto, inclinando as costas contra a cadeira.

–Ethan deixou bem claro que não queria tentar um namoro comigo. – Megan ficara boquiaberta. –Eu confessei meus sentimentos por ele, mas ele disse que não ia dar certo. Adrenalina, liberdade... são os principais motivam que o impede.

–Ai! Aquele filho da mãe! – bateu os punhos contra a mesa, demonstrando o quanto estava irritada. –Tenho vontade de virar o pescoço dele ao contrário!

–É deprimente, não é? – indaguei chamando a atenção dela, que fazia um grande esforço para se controlar. –Mas tem algo muito legal nisso.

–Então me diga, por que eu só enxerguei tragédia.

–O fato de ele se preocupar comigo. – mesmo contrariada, Megan parecia refletir. –Ele poderia ter se aproveitado, eu estava completamente vulnerável, mas ele não quis.

–Tá. Ele merece dez pontinhos por isso, mas essa atitude não o transforma em um herói, mas em um... idiota! – sem conseguir manter-se quieta na cadeira, ela levantou recolhendo os pratos da mesa. –Será que ele não entende que você é a garota perfeita para a vida dele? – depois de recolher os pratos, ela tirou as migalhas da mesa, como se fosse um robô programado. –Pelo menos ele disse que te ama?

–Lógico que não! Ethan apaixonado por mim... Essa é boa!

–E quando é que você vai perceber isso, mocinha? – ela parou o alvoroço, me dando atenção.

–Ele não está apaixonado por mim, Megan! – levantei-me inquieta e fui respirar o ar da janela. –Se ele me amasse não me diria adeus.

–Eu sou louca pelo Jason e tenho que dizer adeus a ele. Isso te faz refletir?

Por um breve instante, refleti sobre as palavras de Megan, mas me dei conta de que eu estava me iludindo. Não era saudável manter a esperança de palavras não ditas e sentimentos guardados. Por mais que doesse tanto, eu preferi vê as coisas de um único modo, que se resumia na escolha da liberdade dele, e no seu estilo de vida intocável.

–Não, Megan. – balancei a cabeça negativamente, enquanto meus olhos suportavam o peso de lágrimas presas a uma visível barreira de proteção. –Talvez Ethan sinta por mim... gratidão ou conforto emocional.

–A verdade? Vocês estão se negando um ao outro! – olhei-a. –Você está convencida de que Ethan não a ama e ele está convencido de que uma futura relação entre vocês não dará certo. Estão sendo lamentavelmente precipitados. – passeei a mão no cabelo, sentindo-me terrivelmente perdida. –Desculpa se eu estou sendo persistente, mas é que... Acho que estou fragilizada demais.

–Eu tenho certeza disso. – aproximei-me dela, arrastando-a pela mão. –Vamos nos arrumar e visitar Melissa.

–Ainda não posso ir vê-la. Normalmente a visito três ou quatro dias quando ela é internada.

Parei, olhando-a espantada. –Por que tanto prazo?

Megan se encostou à parede, encarando o chão.

–Só dessa forma minha raiva terá passado. – com a respiração pesada, ela olhou-me melancolicamente. –Você pode ir se quiser.

Eu não tinha conhecimento de suas ações no primeiro momento que ela via a mãe depois de uma recaída, por isso, achei que seria certo não insistir para que ela fosse.

–Sendo assim... Você quer mandar alguma coisa pra ela?

Os olhos de Megan embargaram, mas duramente ela repreendeu as lágrimas.

–Eu vou com você, mas não vou entrar no quarto.

Sorri aceitando sua decisão e a abracei pelo ombro. –Vamos logo! Melissa deve está morrendo de saudade de você!

&&&&*&&&&

–O David esteve aqui hoje, Carmen?

Foi a primeira coisa que Megan perguntou assim que pôs os pés no hospital. Além de resmungar o nome dele o tempo todo – acusando-o devido o estado da mãe –, ela confessava a vontade de vê-lo, e encurralá-lo com sua raiva.

–Graças a Deus não apareceu, nem ligou! – cochichou Carmen, percebendo que o doutor Caleb se aproximava de nós.

–Bom dia, meninas.

–Bom dia, doutor. – falamos em uníssono.

Assim que ele desviou do nosso caminho, Carmen chegou mais perto de nós. –Já deixei os seguranças de sobreaviso. Nesse hospital, aquele desgraçado não entra mais!

–Obrigada, Carmen.

Agradeceu Megan, mostrando-se aliviada.

–Não me agradeça, faço com muito prazer. Agora entrem!

Entramos no quarto em passos sorrateiros, sem tirar os olhos de Melissa que, sem nos perceber, mantinha a visão em um ponto imaginário a sua frente.
Como se estivesse com medo – por que passara muito tempo se negando a entrar no quarto –, Megan aproximou-se mais da cama. Observando o avanço dela, percebi que sua expressão não era de raiva, mas de alguém que precisava ser firme.

–Vocês vieram!

Melissa sorriu e, como se precisasse a todo custo de um abraço, estendeu os braços a Megan. A Scott hesitou, mas não demorou muito para abraçar a mãe.

–Minha menina!

Não pude vê as emoções de Megan naquele momento, mas sei que seu coração batia desgovernado ao sentir Melissa perto; mostrando-se forte.

–Venha, Claire! Dei-me um abraço também!

–Como se eu fosse correr de você.

Brinquei arrancando um sorriso dela, que alegremente apertou meus ombros.

–Cadê o Ethan e o Nicholas?

–Nicholas estará aqui em breve. – respondi olhando Megan que me olhou de soslaio.

–E Ethan?

Esperei que Megan falar sobre ele.

–Ethan caiu no mundo de novo e acho que ele passará um bom tempo fora. – Megan disse sem rodeios.

–Quando ele foi?

–Quando ele voltou pra casa e viu a senhora deitada numa maca, aparentemente morta.

–Megan...

–Ela precisa saber o que está fazendo com a gente! – Megan interrompeu-me, encarando Melissa que desabou em lágrimas. –A senhora enxerga o David, o álcool, as drogas, mas não enxerga seus filhos! O que temos de errado?

–Não são vocês! Sou eu!

–Nós sabemos, mas não compreendemos o porquê de você não querer se esforçar! – Melissa olhou a filha. –Estamos fartos disso e se a senhora continuar assim, não sobrará ninguém na sua vida! – Melissa controlou o choro, evitando o olhar direto com a filha. –Eu quero que você saiba que estou abrindo mão do Jason por sua causa. Se você pensar em ter outra recaída, pelo menos reflita sobre o esforço que estou fazendo pelo seu bem, e aceite que não é impossível fazer o mesmo por nós!

Surpresa com o tom da conversa, principalmente pelo modo agressivo de Megan querer enfiar suas palavras na mente de Melissa, olhei-a estagnada. A Scott engoliu a seco, com a respiração oscilante, e brevemente trocou olhares comigo. Perdida nas próprias ações, Megan se retirou do quarto.

–Melissa...

Sentei-me ao lado dela, abraçando-a de lado. Era a primeira vez que eu a vi chorar daquela forma, completamente afogada no desespero.

–Acalme-se, por favor.

Quase a obriguei a tomar água e deitar na cama. Passado algum tempo, ela parou de chorar, e estava mais calma.

–Estou tão envergonhada! – disse evitando meu olhar. –Nunca perdi as estribeiras dessa forma! Não sei o que me deu para perder o controle de vez! Eu sou uma pessoa problemática, mas lúcida! Eu sei me controlar! – suspirou alto. –Argh! Tenho que ser mais cuidadosa!

Seu desabafo não significou outra coisa senão desculpas. Melissa claramente admitiu seus erros, mas em nenhum momento, refletiu sobre a negação que eles eram em sua vida.

–Ser mais cuidadosa? – indaguei olhando-a duramente. –O que quer dizer? – finalmente seus olhos azuis me encararam. –Significa que você pretende continuar assim, mas controladamente?

–Claire...

–Jason está prestes a se mudar para Los Angeles e quer levar Megan com ele, mas ela não quer deixar você. Ela está fazendo essa dura escolha por sua causa, Melissa!

Somente naquele momento, entendi a exaustão de Megan a dialogar com a mãe.

–Ethan... Ele não aguenta mais carregar tantos fardos e está se dando um tempo. – continuei. –Sabe o que vai acontecer se você não parar de deixa-los em segundo plano? Eles vão sumir da sua vida. É isso que você quer?

As lágrimas voltaram a rolar pelo rosto dela.

–Eu fiz de tudo para ajudar meus pais e, mesmo sabendo que eu não tinha culpa do que estava acontecendo, eu me culpei quando os perdi, e até hoje eu penso que algo a mais poderia ter sido feito. – seus olhos lacrimejados se voltaram para mim. –Entendo os sentimentos de Ethan e Megan, por que eu vivi a mesma coisa.

Melissa refletiu, controlando as lágrimas e, quando seus olhos me observaram novamente, havia determinação neles.

–O que devo fazer?

Segurei a mão dela, aceitando aquela pergunta como um sim para uma nova vida.

–O que você acha que deve fazer para recomeçar de novo?

–Bem... – ela sorriu desajeitada. –Preciso iniciar um tratamento. Conquistar a confiança dos meus filhos. E ter muita força de vontade.

–E... Manter o David longe da sua vida.

–Por que ele?

–Melissa, o David não é uma boa influência para você. – ela desanimou. –Você o ama?

–Eu gosto dele. Ele me faz rir. É uma boa companhia.

–Você o ama? – insistir.

–Não. – custou-lhe responder aquela pergunta.

–Eu posso saber o que lhe impede de ter um sentimento mais afetuoso por ele?

Pensativa, Melissa soltou minha mão, e apertou o lençol com força.

–Ele é grosso comigo. Não gosta de ouvir meus sentimentos. Ignora uma vida saudável e... está sempre empurrando porcarias para mim.

–Você ainda acha que ele deve permanecer por perto?

–Não! – apertou o lençol com mais força. –Eu o quero longe de mim! Longe! Definitivamente! – sorridente, ela pegou o telefone. –Vou ligar agora mesmo para a clínica de reabilitação, mas... – olhou-me entristecida e preocupada. –, não tenho dinheiro suficiente para cobrir tantas despesas.

–Não se preocupe com isso. Eu vou me encarregar para que você tenha um bom atendimento.

O sorriso dela se alargou e, empolgada, ela entrou em contato com a clínica. Com os olhos lacrimejados de felicidade, fiquei observando Melissa falar, e almejei o dia em que ela estaria livre do seu passado marcante.

&&&&*&&&&

Um mês depois...

Um mês se passou e muitas coisas mudaram.
Parecia ser algo impossível vê Melissa hospedada em uma clínica de reabilitação, mas o milagre aconteceu, para a surpresa de Megan, que não desgrudava mais da mãe, sempre que íamos visita-la.
Para o conforto total da Scott – e, claro, meu e do Nicholas –, tínhamos nos livrado de David e, só para garantir, trocamos todas as fechaduras do apartamento, e tínhamos outro número de telefone residencial. A empolgação foi tanta que reviramos o apartamento na reforma, pintando paredes, nos livrando de objetos que ninguém mais usava e, a melhor parte, mudamos completamente o quarto de Melissa; sem que sobrasse um único vestígio de como ele era antes.
Como era o esperado, Jason tinha se mudado para Los Angeles, e Megan não pôde acompanhá-lo. Mas isso não impediu o casal de falar sempre por telefone e se verem pela web câmera. E, sempre que podia, Jason pegava o primeiro voo para New York, matando ligeiramente a saudade de Megan que começava a se refletir na perda de peso dela.
Não tínhamos notícias sobre Ethan, apenas o contato eletrônico dos depósitos que ele fazia na conta de Melissa, e nada mais.
Quanto a mim... Acabei tomando coragem e fiz um teste na agência de moda que Crash havia me indicado. Tive uma boa aceitação e, surpreendentemente, eu estava prestes a assinar um contrato – que envolvia mais publicidade do que dinheiro –, para uma revista de lingerie.
Se eu fosse resumir minha vida, naquele mês de superação, eu diria que ela estava tomando outro rumo do que era esperado, ainda assim... havia uma única coisa que continuava igual e parecia mais forte a cada dia: A saudade.

&&&&*&&&&

–Preparada, Claire?

–Sim, Beth.

–Ótimo! – a mulher ajeitou meu cabelo e sorriu. –Não se esqueça do olhar. Tenha foco na lente, de um jeito sexy, e deixe os lábios entreabertos de vez em quando, mas de forma sútil; como se fosse sem querer.

–Entendi.

–Preciso de um salto quinze centímetros! – gritou observando minhas sandálias, de salto tamanho doze. –Eu tenho que fazer tudo aqui!

À procura do salto perfeito, a mulher responsável pelo ensaio saiu em disparada.

–Você é Claire?

–Oh! Sim!

Virei-me para o rapaz que se aproximou mais, com uma máquina fotográfica pendurada no pescoço.

–Meu nome é Ryan. – sorridente ele estendeu a mão.

–Ryan Carter? Muito prazer! – apertei sua mão assim que o reconheci. –Você é tão novo e já tem uma boa reputação.

–Ora! Comparado a grandes nomes, ainda sou um amador no ramo.

Não era verdade. Seu nome era bem requisitado e seu talento se estendia por diversos países. Eu só não entendi o porquê de ele está sendo encarregado de fotografar aquele ensaio, mesmo sendo para uma revista bem conhecida.

–Ouvi bons comentários a seu respeito. Há quanto tempo está nisso?

–É meu primeiro contrato oficial.

–O primeiro de muitos. Tenho certeza disso.

–Carter!

–Vou vê o que a Beth quer. Deu pra perceber que ela é louca, não é?

–Nem notei.

Brinquei arrancando um sorriso dele, que logo se afastou. Ryan era um homem bonito e extremamente charmoso. Devia ter um metro e oitenta de altura. Porte atlético, cabelo castanho, e olhos negros.

–O que você conversava com o Ryan?

Deparei-me com Daisy Harris, sendo a primeira vez que ela me dirigia à palavra. Daisy fazia ensaios desde os quatorzes anos, apesar do tempo, não era conhecida na mídia, e não assinava bons contratos; já que ela se considerava uma celebridade.

–Nada demais. – ajeitei o laço do roupão, um pouco nervosa por que eu logo o tiraria para fazer as fotos.

–Ele conhece muita gente influente. Uma amizade com ele renderia bons contratos, você não acha?

Nada respondi, mas isso não tirou o sorriso dela.

–Boa sorte.

–Obrigada. – agradeci vendo-a se afastar, se livrando do roupão.


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