The Innocent Can Never Last escrita por Clarawr


Capítulo 19
Capítulo 19


Notas iniciais do capítulo

Aviso aos navegantes: Essa nota ficará enorme.
Eu nem acredito que acabou, gente. Eu não sei se vocês sabem (sabem sim, eu vivo falando isso aiduaieuo) mas eu escrevo essa fanfic há mais de um ano. Ela ainda não se chamava The Innocent Can Never Last e era pra ser só um devaneio sobre um shipp absurdamente nada a ver entre Johanna e Finnick e olha onde nós chegamos!
Enfim, eu não vou agradecer agora, porque vai ter eu espacinho especial depois do próximo capítulo para todas essas baboseiras chorosas, então aguardem até o próximo capítulo para lerem meu muito obrigada.
O caso é que, nessa nota eu finalmente venho explicar o porque de eu postar os dois últimos capítulos juntos. Como tudo nessa fic, isso tem um objetivo. Já estava planejado desde o início. Porque, caso você seja esperto e já tenha notado, eu disse que Os Capítulos Que A Clara Se Odeia Por Ter Escrito são 3. E até agora só foram dois. Logo, presumivelmente, um desses dois capítulos postados hoje é a parte três dos meus capítulos odiados. E eu guardei o pior para o final. Quer dizer, na minha opinião os três são péssimos, mas esse tem algo de pior e vocês logo verão porque. Tô postando logo tudo junto porque o epílogo é relativamente feliz, então alivia a barra.
E, para encerrar e para não alongar muito essas notas: VOCÊS VIRAM EM CHAMAS? PUTA. QUE. PARIU. É POR ISSO QUE A JOHANNA É MINHA PERSONAGEM FEMININA FAVORITA DA SAGA. É POR ISSO QUE O FINNICK É MEU PERSONAGEM FAVORITO DA SÉRIE. PUTA. MERDA. QUE FILME FODA. EU SÓ CHORAVA/GRITAVA. EU TREMI O FILE TODO, GENTE, CÊS NÃO TÃO ENTENDENDO E QUANDO O FINNICK APARECEU TODO MUNDO (TODO MUNDO MESMO) BERROU HORRORES, O CINEMA VEIO ABAIXO!!!!!!
Ok, parei por aqui. Mais sobre isso nas finais, mas vcs não precisam ler pq provavelmente vai ter spoiler asidaieouowe. Bom capítulo. Aproveitem porque esse é o último (o próximo vai ser tipo um epílogo. Enfim, eu explico nas notas do próximo asieuaioeuaoi). Com vocês, Capítulos Que A Clara Se Odeia Por Ter Escrito, Parte 3/3.



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Estou com a cara grudada na televisão agora, como se a proximidade excessiva da tela pudesse tornar a cena menos real. Talvez, se eu chegar perto o bastante eu veja que o rosto que se contorce em agonia na TV em frente a mim não é de minha mãe e que essa casa não é a minha. O sangue manchando o carpete não pode ser de minha mãe. Simplesmente não pode. Eu me recuso a aceitar essa verdade.

– Mãe? – Eu sussurro para a tela, mas a única resposta que eu recebo é um grito agonizante que perfura meus tímpanos. – Mãe? É você? – Eu sei que ela não vai me responder, que ela não está aqui, mas então o que eu vou fazer para descobrir se essa pessoa na tela é mesmo ela?

A pessoa na tela está jogada sobre a mesa da sala de jantar de minha casa. Ela está vestida com algo branco rasgado que parece que outrora fora um lençol, mas que agora não passava de um trapo esfiapado e sujo de sangue. A qualidade da imagem não é tão boa, mas eu consigo ver a câmera tremer levemente e um lampejo de pernas e sapatos brancos entra no meu campo de visão. Pacificadores. Eu ouço um barulho de impacto e a cabeça de minha mãe é jogada para frente. Sua boca se abre e um grito rouco e desesperado escapa dela.

– Não! A Johanna não! – O grito diz.

É ela. Eu finalmente me convenço, a realidade espinhenta finalmente se enfia na minha cabeça, arranhando meu cérebro e fazendo meu crânio latejar. Meu corpo parece ter perdido a capacidade de sustentar seu próprio peso e eu me largo no chão feito um pedaço de madeira, a mão ainda grudada à televisão.

– Mãe? – Eu repito. – Mãe. – Minha voz assume um perigoso tom embargado e eu de repente sinto cada uma das coisas ruins que me aconteceram voltarem pela minha garganta, todas emboladas em uma massa explosiva de lágrimas.

Eu vejo um chicote ser sacado de um bolso, então ouço o inconfundível estalo de uma chicotada em pele humana e vejo os dedos de minha mãe apertarem a base da mesa com mais força.

– Não! – Eu berro automaticamente. – Não! – Eu me jogo contra a TV e quase quebro o aparelho enquanto minha mãe é chicoteada. – Parem! – Eu berro mais uma vez, absolutamente impotente, porque eles não estão me ouvindo e não importa o quanto eu me esgoele eles não vão parar até matá-la, exatamente como aquelas bestas não pararam até matar Liz.

Eles a estão torturando? Estão. Por quê? Mais uma vez, porque eu só faço merda.

Snow achou que matar Liz fosse ser o suficiente para me domar. Mas não foi. Então agora ele resolveu apelar para a minha mãe.

Bom, agora ele conseguiu o que queria. Eu estou cansada de me jogar contra aquele muro sozinha. De nada vai adiantar eu ir contra a Capital um milhão de vezes se eu for sozinha. O único resultado de toda a minha ousadia vai ser dor e sofrimento para quem eu amo. Se todos nós nos jogarmos juntos, o muro cai. Mas eu sou pequenina demais para surtir algum efeito sobre o sistema. Agora eu entendo o que Finnick me disse. Nós não temos mais como atrair alguma atenção. Nós precisamos de alguém novo que simplesmente coloque fogo em tudo isso aqui. Mas as minhas chances de fazer algo já acabaram. A única coisa que me resta agora é esperar o louco que vai pôr a Capital abaixo para poder apoiá-lo com todas as minhas forças quando ele chegar.

Meus olhos estão grudados na tela, apesar de a minha visão permanecer embaçada por conta das lágrimas. Minha mãe ainda está sendo chicoteada. Ela agüenta bravamente, até que um grito escapa de seus lábios quando o Pacificador a chicoteia duas vezes seguidas exatamente no mesmo ponto.

É instintivo; quando ela grita, eu grito também. E no momento que esse berro escapa, eu não consigo fazê-lo parar, porque ele está liberando tudo que eu senti e ainda sinto a cada momento que a Capital dá um soco na boca do meu estômago com seus castigos e punições desumanos.

Eu ouço algo que se parece com uma voz masculina fazendo uma pergunta, mas está muito abafada e distorcida. O barulho das chicotadas cessa e eu agora ouço um chiado esquisito. Não consigo imaginar o que seja isso, e na verdade nem quero imaginar. Aliás, tudo que eu quero nesse momento é desligar essa televisão e me soterrar nas minhas cobertas para ficar sozinha com meus pesadelos. Mas não consigo. Eu não posso. É mais ou menos como na morte de Liz; quando é com alguém com quem você se importa, você não tem a opção de simplesmente sair andando e ignorar o sofrimento da pessoa. É como se uma força invisível te impedisse. Principalmente quando todo o sofrimento é culpa sua. Não para dar as costas quando você é o responsável por aquilo.

Um brilho alaranjado se faz ver no canto esquerdo inferior da tela, onde as mãos de minha mãe ainda agarram a beirada da mesa com força. Uma mão enrugada força os dedos a se soltarem e de repente o brilho e os dedos estão se sobrepujando com os gritos de minha mãe ao fundo. Eu entro em desespero e começo a berrar novamente quando percebo que o brilho é fogo.

– Não! – Eu berro, levantando-me e começando a atirar as coisas do quarto nas paredes enquanto procuro freneticamente o controle remoto porque sei que ele é uma coisa quebrável com um grande potencial para ser espatifado na parede também. Eles não vão atear fogo nela. Isso já é demais. – Vocês não vão matá-la! Ela não fez nada! – As lágrimas voltam a correr, os soluços voltam a me sacudir e eu sinto que estou por um fio, estou a um passo de me desintegrar e me desfazer em um milhão de pedacinhos afiados. Eu finalmente perco a força nas pernas novamente e caio no chão, me debatendo. - Vocês não vão matá-la! – Eu grito e sinto minhas cordas vocais se arranharem, minha voz chegar no limite, mas eu não paro de berrar muito menos de me debater.

A voz masculina faz uma pergunta novamente e eu ouço a voz rouca de minha mãe gritar para mim com o mesmo desespero com o qual eu grito para ela:

– Johanna! Não faça o que eles mandarem! – Ela emite um som absurdamente desesperador e eu presumo que eles continuam queimando-a viva aos poucos. – Não!

O desespero me consome por completo e eu ganho forças para levantar novamente e derrubar a TV no chão, quebrando sua tela e interrompendo os gritos e sons perturbadores. Não satisfeita, eu me ajoelho no chão e fecho as mãos em punhos, esmagando o vidro com as mãos, os pés e os joelhos. Em poucos segundos eu vejo pequenas manchinhas de sangue, então eu olho para os nós dos meus dedos e para os meus joelhos e vejo que o vidro fez diversos cortes neles. As gotinhas vermelhas no chão me lembram o sangue de minha mãe manchando o chão de casa e eu volto a destruir o aparelho, me atendo dessa vez aos circuitos internos, arrebentando fios quentes e tomando alguns pequenos choques.

Em poucos minutos estou rodeada de peças quebradas. Eu ainda estou com raiva o suficiente para quebrar o que já está quebrado em pedaços ainda menores, mas subitamente sou acometida por um cansaço paralisante, uma letargia invencível. Minhas forças parecem ter sido sugadas de meu corpo e eu deito sobre os cacos que eu acabei de produzir. O vidro pontiagudo me machuca e agora que a adrenalina diminuiu, eu sinto a ardência dos cortes que arrumei socando tudo ao meu redor, mas não me importo.

Eu acabo cochilando, mas meu sono não é bem algo que se pode chamar de sono. Quando você dorme, você descansa, mas as imagens recentes impossibilitam meu cérebro de relaxar. E o fato é que eu descanso por alguns momentos, mas quando desperto novamente estou mais cansada e abatida do que antes.

Apesar de ainda estar cansada e confusa, eu acordo com algumas percepções importantes na cabeça. Eu não sei se minha mãe está viva ou morta, e não quero pensar nisso agora porque sempre que a ideia me vem a cabeça eu começo a tremer e soluçar descontroladamente. Liz está morta. Roger está morto.

Eles não têm mais quem usar para me atingir.

Eu quase sorrio quando percebo que nem tudo está completamente perdido. Se eles não têm mais quem usar para me atingir, eu posso continuar fazendo as merdas que eu quiser. O meu grande problema é controlar minha impulsividade. Se eles não têm em quem descontar minha impulsividade, eu não vou precisar controlá-la. A única opção deles será me matar, coisa que eles não vão fazer porque – por incrível que pareça – as pessoas me amam na Capital. Elas dariam falta de mim. Eles não podem simplesmente me matar e me jogar numa vala.

Eles vão ter que me engolir.

Eu acabo rindo da minha conclusão, mas subitamente paro, porque me lembro de um ponto importante que eu esqueci de acrescentar à equação.

Finnick.

Espera. Será que Snow sabe da nossa amizade? Será que ele sabe que é a Finnick que eu recorro quando estou desesperada? Será que ele sabe que eu só não enlouqueci há muito tempo por causa dos conselhos que Finnick geralmente me dá tentando me acalmar?

Sabe. Uma vozinha fina martela minha cabeça. Snow é basicamente onipresente. Ele disse que sabe de tudo que acontece em Panem e eu não duvido. Como ele descobriu que matar Liz surtiria tanto efeito sobre mim? Como, para início de conversa, ele descobriu que eu tinha mandado o remédio para ela? Não sei, mas o fato é que ele descobriu. E que eu não estou em condições de duvidar da capacidade da Capital de descobrir cada mínimo detalhe referente a minha vida pessoal.

Eu tenho duas opções: Comprometer-me a não me deixar levar pela minha impulsividade outra vez ou afastar Finnick de mim. A solução é simples e direta, mas extremamente drástica. Eu não tenho como garantir que nunca mais vá fazer besteira. Eu não posso afirmar que nunca mais vá ser punida pela Capital, porque eu me conheço bem o bastante para saber que eu posso cometer um deslize novamente por qualquer coisa. Eu não sou uma boa companhia, as pessoas próximas a mim morrem. Então eu acho que sei como vou resolver esse impasse. Só não sei se estou preparada para levar o plano a cabo.

Começo a preparar minha cabeça para o que vem pela frente. Finnick é teimoso. Eu não posso tentar explicar a coisa racionalmente para ele, porque ele vai virar e me responder: “Ok, todos nós aqui corremos risco. Eu não me importo.”. Ele não entende a magnitude da situação. Ele não entende que eu simplesmente não vou suportar ver mais ninguém sofrer por minha culpa. Eu preciso fazer com que ele queira me deixar. Eu preciso fazê-lo não querer olhar mais para a minha cara. Eu preciso magoá-lo tão profundamente que ele não vai mais querer contato comigo, fazendo uma cena que convença Finnick e Snow de que eu não me importo mais com ele. Convencendo Finnick, eu posso ter certeza de que em breve minha nova indiferença por ele chegará aos ouvidos de Snow e, consequentemente, ele acreditará que ameaçar Finnick não terá mais nenhum efeito sobre mim. Esse é o plano. Parece fácil. Mas como é que eu vou magoar a única pessoa que me acolheu além da minha mãe?

Perdendo Finnick, eu vou perder todo o resto. Vou ficar somente comigo mesma. Talvez a parte mais difícil seja aceitar isso. A solidão se agiganta sobre mim e eu sinto um medo enorme do que me espera quando eu não tiver mais nem minha mãe nem Finnick em quem me escorar. Mas pelo menos assim eles não correm mais risco nenhum.

Eu acabo passando uma semana remoendo o plano em minha cabeça, tentando arrumar coragem para levá-lo até o fim. E uma semana é o tempo exato que demora para o novo vitorioso dar suas entrevistas e fazer suas aparições com seu novo status. Continuo vendo Finnick nesse tempo, mas bem menos vezes do que antes. Acho que ele acredita estar respeitando meu luto, ou dando um tempo para eu me recuperar das mortes de Liz e Roger. Não sei. Mas esse gradual afastamento é perfeito para eu começar a colocar o plano em prática.

Um dia antes de todos voltarmos para casa, eu bato na porta de seu quarto com o coração na mão. Meus dedos tremem levemente e eu os entrelaço com força. Eu não posso deixar rastros. Isso precisa ser convincente. A vida de Finnick depende da minha atuação. Eu não posso errar.

Ele abre a porta sorridente.

– Achei que você não viesse se despedir.

Lanço um sorriso forçado em direção a ele.

– A gente precisa conversar. – Eu digo num tom sombrio, forçando as palavras a saírem da minha boca.

Ele ergue as sobrancelhas e senta na cama, esperando que eu dê continuidade.

Olho para baixo, evitando seus olhos verdes. Eu não vou conseguir fazer isso, meu Deus, eu não vou. Mas eu preciso.

– A gente é ridículo, Finnick. Você já se deu conta disso? – Eu começo, seguindo o roteiro que criei em minha mente para não perder meu foco.

Ele franze o cenho e me olha confuso, mas ainda calado.

Eu solto uma risada irônica.

– Olha só para a gente. Por que a gente ainda se dá ao trabalho de tentar ajudar um ao outro sendo que nós dois sabemos muito bem que não temos condição de ajudar ninguém? – Eu pergunto, minha garganta arranhando.

Então uma memória ganha força na minha cabeça e de repente é como se a cena em meu cérebro ganhasse vida e passasse diante dos meu olhos como um filme, tamanha sua força. Eu e Finnick. No meu quarto. Bêbados. Rindo e falando bobagem. A lembrança açoita minha mente com seu chicote de fogo e meus olhos, por puro reflexo, se enchem de água automaticamente, tentando aliviar os rastros das chicotadas que me arrebentam de dentro para fora.

“– Eu prometo não ficar nojento se você prometer não me abandonar. – Ele propõe.

– Está bem. Eu prometo que vou continuar sendo sua amiga, mesmo com você apaixonado.

– Para sempre? – Ele pergunta, com um olhar de cachorro abandonado.

Mesmo bêbada, não consigo deixar de ser eu mesma, então reviro os olhos e bufo:

– Porra, mas você é chato, hein? Cacete...”

Por quê?! Por que eu ainda me lembro disso? Por que a imagem de nós dois bêbados e felizes fazendo promessas impossíveis de serem mantidas insiste em berrar e espernear na minha cabeça agora? Justo agora! Como se já não fosse ser difícil o bastante...

Eu prometi que eu não ia deixá-lo. E essa é mais uma promessa que eu não vou ter condições de cumprir.

– Do que você está falando, Johanna?

Dou um jeito de engolir com força para desobstruir a garganta e falar alguma coisa que o convença de uma vez por todas que não podemos mais ter nenhum tipo de contato.

– De tudo, Finnick. De tudo. – Eu digo e, por incrível que pareça, minha voz parece dura e uniforme. – A gente fez tudo errado, eu achei que fosse dar para seguir em frente, mas não. Eu não mereço amizade de ninguém, porque eu não consigo fazer nada pelas pessoas ao meu redor, nada. – Provavelmente, essa é a única frase verdadeira que eu disse até agora.

– Johanna, você não pode ficar assim sempre que os seus tributos morrerem. Eu sei que é horrível, mas isso vai acontecer muito daqui para frente. – Ele diz, ainda sem se convencer do que eu estou falando e eu fico ainda pior, porque me lembro de Liz, de minha conversa com Snow, do pânico subseqüente a ela e de como tudo começou a sair de controle depois disso.

– Não estou falando disso! – Eu grito, me descontrolando e ele se assusta. Ótimo. – Você não entende que essas coisas não adiantam nada para a vida de nenhum de nós? Essa palhaçada da gente ficar andando de um lado para o outro como se fossemos amigos? Eu só vou te encher o saco e te magoar e te deixar puto e me estressar com você, porque é isso que sempre acontece! – Eu abaixo esfrio o tom de voz, fazendo da frase seguinte uma lâmina afiada de gelo. - Eu enjôo das pessoas com muita facilidade, Finnick. E foi isso que aconteceu com você. Pelo menos eu estou aqui tendo a decência de falar tudo isso para você. É bem melhor do que deixar isso chegar mais longe, não acha? – Eu pergunto, erguendo uma sobrancelha.

Seus olhos, até então incrédulos, esfriam e eu sinto a raiva se formando dentro dele. Pronto. Consegui.

– Enjoou? – Ele pergunta. – Tá. Agora você já pode me contar o motivo real de toda essa palhaçada. E não venha me dizer que é esse, porque eu sei que tem mais coisa escondida aí. – Ele não está falando em um tom condescendente, como um amigo que tenta fazer com que o outro desabafe. Ele está me exigindo uma explicação que, diga-se de passagem, ele tem todo o direito de receber. Mas não vai.

Por que ele simplesmente não fica com raiva, grita comigo e me expulsa de seu quarto? Por que ele ainda está lutando para me ter por perto? Ele podia muito bem simplesmente desistir e me deixar ir embora. Como se eu fosse alguém que vale o esforço.

– É exatamente isso. Eu não quero que isso chegue mais longe. Eu não quero mais ficar perto de você, Finnick, qual é a dificuldade de entender isso? – Eu cuspo as palavras para ele e sinto minha boca arder. – Você tem a sua vida e eu a minha, e já está difícil o suficiente sem termos de tomar conta dos problemas um do outro. Eu tenho mais o que fazer além de ficar aqui fingindo que eu me importo. – Aperto os lábios e calo a boca, porque essa última foi demais até para mim, uma mentirosa profissional. Porque eu me importo. E é exatamente por me importar que estou aqui fazendo essa cena.

– Fingindo. – Ele repete, a voz um pouco mais alta por causa da raiva. – Você é maluca? Do nada você chega aqui e começa a falar tudo isso... Johanna, isso não faz sentido nenhum! E você ainda quer que eu acredite que não aconteceu nada? Você vai me falar agora o que aconteceu para você dar esse chilique. Agora. – Ele diz, entre dentes.

– Meu Deus! – Eu grito e solto uma risada forçada que arranha minha garganta. – Já falei que não aconteceu nada. Maluco é você, ou burro porque ainda não entendeu o que eu falei. Acabou essa história de eu vir aqui no seu quarto e você aparecer lá no meu. A gente volta para casa amanhã e vai passar um ano sem olhar na cara um do outro, o que vai ser bom, porque você vai entender o que eu estou falando. – Então eu decido que preciso sair dali urgentemente, porque ver toda a raiva dentro de Finnick direcionada diretamente para mim é doloroso demais. A única coisa que me consola é que estou fazendo isso por ele. Isso aqui é remediável. Sua morte, não. Desfiro então meu último e mais doloroso golpe, sabendo que depois disso ele vai me expulsar de seu quarto e de sua vida para sempre e eu terei alcançado meu objetivo. – Mesmo que tivesse acontecido eu não ia te falar. Não dá para confiar em quem cobra segredos para passar a noite com as pessoas. Sabe-se lá como e quando você ia usar o que eu te falar.

Ele olha fundo nos meus olhos e eu quase consigo ouvir seus dentes trincando.

Como se eu não soubesse que ele é obrigado a fazer tudo que faz. Como se eu estivesse esfregando na cara dele que ele passa por isso porque quer.

Esse é um dos pontos sobre os quais nunca conversamos diretamente. Tudo o que sei são apenas especulações, e eu tenho consciência de que é exatamente por não saber o que se passa na vida de Finnick em relação a seus encontros que eu não tenho o direito de levantar suspeitas sobre esse assunto em sua frente. Mas agora, é o espinho mais afiado que eu tenho para machucá-lo. Quem sabe um dia, quando eu puder lhe explicar tudo, provar que eu nunca deixei de ser sua amiga e lhe pedir perdão por todas as atrocidades que eu falei para fazer com que ele me odiasse, ele me conte em troca a história por trás de seus encontros.

Mas isso não faz mais diferença. Não acho que algum dia ele vá voltar a por os olhos em mim, porque muito provavelmente nunca terei a oportunidade de contá-lo como doeu dizer-lhe todas essas coisas. Além disso, mesmo que a chance apareça, duvido muito que ele aceite me escutar novamente. O que eu fiz não tem volta. Então, acho que todo esse sofrimento de ser obrigada a afastá-lo de mim vai acabar guardado comigo até eu morrer. A ideia me faz querer gritar.

– Sai daqui. – Ele diz, finalmente, ainda olhando fixamente para mim. Suas íris tremem levemente. – Sai. Se você veio aqui para falar essas coisas para mim, você já disse. E se é isso que você quer, eu não vou mais aparecer no seu quarto. – Seus olhos cintilam malevolamente e eu espero o golpe, porque sei que ele não vai cair sem me deixar ferida. – Sabe, é engraçado você vir falar comigo sobre confiança. Não fui eu quem ganhou os Jogos mentindo feito um covarde. – Sinto uma mão comprimindo meu estômago por dentro, mas me forço a parecer calma e entediada, como se já estivesse preparada para as ofensas. – Pronto. Agora sai. Não sei o que você ainda está fazendo aqui.

Puxo a porta e saio, batendo-a atrás de mim. A minha vontade é gritar e espernear até acordar o prédio inteiro e alguém vir me socorrer. Mas agora eu me lembro que ninguém vai vir em meu socorro, porque a Capital conseguiu arrancar de mim todas as pessoas que se dariam ao trabalho de me acudir.

Acho que eu finalmente entendi o objetivo da coisa. O castigo mesmo era me fazer perceber que ter alguém perto de mim só ia me tornar vulnerável. A verdadeira punição consiste em fazer com que eu me sinta exatamente como estou me sentindo agora: completamente só. Eles fizeram questão de deixar tudo nas minhas costas. As mortes, a mágoa de Finnick. Tudo isso é minha culpa. O pior é perceber que o único que tinha me sobrado não foi arrancado de mim. Não tecnicamente. Eu poderia ter seguido minha amizade com Finnick. Mas como, depois de saber que qualquer um do meu lado só ia servir para sofrer as conseqüências dos meus erros? A partir do momento que você fica ciente do quanto as relações te tornam um alvo fácil, como escolher seguir com elas como se nada pudesse acontecer com quem você ama? Pelo menos agora que eles levaram todo mundo nesse mundo com quem eu me importo, não tenho nada a perder além da minha vida. E, sinceramente, no estado atual isso não me parece muita coisa.

Afasto o pensamento, porque eu não posso derramar uma lágrima, não posso agir como se estivesse desesperada ou arrasada. Eles estão me vigiando, esperando que eu saia da linha, Além disso, qualquer demonstração de fraqueza poria meu plano todo por água abaixo. E eu já fui longe demais para estragar as coisas justo agora. Eu não posso deixar alguma pista que dê margem para que Snow pense que Finnick ainda é alguém que pode ser usado contra mim. Então, embora eu me sinta completamente dilacerada e morta por dentro, eu simplesmente entro no meu quarto e sento na minha cama, tentando esquecer o que eu acabei de fazer, o que vêm me acontecendo, a minha vida e quem eu sou.


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Notas finais do capítulo

Agora que vocês já leram e tão querendo me matar, eu to indo aliviar a barra e postar o epílogo. Pode deixar que eu vou compensar (quase) todas as coisas ruins que eu fiz até agora. Aguardem um pouquinho que eu vou terminar de editar e de arrumar coragem para postar.
Amo e mamo vocês.
PS: O SAM ESTAVA INCRIVELMENTE PERFEITO DE FINNICK, MEU SANTO DEUS. EU QUERO DAR PARA AQUELE HOMEM. PERDÃO PELAS PALAVRAS CHULAS. DESCULPEM, PERDI O CONTROLE NOVAMENTE SAIEUIAWEUOIWEUIQUEOWEUIQWUEIORUIQRUIOQ