Borrões escrita por hipyao


Capítulo 4
Carta 4




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De que importa o rumo das coisas, tendo em vista nossos sentimentos nestas realizações?

Uma pontada lancinante me arrebatava a cada vez que eu abria meus olhos perdidos. Deparar-me com tua face tranquila em sono profundo, na cama que antes, só eu e o coelho Leopoldo descansávamos, de repente, parecia errado. E ninguém, além de você, era responsável pelos meus tormentos matinais.

Envaidecia-me do meu achismo. Jurava que, era bela a certeza de que nem o último dos dias no corpo carnal nos separaria, pois nosso amor percorria caminhos além do corpo. Nossas almas estavam acorrentadas e nós nos conhecíamos a milênios, entendíamos o sentimento um do outro, sabíamos exatamente o que pensávamos. Eu era patética.

Minha mente parecia quase que num transe confuso e o que mais incomodava era o fato de você sequer reparar minhas inseguranças. Tua indiferença havia sido bonitinha no começo, quando dava lugar a uma paixão ardente, mas agora eu precisava, sentia nos meus ossos que precisava, mais do que isso. Talvez a rotina tivesse atracado em nosso cais. Eu não suportava mais teus gritos quando eu ligava o secador de manhãzinha.

–"Não lhe peço para ficar, vá embora! De ti, estou farta."– Hoje minhas palavras são como facas fazendo feridas constantes na minha sanidade. A verdade é que tu nunca acatou meu pedido. Optava por ignorar-me, colocando o travesseiro sobre a cabeça. Às vezes, se afastava por algum tempo após dar de ombros, dizendo que era seu dever me lembrar que a vida é feita de tudo aquilo que perdemos. Se existe uma verdade absoluta, essa era ela. A vida é feita de tudo que perdemos e hoje a certeza disso me invade nos mais profundos abismos de minha alma.

Por muito tentei repelir todos esses conflitos de mim. Me negastes o apoio que tanto precisei, como esqueceria disso? As lágrimas encharcavam meu rosto e a nicotina, encharcava meu organismo. Que decisão deveria eu tomar? Era insuportável.

Meus pais, abastados financeiramente, sempre almejaram uma princesinha dos cabelos longos e louros casando-se com o filho do sócio da empresa. Eu não os culpava. Qual é o rumo que se segue, para fugir de si próprio? Eu sempre seria aquela garota cuja pele era alva, o corpo esquelético tatuado, o cabelo cortado com minha gilete cega e um cigarro na boca. Acima de tudo, tua eterna amante. Jamais seria um sonho, a vida fazia de mim, real. Fazia de mim um pacote de problemas, uma massa mal feita de sentimentos.

Os apelos aos quais meus pais se agarravam para fazer-me abandonar meu pingo de realidade me destruíam. Dilaceravam cada parte de mim. Esse tal de amor, ele sempre se põe a nos machucar. Que tolice! O amor é o que nos mantém de pé, a onda nos puxando para baixo na maré agitada, é a possibilidade de decidir. Eu queria, com todo meu coração ser boa o suficiente para meus pais. Você nunca se deu ao trabalho de se importar com os seus. Talvez, não tivessem sido esforçados o suficiente e com toda a certeza, você não entendia como eu me sentia. Apesar de tudo, desejava que sussurrasse em meu ouvido pedidos pr'eu ficar e cuidar de você - que não me casasse com aquele moreno rico. Que prometesse me envolver no mais puro amor novamente, mas ao invés do teu carinho, recebi um tanto faz. Me pergunto dia após dia, o que havia de tão difícil em deixar um pouquinho de lado toda aquela postura de durão. Se me amasse, teria lutado, nem que fosse só por alguns instantes.

Nunca lhe esquecerei,

Dorathy.


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