Bem ao Lado escrita por Alessa Petroski


Capítulo 23
Capítulo 23




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Assim que a diretora sumiu por trás da enorme cortina de veludo azul todos os integrantes da minha equipe e da do Lucius correram para seus postos. Alguns foram monitorar os equipamentos de microfone e outros foram para a plateia. Lucius e eu acabáramos de selar um acordo de tentarmos ser mais amigáveis um com o outro e a situação pedia que eu fosse prestativa diante a sua expressão um pouco incômoda, mas eu sentia que se falasse algo eu acabaria vomitando – de novo – só que desta vez seria em cima dele. E isso, com certeza, não era algo bom.

A diretora Minerva fazia uma introdução que vencia aquele pano groso entre nós e chegava claramente aos meus ouvidos, mas foi preciso que o Lucius me cutucasse para eu perceber que ela me chamava. Pela primeira vez não senti raiva quando ele me tocou. Senti um pouco de gratidão. Mas só um pouco.

Fiquei com medo de minhas pernas falharem e quando dei os primeiros passos foi meio como se eu não lembrasse mais como andar. Senti isto apenas uma vez e esta recordação me impulsionou pela raiva que ainda queimava em mim. A até então única vez que senti isso foi logo no início do meu relacionamento com o Vini, quando ainda estávamos apenas nos conhecendo. Uma falsa ilusão me tomou na época porque agora eu sabia que mal o conhecia.

Um mar de rostos familiares e alguns, apenas levemente conhecidos, estavam diante de mim. Logo na primeira fileira estavam os meus amigos: Elli, que parecia mais rígida que um robô; Joseph que olhava para as unhas demonstrando estar entediado; Katrina, que levantava seu polegar para mim como se me desse um like e finalmente, Giane encostada na cadeira, com a mão em uma garrafa prateada que eu sabia bem o que continha. Eles estavam ali perfeitamente estagnados em suas características bem diferentes, tendo apenas em comum a vontade de que eu fosse bem ao debate.

Na primeira fileira ao lado direito estavam às senhoras do Comitê, que usavam vestidos em tons creme e ligeiramente apáticos como se não estivéssemos no século em que estávamos. Reconheci todas, no entanto a que mais me intimidava era Isabella Fiore, casada com o Senador Antônio Fiori, filho de italianos e – como se o resto não bastasse – mãe de Vinicius Fiore, o Vini. Este que estava sentando na cadeira bem atrás da de sua mãe.

Fiquei intrigada pela presença do Vini porque soube mais cedo que haveria um jogo amistoso entre o time de futebol da nossa escola e o da escola vizinha. E sendo Vini o capitão era quase improvável que ele comparecesse. Quase improvável, mas, infelizmente, não impossível. Era provável que seus pais já soubessem de nossa separação, mas era mais provável ainda que a mãe o houvesse arrastado para ali.

Para mim Vini continuava sendo um canalha que piorava sua reputação comigo a cada dia que passava, mas devo confessar que ele estava lindo com o cabelo loiro ainda molhado e aquela blusa xadrez, do jeito que ele sabia que eu gostava.

– Senhorita Jason, tome seu lugar, por favor – falou a diretora Minerva gentilmente.

Caminhei a passos firmes até o lugar que me era destinado. Dos dois lados da diretora estavam duas mesas altas onde ficavam os microfones para os candidatos, assim como ela tinha sua própria, mas no caso dela, o microfone estava conectado ao se rosto e havia uma pequena caixa de transmissão a sua cintura. A modernidade invadindo escolas do ensino médio.

– Senhor Yvon, daria a honra de sua presença? – indagou a diretora dando à deixa para o Lucius percorrer o mesmo caminho que eu.

O tal senhor Yvon mantinha sua postura impecável e eu tinha a certeza de que não havia tido tanta elegância para tomar meu posto como a que ele demonstrou para tomar o seu.

– Maravilhoso – disse Minerva – Vamos a primeira pergunta, a que iniciará, de fato, nosso modesto debate estudantil – ela de uma pausa e alguns riram secamente – Senhorita Jason, o que pensa sobre os últimos acontecimentos que ocorreram no país, que ficou marcado por manifestações?

Respirei fundo. O problema do debate com aquele Comitê a nossa frente era que eu deveria dar respostas que satisfizessem tanto a juventude de que tinha sede de se rebelar quanto àquelas donas de casas que mantinham um pensamento mais ligado ao imutável e a politica atual. A dosagem nas repostas deveria ser feita minunciosamente porque eu não poderia perder os votos dos alunos e também, porque se eu não agradasse às senhoras eu tinha certeza – mesmo que ninguém nunca tivesse verbalizado isso – que elas dariam seu jeito de me tirar o posto de candidata.

Respondi o mais sincera que pude diante a situação. Logo Lucius deu sua resposta que praticamente foi à mesma que a minha, mudando apenas as palavras e a forma como elas estavam sendo organizadas. Na pergunta seguinte ele respondeu primeiro e eu por último, seria desta forma alternada até a última pergunta ser feita. Respondi quase o mesmo que ele, tomando o cuidado para não usar as mesmas palavras, optando por seus sinônimos.

Não era que eu o estivesse colando nem ele colando a mim, mas sim porque tínhamos pensamentos iguais. Ele era um ótimo orador e conseguia manipular a todos com sua fala. Sendo óbvio para mim que ele pisava em cascas de ovos assim como eu. No entanto isto não mudava o fato de que mesmo nós tendo gostos diferentes tínhamos uma linha de pensamento parecida.

Isto me assustou ao mesmo tempo em que um contentamento tomou conta de mim. Logo encobri estes sentimentos com a leitura que fiz das senhoras do Comitê que demonstravam estar contentes com nosso pequeno show. Porque aquele debate não passava de um show de apresentações de candidatos onde às repostas dadas eram apenas um fantasma das verdadeiras respostas que os candidatos tinham vontade de dar. As discursões que já tive com o Lucius dentro da nossa sala eram mais divertidas.

Logo as três primeiras perguntas do “batata-quente” se esgotaram.

– Bom, agora é a vez de nossa estimada plateia contribuir com suas perguntas – introduziu mais uma vez a diretora Minerva esta nova parte do debate – Vou sortear um número neste globo – ela mostrou um globo de vidro que Augustos acabara de empurrar para o centro do palco – onde vou retirar o número de uma destas cadeiras, dando assim a fala a alguém da plateia. Alunos ou pais ou responsáveis.

Sorri simpaticamente enquanto por dentro fazia uma oração silenciosa para que o número da cadeira do Vini não fosse chamado.


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