Querido Carter,

Eu espero que você entenda.

Você, que era meu melhor amigo, meu confidente.

Você, que aos 2 anos, me emprestava teus caminhõezinhos de brinquedo.

Você, que aos 4 anos, tentava me empurrar no balanço.

Você, que aos 6 anos, construía castelos de areia para agente morar.

Você, que aos 8 anos, via desenhos de menininha comigo, mesmo se isso te fazia cochilar.

Você, que aos 10 anos, fingia que não me via no esconde-esconde, só para eu poder ganhar.

Você, que aos 12 anos, me dizia tudo o que os seus amigos falavam de mim, mas escondia todas as coisas ruins.

Você, que aos 14 anos, ouvia todas as historias dos caras com quem eu ficava e ainda me dava concelhos, sem bocejar, nenhuma vez.

E você, que aos 16, fez eu me apaixonar, de verdade, pela primeira vez, pelo meu melhor amigo, por você.
E a vida, má como ela é, fez com que você se apaixonasse também, só que não por mim, por uma outra. Mas a vida ainda não estava satisfeita, e fez com que essa outra tivesse um namorado.

E enquanto ela olhava para ele, e você olhava para ela, bem, eu olhava para você.
Eu boto a culpa na vida, mas, na verdade, nós somos todos um pouco masoquistas. Nós sabemos que o amor nos faz sofrer e, mesmo assim, nós não podemos nos impedir de amar. É por isso que ela amava ele, é por isso que você amava ela, é por isso que eu amo você.

Um dia,ao vê-la passar, você suspirou e virou-se para me olhar.

“Você não está saindo com ninguém, não é, Rosalyn?” Você me perguntou.

“Resolveu se interessar na minha pessoa?” Fiz como se estivesse magoada para esconder, que, por dentro, eu estava mesmo. Mas você me ignorou, já estava pensando em outra coisa.

Algum tempo depois você se virou para mim de novo.

“Quer sair comigo?” Você pediu e parecia nervoso.

“Eu sempre saio com você” Respondi, mas você sacudiu a cabeça.

“Não. Eu quero dizer num encontro.” Você explicou.

E aí, você não percebeu, mas minha respiração parou e meu coração acelerou, era tudo o que eu queria ouvir da sua boca há meses.

Então a realidade me acordou. Você só queria aquilo para esquece-la. Enquanto alguns usavamm o álcool, você me usava e isso, isso doeu.

Você viu, que eu havia entendido que você estava me usando. Você se desculpou e eu te interrompi.

“Tudo bem, eu também quero esquecer alguém.”

Mas era mentira, Carter. Porque ficar com você só ia me fazer lembrar. Para esquecer eu ia ter que... Não, não ia ter como eu esquecer, nunca, de você.

Nesse dia Carter, eu fui fraca, eu não pude dizer “Não”, porque, mesmo se me faria sofrer, aquilo era uma tentação, estar com você.

E eu estive com você, sem estar. Eu tive o seu amor, sem ter. Nós não eramos um verdadeiro casal, até o dia, não muito tempo depois, uns dois meses talvez, em que você a esqueceu, o dia em que você percebeu o porque de eu ainda estar com você. Então você me olhou de um outro jeito, tinha um brilho diferente nos seus olhos e você me perguntou:

“Porque você fez isso, Rosalyn?”

E eu te respondi:

“Porque eu sou masoquista, e gosto de sofrer.”

Você me beijou, o nosso primeiro beijo de verdade, o primeiro como um verdadeiro casal, mas você ainda não conseguia entender.

“Como você ainda consegue me amar, se eu te fiz sofrer?”

Eu dei de ombros e disse:

“Amar é sofrer.”

Aí você me puxou mais para perto de você e sussurrou no meu ouvido:

“Entao eu vou sofrer muito, porque eu amo você.”

A dor parou, Carter, naquele instante. Eu dei tudo para você
, meu melhor amigo, meu confidente, meu namorado.

Você, que aos 17 anos, me levou para o seu quarto, quando seus pais não estavam e me fez sentir a garota mas sortuda do mundo.

Você, que aos 18 anos, foi para a universidade comigo e se sacrificou para me acompanhar nas apresentações do meu grupo de teatro.

Você, que aos 22 anos, ficou famoso com sua própria banda, enquanto minha carreira no cinema só aumentava e, mesmo assim, encontrou tempo para me pedir em casamento.

Você, que até a morte me amou, e eu amei você.

Eu queria escrever mais Carter, mas minhas mãos estão falhando, e eu sei que vou morrer.

Neste mesmo momento, estou olhando para o velho homem em uma cadeira, ao lado da minha cama de hospital. O velho homem que um dia foi você, o adolescente lindo de cabelos escuros e olhos claros por quem eu me apaixonei, mas por dentro você não mudou, como o meu amor por você.

Você está dormindo e eu não quis te acordar, por isso estou dizendo tudo isso nesta carta. Espero que você à leia Carter, e à guarde com você.

Espero que você entenda, como eu acabo de entender, que se a vida te fez sofrer pela outra, no começo, e me fez sofrer por você, era para que nós pudéssemos perceber o quanto nós precisávamos um do outro. E eu ainda preciso de voce...

Sinto muito ter que te deixar,

Eu ainda amo você,
Rosalyn

— Quando os médicos chegaram no quarto de hospital, eles encontraram a velha senhora, segurando uma longa carta, e o velho senhor, seu marido. Ambos tinham falecido, por causas naturais.