O Príncipe e o Monge escrita por Aloistitch


Capítulo 1
Capítulo único.




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Sobre o leito revestido dos mais caros panos, jazia o hemofílico querubim, Alexei Romanov. Suas pálpebras enfastiadas tendiam a repousar sobre seus orbes cor de céu – que já estavam por perder o acalorado cintilar característico do infante -, como se ansiassem pelo sossego perene. Babélico era o estado das madeixas flavescentes que lhe debruavam a face, e de sua pele - antes alva e provida d’um terno par de maçãs enrubescidas - que agora tendia para um acinzentado fantasmagórico. A enfermidade estampava-lhe o rosto, roubando-lhe o feitio celestial.

 A seu lado postava-se a czarina Alexandra Feodorovna, - sua progenitora – que sucumbia ao pranto, deslizando um lenço bordado em torno dos olhos inchados a fim de livrar-se do fluido fruto de sua tormenta. Permitia que soluços de baixo timbre escapassem por entre a fissura de seus lábios trepidantes, ecoando pelo aposento.

Nicolau II, - o pai do adoentado – consolava sua esposa, deslizando os dedos compridos pelos fios brandos de seus cabelos dourados, enquanto assistia de soslaio o declínio de seu púbere herdeiro.

Mais uma meia dúzia de sujeitos situavam-se no dormitório do príncipe naquele entardecer. Os cochichos tomavam conta do ambiente, a maior parte deles tratando-se da visita do tal monge siberiano que levava fama de milagroso.

O citado lá fora convocado por sugestão de Anna Vyrubova, amiga íntima da czarina. Dizia ela que o indivíduo chamava-se Grigori Rasputin, e a havia tirado d’uma coma devastadora, uma vez em que até mesmo os médicos já haviam perdido as esperanças de recuperá-la.

No que as portas altas e bem esculpidas do aposento abriram-se, dentre elas surgira uma figura puída e desanimadora. O monge trajava um manto negro que lhe cobria o corpo inteiro, expondo exclusivamente suas mãos magras – cujas veias azuladas saltavam como se quisessem rasgar-lhe a pele – e a face estampada por uma expressão enfadada – salvo os olhos, imensos e arregalados, que reforçavam seu ar alienado -, de onde brotava uma comprida barba escura, repleta de fios grossos e desgrenhados que atingiam-lhe a altura do peito. Seus cabelos escorridos e mal lavados estavam presos na nuca por um laço maltrapilho.

Rasputin pousara as magras mãos nos botões do pijama do querubim, que lançou-lhe um olhar abatido e descrente. O siberiano desguarneceu o petiz de suas vestes superiores, e pusera-se a deslizar a ponta dos dedos sobre o peito alvo do pequenino, roçando as unhas compridas em sua pele branda, e proferindo por entre os lábios rachados uma série de rezas num idioma por todos ali presentes desconhecido, que mais lhes soava impronunciável.

Assim permanecera por cerca de uma hora. Ninguém se atrevia a interrompê-lo, fosse com censuras ou indagações, nem mesmo o czar a ou czarina. Limitaram-se a servir de platéia, borbulhando em curiosidade e aflição.

Ao terminar o serviço, Grigori acariciara as madeixas claras do príncipe e dirigira-se até seus progenitores:

- Dentro de sete horas terão seu filho recuperado e vivaz como lhes é costumeiro.

Sem mais pronúncias, a figura enegrecida deixou o aposento a passadas leves, - mais parecia que flutuava dentro daquele manto abissal – e todos ali presentes conservaram o absoluto silêncio.

Silêncio que fora logo estilhaçado pelo choro descrente e flébil da czarina. Recusava-se a acreditar que aquele monge desequilibrado havia feito algo em prol de seu pequenino. O siberiano havia apenas tomado seu tempo e alimentado suas ilusões ouvir novamente o riso de Alexei ecoando pelos aposentos do palácio.

Nicolau deu ordens para que todos deixassem o cômodo, e acompanhou Alexandra até seu dormitório. Calado, envolvia a esposa entre os braços e continha o choro, lamentando a perda deu seu único filho homem.

O czar deitou a companheira em seu leito e sugeriu-a para que descansasse. A moça obedeceu-o, assentando a cabeça sobre os travesseiros recheados de plumas e encharcando-os com suas lágrimas. Dentro de alguns minutos, a czarina sucumbiu aos braços de Morfeu, tal qual seu marido.

O casal fora despertado pelo ranger da pesada porta de madeira que resguardava seus aposentos. Da entrada, avistaram a pequenina figura de Alexei, que interrompera seu descanso com o seguinte pretexto:

- Mamãe, eu estou com fome...


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