Confesso que ouvir a voz triste de Liam me deu arrepios e um estranho aperto no coração. 

- Tive uma discussão com meu pai, pra variar. - ele tentava controlar seu nervosismo. - Ele não entende que eu não quero ficar nessa empresa e que eu não quero ser um advogado. Não é essa a vida que eu planejei pra mim e não é isso que vai me fazer feliz.  

- E pelo jeito conversar com ele não adianta muito, não é? - tentei falar. 

- Eu tento dizer, mas ele não quer escutar. Eu já não sei mais o que fazer. Ontem ele veio falando com um enorme sorriso no rosto sobre como a empresa vai crescer comigo e com meus irmãos na direção.  Mas isso é a felicidade dele, não minha. 

- Diga isso na cara suja, Liam. Fale que você não quer e não vai fazer só para agradá-lo. 

- Mas isso não é o pior, Sally. 

- Não? - perguntei curiosa. 

- Não. Ele quer que eu transfira minha faculdade para aqui. 

Suas palavras me atingiram como um tapa. Fiquei por segundos digerindo duas palavras.

- Isso significa que você teria que mudar pro sul do país? - minha voz saiu fraca. 

- É... 

- Mas o sul é longe demais. - disse tão baixo que ele provavelmente não ouvira. 

- Por isso estou bravo e com raiva. Não quero me mudar e ele quer que eu volte só para pegar minhas coisas. Ainda usa seu problema no coração como desculpa para fazer chantagem emocional. 

- Justo agora... - tentei dizer, mas parei.

- Justo agora? - repetiu. 

- Que nos reencontramos e estávamos convivendo civilizadamente. - tentei rir. - Se isso realmente acontecer, vou sentir sua falta. Afinal, já to sentindo agora. - disse tentando parar as lágrimas que insistiam em sair dos meus olhos. 

- Eu também sinto a sua falta. - sua voz estava novamente triste. - Mas as coisas estão tão difíceis aqui... 

- Eu sei. 

- Mas escuto o CD que me deu todos os dias e lembro de você. - disse com a voz baixa. - Ele tem feito eu me sentir bem, assim como você tem feito.

Sorri sozinha pela primeira vez durante aquela conversa. 

- Qualquer coisa que precisar eu vou estar aqui, ok? E arrume um jeito de voltar logo. Não quero que fique tão longe. 

- Tudo bem. Vou tentar.

*

Desliguei o celular e deixei minha cabeça cair por cima dos meus braços na mesa antiga de madeira. Eu deixava as lágrimas caírem como se aquilo não fosse acabar. Me sentia fraca e completamente desamparada. Primeiro Andrew com sua paixão estranha ou sei lá o que e depois Liam com a péssima notícia que talvez fosse mudar-se. 

- Senhorita, vamos fechar a biblioteca. Acho que deveria ir pra casa. - uma mulher alta disse. Sua voz era firme e ela parecia brava.

- Me desculpe, estou saindo. - disse pegando minhas coisas e saindo da biblioteca. 

Lá de fora, pensei em entrar em meu carro, mas resolvi ir na lanchonete. Falar com Jane seria uma boa ideia naquele momento.

*

- Oi, Sally! - Adam sorriu ao me ver. - Como está? 

- Não no meu melhor dia. - tentei sorrir de volta. - Jane está? 

Fez que sim com a cabeça. 

- Pode entrar. Ela vai ficar feliz em te ver. 

Me dirigi a enorme porta da cozinha e entrei. Encontrei Jane como sempre suja de farinha e recheio de doces. Cantarolava uma música que logo reconheci como sendo Three Times a Lady. Eu amava aquela música e fiquei por alguns segundos parada ouvindo-a. 

- Querida! Não te vi aí. - disse finalmente ao me ver. - Oh, você parece péssima. - se referia aos meus olhos vermelhos. 

Sem querer, deixei que mais lágrimas caíssem. Jane veio ao me encontro e meu abraçou.

- Sente-se. Me conte o que foi com você. 

Expliquei a Jane os motivos que haviam me levado até ali.

- Se acalme, querida. Já parou para pensar que esse Andrew pode ser um canalha e não te merecer? Esqueça ele. Esqueça isso de segunda chance. Ele já está te fazendo chorar antes mesmo de vocês começarem algo... já é um péssimo começo, não acha? 

- Sim... mas e quanto a Liam? 

Sua expressão mudou e vi que um sorriso havia aparecido em seu rosto. 

- Vai sentir falta dele? 

- É! - disse mais alto do que devia. - Talvez não seja motivo para estar chorando tanto...

- Então o motivo das suas lágrimas é Liam? - ergueu a sobrancelha. 

- Acho que sim. - só naquela hora percebi que era nele que eu havia pensado nos últimos dias e naquela noite. 

- Sally, coloque essa cabeça pra pensar. - riu. 

- O que quer dizer com isso?

- Me responda, passa pela sua cabeça a possibilidade de dar uma nova chance ao Andrew?

- Não sei. Realmente não sei. 

- Você sente algo por ele?

Pensei um pouco.

- Não. - suspirei. 

- Por que não diz isso pra ele? 

- Parte de mim quer dizer, mas outra parte quer dar um chance. Me entende? 

- Não. - disse rindo. 

- Qual é, Jane? 

- E sobre Liam? - mudou de assunto. 

- O que tem ele? 

- Vocês ficam com isso de serem amigos, mas sentem a falta um do outro mais do que deviam. 

- Justamente por sermos amigos. - fui óbvia. 

- Qual é, Sally? - imitou minha voz, me fazendo rir. - Sei que vai mandar eu calar a boca ou negar, mas já parou pra pensar que vocês ... andam juntos demais? 

- Juntos? Ele nem está aqui, Jane. 

- Você entendeu... juntos no sentido de um sempre acabar precisando do outro. Pelo que você me disse, Liam mudou desde quando vocês se conhecem e está mais amigável e até mesmo legal com você. Ele é um bom moço, você sabe disso. E outra, já disse sobre o jeito que ele te olha. 

- É, já disse.

- E você me disse que ele já disse ter se apaixonado por você.

- Tenho medo de isso ser da boca pra fora. 

Jane riu e me deixou sem entender por qual motivo.

- Tem medo? 

- Oh, Jane! Alivia aí, ok? - ri. - Mas preciso ir. Já está tarde e você tem que fechar aqui. 

- Foi bom você vir aqui. - sorriu e eu andei até a saída. 

- Até amanhã. 

Caminhei na rua pela noite fria e escura.

- Quer saber? Não ia dizer nada, mas você está apaixonada. - gritou na rua quando eu já havia atravessado a rua.

- Jane! Você nunca alivia, não é mesmo?