Serendipidade escrita por Roxanne Evans


Capítulo 3
03




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"Eu gosto das luzes desligadas
O som de portas se fechando
Eu não sou como as outras garotas
Que sempre tem certeza
De tudo o que são
Do que elas serão
Às vezes eu sou só uma garota presa dentro de mim"

Nessie permanece encolhida no carro, intimidada, enquanto sua mãe e Jacob pareciam conversar. Sentia-se acuada de alguma forma, os olhos presos em Jake enquanto ele falava. Subitamente estava demasiadamente autoconsciente de si mesma. Das roupas, agora sujas que usava, do rosto sujo de maquiagem e terra, os sapatos vomitados. Sentia vergonha e raiva em níveis proporcionais. Não gostava de sair de seu próprio controle e aquilo a irritava.

Engole em seco, encolhendo-se mais no lugar. O movimento parece chamar atenção do homem sentado no banco da frente, que lhe lança um olhar pelo vidro retrovisor, parecendo nota-la pela primeira vez depois de terem entrado no carro.

-Está com frio? – Ela abaixa um pouco o rosto, fazendo um sim suave. Não estava acostumada a se sentir desnorteada perto de pessoas, e o sentimento começava a tira-la do sério. Ele sorri de leve, mostrando os dentes perfeitos, os caninos levemente pontiagudos, fazendo-a voltar a engolir em seco. Ele tira o agasalho que vestia, passando-o para ela.

Ela o encara por alguns instantes, segurando o tecido em mãos, ainda podendo sentir o calor dele que não se esvaíra.

-Não vai sentir frio? – Encontra sua voz finalmente, percebendo-a rouca, falha e baixa. Era uma bela visão a que tinha posto, completamente. Estala a língua com o pensamento.

Ele volta a sorrir, e dessa vez, ela solta o ar dos pulmões, não sabendo fazer nada além de encara-lo, fixamente, sentindo a boca secar.

Ele volta para o lugar inicial, lançando-lhe um olhar pelo espelho.

-Não se preocupe, não costumo sentir frio – Disso Bella riu, e os dois voltaram a conversar de algo no passado que a ruiva não poderia fazer nem idéia. A menina coloca o agasalho, sentindo-o excessivamente aquecido, de fato, mas aconchegante, fazendo-a ajeitar-se melhor dentro dele. A jaqueta deveria ter no mínimo, o dobro de tamanho dela, fazendo-a parecer insignificante lá dentro.

Sente o cheiro forte, masculino e sente sua pele arrepiar. Volta a encarar o espécime com o canto dos olhos, inconscientemente alcançando a saia e tentando puxa-la levemente para baixo. Era terrível sentir-se exposta.

Desistindo do que fazia, por fim, encosta a cabeça no vidro a seu lado, puxando a manga da roupa emprestada levemente para cima, de modo que esta ficasse raspando de leve em seu nariz e pudesse constantemente sentir o seu cheiro. Era tão agradável que tinha certeza que, se exposta durante muito tempo àquilo, suas pernas ficariam bambas.

Fecha os olhos devagar, permitindo-se descansar. Era um instante que parecia um século, e tudo ao seu redor se calava, caindo na mais profunda imobilidade.

-Nessie? – A voz de sua mãe, baixa e dita com cuidado a acorda sobressaltada, fazendo-a pular de leve no lugar, percebendo que dormira. Estava na garagem subterrânea de sua casa. A garganta estava seca a e cabeça pesava.

Entra em casa de cabeça baixa, sentindo-se um pouco tonta, mas estranhamente confortável, como se algo estivesse certo. Talvez fosse a presença de sua mãe, mas não podia dizer.

Não tivera coragem de voltar a encarar Jacob depois que saíra do carro, por isso permanecia com o rosto abaixado, notando todos os padrões do chão. Sua roupa suja realmente começava a incomoda-la.

Automaticamente, ouvindo o contraste das vozes extremamente grave e suave dos dois que conversavam de fundo, entra na cozinha, tomando seguidamente alguns copos de água. Aquilo ajudaria com a ressaca, ou pelo menos, esperava que sim.

Sai, apagando a luz, percebendo na sala a sua frente, de luzes acesas, que os dois estavam longe de ir dormir.

-Mãe? – Chama, parando no batente, logo na entrada do recinto. Bella se vira para prestar atenção ao que queria. – Estou morrendo, vou tomar banho e vou dormir, tudo bem? – A mulher simplesmente faz um aceno positivo com a cabeça, levemente, e sorri.

-Boa noite. – Não dissera nada sobre a festa, como sabia que não diria. De alguma forma, não sabia se estava satisfeita com aquilo. E para o diabo com tudo, afinal faria diferença? Deixaria de fazê-lo, ir as festas, quer dizer, se ela brigasse consigo? Sabia que não.

-Hum – E faz um sinal de que ia tirar a jaqueta, que quase lhe chegava aos joelhos, mas Jacob, sentado ao sofá que ficava de frente para a janela, o oposto de onde sua mãe estava, rapidamente sinaliza que não com as mãos, agitando-as.

-Não se preocupe com isso, pode me devolver amanhã – Ela concorda, estranha e já um pouco distante pelo cansaço, virando-se, voltando a ouvir as conversas e as risadas, subindo devagar, pronta para um banho urgente e para jogar-se na cama.

–/-

O dia amanhece bonito, um céu brilhante, amarelo esbranquiçado gritava lá fora, uma brisa fraca fazendo o máximo que podia para combater o calor.

E é nesse estado que a menina que fora dormir ontem se sentindo tão mal acorda, o calor fazendo seu pescoço suar, incomodando-a. Ainda se sentia cansada, o corpo dolorido. Olha para frente, sem vontade de se mexer. Era domingo e enrolaria o máximo que podia para levantar.

No andar debaixo, a casa já se movimentava, Bella e Jacob animados conversando.

-Mas e então, ainda não perguntei, como estão a Leah, o Sam, o seu pai? Estão todos bem, nunca mais tive a chance de saber deles – Diz brevemente, bebericando o café, voltando a olhar para o amigo que fazia tanto não via, entretida.

-Estão todos bem. Acho que a Leah não mudou nadinha, se você tivesse continuado por lá ela provavelmente ainda ia implicar com a nossa amizade... – A morena riu um pouco, lembrando-se de como a outra não aprovava a amizade entre os dois, as caras feias e as provocações infantis. Chegava a ser engraçado lembrar-se de tais coisas, que agora eram como um sonho distante e um pouco embaçado, como se fossem vistos através de uma parede de água.

-Fico aliviada ao saber – E sorri, mostrando os dentes grandes, de formato bonito. Um curto período de silêncio se seguiu. – Posso te pedir uma coisa?

Aquilo chama a atenção do rapaz, que levanta o rosto, parando de comer, passando a encara-la intensamente, inquisitivo.

-Ahnn, não sei exatamente como dizer isso, mas queria pedir para que você não julgasse a Nessie pelo que viu ontem. Ela não é essa menina irresponsável que parece – Aquilo só causou que o de cabelos pretos levantasse uma sobrancelha, incentivando-a preencher o vazio com mais explicações – Na verdade, não sabemos exatamente o que fazer. Ela nunca foi assim, sempre foi um amor de criança, e até adolescente não deu muito trabalho, mas, de uns dois anos pra cá, parece que algo simplesmente quebrou dentro dela, uma mudança drástica, e foi tão repentino que até agora não sabemos o que aconteceu. Ela passou a freqüentar essas festas e a matar aula. No começo achamos que era só uma atitude rebelde e ela ficava de castigo todo o tempo, a gente brigava, mas, quando ela fez dezessete anos, a gente meio que cansou. Depois de conversarmos, decidimos mudar um pouco a abordagem, afinal, ela é praticamente uma adulta e devíamos trata-la como tal, por isso, tudo o que pedimos é que vá a aula e mantenha boas notas, e não se meta em problemas, coisas que ela parece ter consciência e fez até agora, mas a verdade é que estamos constantemente preocupados.

De colocar tudo aquilo pra fora, Bella suspirou, sentindo-se um pouco mais leve, como se um peso tivesse sido arrancado de seus ombros. Ela volta a olhar o amigo. Ele parecia formular um comentário para fazer, mas Nessie entrou na cozinha, fazendo o assunto morrer.

-Bom dia – A menina murmura, sentando-se, um pouco acanhada a mesa. Não sabia se tinha mais vergonha do que fizera ontem, do que fizera sua mãe passar ou da presença de Jacob, mas uma coisa era certa, estava sentindo-se estranhamente fora de lugar, como uma peça de exposição excessivamente aparente.

Já passava das dez horas da manhã e ao se dar conta disso, a ruiva percebeu que os dois a sua frente deveriam ter tido muita conversa para colocar em dia e deviam tê-lo feito ontem, madrugada adentro.

Tentou se concentrar para lembrar-se do que sua mãe já falara a respeito de Jacob. Se soubesse como ele se parecia, talvez tivesse ficado mais interessada em ouvir.

Lembrava-se de ela ter lhe dito que eram melhores amigos, antes de ela se mudar para viver com a mãe, que ele morava em uma reserva indígena, perto de sua casa, que seus pais eram melhores amigos e que ele era mais novo do que ela, só não se lembrava de quantos anos. A essa altura, daria tudo para se lembrar.

Devia estar fazendo uma cara compenetrada, quase uma careta na verdade, pois sua mãe parece um pouco assustada ao perguntar.

-Tudo bem amor? Está passando mal? – A menina a olha admirada, demorando um pouco para processar.

-Não, estou bem, estou tentando lembrar uma coisa – E sorri, tranqüilizadora, voltando-se para a fatia de pão a sua frente, voltando a passar requeijão sobre ele. Sente haver uma pequena tensão no ar, mas, acostumada a isso, resolve simplesmente ignora-la.

É só no final da refeição que sua mãe volta a lhe falar.

-Então Nessie, estava pensando em hoje sairmos pela cidade para mostrar alguns pontos legais para o Jake, o que acha? Podemos ir almoçar naquele restaurante que você tanto gosta – Aquilo parece ser a idéia certa, pois o rosto da menina se ilumina, e ela parece genuinamente satisfeita ao pular da cadeira, ajudando sua mãe a tirar a mesa.

-Não precisam ter todo esse trabalho por mim – A voz grave era tão agradável que não importando o que dissesse, a ruiva tinha a impressão de que poderia ouvi-la o dia inteiro.

-Imagina, não é trabalho algum – Bella responde, terminando de colocar a louça que a filha lhe entregava na máquina de lavar, fechando-a em seguida, ajeitando o cabelo no rabo-de-cavalo frouxo que usava.

-Não mesmo, e não se preocupe porque se fosse realmente trabalhoso, eu provavelmente não iria – E a menina lhe lança um sorriso maroto, sem que notasse sua atitude, arrependendo-se imediatamente quando ele lhe responde com outro sorriso, sentindo seu rosto corar, o coração acelerando rapidamente.

Novamente, volta a sentir-se exposta diante de seu olhar intenso, respirando fundo, virando-se, tentando se acalmar. Sua sorte era ter se lembrado de trocar de roupa, colocar um jeans, porque se estivesse de pijama agora já teria surtado do tanto acrescido que teria se sentido balançada diante aquele olhar.

-Tem certeza que está tudo bem? – sua mãe volta a se aproximar, fazendo questão de toca-la, parecendo achar que ela estava com febre, mas Nessie afasta a mão delicada com cuidado.

-Estou bem mãe, só minha pressão que baixou um pouco – Dá uma desculpa qualquer, sorrindo, torcendo para que acreditasse.

A morena parece bastante convencida quando se vira para o causador de constrangimento – Então, antes de ir preciso terminar uma reportagem senão minha editora me mata e aí a gente já vai – E sorri travessa, acrescentando – Mas já estou acabando então não se preocupem vocês também – E lança um olhar para a menina – Daqui a pouco a gente sai, vou até tentar dar uma corrida pra gente sair o mais cedo possível. – E sorri novamente, caminhando para a saída. Ao perceber que a mãe pretendia subir para escrever, a ruiva sentiu-se extremamente encabulada, e tratou de segui-la, alguns passos, parando na porta da cozinha.

Seu cérebro pareceu ponderar alguns instantes. Podia subir e matar tempo agora, mas provavelmente Jacob iria ficar um tanto quanto sem graça nessa casa que não era dele, sozinho, sem nada para fazer ou ninguém para conversar.

Não antes de lembrar-se de se dar um chute mental, vira-se, um sorriso forçado passando por seus lábios, encarando o rapaz que agora a encarava de volta, parecendo interessado em sua aparente hesitação.

-Então... – E as palavras morrem aí. Não tinha idéia do que dizer e sentia-se envergonhada por isso.

-Então? – E ele parece conter um riso, engasgando de leve, fazendo um movimento de 'continue' com a mão.

Ela pensa rápido no que poderia dizer e fala a primeira que lhe vem à mente, sem se preocupar muito com o assunto.

-Quantos anos mesmo você é mais novo que a minha mãe? – Ele lambe o lábio inferior rapidamente antes de responder, sem nunca largar uma espécie de sorriso debochado do rosto, parecendo divertir-se as suas custas, fazendo-a irritada.

-Quatro, por quê?

-Não lembrava – E bate uma mão na outra, mais por não ter o que fazer do que qualquer outra coisa.

Ele acena com a cabeça.

-Agora é sua vez – Ela diz, no término de um minuto, não aguentando o silêncio. Mesmo que encarasse o chão, sentia os olhos dele queimando em si, parecendo perfura-la com sua força.

-Minha vez? – E ele levanta uma sobrancelha.

-É, de contribuir com a conversa. Já fiz minha parte, agora é sua vez – Ele parece um pouco descrente por um instante, desconcertado, e depois começa a rir. Nessie fica um pouco apreensiva no começo, depois sorri, discreta. A verdade é que o som da risada dele era tão agradável quanto qualquer outra coisa a seu respeito de que soubesse até agora e se ele simplesmente risse, não se sentiria tão embaraçada quanto estava há instantes atrás.

-Não estava ciente dessa regra – Ela cruza os braços, ainda sorrindo e chuta o ar, risonha.

-Pois é, ela existe para que eu não tenha de construir um monólogo aqui, parada em pé – Ele mantinha um sorriso constante e aquilo parecia fazer seu coração saltitar, toda vez que o encarava.

-Justo – E ele encara a mesa por um instante, antes de levantar-se, vindo em sua direção. Os olhos chocolate se arregalam, mas ele passa por ela, indo em direção à sala. Ela o segue, mais por curiosidade, analisando suas costas, tentando entender o que ele fazia, enquanto ele se sentava no mesmo lugar do dia anterior, confortável, olhando o sofá menor a sua frente, sugerindo que ela fizesse o mesmo.

Ela caminha devagar, sentando-se.

-Posso saber pra que isso? – E ele sorri, passando a língua pelos dentes.

-Para que você não tenha de fazer seu monólogo em pé. – Diz simplesmente, uma expressão divertida no rosto. É a vez dela lhe lançar um olhar descrente, antes de cair na gargalhada.

-Ah, agora sim, muito melhor! O problema era estar em pé mesmo! – E ele lhe lança um sorriso irônico que dizia 'não há de que', só servindo para fazê-la rir ainda mais. É a vez dele sorrir de lado com a risada entretida dela.

-Você me lembra um pouco a sua mãe – E embora fosse apenas um comentário, nem ao menos dito para ela em especial, a pôs intrigada.

-Por que diz isso? – Quis saber, colocando as pernas para cima do sofá, sentando-se de lado.

-O seu jeito, sei lá, seus olhos. – E dessa vez, ele parecia um pouco sem graça, encolhendo os ombros de leve, antes de voltar ao normal, fazendo-a sentir-se vitoriosa, nem que fosse um pouco.

-Costumam dizer que eu pareço com meu pai, meu rosto, minha pele, meu cabelo, meu jeito... Resumidamente, tudo com exceção dos meus olhos – E ela percebe que o estava olhando direto nos olhos, agora consciente do fato, procurando outro lugar para olhar, mas não achando, desconfortável.

-Jura? Pode ser, não o conheço, então não sei, mas ainda assim, há algo de muito igual a Bella em você – ela concorda com a cabeça, sem saber o que mais fazer. O que será que tinha que era dela mesmo?

Era uma situação estranha, e os dois conseguiam sentir isso no ar, mas tentavam ao máximo manter uma conversação, para ultrapassarem a barreira da estranheza de não se conhecerem.

-Você mora em um vilarejo, é isso? – E emenda um assunto no outro, não dando espaço para o silêncio.

-É mais ou menos isso, é uma vila indígena – Ele diz, com pouco caso. Aquilo parece intriga-la.

-E como é lá? De alguma forma, não consigo imaginar isso – Ele solta um riso fraco, passando a apoiar o pé direito de lado sobre a perna esquerda, mexendo no jeans desse.

-É como qualquer outro lugar do interior, sem muita coisa pra fazer, tranqüilo, casas de madeira, esse tipo de coisa... – Ela parece pensar sobre o assunto, processando.

-Deve ter bastante coisa de trabalho manual... – E ainda parecia pensativa quando ele cruza as sobrancelhas, não entendendo.

-Como assim? – Volta a se lembrar de que conversava.

-Ah, não, quero dizer, deve ter bastantes enfeites e coisas manuais não? Ou estou enganada? – E sorri, sem graça, remexendo-se no lugar. Ele volta a sorrir, pondo-a tranqüila.

-Disso eu não posso reclamar, por quê? Gosta desse tipo de coisa?

-Gosto desse tipo de coisa. Como o apanhador de sonhos, acho tão bonito, os detalhes, a teia. Sou apaixonada por eles – E morde o lábio inferior.

-É bom eu me lembrar disso se algum dia quiser te dar um presente – Ela ri um pouquinho, acompanhando-o.

-Eu com certeza ia adorar.

E os dois se calam, apenas por um instante, a ruiva retomando, parecendo realmente entreter-se na conversa.

-Posso te perguntar como você e minha mãe se conheceram? – Ele sorri, mexendo-se na cadeira, abaixando um pouco o rosto.

-Você roubou a minha vez – Ele comenta, fazendo-a estranhar, antes de entender, e cruzar os braços, sorrindo – Claro que sim, só sinto não poder responder. – E antes que ela perguntasse, continua – Nossos pais eram melhores amigos, então acho que nunca tivemos uma chance, eu praticamente nasci sabendo quem era Isabella Swan.

Nessie sorriu diante disso.

-Quantos anos vocês tinham quando ela foi embora?

-Ela tinha treze, talvez um pouco mais e eu tinha nove. Muito novos né? Deve ter gente que estranha à gente nunca ter perdido o contato – Nisso, a menina se admira.

-Vocês nunca perderam contato? – Ele delicia-se com a cara de impressionada da garota.

-Nunca, alguns anos a gente conversava mais, outros menos, mas sempre mantinha o contato. Foi legal isso, pelo menos soube o que aconteceu na vida dela, assim como ela soube o que aconteceu na minha.

A garota lutou contra um impulso, mas perdeu, as palavras parecendo vomitar de sua boca.

-E você, falando nisso? Porque no tempo que esteve aqui minha mãe conheceu meu pai, teve um filho, casou, virou escritora e... Tá aí agora... E você, o que aconteceu com você nesses anos? – Era uma pergunta estranha, até um pouco intrometida, sabia disso, mas não conseguiu desviar-se dela.

Ele não parece estranhar.

-Não muito, na verdade. Não casei, nem tive filhos, simplesmente cresci, acho, namorei e estou trabalhando para ajudar o meu pai. Sinto dizer que acho que ainda sou o mesmo garoto do interior que ela conheceu há tanto tempo – Dessa vez ele pareceu realmente sem graça, como se o fato o incomodasse. Nessie percebeu e identificou-se.

-Mas... Tem alguma coisa que você queira fazer? – Hesita um pouco, incerta se deveria perguntar, mas ele estava concentrado demais em si mesmo para perceber.

-Na verdade não, gosto de onde eu estou, trabalhando para a empresa do meu pai, consertando carros como hobby, saindo com meus amigos. Nada de muito luxo, mas é uma vida legal. – E ele termina a sentença sem encara-la.

Ela morde o lábio inferior, encarando-o com simpatia.

-Pelo menos você sabe o que quer fazer, digo, o que gosta de fazer – Disso ele solta uma risada engasgada.

-Todo mundo sabe o que gosta de fazer – Diz de contrapartida, voltando a encara-la. É a vez dela de sentir-se mal e abaixar o rosto.

-Não necessariamente, eu não tenho muita certeza. – E sorri fraquinho, sem graça.

-Ah vamos lá, eu te ajudo. O que você gosta de fazer, no seu dia a dia? – Ela sorri, voltando a morder o lábio, levantando o rosto, um dos cachos de seus cabelos caindo para frente, ela puxando-o para trás para ajeita-lo.

-Maldito cabelo rebelde... – E se cala, o silêncio voltando, um pouco mais denso, até que ela conseguisse pensar em alguma coisa, qualquer coisa – Não sei, gosto de ler, escrever, mexer no computador, tirar fotos, desenhar, esse tipo de coisa, o tipo de coisa que quase todo mundo gosta – E mexe as mãos nervosamente, mas ele permanece sério.

-É alguma coisa sólida para se começar a pensar a respeito. Já pensou em fazer algo com isso?

Ela balança a cabeça em negativo.

-Pois devia, é um bom começo – E dessa vez ela sorri, pensando que ele poderia ter razão, sentindo-se até um pouco idiota por aquilo nunca ter lhe ocorrido.

-Obrigada – E sorri, agradecida, fazendo-o devolver a simpatia, sabendo que ele a havia entendido por isso.

–/-

Bella desce ouvindo risos vindos da sala, uma conversa animada. Curiosa, a moça aproxima-se, discreta, parando a porta, observando um pouco.

A filha e o amigo conversavam de um filme qualquer, mas o interessante não era isso, era mais o modo como interagiam, conversavam sem embaraço, empolgados, rindo e às vezes até inclinando-se um pouco para frente na cadeira, em direção ao outro.

A morena entra, sorrindo.

-Terminei meu trabalho, ainda estão com vontade de sair?

Renesmee surpreende-se. Não sabia que tanto tempo havia passado. Na verdade, não tinha percebido, o que era incomum. Sente-se um pouco estranha ao percebê-lo, como se a menina que tivesse aproveitado tanto o momento não fosse ela mesmo, e sim uma outra Renesmee, tão parecida consigo.

-Vamos então? – E a menina sorri, levantando-se.

Estavam alcançando o carro quando Jacob suspira, como que desapontado.

-Então quer dizer que você não gosta mais de motos? – E olha para Bella com um leve olhar infantil, um sorriso traquinas no rosto. A morena ri.

-Não, não. Acho que cresci e simplesmente deixei isso pra trás – Responde, abrindo a porta do carro.

-Minha mãe gostava de motos? – Não demora em interromper, também entrando no veículo, ajeitando-se na parte de trás. Jacob passa a encara-la pelo retrovisor.

-Ela adorava, sempre quis aprender, eu até fiz um pacto com ela, de que quando crescesse a ensinaria a andar, mas parece que ela perdeu o interesse. – Ele diz, lamentando-se, mas soltando uma pequena risada em seguida.

Nessie parece se animar.

-E pode me ensinar? – E espera, com expectativa.

O moreno mantém um sorriso misterioso no rosto, lançando seu olhar sobre Bella, que simplesmente dá de ombros.

-Não deixe que seja eu o empecilho! – Exclama simplesmente, fazendo Nessie comemorar.

–/-

O passeio não foi muito longo. Passearam um pouco, as lojas mais conhecidas, alguns pontos turísticos, algumas fotos, mas logo sentiram fome e como prometido foram ao restaurante favorito de Nessie.

Era um restaurante italiano pouco conhecido, que ficava em uma travessa pouco movimentada, mas agradável e familiar. O lugar era refinado, todo no estilo vintage e cores pastéis.

Sentaram-se na parte de cima, perto da janela de madeira, onde agora, uma brisa mais agradável batia. Bella e Renesmee de um lado, Jacob do outro. A menina ajeita o cabelo cacheado, que o vento insistia em bagunçar.

Fazem o pedido e retomam a conversa. Como sempre, sua mãe e Jacob conversavam de alguma coisa do passado, algo que a de cabelos cobreados não fazia nem idéia, a diferença é que desta vez, estava interessada.

Conversavam sobre o tempo em Forks, sobre como costumava ser frio e chuvoso, depois mudaram para o tópico de como era a praia aonde Jacob e Bella tanto iam, para depois irem para pessoas que ela não fazia nem idéia de quem eram.

Eram tantos nomes, Sam, Rachel, Rebecca, Paul, Quil, Embry, Leah, que estavam até a deixando um pouco confusa. Era casamento, amor infindável, mudança, mágoa. Todos os assuntos possíveis, o que a levou a pensar em quantas pessoas no mundo tinham uma vida completa que ela mal conhecia, nem ao menos tinha ouvido falar. E tantas outras que ainda seriam. E quantas vidas tinham se perdido sem que ninguém hoje soubesse sequer que existiram ou o que tinham feito, por mais importantes que tivessem sido na sua época.

Seus pensamentos são interrompidos quando os pratos são deixados à mesa. O foco muda.

-Quer dizer então que você vai aprender a andar de moto agora? – A menina sorriu, animada.

-Quando posso começar? – E lança um olhar para Jake, que levanta os braços, derrotado.

-Nem ao menos tenho uma moto para te ensinar como andar! – Aquilo a frustra um pouco, mas ela tenta não deixar transparecer. – Pensando bem, posso ver se arranjo com uns caras que eu conheço por aqui – E parece pensar um pouco. Novamente, tenta esconder sua reação, o coração acelerando em expectativa.

Os três começam a comer, a ruiva tendo de se segurar para não começara a cantarolar. Ficam assim por alguns instante, quando o celular de Bella toca. Ela pega o aparelho, olhando quem ligava, estranhando.

-Mas o que...? – E levanta-se para atender.

Jacob faz um olhar interrogativo para Nessie, que dá de ombros, os dois esperam, olhando-a enquanto ela gesticulava. Ela volta alguns instantes depois, agitada.

-Acho que precisamos ir. – O coração da menina gela.

-O que aconteceu?

-Os resultados da Rosalie chegaram, me parece que o diagnóstico não é bom e ela tá surtando. A Alice está lá e parece desesperada, ela pediu pra gente ir pra lá imediatamente.

O caminho praticamente inteiro é feito em silêncio, a agonia de Bella visível para os outros dois, só interrompido pelos pedidos de desculpa feitos a Jacob, de tempos em tempos, por ele ter de acompanha-las.

Ele faz mais do que questão de demonstrar que estava tudo bem, mas a morena ainda não parecia convencida, enquanto dirigia o mais rápido que conseguia para o apartamento do cunhado e da amiga.

–/-

Chegam e entram sem problemas, sendo reconhecidos pelo porteiro. O elevador chega rápido e eles sobem, Nessie olhando de canto de olho, vendo o quanto Jacob admirava seus arredores, o apartamento refinado da loira. Ela mesma demorara um pouco para se acostumar, mas, naquela altura do campeonato...

São recepcionados por Emmett, que mantinha os mesmos olhos preocupados de Bella, os dois apressando-se em voltar ao quarto do casal, onde aparentemente, todos se reuniam.

Jacob e Nessie eram os únicos na sala, no momento ninguém se preocupando em fazer sala para eles. O choro descompassado da loira podia ser ouvido de onde estavam.

O apartamento do casal era, de fato, algo para se admirar. Extremamente espaçoso, duas suítes, quarto de hóspedes. A sala com uma janela que dava para uma sacada. A janela na verdade era uma parede de vidro com cortinas.

Os móveis eram todos modernos, no estilo clean.

A ruiva conseguia ver claramente o moreno a seu lado se remexer um pouco, ajeitando os tênis, não se sentindo muito bem. Ela lhe sorri.

-Vamos sentar?

Eles se sentam no sofá maior, que ficava de costas para a sacada, embora distante desta. E embora ali houvesse três sofás, inexplicavelmente, Renesmee senta-se do lado de Jake, como que não conseguisse evitar, como se fosse impelida a fazê-lo. Como fizera antes em casa, puxa os pés para cima, colocando-os à frente ao corpo, abaixados, de lado, ficando reclinada para trás.

Jacob permanece sentado corretamente, olhando ao redor.

-Não é perigosa – A menina murmura de repente, fazendo-o encara-la. Ela sente o coração acelerar, percebendo a proximidade dos corpos, e torce para não corar.

-O que?

-A casa – Ela repete, sorrindo timidamente, mexendo em algo na calça. Ele lhe sorri, parecendo relaxar um pouco.

-Acho que não estou acostumado – E se encosta ao encosto atrás de si, parecendo testar o estofamento.

-Percebi – E ele ri com gosto.

-Estava tão na cara assim? – Ela ia responder, mas Jasper e Emmett aparecem na sala. Ao ouvi-los a ruiva se vira, passando a encara-los.

-Nessie! – O loiro exclama, com um sorriso no rosto, mas calando-se em seguida, ao ver a situação dos presentes.

-Estávamos mais atrapalhando do que ajudando ali – O moreno explica, batendo uma mão na outra, um pouco agitado. Em seguida, encara Jacob e Nessie, um pouco inquisitivos, a menina percebendo imediatamente o que ele pensava, pelo tanto que estava próxima do homem a seu lado.

Levanta-se em um pulo, um pouco envergonhada.

-Esse é Jacob, um amigo de infância da minha mãe. – Explica, gesticulando. O maior se levanta, para apresentar-se.

-Jacob! – Os outros dois exclamam ao mesmo tempo. O índio faz uma cara de surpresa, admiração.

-Pelo visto, sou famoso por aqui... – E sorri, estirando o braço e cumprimentando os dois.

-É claro que é – Jasper começa, sorrindo – Já ouvimos falar muito de você através da Bella, inclusive, teve uma época que fizemos uma aposta – E o loiro bem definido esconde um sorriso.

-De quando a Bella ia largar o Edward pra voltar pra você – E embora os dois tenham caído na gargalhada e Jacob tenha seguido, um pouco sem graça, Nessie sentiu-se desconfortável, uma pontada de irritação.

–/-

Os três voltam para casa exauridos, a crise de Rosie sobre controle. Ainda teriam muita dor de cabeça sobre aquilo, tinham certeza, embora dessa vez tivesse uma forte razão.

-Mais uma vez, desculpe-me Jake, não era assim que eu queria que nossa tarde tivesse sido – A morena tenta, mas ele a apazigua, dizendo não haver problemas. Nisso, Nessie nota a luz do escritório acesa.

-O papai já voltou mãe? – A menina indica, fazendo a mais velha sorrir, ao ver o marido sair do escritório, para a luz do corredor espaçoso, onde estavam, caminhando na direção deles.

Bella o encontra no caminho, beijando-o docemente.

Jacob e Nessie trocam olhares, sentindo-se um pouco intrometidos diante da cena. O ruivo e a mulher voltam-se para eles. Edward em primeiro lugar abraça a filha, depositando-lhe um beijo e lhe lançando um sorriso, antes de voltar-se para o Quileute.

Os dois trocam um olhar, o dono da casa falando primeiro.

-Então você é o Jake? Muito prazer! – E o moreno abre um sorriso, mostrando os caninos pontudos, simpático, cumprimentando-o.

-O prazer é todo meu.

Os dois trocam algumas outras palavras depois disso, mas como aparentemente, todos estavam cansados e Edward só esperava Bella para ir dormir, todos se retiram para seus quartos.

Nessie senta-se na cama durante um instante, antes de finalmente se entregar ao sono, assimilando tudo que acontecera durante o dia. O pensamento de Jake a deixava agitada, e não sabia por que, só sabia que ele lhe parecia extremamente atraente.

Tenta refrear a linha de pensamentos, afinal de contas, ele era amigo de sua mãe e treze anos mais velho! Mas, quanto mais tentava, mais pensamentos sobre ele pareciam brotar em sua mente, e antes que percebesse, o analisava.

Ao lembrar-se da boca de aparência bonita e convidativa, sente um arrepio passar por sua espinha, um formigamento leve no meio das pernas. E antes que conseguisse bloquear, imagina como seria beija-lo, se ele beijaria bem, a imagem inundando sua mente, os braços fortes em sua cintura.

Sente vontade de bater-se e se joga na cama. A melhor solução agora era dormir, antes que pensasse em algo pior. Mal sabia ela que aquele era apenas o primeiro de muitos pensamentos atormentadores e que nem em seus sonhos estaria protegida deles.





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Notas finais do capítulo

Terminada em: 29.11.2011
Publicada em: 12.07.2013

A sorte da Nessie é que a mãe dela é a Bella e não a Alice, senão, na primeira olhada, ela já tinha percebido o que estava acontecendo kdsopakdaops

A música do capítulo, que inclusive combina muito com o momento é Hook me Up do The Veronicas.

Bem gente, apesar da demora em revisar, o texto veio, espero que estejam gostando da interação deles aí ^^~

Até a próxima! o/