A criatura que surgiu da noite escrita por Nobody


Capítulo 1
A criatura que surgiu da noite


Notas iniciais do capítulo

Conto escrito para o 9º Concurso Literário ORLANDO BRONZATO, 'PINTACA' da Bibioteca Pública Municipal de Mogi Mirim, participante da categoria Juvenil onde utilizo o pseudônimo GiCrisLi.



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Os galhos da árvore batiam levemente na janela e o sopro do ar gelado e úmido correndo pela casa fazia ecoar o barulho que mostrava a magnitude da natureza. No meio daquele espetáculo de sons naturais, eu podia escutar: algo se aproximava.

Aquele som vindo de uma pisada furtiva de passos leves chegava cada vez mais perto da porta. Até que parou. Sobrou apenas uma respiração pesada e lenta. Ninguém bateu, ninguém chamou. Ouve apenas um rápido silêncio até que a trinca da porta começou a se desdobrar.

Levantei-me vagarosamente da poltrona de couro antigo na qual eu estivera permanecido imóvel até então. O vento frio e sorrateiro que adentrou pela porta apagara a lamparina, o único objeto que trazia luz para aquele imenso quarto envolto em trevas, onde já se encontrava aquela misteriosa criatura.

Meu coração palpitava aceleradamente. Corri minhas gélidas e suadas mãos para perto da parede, esta iria servir de orientação no meio daquela escuridão. Por instantes permaneci em silêncio para tentar decifrar em qual posição se encontrava o ser que me trazia tanto medo. A tentativa foi em vão. Apenas o som surdo da brisa e a calmaria da chuva quebravam o silêncio da noite.

O pensamento de que aquela criatura oculta no escuro estava me esperando, assim como uma vípera pronta para dar o bote, fazia-me contrair cada músculo do corpo em uma tentativa de fortificação.

Um forte suspiro rompeu a pequena calmaria. Passos, ora leves, ora errados e tropeços, começaram a ecoar pelo quarto. Saquei o sabre e, apertando-o fortemente na mão, recorri tateando pela parede até encostar na lamparina apagada. O primeiro pensamento que veio em minha mente foi de acendê-la para que fosse possível enfrentar um inimigo visível, pois nada era pior do que aquela tortura mental angustiadora.

Aos poucos, a luz foi cobrindo o cômodo com sua fraca claridade, trazendo as formas daqueles robustos móveis aos olhos. Parada, ao longe, estava a figura que me assombrava até então: uma garotinha. Quando observei o motivo que me deixara tão aterrorizado, um largo sorriso rompeu em minha face e deixei o sabre cair no chão. A pequena garota, ao olhar-me e analisar o local em que se encontrava, caiu em prantos. Seus grandes olhos negros como a noite eram percorridos por finos rios de lágrimas. Fui rapidamente ao seu encontro e peguei-a no colo para lhe consolar.

A pobre menina estava molhada pela chuva e com vários ferimentos espalhados no corpo. Pesou-me o coração ao pensar nos acontecimentos que fizeram com que aquela pequenina chegasse a mim em tal estado.

Levei-a para a cozinha e lhe preparei uma bebida quente. Enquanto ela tomava a bebida, fui buscar-lhe um cobertor para se envolver e se secar.

Sentei-me em sua frente e observei-a cuidadosamente. Tinha a aparência de uma criança de oito anos de idade, suas feições delicadas eram deformadas pelos machucados. Sua boca rosada que se banhava a beber era contornada por seu cabelo liso e curto, tão negro quantos seus olhos, o que surtia um grande contraste com sua pele branca. Apesar das feridas, ela era uma boneca de porcelana no corpo de uma criança.

Perguntei-lhe o que tinha acontecido e ela não respondeu. A voz da menina ainda era um mistério para mim. Disse para que ela fosse deitar e que ao amanhecer resolveríamos isto.

Deitei-a no quarto reservado para visitas e sentei ao lado, velando seu sono. A pequena garota parecia não ter sentimentos, pois além do choro, nenhuma expressão, triste ou alegre, despontava em seu rosto. Os olhos cerrados da menina disseram-me que ela já tinha caído no sono; levantei e fui ao meu quarto no fim do corredor, que se encontrava a alguns passos de onde estava a menina. Deitei pensando no amanhã que traria respostas para as perguntas de hoje. A quietude do ambiente trouxe rapidamente estagnação em meu ser. Quando eu já estava quase dormindo, apareceu na porta o pequeno vulto da garota, o qual anunciou que a pouco tempo atrás ela apenas havia fingido o sono.

Seus olhos indiferentes e sem emoção, traziam a frieza que ainda não tinha sido demonstrada em tais. Fitou-me por um tempo, até que se virou e começou a andar pela casa. Levantei-me para segui-la.

A menina abriu a mesma porta pela qual entrara e saiu novamente para o mundo frio de que viera. Peguei meu casaco pendurado ao lado da porta e corri para alcançá-la.

A natureza curvara-se a si própria ao deformar-se tanto pela fria chuva que tinha parado a pouco: as pedras estavam com a superfície branca e a relva que tentava sobressaltar os pedregulhos estava coberta de orvalho. Ao longe, vi a figura da menina e apressei o passo.

Ela parou diante de uma velha cabana de madeira e abriu-a pela fraca porta sustentada por uma pedra. Entrou. Apenas enxerguei a escuridão lá dentro. Novamente me deparava com o medo que trazia as trevas de um desconhecido. Adquiri o pouco de coragem que tinha e a acompanhei entrando na velha cabana. Cada passo era um rangido que a madeira do chão soltava.

Busquei ver algo ou ao menos escutar, mas nada me era perceptível.

Logo chutei um objeto duro e molhado no chão. O cheiro estava forte naquele lugar. Tateei aquele objeto que eu acabara de chutar e tive minhas mãos molhadas por um líquido. [O que é isto?] Um choro despontou ao meu lado e só assim percebi que a garota estava perto.

Preocupei-me em saber o que estava acontecendo, mas nada era visível. Lembrei-me de um isqueiro guardado no casaco e comecei a tatear os bolsos. Ao acendê-lo, iniciou-se o meu tormento.

Meus olhos sobressaltaram-se e minha respiração tornou-se rápida e pesada. O desespero apossou-se de mim: o objeto que havia chutado era o corpo de um homem e ao lado tinha também o corpo de uma mulher, ambos banhados em sangue. Um grito de terror partiu de meu peito.

— O que é isso?! — Questionei ao ver a menina com uma mão sobre cada cadáver, chacoalhando-os incansavelmente em lágrimas.

— Mama! Papa! — A menina dizia isso aos prantos em uma tentativa de reanimá-los. Subitamente ela parou com seus movimentos e sorriu desdenhosamente — … vocês foram crianças más... não é, Sr. James?

O meu nome dito por aquela criança infernal que sorria, fez-me disparar em uma corrida até minha casa.

Fechei a porta e novamente coloquei o sabre em mãos.

Desta vez, a pisada furtiva de passos leves que se aproximava novamente da casa já tinha o seu criador conhecido. Aquela respiração pesada do outro lado da porta, eu sabia a quem pertencia, e isso dificultava a situação.

A criança assassina esperava por mim. Eu sabia que não conseguiria enfrentá-la, pois assim eu estaria condenado a quebrar aquela pequena boneca de porcelana.

Agora se iniciava o verdadeiro pesadelo.


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Notas finais do capítulo

Gostaram?
Então comentem e torçam por mim! xD



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