05 de junho de 1993

Querido Amigo,

Não é madrugada. Estou de férias. Então prepare-se para uma carta do jeito que você gosta, bemmmmmmmm longa.

Enfim descobri o que as pessoas achavam, e ainda acham, de mim. Elas pensam que sou lésbica. De onde tiraram isso?! Eu me pergunto á vários dias. Como descobri? Do pior modo possível, Charlie. Uma lésbica pediu pra ficar comigo. Rapidamente eu me recusei. Já pensou nisso? Eu, bianca, lésbica? 

A garota ficou chateada, é claro. Não posso culpa-la por gostar de mim. Porém, não vou começar a gostar dela por causa disso. 

O bom dessa história toda é que finalmente ganhei uma amiga. Eu não me importo de andar com ela, mesmo sabendo que as suspeitas das pessoas possam ser ainda maiores. Ela é legal. Chama-se Lyra e nunca tentou nada comigo depois daquele dia. Ela me ajuda a me enturmar com as outras pessoas e aos poucos os boatos vão se apagando.

Enfim, como eu disse, estou de férias. Mas é como se eu não estivesse. Sempre ficava sem nada pra fazer, a não ser estudar. A Lyra vive me chamando pra sair á noite, mas meu irmão nunca autoriza e tenho medo de sair sem permissão, acho muito errado.

Então, todos os dias, vou caminhar, como sempre caminho. Charlie, você não sabe como é bom fazer isso, deveria tentar. A pessoa se sente renovada.

Foi em uma dessas caminhadas, sempre é, que encontrei a Lyra andando de carro com um garoto. Bem, não era andando, eles estavam "namorando" no carro. Não quis ficar pra ver no que iria dá, então passei direto mas ela me viu. Vestiu a blusa que estava no banco  do passageiro, saiu de carro e correu em minha direção.

— Diz pra mim que você não viu isso?

Eu havia visto, mas não queria incomoda-la.

— Não vi nada, Lyra.

— Você viu sim. Por favor, não conte pra minha mãe ou pra ninguém. Ela ainda acha que sou lésbica.

— E você não é?

— Não. Só contei isso pras pessoas pra chamar atenção e pra poder sair de casa, minha mãe é insuportável.

Fui enganada, Charlie, mas não queria perder a amizade dela. Tenho tão poucos amigos que chega a doer perder algum.

— Tudo bem. Eu não vou contar pra ninguém. Volte pra lá. Acho que sou namorado não está satisfeito.

Subitamente ela me abraçou e deu um beijo em minha bochecha. Fiquei paralisada. Por um momento pensei que ela iria me beijar.

— Te adoro, amiga.

Sorri. Agora tinha certeza de que tinha uma amiga.

Amigo, como é bom ter alguém pra conversar, não é? Chamei a Lyra pra ir ver um filme lá em casa enquanto meu irmão estava no trabalho. Alugamos um filme chamado Thelma e Louise. Fala sobre duas amigas que vão viajar e entram em várias encrencas. Era hilário, Charlie. Rimos muito. Fazia tempos que não me divertia tanto.

Como meu irmão chegava no começo da noite, Lyra teve que ir para casa ás 5 horas. Ela adorou a visita a minha casa e pediu pra fazermos isso mais vezes.

Ao ir embora foi que descobri que ela não morava tão longe. Só alguns quarterões de distância. Qualquer dia eu pediria para visita-la.

As férias acabam daqui a duas semanas. E as suas, Charlie?

Espero que aproveite bem.

Com amor, 

Bianca.