Memórias de Uma Loucura: o Amor escrita por Mara S


Capítulo 1
Capítulo Único




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07 de Dezembro de 2007

 

Eu decidi escrever aqui, neste caderno, o que sinto e me deixa engasgado. Não sei bem se irá funcionar, mas isso me lembra de escrever sobre Raquel.

Raquel...

            Lembro-me bem de quando a conheci. Estava longe de mim, saindo de sua casa. Estranho como nunca havia percebido quão interessante era minha vizinha. Deve ter se mudado num momento em que não estava em casa. De qualquer modo, senti que nunca mais seria o mesmo. Seu modo de caminhar mexia comigo... Isso mesmo, algo que parece ser tão simples, mas não é. Eu guardei esse sentimento dentro de mim por tanto tempo, até que um dia ela sorriu ao me ver. Não um sorriso qualquer... Não. Ela já havia me visto antes e naquela tarde ao cruzar comigo, seu sorriso foi diferente. Naturalmente ela deve estar confiando em mim. Mulheres têm medo de se mostrarem simpáticas a estranhos, ainda mais ela. Tão bonita... Mas você não precisa ter medo.

            Na verdade, ela não é bela de um modo simplório, possui olhos profundos que não consigo explicar em palavras. Talvez seu rosto seja menos vulgar que os demais. E aquele sorriso...

 

11 de janeiro de 2008

 

            Não sei ao certo como essas coisas acontecem, mas eu decidi segui-la (foi depois daquele bendito sorriso), guardar suas coisas depois que jogava fora e tirar fotos do que ela fazia. Não posso me controlar. Eu tentei... Juro que tentei! Acho que se minha mãe estivesse viva eu não faria essas coisas. Iria conversar e ela me ajudaria. Minha mãe sempre achou uma solução para meus problemas. Acredito que elas tenham esse poder. Infelizmente ela não está aqui. Sinto-me sozinho, numa total escuridão. Não consigo pensar em outra coisa que não seja Raquel.

Hoje ela saiu sozinha, depois do almoço. Fiquei esperando voltar. Eu sempre faço isso. Raquel voltou depois de duas horas e vinte minutos com algumas sacolas. Corri para ajudá-la e ela me agradeceu, mas não conversou comigo. Isso me deixou irritado, não vou negar, porque fui tão agradável... Tenho certeza.

 

24 de março de 2008

 

            Eu sei que ela é tão sozinha quanto eu. Trabalha em casa e quase não sai. Na verdade, não me interessa muito com o que ela trabalha, contanto que não tenha muitas pessoas por perto. Eu sei do meu egoísmo, mas seria mesmo egoísmo?

            Nesses últimos meses percebi que seu olhar está distante e chorei tanto. Engraçado que também senti um prazer... Culpa... Eu não consigo controlar. Ela é tão bonita e sozinha, assim como eu. Sinto-me mal quando paro para pensar sobre meu amor. Eu sei que ela me ama, mas eu não consigo me aproximar mais. Por isso, preciso me contentar em abraçar e beijar suas fotos; são tantas. Meu quarto está cheio delas. Poderia ficar escrevendo sobre cada uma das fotos que tenho aqui...  Eu me masturbo olhando suas coisas jogadas no quarto e suas imagens. Maldição!... Depois fico confuso e choro; logo passa, então não sei se devo me preocupar com esse problema.

 

07 de maio de 2008

 

Nem sabia bem ao certo se queria escrever sobre meus sentimentos, faz um bom tempo que não tenho vontade, mas hoje vi na televisão uma reportagem falando de loucura. Para o psicanalista, ou sei lá o que, paixão e loucura podem se confundir. Não sei muito bem se acredito nisso, não me sinto louco. Ele disse que esse sentimento pode nos levar a cometer coisas absurdas, além do limite da razão... Eu gosto tanto de Raquel. Ela vai ficar comigo para sempre.

 

09 de maio de 2008

 

Eu roubo as coisas que Raquel joga fora, não tudo, mas o que consigo pegar (essa rua é tão movimentada). Descobri muitas coisas guardando o que posso. Papéis que ela escreve. Sim, ela escreve. Lindas poesias, mas ela as joga fora e não consigo entender o porquê. Eu já coloquei todas na parede, junto com as fotos. Esses dias eu tirei uma tão bela. Ela está sorrindo para uma amiga. A única que eu vejo aqui – moça magrinha e pequena. Ela não é interessante, então não preciso ter ciúmes dela, lógico que Raquel nunca me trairia com ela. Nunca. Isso me lembra que mandei chocolates para ela. Sim, eu mandei. Descobri, pelo lixo, que ela ama chocolates. Ela até escreveu em um papel de dieta que precisava parar de comê-los. Raquel não precisa disso. PRECISO dizer a ela quão perfeita é. Enfim, eu os coloquei na caixa do correio. Chorei só de pensar como ela deve ter amado o presente. Tenho certeza que ela sabe que fui eu e está com vergonha de vir falar comigo. Não tem problema, pois eu gosto dela mesmo assim. Eu gosto de observá-la do jeito que ela é.

            A única coisa que está me incomodando, nada muito grave, mas estou me masturbando muito pensando nela e depois me sinto mal... Esses dias eu assisti a um filme na televisão e pensei nela... Não é algo que me vanglorie, não há nada bonito nisso. Mas não consigo me CONTROLAR! Tenho que me acalmar, logo não precisarei mais disso.

 

28 de agosto de 2008

 

            Eu descobri... Eu não acredito que isso está acontecendo. Minha mão está tremendo tanto que nem sei se consigo escrever. O que foi que eu fiz de ERRADO? Tudo por ela. Será que a ignorei alguma vez? Não retribuí seu amor como deveria? Ela deve ter se sentido tão sozinha, vulnerável. Tantas perguntas e nem sei como descobrir a verdade. Só sei que descobri hoje que ela está grávida! GRÁVIDA! Não estava no lixo nada sobre isso!

Fazia meses que não pegava esse maldito diário para escrever e hoje eu tive que desabafar meu ódio! Não sei se estou com raiva dela. Talvez Raquel foi somente mais uma vítima, já que nunca vi ninguém com ela. Eu iria saber se Raquel tivesse outra pessoa, lógico que saberia. Se tivesse sido menos distante e mostrado que ela não está sozinha, isso não ocorreria. É minha culpa e preciso resolver este problema! Vou conversar com ela sobre a criança e sobre o pai também. Se... Deus! Se algo aconteceu, eu juro que mato o desgraçado! Agora eu entendi porque seu olhar estava tão distante. Ela está triste com tudo isso! Houve um dia que ela estava com os olhos cheios de lágrimas quando a cumprimentei. Eu perguntei se estava bem e ela disse que sim. Por que Raquel mente para mim, Deus? Eu SEI que sou seu único conforto!

Eu vou jogar esse diário fora... Sim. Eu não me sinto melhor depois de escrever nele. Preciso pensar sobre nosso futuro e não quero ser influenciado pelo o que escrevo. Será que tem sentido isso?...

 

09 de novembro de 2008

 

            Já se passaram tantos meses... Eu não a vejo a dois dias, por isso decidi pegá-lo de volta. Não tive coragem de jogar fora, como falei que faria. Estou preso... Sinto-me fraco, um covarde. Covarde.

            Saí pelas ruas da cidade nesses últimos meses para pensar melhor em tudo. Pensar em Raquel, meu amor e sua barriga que ela tentava esconder inutilmente. Eu sei que ela está sofrendo e que não quer o bebê. Tentei esquecê-la, porque sei que não sou digno de seu amor, mas eu SEI que ela precisa de mim. Estou desesperado! Nesses dois dias que não a vejo pensei que talvez algo tenha ocorrido, pode ter perdido o bebê e então todas as coisinhas que ela comprou não terão necessidades. Preciso compensar isso. Espero que seja isso mesmo que tenha ocorrido... Eu não sou mal, só que não quero perdê-la. E eu sei que a criança vai fazer isso – me separar.

            Pelo menos eu sei que ela continua sozinha, apenas aquela amiga vem visitá-la...

            Eu precisava desabafar. Pensei que nunca precisaria de você e aqui estou novamente! Ainda bem que você estava guardadinho. Minha mãe sempre me disse que tinha mania de guardar as coisas. Dessa vez isso me ajudou.

 

            Vou esperar pela sua volta Raquel. Eu lhe ajudarei a suportar a dor. Prometo.

 

10 de novembro de 2008

 

            Ela voltou! Hoje pela manhã, bem cedinho. Não sei como estou conseguindo escrever, mas se não fizer isso, serei capaz de cometer uma loucura... O bebê está com ela! Está com ela... Eu a perdi para sempre... Sempre...

            Estou descontrolado. Como eu pude? Se tivesse lhe dado mais presentes, se tivesse lhe visitado mais vezes. Eu sempre tive medo e quando conversava com Raquel eram tão poucas palavras. Isso me faz lembrar o dia que fui visitá-la. Seria uma visita tão linda, se ela não tivesse ocupada. Não tive tempo para nada... Eu entendo.

           

            E agora...

            Deus, me ajude! Eu não sei mais o que fazer... Eu preciso recuperá-la e tenho certeza que ela vai me agradecer por tudo que fizer.

 

15 de novembro de 2008

 

            As imagens dela na parede estão falando comigo...

 

Estão rindo de mim.

 

19 de novembro de 2008

 

            Eu sei que o farei. Não estou mais perdido! Vou resolver tudo entre nós dois hoje à noite... Ficaremos juntos, só nós dois.

 

...

 

            Ela está me encarando, mas o que foi que fiz de errado?

Ela ficou assustada quando entrei pela porta da casa dela dizendo que precisávamos ficar juntos e Raquel me pediu pra ir embora gritando! Então eu deduzi... Ela sempre me amou, e agora a criança estava entre nós! Precisava tirar o bebê de nosso caminho.

            Engraçado que ela tentou me agarrar quando disse o que iria fazer, estava chorando muito. Eu tive que empurrá-la escada a baixo, mas não olhei pra trás. O bebê estava dormindo e vai continuar a dormir para sempre.

Que Deus o leve para o bom caminho.

Tão pequeno que minhas mãos nem forçaram nada. Ele chorou tão pouco...

Raquel estava atrás de mim chorando também. Deve ser de alegria. Eu me ajoelhei pra beijá-la e ela me empurrou gritando coisas horríveis que não quero lembrar. Não quero. Levantei-me do chão e disse que não precisava gritar comigo e nem chorar. Era só dizer a verdade que ela escondia – de seu amor por mim, mas ela não me escutou! Saiu correndo escadas a baixo e eu tive que correr atrás dela. Raquel me atingiu com um abajur. Por quê? Ela estava fora de si depois de tudo aquilo! Quando ela começou a gritar dizendo que me odiava e que eu era um homem cruel eu não suportei. Foi com lágrimas nos olhos que a silenciei com o mesmo abajur que ela me atingiu. Ela havia deixado de me amar...

Ela tentou levantar, mas eu a atingi de novo e de novo. Minhas mãos ficaram sujas de sangue e ela ficou me fitando. Por que ela não se mexe? O que eu fiz?

 

Mãe... Eu estou sozinho e perdido de novo.

 

Ela continua me olhando com os olhos cheios de lágrimas e com sangue em toda a cabeça. Ela está tão bonita... O que foi que eu fiz?

 

Ela está morta. Seu sangue...

 

Estou ouvindo barulhos, agora, longe daqui. Gritos... Mãe, é você?

 

FIM- 19/08/09

 Mara L. R. de Sousa

 


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