Ártemis mira no alvo: Um minúsculo círculo feito por sangue em uma das muitas árvores naquela calma e imensa floresta. Estica o elástico até chegar perto de suas coradas bochechas e dispara a flecha, observando a mesma acertar magnificamente o local desejado. 

- Ótima mira! – a deusa escuta uma voz masculina conhecida vinda de cima da árvore. Por já imaginar quem é, ela não consegue resistir e sorri. 

O dono da voz, mais conhecido como Hermes, desce voando graças aos seus tênis poderosos e para em frente a Artemis. 

- Por quanto tempo esteve aí, me espionando? – a deusa pergunta, sentindo ‘borboletas no estômago’, porém demonstrando certa indiferença e mirando novamente em outro alvo. 

- Já faz algum tempo, não consegui resistir. Peço minhas sinceras desculpas.  – Artemis abaixa o arco e observa a feição linda e arrependida do deus. Como resposta, sorri e bagunça os negros cabelos de Hermes. 

- Então, mas e aí? – O deus dos ladrões pergunta, quebrando o silêncio e se aproximando do corpo da moça.

- E aí, o quê? – Artemis responde, fingindo não saber a que ele estava se referindo, e sentindo-se tensa. 

- Aquele pedido que eu te fiz a uma semana. Você aceita ou não? 

“Aceito” ela pensa. E na verdade queria muito mesmo ter Hermes como namorado. Mas não sabia se era a coisa certa a fazer. Ele era um canalha e sem vergonha! Tá certo: era lindo e a seduzia, mas como ia saber se ele não queria só “brincar” com ela? Entretanto, o que ela sentia por ele era muito forte. Quando o deus estava por perto, ela sentia como se seu coração estivesse pulando de alegria. Ainda mais agora, que ele estava quase a abraçando. 

- Sim, eu aceito! – respondeu, esperando alguma reação do companheiro. 

Hermes sentiu vontade de voar, correr e avisar a todos que finalmente teria Ártemis só pra ele. Por tanto tempo a amou em silêncio, mas agora... Agora ela seria sua, sua mulher! Ele queria dar pulos de alegria, mas ao invés disso deu um sorriso abobado e passou as mãos pelo rosto da dama, seguindo para a sua nuca. Então a beijou e sentiu o suave toque das mãos dela em sua face.

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Artemis e Hermes; a Lua e o Ladrão; a Ovelha e o Lobo. Possuíam vários nomes e várias interpretações alheias sobre o novo caso polêmico. Muitas pessoas tinham opiniões sobre este casal com personalidades tão distintas, mas só os dois sabiam como era, realmente, o relacionamento. E para falar a verdade era muito bom.

Felizardos os que puderam apreciar o luar nesta época! 

O fato é que nunca se vira no mundo casal mais apaixonado que este. Os dois estavam sempre juntos, ensinando um ao outro, compartilhando experiências e momentos e desfrutando dos prazeres que lhes eram direitos.

Brigavam às vezes, é claro, Na maioria das vezes por terem teorias diferentes sobre algum aspecto. Mas sempre faziam as pazes. 

Artemis nunca amara ninguém como amou Hermes. Nem mesmo sua mãe ou seu pai. Nem mesmo ela mesma.

Infelizmente a dócil deusa não tinha certeza se tamanho amor era recíproco. Às vezes mentia-se triste e perguntava a Hermes o quando ele a amava. Este a tomava nos braços e respondia:

- Não há grandeza no mundo que se iguale ao meu amor por ti, liebe.

Isso a mantia feliz por alguns dias.

Sua família era contra tal relacionamento.

- Escute o que eu te digo, Artemis. Este homem não presta! Ele vai arrancar seu coração e feri-la. Deixe-o enquanto ainda há tempo! – Ouvia constantemente tais alertas vindas de seu pai e seu irmão, mas ela ignorava-as argumentando que Hermes havia mudado e que ambos viviam muito felizes. 

As reclamações vindas de Zeus e Apolo aumentaram quando Hermes iniciou uma viam de um mês para outro continente, a fins comerciais. 

- Você não deveria confiar neste rapaz. Está longe dele, vai saber o que ele está fazendo agora. E com quem.

A princípio, a deusa não se intimidava com os comentários, mas ao passar dos dias o receio tomou sua mente. Não confiava mais em Hermes como antigamente. 

“Deve ser o efeito da saudade”, pensava.

E quanta saudade! 

Os dias foram passando e com muito custo acabou- se o mês. Mas Hermes não voltou. Ela tentou em vão mandar lhe uma mensagem de Íris: o deus não atendera. Mais meses passavam e seu companheiro continuava ausente. Ártemis, já desgostosa da vida, implorava aos outros deuses que localizassem seu amado, porém ninguém era capaz de ajudá-la. 

- Sinto muito filha. Eu disse que Hermes não valia nada. 

Artemis chorava tanto que parecia não haver mais lagrima dentro de si. Como pode acreditar nele? Como ele pode fazer isso com ela? Estava magra e pálida. Era como se sua vida sumira junto a Hermes. 

Então, de repente, como se fosse da noite para o dia, sua tristeza transformou em ódio. Ódio de Hermes e de todos os outros homens. Mais decidida do que nunca, fez sua escolha e foi falar com Zeus: 

- Quero nunca me casar. Quero a floresta, a liberdade. Farei o que mais gosto: sairei em busca de aventuras pela mata, caçando e apreciando a beleza floral. Peço que providencie algumas virgens, de preferência as que estejam com o coração partido, para me servirem e me acompanharem nas caçadas. Serão denominadas Caçadoras de Artemis. 

- Se é o que queres, assim será feito, minha filha. 

Com seu pedido atendido, Artemis viveu desta forma por longos e longos anos. 

Porém, às vezes no silêncio da noite, quando se deitava para dormir na floresta e observava a agora triste lua, lembrava-se dele, e uma dor surgia em seu peito, pois ela ainda o amava demais. 

- Sinto tanto a sua falta, Hermes...

Mal sabia a coitada que o céu cujo ela tão tristemente olhava era sustentado pelos braços do deus dos ladrões. 

- Por Zeus, Atlas! – Gemia Hermes, não mais suportando o peso do céu segurado por tanto tempo – Deixe-me ao menos ver minha amada novamente! 

Agora o deus dos viajantes tinha os cabelos brancos, o rosto magro e as pernas fracas. Não suportava mais aquela tortura, mas não podia remediar. Não diante da frase ameaçadora de Atlas:

“ Se ousar soltar o céu, as consequências irão para a caçadorazinha.” 

E ouvindo essas poucas palavras foi que ele suportou a dor pela sua amada até o fim. 

A dor de segurar o céu, 

Provavelmente a maior prova de amor... Que ninguém irá conhecer.