bolsos cheios de pedras. escrita por Aphrodite Laclair


Capítulo 2
capítulo 01.


Notas iniciais do capítulo

Eu sei que eu havia dito que a tracklist ia ser uma só para a fic inteira, mas eu não resisto! Sendo assim, voilà: http://8tracks.com/laclairdite/bolsos-cheios-de-pedras-capitulo-01
Tracklist do capítulo um. Ouçam-na, é muitíssimo importante! Principalmente a primeira música.
Eu gostaria de dizer que essa é uma fic que eu estou gostando muito de escrever, e espero que vocês gostem também! ♥
P.S.: o capítulo é pequeno, mas (eu acho) que o tamanho logo será maior.
P.S.2: senhorita Mayumi, seu desafio é um tanto vago e dá espaço para um grande leque de possibilidades de desenvolvimento, então desejo sinceramente que não fique decepcionada com o que acontecerá! >



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Capítulo 01

(as escolhas que fazemos e os caminhos que trilhamos)

envie seus sonhos

onde ninguém esconde

dê suas lágrimas

para a maré

wait — M83

A primeira coisa que devemos saber é que o ano é 1742. Maio de 1742. Sendo específica, 12 de maio de 1742. A segunda, é que existem duas mulheres. Que definitivamente não se conhecem, meu deus, imagina se sim? Matariam-se!

Terceiro, e mais importante, existe a esperança. Sim, como eu posso contar essa história sem apresentá-los a ela? A esperança, sim, ela sim, é nossa protagonista. Mais que aquelas moças que eu já citei. Muito mais. Não estaríamos aqui sem ela. Isso aqui não existiria sem ela. Não apenas essa história, mas toda a história. A história que respira e está seguindo em frente agora.

Existe a esperança e é ela que rege o mundo.

X

O piano surgiu na Itália, em 1709. Em 1714, aproximadamente, a maioria das grandes famílias já orientavam seus filhos a tocarem o intrumento. Em 1742, era de praxe. Rebeka não ea uma excessão à regra. Ela era uma pianista. Ela era brilhante. Mas Rebeka não queria ser só uma filha de família rica que tocava em festas ou bailes particulares. Rebeka queria mais. Rebeka sonhava.

Sim. Aí está ela. A esperança. Ela vai ser nossa constante nessa história. Sinta-se a vontade para segurar na mão dela. Cumprimentá-la.

A escrita é tão primordial quanto a própria humanidade. A escrita é grande, ela respira, ela pulsa, ela se alimenta da alma de quem encosta nela, de quem ousa se colocar como oferenda para ela. Sim. A escrita, ela, sim, é a mais antiga instituição. Não a Igreja. Muito menos a fé. Não. É o ato de sentar e pensar e escrever até que suas mãos fiquem cheias de calos. Julchen amava a literatura. Amava a escrita. E ela não se contentava em escretar para si mesma, em escrever por escrever. Ela não sabe escrever por escrever. Porque ela é mais. Ela é genial, ela pisa em nuvens, ela está atrás de seu pote de ouro no fim do arco-íris.

Olá, esperança, como vai você?

X

Eu prefiro imaginar que existe um lugar onde os sonhos se tornam realidade, onde o sofrimento é banido. Esse lugar tem o céu cor de rosa e os lagos são roxo, a grama é azul e os sorrisos são todos abertos, lindos e verdadeiros. Nesse lugar, ninguém tem que ouvir que não pode ser quem é. Nesse lugar, duas mulheres podem correr atrás da vida que sempre sonharam sem ter qualquer empencilho. Esse lugar maravilhoso não se chama céu, mas se chama paraíso. Um paraíso terreno que um dia ainda vamos conquistar.

Um paraíso ilusional que eu ainda gosto de amar.

X

Ela tem cabelos esbranquiçados e olhos de cor indefinida. Parecem vermelhos, mas talvez não o sejam. Talvez seja só aquela aura de encantamento, de ilusão, de desapego da realidade, que paira em volta dela. Ela usa um vestido simples de cor escura, preto, porque ela gosta de mexer no jardim e não gosta de ter que trocar de roupa o tempo todo. Na verdade, a única coisa que ela gosta é de pensar que ela não está se escondendo, nem fugindo, de ninguém. Que estar numa casinha no meio do nada, bem longe de qualquer vizinho fofoqueiro e desrespeitoso, é só questão de privacidade. Não é como se ela tivesse medo que eles descobrissem demais. Claro que não.

Nos arredores, só há um velho casarão, que está desocupado desde que ela se lembra.

É perfeito.

O céu está se fechando, você pode ver?, mas Julchen não se importa. Porque ela ama a sensação da terra meio molhada entre seus dedos, ou do sol fraco aquecendo e queimando sua pele pálida. Ela adora a sensação que é intocável, inatingível, contanto que fique onde ninguém nunca a ache, nunca a toque, nunca mais.

Contanto que ela deixe de exister para o resto do mundo, ela pode existir para si mesma. Só para si mesma. Para mais ninguém.

Porque Julchen Beilschmidt não existe, apenas John Fables, e com alguma sorte, será assim até o fim dos tempos.

X

Ela é uma mulherzinha baixa e mal humorada. Rígida, dizem todos, sussurram quando ela passa, cansativa demais para qualquer marido, sempre com aquele piano para lá e para cá, piano, notas, partituras. Rígida.

Ela tem os cabelos escuros e os olhos de um tom curioso, seria roxo?, e as mãos dela estão sempre feridas e cheia de calos por tocar o piano insesantemente. No começo, os pais dela não acharam que era nada demais. Era só uma distração e era bom poderem se gabar que a filha deles era, sim, uma maravilhosa pianista, tão talentosa quanto qualquer outra (“e quanto algum homem?” “homem, imagine só! arte é coisa de homem! é só um passatempo da menina!”), claro, talvez até melhor, tenho certeza que melhor. Brilhante, a professora dizia. Brilhante, os pais diziam. Até ela não parar. Nunca parar. Dia e noite, noite e dia. E então vieram os pedidos. Deixe-me apresentar um concerto, papai, mamãe, era o que ela dizia. Naquele tom gelado. Sem expressão.

E então os pais começaram a se preocupar. Eles eram bons pais, não eram? Tinha feito tudo direito, não tinham? Então qual era o problema daquela menina? Por que ela queria tanto tocar em público? Não lhe bastavam as festas? Ela queria ser profissional?! Pois nunca ouvi maior tolice! Falta de marido, quem diria!

Mas ela não desistiu. Era uma garota determinada, aquela. Então os pais a mandaram para uma casa, de uma tia viúva e sem filhos que havia morrido e deixado aquele lugar como herança para a sua sobrinha mais adorada, mais rebelde, mais talentosa. Acompanhada só de uma criada, talvez ela tomasse vergonha. Voltaria para casa implorando por um casamento e totalmente desiludida dessa história de tocar. Definitivamente. Aquelas mãozinhas teriam que ajudar no serviço pesado, e ela nunca havia feito isso na vida, mimada como era, haveria de pedir para voltar. Não duraria nem uma semana!

E ela foi. Ela, seu piano, as partituras e a empregada.

E a esperança foi na bagagem.

Porque Rebeka Edelstein nunca foi nem nunca será mulher de desistir de sonhos.


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