Música De Elevador escrita por Mariana


Capítulo 7
Capítulo 7




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Desde que comecei o novo trabalho, há um ano e meio, ainda não tinha sentido o prazer de tirar uns dias de férias.

Percebi que estava precisando disso, mas a sorte de ter encontrado um trabalho bacana me fazia adiar um pedido quase insano — insano para eles, óbvio para mim — de alguns dias em algum lugar distante daqui.

Percebi neste feriado que passou que fazia muito tempo que eu não me sentia sozinha de fato. Todos os dias, com a correria de ter de trabalhar, ir duas vezes por semana às obras e ter de ser dona de mim mesma me fazia ter uma sensação enganosa de estar sempre acompanhada.

Mas não, eu chego todas as noites em casa, preparo uma xícara de café com leite e ouço aquela música que me faz sentir num episódio de um seriado qualquer.

Eu queria saber quem era o dono dela.

Quem era essa pessoa que ritmava as minhas noites de insônia e cansaço com uma canção que mais me parecia uma ode apaixonada.

Dias depois da reunião do condomínio e do papo na cafeteria com o Gin, parei pra pensar que talvez ele fosse o dono daquela canção que me faz lembrar das tempestades de alguns anos atrás quando vim sozinha morar em Tóquio, quando me trancava no quarto e chorava uma saudade que nunca soube explicar.

“Ei, por que você toca todos os dias essa música?!”, senti vontade de bater à porta do Gin e perguntar, como se tivesse alguma razão para isso.

Não.

Continuei bebendo o meu café, pensando nas coisas que não fazem mais sentido pra mim. Em como me tornei essa pessoa que fica sentada no sofá segurando a tal xícara nas mãos e pensando num desconhecido que toca piano, mas não é nerd, que propõe música no elevador social, que tem cara de poeta maldito e se veste como estudante, mas que é um astro do rock, que mexeu comigo pelo simples fato de eu usar uma regata cor-de-rosa.

Meu Deus, devo ser a pessoa mais carente da face da Terra. Mas convenhamos que o tal do Gin é muito bonito, isso ele é.

E eu queria que ele fosse dono daqueles acordes.

---

Caso eu estivesse na Inglaterra e um inglês olhasse pra mim, diria que eu perdi minhas castanhas. O que significa que eu perdi a minha cabeça.

Essa nem Freud explicaria. Ou tentaria explicar, dizendo que eu estaria sofrendo um processo de regressão, um retorno a um modo de expressão mais infantil, um desenvolvimento anterior. Uma forma de aliviar a minha ansiedade, escapando da realidade e voltando ao meu comportamento de anos passados.

Não encarando a realidade ou tornando-a aceitável, fantasiando pensamentos que te agradaram no passado.

Minhas bolas de gude.

A infância de qualquer ser humano é uma fortaleza, onde a sua única responsabilidade era a prova de matemática daquela professora brava que tinha nome de boneca russa. Minha realidade invisível me forçava a apoiar em algo que pudesse me reerguer.

Lembro-me que, quando criança, eu brincava nos intervalos das aulas com bolas de gude, apostava minhas joias que cuidava com todo o cuidado. Talvez nessa época eu sentisse uma confiança que há muito não sinto.

Havia acontecido muita coisa. O frio que eu nem vi chegar já estava indo embora.

Decidi que precisava dar um rumo na minha vida solitária, por isso me indicaram um psicanalista que inventava de perguntar sobre a minha infância toda maldita vez que eu aparecia por lá.

Eu dizia algumas coisas e inventava outras, ele mexia a cabeça, “sim, sim”, e anotava algo que eu acreditava que fosse sobre mim - deixava o cheque na mão dele após a sessão e voltava pra minha casa.

“Pelo menos está fazendo algo”, diziam meus amigos sem indagar se aquilo tudo me faria bem.

Voltei a prestar atenção nas coisas que aconteciam ao meu redor, nas estrelas e na Lua, na brisa que despenteava o meu cabelo e nas pessoas. Sim, nas pessoas e Rangiku foi a primeira que me chamou a atenção.

Imagino, nós dois subindo as escadas nos beijando, eu a agarraria pela cintura quando entramos no meu apartamento.

Tirava sua roupa e acariciaria todo o seu corpo, sentindo sua respiração ofegante no meu ouvido.

Deitaríamos nus, nos abraçando tornando-nos um só corpo. 


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Notas finais do capítulo

Desculpe pelo atraso. Esses dias andam muito tumultuosos, fico sem tempo para escrever.



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