Eu caminhei apressadamente pelos corredores como sempre fazia no fim do dia, entre a reunião com o Pequeno Conselho e a ceia, apenas ouvindo meus passos contra o chão de pedra e o farfalhar de uma capa às minhas costas que irritantemente não era minha. Eu era sempre seguido de muito perto pelo chefe da Guarda Real, Loras Tyrell...

            As portas de meu quarto estavam destrancadas e eu despedi os serviços de Sor Loras com um aceno mínimo de cabeça que ele retribuiu antes de me ver entrar. Minha rainha me esperava lá dentro, como sempre, sentada em uma das poltronas próximas da varanda, por onde ainda entrava uma réstia de luz do dia para que ela pudesse ler o livro em suas mãos.

            - Como foi a reunião com o Conselho? – seus olhos se levantaram instantaneamente do livro, como se não fosse mais importante e encontraram os meus, me fazendo sorrir ao vê-la largá-lo e caminhar até mim para prender minha cintura com seus braços num abraço carinhoso.

            - Foi como sempre – segurei seu rosto entre minhas mãos e o trouxe até os meus para selar nossos lábios, cheio de saudades. – Longa, cansativa e tediosa... Mas as notícias estão melhorando aos poucos ao que me parece! Eu estou sendo otimista, é claro, mas acho que muito em breve veremos o reino voltar a prosperar!

            - Isso é ótimo, Gendry! – ela sorriu lindamente e fez com apenas aquele sorriso valer todo o meu dia.

            Entrelacei nossos dedos e a puxei para nossa cama, fazendo-a rir. Quando nos conhecemos, Arya encarava com desconfiança toda vez que eu tentava me aproximar dela, mas sua reação agora era bem diferente. Seus olhos brilhavam na minha direção toda vez que me via, eu me sentia mais importante ali só nós dois, do que com aquela coroa sobre minha cabeça, diante de toda Porto Real... Eu adorava poder tê-la em meus braços e sentir o calor confortável de seu corpo.

            - Você parece estressado – ela beijou minhas mãos e acariciou minha nuca. – Quer uma massagem? Eu não sou muito boa nisso, mas você sabe que eu tenho mãos bem firmes – eu gargalhei, deitando-a sobre o colchão e fiquei sobre ela, unindo nossos lábios de novo.

            - A sua presença já me deixa muito mais relaxado! – beijei seu pescoço várias vezes, fazendo-a rir. – O que seria de mim sem você, Arya?

            - Você teria morrido na Estrada do Rei – ela brincou. – Ou em Harrenhal... Você teria Torta Quente como parceiro... Talvez tivesse acabado mesmo na Patrulha da Noite...

            - Eu me esqueci que você não sabe receber elogios – revirei os olhos, caindo deitado ao seu lado e puxando-a para os meus braços.

            Ficamos em silêncio por algum tempo em que apenas nossas mãos se moviam umas nas outras, delicadamente e eu podia sentir uma alegria imensa dentro de mim, como jamais imaginaria que iria sentir na vida. Arya era a coisa mais perfeita que tinha me acontecido e dela vinha todo o resto.

            - Estou tão cansado que poderia dispensar a ceia de hoje... – confessei, escondendo meu rosto em seus cabelos cada vez mais compridos e inspirando o delicioso aroma que subia deles. Arya deu risada e beijou meu pescoço, acariciando minha nuca.

            - Se você começar a pular refeições, não vai mais aguentar sua rotina, Gendry – ela apertou seus braços em torno de mim.

            - Mas eu estou tão cansado... – me lamentei e ela puxou meu rosto para me beijar. – Ser rei não é só chato, esgota todas as minhas energias também!

            - É só enquanto o reino se reestrutura, querido! Depois você não vai mais precisar se reunir todos os dias com o Conselho, não vai precisar dar Assembleias com o povo todos os dias também...

            - Ainda assim, falta muito tempo para isso acontecer... O reino está engatinhando para voltar ao que já foi uma vez... Stannis às vezes parece mais disposto do que eu... Ele devia ser o rei e eu a Mão...

            - Um filho tem direitos antes de um irmão – ela declarou, como sempre fazia quando eu voltava a esse assunto.

            - Eu ainda acho que um filho bastardo não devia ter mais direitos do que um irmão! Eu não nasci para isso! Stannis faria muito melhor!

            - Você tem tomado ótimas decisões como rei, meu amor! Agido com sua própria consciência, muitas vezes contra o que o Conselho ou até mesmo Stannis lhe diz, porque sabe de coisas que eles não sabem! O povo precisava de alguém como eles no trono de ferro, alguém que os conhecesse de verdade, para governá-los! As pessoas acreditam em você, confiam em você! Pelos Sete Reinos, seu povo ora ao Ferreiro para que proteja você contra todos os males que derrubaram seus antecessores! Você se importa com eles, Gendry! É pra isso que os reis servem: para cuidar de seu povo!

            Acariciei seu rostinho redondo com veneração. Arya conseguia restaurar minhas forças toda vez que eu me sentia prestes a desistir de tudo e eu agradecia aos deuses por ela estar ao meu lado nessas horas. Aos deuses antigos dela, aos Sete Deuses de meu povo, ao Deus da Luz que me guiara de novo para seus braços, a todos os deuses que existiam! Agradecia por ela existir e por ser minha!

            Muitas pessoas acreditavam que a função da rainha era dar festas e herdeiros ao rei (eu mesmo pensava assim antes), mas agora eu podia ver que a rainha era a única pessoa com quem o rei poderia realmente contar sempre, com quem podia dividir seus medos, suas frustrações, suas fraquezas... A rainha estava ali para não deixá-lo desistir, para não deixá-lo se render sem lutar! Mas os homens tinham o péssimo hábito de subestimar as mulheres ao seu lado. Eu só não caíra nessa mesma armadilha porque Arya e eu nos conhecemos de uma maneira completamente fora do convencional... Eu sabia que não podia subestimá-la e eu jamais faria isso! Ela era uma guerreira, ela era uma espada afiada, forjada para batalhas... E eu era só um ferreiro...

            Minha rainha com certeza não estava ali para dar festas (Arya abominava tanto aquele tipo de convenção feminina que era capaz de procurar por alguém que se parecesse fisicamente com ela para participar disso em seu lugar), muito menos apenas para me dar herdeiros (apesar de nós dois gostarmos muito de tentarmos)...

            Eu sabia que o reino precisava de um herdeiro meu e logo para consolidar o fim da guerra, o começo da Primavera... Mas não era pelo reino, pelo meu dever que eu ia para a cama com Arya todas as noites... Eu a amava mais do que tudo e eu queria um filho com ela!

            - Eu tenho uma surpresa para você! – ela sorriu lindamente, beijando meus lábios com carinho.

            - Uma surpresa? – eu sorri, intrigado e Arya assentiu. – O que é, meu amor?

            Ela segurou minhas mãos entre as suas, cheia de mistério, e levou-as até seus lábios, beijando-as muitas vezes, com devoção. Eu fechei os olhos, sorrindo. Sorrindo e esperando em silêncio. Ela segurou-as contra seu rosto, aspirando-me as palmas tão duras e calejadas de ferreiro que eu tinha. Depois de um tempo, ela se virou em meus braços, colando suas costas ao meu peito e tornando a pegar minhas mãos, pousando-as sob as suas, em seu ventre e parando ali, virando sua cabeça minimamente para encaixar seu rosto na curva de meu pescoço. Seus lábios colaram-se à base de meu ouvido e ela sussurrou, sorrindo:

            - Você vai ser pai!

            Prendi a respiração e a olhei espantado, enquanto ela ria divertida de minha reação. Desviei meus olhos para nossas mãos em seu ventre e ofeguei, acariciando-lhe a barriga como se pudesse tocar o bebê que crescia dentro dela. Meu filho! Não o filho de um bastardo, mas de um rei!

            Eu, que nunca pensei que teria nada meu, tinha uma família só minha agora! E eles eram meu sonho de primavera!