Caio E Fernanda. escrita por Vanessa Carvalho


Capítulo 1
Capítulo 01


Notas iniciais do capítulo

Nem sempre a primeira impressão é a que fica.



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Era apenas mais um dia na vida da Fernanda. Ela estava chegando ao escritório com seu carro que há tempos estava precisando de aposentadoria, mas, por enquanto, aquele plano de trocar de carro ficaria pra depois. Não vivia sem dinheiro, mas também não ganhava para ficar esnobando um carro novo. Principalmente o que ela queria. Um novo modelo, desses que tem tudo, até mesmo computador de bordo.

Estacionou em seu lugar de costume e pegou o elevador. Estava já com sua tradicional pasta do notebook. Esse sim, de primeira linha. Único luxo que ela se deixou ter. Seu pai ainda quis ajudar, mas ela declinou da oferta. Economizou durante quatro meses para poder comprá-lo.

– Bom Dia, Fernandinha! – Falou Carlos segurando a porta do elevador para poder entrar.

– Bom dia Carlos. Chegou cedo hoje.

– Sim, tenho uma reunião agora pela manhã com um cliente. Está insistindo que o vizinho invadiu em um metro sua propriedade. Caramba, essas pessoas não se cansam de causar problemas.

– Bem, você escolheu ser civilista...

– E você? Soube que seu escritório pegou algo grande, não foi?

– Sim, e está sendo uma tremenda de uma dor de cabeça.

– Por que?

– Bem, existe esse cara, certo?

– Caio Costa? Lembro sim, saiu no noticiário por vários dias que ele enfim foi preso.

– É... E é justamente isso.

– O que foi? O que você achou?

– Nada! Esse é o problema. Mesmo a gente sabendo que o cara é ligado ao crime organizado, eu não achei nada.

– Como assim? Tá dizendo que ele é inocente?

– Pelo menos, desta vez, é sim.

– Seus chefes...

– Eles sabem, por que você acha que eu estou no caso?

– E o que você vai fazer?

– Vou me encontrar com ele mais tarde.

– Na cadeia? Você? Na cadeia? Não gosto disso.

– Ai Carlos... Há muito tempo deixei de ser aquela garota tola. Sei me cuidar sozinha. E estarei cercada de policiais, ele mal não poderá me fazer.

– De qualquer forma, não gosto nada disso.

– Vida de uma criminalista, meu amigo.

Carlos não gostou como ela o chamou. Há muito eles tiveram um caso, mas esfriou por parte dela. Logo ela se cansou dele. Ele era romântico, carinhoso, mas faltava alguma coisa que Fernanda não sabia explicar o que era. Logo o que ela achava que era amor, se tornou numa grande amizade. Pelo menos pela parte dela.

O elevador chegou ao andar dela. Dois abaixo do dele, mas ele mesmo assim saiu acompanhando-a. Essas coisas deixavam Fernanda irritada. Ela não precisava de escolta. E há tempos sentia-se incomodada na presença de Carlos.

– É sério, Carlos, você não precisa me acompanhar até o escritório.

– Eu sei, mas gosto de ficar perto de você.

Se você soubesse que eu não me sinto confortável ao seu lado... – Ela ficou tentada em falar, mas preferiu não falar nada sobre isso.

Abriu a porta do escritório. Sempre chegava cedo e era ela quem sempre abria o escritório. Colocava as coisas em sua mesa, preparava um café para seus amigos, ligava todos os computadores, depois entrava em sua sala e via os recados do dia anterior. Em sua casa evitava olhar e-mails. Mal pegava no computador. Chegava, tomava um banho, comia alguma coisa, lia e logo dormia. Era assim a vida dela há algum tempo.

Os amigos do escritório tentavam leva-la para alguma boate para poder se divertir. Uma rede delas, as mais badaladas da cidade, era o destino preferido dos advogados, mas ela sempre inventava alguma coisa. Há um ano estava tendo um caso com um homem casado, se achava apaixonada, mas sabia que aquele romance proibido não tinha futuro.

Em seu último aniversário, se arrumou toda para espera-lo e a única coisa que recebeu foi uma mensagem codificada dele dizendo que não podia aparecer porque sua filha estava com muita febre e ele e a mulher estavam no hospital. Foi uma das últimas vezes que falou com ele. Claro, no dia seguinte ele apareceu com flores e bombons, mas não foi a mesma coisa.

Sentou-se em sua poltrona e começou a analisar novamente o processo que pegou desta vez. Caio Costa, conhecido empresário ligado ao crime organizado. Ela sempre quis coloca-lo atrás das grades, e ficou com alguma inveja quando soube que ele havia sido preso. Foi com certa alegria que recebeu de seus chefes, o processo, mas logo desanimou. Analisava aquele processo há duas semanas e todos os documentos apontavam para a inocência dele. Ele estava limpo. Desta vez ele não fez nada. Estava em seu escritório quando foi preso. Alguma coisa ligada a um perigoso traficante.

Pelo que ela estudou do administrador, ele nunca mexera com drogas. Vivia em campanhas contra o uso das drogas desde que teve uma irmã que morreu devido ao uso excessivo de cocaína. Ela não entendia. Ele fora preso porque sonegou impostos ou algo assim. Com o passar das semanas criou obsessão sobre este caso e não aceitou mais nenhum.

Se havia uma coisa que ela não aceitava, de forma alguma, era injustiça e pelo que ela estava vendo neste caso, tudo apontava para um antigo desafeto de Caio. Era isso que ela estava estudando quando escutou baterem a sua porta.

Ao levantar a cabeça avistou Inês e Gustavo, os dois amigos mais íntimos que ela tinha. Inês já estava alcançando os 60 anos e desde que a mãe de Fernanda morreu, tomou seu lugar no quesito “cuidar da garota inocente” e Gustavo? Bem, Fernanda era a única pessoa que sabia da sua real condição homossexual. Não eram muito comuns advogados gays e todas as vezes que o assunto era tocado no escritório, ela tratava de mudar para não deixar o amigo incomodado.

Ela, Gustavo e Inês se tornaram uma espécie de cúmplices. Eles dois sabiam do caso que ela tinha com o juiz Pedro e várias vezes Inês a aconselhou a acabar com tudo. Foi nos colos deles dois que ela passou a noite de seu aniversário chorando com o bolo que Pedro deu nela. Todas as vezes que havia audiência com ele, era a mesma coisa. Terminava a audiência e ele pedia para que ela ficasse mais tempo. Ela tentando conversar com ele, logo eles terminavam transando em seu gabinete. Depois que ela chegava em casa, tomava um banho demorado chorando se sentindo suja. Depois que Inês soube disso nunca mais deixou Fernanda participar de uma audiência com Pedro sozinha.

– Estudando o caso daquele administrador novamente?

– É... Não faz sentido Inês... Ele é ligado ao crime organizado, certo? Mas aqui... Nesses volumes ele... Ele é inocente. Quanto mais eu estudo isso, mais me convenço.

– Calma você vai conseguir. Tem uma reunião com ele hoje, não tem?

– Tenho.

– Quer que eu vá com você?

– Não Gu, não precisa não. Pelo que andei estudando, ele é meio arredio com as pessoas. Indo somente uma talvez ele se solte mais.

– É você tem razão, mas tome cuidado, certo?

– Terei.

Perto das 10 da manhã, antes de sair para o encontro com esse cliente em potencial, teve uma reunião com seus superiores. Aparentemente, sua competência estava dando certo. O número de sentenças positivas que ela tinha a ajudou a conseguir um aumento e isso a animou muito.

– Então Fernanda, estamos reunidos com você para lhe dar os parabéns pela sua competência. Não é fácil ter tantas sentenças positivas e ao longo desses cinco anos conosco você se mostrou forte e competente.

– Obrigada Sr. João. Gosto de trabalhar aqui.

– Fico feliz. E a diretoria chegou a um consenso de que seu salário sofreria um aumento de 35%.

– Nossa... Isso é... É... – Ela estava tão feliz que não conseguia nem terminar a frase. - Obrigada Sr. João. Eu agradeço muito.

Fernanda saiu da sala renovada. Aparentemente o dia seria promissor. Se a vida pessoal dela estava uma porcaria, ao menos a profissional estava dando certo. Nunca pensou em pedir aumento, mas aqueles 35% a mais vieram em boa hora. Agora ela poderia pensar em trocar de carro e fazer aquela viagem que há muito estava adiando.

Saiu do prédio do escritório e seguiu para a penitenciária. Agora ela vestira seu mais profissional suéter. Preto básico que combinava com o vestido branco que estava vestindo. Não estava vestida para uma festa de gala, mas sabia que deveria se manter o mais intimista possível. Conhecia a penitenciária e graças a isso, conversaria com Caio em uma sala reservada.

Chegou e logo se dirigiu a sala do diretor, seu colega de faculdade. Conversaram amigavelmente durante algum tempo. Ele querendo abandonar a carreira para seguir em algo mais leve, menos angustiante. Ela sabia que isso iria acontecer mais cedo ou mais tarde. Gostava de Tiago. E deu a maior força para ele seguir seus sonhos.

Enfim um guarda chegou avisando que o “elemento” estava pronto. Fernanda odiava esse tratamento. Por mais errado que a pessoa fosse, ela ainda era uma pessoa, um ser humano. Não era de passar a mão na cabeça de ninguém, mas ele tinha nome e os crimes dele, apesar de graves, não envolviam nada hediondo.

Se despediu de Tiago e foi atrás do policial que avisava todos os procedimentos de segurança que ela já sabia de cor. De alguma maneira estranha ela estava ansiosa em conversar com ele. E quanto mais rápido isso acontecesse, mais tempo ela teria para aproveitar o dia de folga que acabara de ganhar.

Entrou em uma sala e esperou cerca de 10 minutos. Viu um homem alto, moreno claro entrar na sala. Suas feições estavam fechadas. Claro, ele estava preso e estava indo conversar com mais uma advogada metida a besta. Ela suspirou e afastou tais pensamentos.

Ao se sentar, ele permaneceu calado olhando pra ela quanto ela pegava os cinco volumes do processo e colocava em cima da mesa. Estava evitando, ao menos por hora, olhar para ele. Ela sabia que ele a estava analisando e isso a intimidava de alguma forma. Ao terminar de arrumar suas coisas levantou a cabeça. Olhou diretamente nos olhos dele e o que viu foi o olhar de um homem... Com medo.


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Notas finais do capítulo

Aproveitem.



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