Butch tinha terminado a moto naquele momento, tirou a máscara e contemplou o verde brilhante e os detalhes em prata e preto. Ficou satisfeito, foi até a janela pra deixar que aquele odor forte de tinta saísse e o ar ficasse mais respirável ali dentro.

Ele limpou as mãos em um pedaço de estopa e depois passou a mão pelos curtos cabelos negros, se encostando a mesa para poder e apreciar a moto.

Aquele havia sido um trabalho longo, tinha dedicado muito do seu tempo àquele projeto e agora que estava terminada ele sentia uma vontade incrível de apenas ficar olhando pra ela enquanto um pensamento ficava se formando na sua mente.

- Bem, agora que está terminada... – ele começou a considerar. – Ela já não virá mais aqui.

Aquela constatação pareceu soar mais como um lamento. Butch se moveu involuntariamente, não precisou consultar o relógio pra saber que Buttercup estaria ali a qualquer momento, ele também não entendia por que havia se apegado tanto aquela garota e a sua presença barulhenta dentro da oficina.

O camaro 69 preto e de listras brancas parou em frente à oficina, fazendo barulho o suficiente para anunciar a sua chegada.

Buttercup desceu do carro, tirando seus óculos escuros assim que entrou na oficina, ela lançou um olhar sério a Butch, o medindo dos pés a cabeça. Por um momento ele quase vacilou, olhou rapidamente o seu jeans surrado e sujo de tinta e a camisa preta sem mangas tentando enxergar o que estava errado nele.

- O que foi? – ele perguntou fechando a cara diante do silêncio dela.

Buttercup não respondeu de imediato, arregalou os olhos um pouco surpresa e depois sorriu.

- Não foi nada. Estava apenas olhando.

“Olhando?”, Butch abriu a boca, mas as palavras não saíram.
 
Ela começava a se mover dentro da oficina, e foi só então que ele pode reparar no quanto ela estava bonita, estava usando uma calça verde musgo, botas pretas de salto e uma camiseta que revelava bem as suas curvas. Normalmente ela não se vestia assim, aquilo o intrigou, porque Buttercup não estava usando seus tênis de sempre? Ou seu jeans rasgado?

Agora era ele quem a estava olhando, e daquele jeito era difícil desviar o olhar dela, do seu cabelo preto, curtinho, brilhando em cima dos ombros desnudo e branco.

- Onde está? – ela disse se virando pra ele e cruzando os braços.

Butch pigarreou brevemente tentando organizar seus pensamentos. Ele assumiu rápido a mesma postura dela, cruzou os braços e indicou a moto verde no fundo da oficina com a cabeça.

O rosto dela pareceu se iluminar por um instante e ela se voltou pra olhar a moto.

- Ainda está secando. – ele avisou se aproximando um pouco dela.

Buttercup parecia maravilhada.

- Nossa, ficou linda. Mas aparência não é tudo temos que testar o potencial dela! – ela disse com uma ligeira agressividade na sua voz, como se estivesse o desafiando.

- Eu não vou me responsabilizar se você cair e quebrar uma unha... – Butch revirou os olhos com desdém.

Buttercup bufou fingindo irritada, mas depois sorriu e o seu olhar encontrou com o dele.

- Está incrível, Butch. Você fez um ótimo trabalho.

E dessa vez ele vacilou, chegou a bater com os quadris na mesa.

- Até parece, não foi nada de mais pra mim... – ele se afastou indo até a porta da oficina tentando acalmar as batidas doidas que seu coração começou a dar.

Buttercup ainda avaliava a moto, passava a mão sobre o banco de couro, checava a pintura de perto. E os olhos de Butch se perderam no mesmo instante no corpo dela, corpo que ainda não tinha parado para analisar com tantos detalhes assim a mostra, um novo pensamento correu por sua mente, esse pareceu mais sombrio, lhe causou uma fisgada no estomago, e ele não conseguiu se conter.
Ele sabia por que ela estava tão arrumada assim.

- Você... – ele começou sem certeza – Você vai sair com alguém?

Ela não se virou pra responder pra ele:

- Vou. – ela disse se abaixando um pouco pra olhar os pedais da moto.

Butch mordeu o lábio, sua suspeita estava certa, então. Mas do que lhe importava aquilo? Não era da sua conta o que Buttercup fazia ou deixava de fazer.

- Com quem? – ele ouviu horrorizado aquelas palavras se formarem sozinhas em seus lábios, sem que ele tivesse noção que as havia dito.

Buttercup virou-se para ele, tinha um sorriso estranho no rosto, um sorriso daqueles quando ela ficava aborrecida com algo, o sorriso de quem está prestes a esmurrar alguém.

-Quer dizer... Não que eu me importe com que você sai. – Butch fingiu dar de ombros. – Mas deve ser um cara mesmo especial pra fazer você usar saltos.

Ele percebeu que não conseguiu disfarçar o ciúme evidente na sua voz.

- Qual o seu problema então? – ela disse chegando perto dele, o olhando nos olhos, o fuzilando com aquelas orbes verdes franzindo as sobrancelhas escuras.

-Nenhum! – a voz dele falhou o desmentindo. Butch estava irritado com seu próprio corpo por estar lhe contradizendo tão descaradamente. – E que você não se veste assim! Eu quase não a reconheço assim! Nem parece a Buttercup que eu conheço! – ele desviou o olhar rápido para o lado como se a estivesse reprovando.

O rosto de Buttercup ficou vermelho por um instante e Butch se preparou pra levar um soco bem dado no meio da cara.

- Então, você não gosta? – ela disse com o rosto corando. E ele não acreditou no que ouvia, não acreditou quando ela pareceu ficar extremamente preocupada com aquilo, nem em quando baixou os olhos para fitar o chão.

- É claro que eu gosto! – ele gritou beirando o desespero – Você está linda! Mas... Mas, eu não consigo acreditar que tenha se vestido assim pra um cara!

A expressão de Buttercup mudou de novo, ela ergueu os olhos para olhá-lo. Eles se encararam por um instante.

- Você fez um ótimo trabalho com a moto, Butch. – ela começou dizendo.

Ele engoliu seco com a proximidade do rosto dela ao seu.

- Eu lembro quando trouxe a moto aqui pra você. – ela riu. – Você disse que era um caso perdido, que sua oficina não era ferro-velho, que não ia desperdiçar seu tempo em algo impossível.

Butch baixou a cabeça e cerrou os punhos com força, ele pensava no por que de Buttercup sempre mudar de assunto. E ela continuou com o rosto ficando sério novamente.

- Eu vinha aqui todas as tardes, no começo você não gostava muito, reclamava de mais. Mas aos poucos começou a mexer na moto, comprou as peças mesmo eu batendo o pé pra pagar por tudo sozinha. E depois de um tempo vi que estava se divertindo em reconstruí-la.

Ele sabia que aquilo era verdade, mas não toda a verdade. Quando Buttercup apareceu com a moto, seus olhos brilharam com a possibilidade de reformá-la e transformá-la de novo em uma máquina, ele ficou muito contente naquele dia. Mas ele se conhecia e só por orgulho não ia admitir aquilo pra ela, muito menos que estava adorando ter a companhia dela mexendo em tudo, lhe passando as ferramentas, reclamando da bagunça da oficina, falando sobre os gostos em comum que eles descobriam terem durante todas as tardes que passaram juntos enquanto ele consertava a moto.
Butch sentiu vergonha de si mesmo, sentiu vergonha por ter sido implicante de propósito com Buttercup, e por ter a feito pensar que ele não se importava com ela, quando na verdade ficar com ela era tudo que ele mais queria.

Sua mão correu pelo rosto dela e estreitou a distância entre eles a olhando nos olhos e depois inclinando a cabeça levemente para o lado. Sua boca tocou a dela, ele estava triste de mais com a ideia de perdê-la de vez, se pudesse extrair uma recordação daquele momento queria que tudo fosse devagar. Depois Buttercup poderia socá-lo e esbravejar como o de costume.

Ele a soltou, o corpo de Buttercup pendeu mole amparado entre os seus braços. E ela abriu os olhos devagar.

Ficaram um tempo em silêncio antes que os seus rostos começassem a arder simultaneamente.

- Buttercup...? – ele disse baixinho, ainda a prendendo com os braços. – Se eu pedir... Você fica aqui comigo?

Ele a sentiu respirar profundamente. Buttercup espalmou as mãos no peito de Butch e se afastou o suficiente para olhá-lo nos olhos. Mas ele não a deixou falar.

-Eu não sei quem é esse idiota com quem você vai sair hoje, mas eu não quero que vá! – ele disse com raiva.

Buttercup franziu a testa e sorriu.

- Então é isso?

- É! É isso! – ele quase gritou com fúria no rosto dela. – Eu não quero que saia com outros caras! Não que saia com esse idiota!

Dava pra sentir na voz de Butch o quanto era difícil pra ele dizer aquilo.

- Nem que esse idiota seja o cara que reformou uma moto pra mim e que eu o esteja convidando pra ir ao cinema e depois ir comer algo? – ela disse calmamente.

Butch parou horrorizado, um raio o havia acertado.

Os pensamentos confusos foram lógicos os suficientes para que ele pudesse entender finalmente.

Largou Buttercup por um instante e cambaleou apoiando-se na mesa, levando uma das mãos ao rosto.

- Mas que idiota que eu sou... – ele lamentou, morrendo de vergonha de olhar pra ela.

- Tem razão. – ela lhe tirou a mão de frente do rosto. – Você é um idiota!

Butch riu sem jeito para o rosto sorridente a sua frente.

Ele a pegou nos braços a carregando e a colocou sentada na mesa. Afastou-lhe os cabelos da testa a olhando por um segundo antes de beijá-la com força e de envolver sua cintura pequena com as mãos.

- Eu sou um idiota, mas sou o idiota que vai sair com você hoje! – ele riu satisfeito.

Ela achou graça, como se concordasse e passando as mãos em volta do seu pescoço para puxá-lo para um outro beijo.