3 Meses Com Annie escrita por Tamires Nogueira


Capítulo 8
Capítulo 8: Sem Fim.


Notas iniciais do capítulo

Tive que resumir a história porque tinha ficado muito grande :( Mas espero que mesmo assim vocês tenham gostado, e esse é o último capítulo!



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Eu não lembrava mais de contar os dias e até olhar as horas estavam fora da minha rotina.

No dia seguinte, de manhã, minha avó chegou do hospital. Mas ela se recusou a me olhar, e subiu direto pro quarto. E eu nunca pensei que um dia me importaria com isso. Eu precisava arranjar alguma coisa pra fazer, porque eu não queria sair de lá, caso acontecesse algo, e eu não queria ficar parada. Então... Comprei algumas flores, algumas sementes, e fui mexer no jardim. No caminho, ainda dei um vasinho com flores a um velhinho que estava sentado na varanda. Gostei do brilho nos olhos dele. É incrível como coisas simples e pequenas iluminam o dia de certas pessoas. Quando terminei com o jardim, chamei minha avó pra ver.

— Não precisava ter feito nada disso. Essas flores são caras.

Poxa, ela poderia ter pelo menos dito um "obrigado! está lindo", sei lá.

— Não está vendo que eu estou tentando dizer "sinto muito"?

— Então diga.

— Eu acabei de dizer.

— Não. Nem sabe o que quer dizer "sinto muito". Eu estou lutando pra salvar minha vida, e você ai querendo acabar com a sua.

Estão vendo? É disso que eu estou falando. Eu não quero essa parte da vida. Não quero simplesmente esperar a morte, porque meu corpo já não aguenta mais fazer coisas de jovens.

— Por que você faz isso?

— Porque... Eu queria ser como a menina dessa foto... Tão linda e tão cheia de vida. Você era tão diferente. — eu coloquei a foto amassada em suas mãos murchas e enrugadas. 

— Eu não vejo essa foto há tantos anos. Eu era mais velha que você.

— Você era tão feliz... Não sente falta?

— Eu não...

— Então, não aproveitaria a oportunidade se pudesse voltar no tempo?

— Não, não mesmo — ela sorria. — Sabe, Annie, eu era uma pessoa diferente. Eu não sabia nada do mundo, ou de mim mesma. Eu não tinha perspectivas. E isso foi a muito, muito tempo. E todos os dias desde então, cada experiencia que eu tive, cada pessoa que eu conheci deixou uma marca em mim, uma cicatriz ou... Sabe, essa menina, essa criança é apenas uma fração do que eu me tornei. Uma esposa, uma mãe... Uma avó. Eu. Querida, você não faz ideia do que te espera. É tudo uma grande aventura.

— Você tem uma foto do meu pai? Eu queria tanto saber como ele era...

— Nunca viu uma fotografia do seu pai?

— Não... — e pela primeira vez eu chorei por meu pai. 

Ela me abraçou. Por um minuto, eu senti que não poderia soltá-la nunca mais. Eu nunca tinha abraçado ela. Eu nunca tinha chegado mais de um metro perto dela. Mas a buzina estridente e alta de um carro me fez soltá-la para ver quem era o louco.

OU LOUCA!!!!!

— O que ela está fazendo aqui? — eu perguntei pra minha avó, mas ela nao respondeu, e estava tão surpresa quanto eu. Os três meses ainda não tinham acabado! — Karen o que você está fazendo aqui? — sim, eu não chamo minha mãe de "mãe". O nome dela é Karen, e é assim que ela deve ser chamada.

— Annie, entra e pega suas coisas.

— Eu não vou pra casa com você eu quero...

— Você não vai pra casa.

— Entao pra onde... Espera, vai me mandar pro acampamento de reabilitação.

— Vai pegar suas coisas, Annie.

— Que acampamento é esse? — perguntou meu avô, entrando na minha frente.

— É um acampamento para... Crianças como ela. Sem concerto.

— Vovô, por que não me disse que eles estavam vindo?

Ele abriu a boca pra dizer algo, mas Karen interrompeu.

— Eu pedi a ele pra não dizer nada pra você, não queriamos que fugisse de casa.

— Tarde demais!

Eu sai correndo pra longe. A princípio eu corri sem fim, e passei pela praia. E depois... Eu fui para a lanchonete. Mandei uma mensagem pro Vitor, e ele saiu pelos fundos pra me ver.

— Minha mãe está aqui. Ela quer me levar pra um acampamento de reabilitação. O que eu vou fazer?

— O que você pode fazer?

— Deve ter alguma coisa...

— Talvez... você devesse ir pra esse acampamento, e ver como ele é e..

— Você acha mesmo que eu estou perdida e que esse acampamento pode me salvar?

— Sim eu acho que você está perdida. Mas não acho que aquele lugar possa te concertar. Isso só você pode. E se você não quiser, isso não vai acontecer.

Ficamos em silêncio por uns segundos. Ele fitando meus olhos castanhos e eu me afogando em seus olhos azuis. Se eu fosse eu sentiria falta deles.

— Eu sinto muito...Pelo... Lucas. — eu disse, meio gaguejando. Mas eu disse.

— Já é um começo.

Ele me abraçou e me pegou no colo por uns segundos.

— Você tem cheiro de comida... É bom. — eu disse e ele riu.

— Me liga quando tiver as coisas resolvidas?

— Uhum... — eu o apertei mais forte.

Ele voltou pra lanchonete, e eu voltei pra casa andando, sem a menor pressa. Minha avó estava com uma revista, sentada na varanda.

— A caminhada foi boa?

— Karen ja foi?

Ela fez que "não" com a cabeça. E eu parei na porta. Karen saiu com a minha mala.

— O que está fazendo com as minhas coisas?

— Arrumei tudo, já perdemos tempo demais.

— Eu não quero ir, por favor vó deixa eu ficar!?

— Annie, ela não quer você aqui.

— Isso não é verdade! — gritou minha avó.

— Foi isso que disse semana passada.

— Isso mesmo, PASSADA. Se Annie quiser ficar aqui agora, eu gostaria de tê-la aqui.

— Viu, então eu fico!

— Não mesmo!

Eu e Karen começamos uma briga, para quem puxava minha mala mais forte. E ela puxava de lá, e eu puxava mais forte de cá. Eu estava no chão segurando a mala quando meu avô ligou o alarme do carro fazendo barulho pro país inteiro ouvir. Karen soltou a mala e caiu sentada do outro lado.

— Acabou! — Ele gritava. — Eu estou cansado da gritaria, das reclamações, e da policia na minha casa a noite, e minha esposa chateada a cada 15 minutos. E eu não quero ouvir mais nenhuma palavra sobre esse tal acampamento.

— Olha pai, com todo o respeito, mas o senhor não tem nada a dizer aqui.

— Ah, tenho sim, ganhei o direito quando despejou Annie aqui com a gente. Annie precisa de amor, compreenção e paciência.

— O senhor está se ouvindo? Onde estava o amor e a compreenção quando EU precisava? Onde estava isso tudo quando o senhor a deixou me expulsar de casa quando ela não gostava do meu namorado?

— Eu nunca te expulsei, eu só disse que não poderia ficar aqui em casa usando drogas. — KAREN USAVA DROGAS! Acho que eu ia me inscrever em um convento. 

— Vocês dois tem muita coragem em questionar minha capacidade em ser mãe.

WOW! Karen já foi uma "má influencia" como eu. Isso é bom, mais uma coisa pra eu jogar na cara dela quando brigarmos. Mas eu não ia deixar ela fazer isso com meus avós.

— CHEGA! Karen para de falar com eles assim, se é o que você quer eu vou pra esse acampamento idiota, mas eu vou voltar pior do que eu ja sou pra você.

— Não Annie, você fica. — meu avô me segurou pelo braço. — E você Karen, tambem vai ficar.

— Ah não, eu não. Eu tenho meu emprego.

— Mas você também tem férias vencidas. — disse meu avô cheio de certeza.

— É, e que eu ia usar pra viajar pra Posso de Caldas no verão.

— E você vai levar Annie nessa viagem?

— Não, era só eu e Edgar. E você não pode fazer o Edgar passar as férias dele aqui!

— Não vou. Ele não está convidado. Isso aqui é entre você e Annie. Se ele te ama ele pode ficar longe de você por umas semanas enquanto você tenta salvar sua filha.

— É, colocando dessa forma... — Edgar se manifestou, pela primeira vez.

— Você não pode me deixar aqui, Edgar!

— Posso. E eu vou. Tchau!

— Vai me deixar aqui?

— Sim, vou. Vejo você daqui algumas semanas.

Ele entrou no carro quase que correndo. Por um momento achei que Edgar estava feliz por estar se livrando de Karen. E eu achei isso engraçado, porque acho que ninguém mais aguentava ela.

Edgar foi embora, e eu fui pra dentro pra guardar minhas coisas de novo, e Karen ficou reclamando, que é o que ela faz de melhor.

— Isso, fiquei vocês duas ai rindo. Eu nem tenho roupas pra vestir!

— Vovó tem alguns vestidos que você pode usar. — Eu disse sorrindo, e isso pareceu deixá-la com raiva. ÓTIMO!

— Vocês duas são iguaizinhas.

— Obrigada! — eu agradeci, porque eu estava realmente feliz com o elogio e minha avó sorria. E pela primeira vez adorei vê-la sorrindo. 

Arrumei tudo de novo no meu quarto, e mais tarde, desci pra comer algo. Karen e vovó estavam sentadas no sofá, com várias fotos na mesa.

— Annie, vem ver uma coisa... — Vovó foi quem me chamou. — Esse aqui é seu pai.

Ela me entregou uma foto, em que eu estava no colo dele, e minha mãe do lado. Ele se parecia muito comigo. Principalmente os olhos e a boca. Era alto, tinha braços fortes e pele morena. Eu, pálida do jeito que sou,invejei a cor dele. E eles tinha olhos castanhos e fundos como os meus. Mesmo Karen tenho olhos verdes, eu gostava mais dos meus.

— Ele era bonito. Eu sonho com ele as vezes, mas nunca tem a mesma aparência.

— Você pensa como ele, mesmo cérebro funcionando do mesmo jeito... — disse Karen.

— É e eu vo tentar manter o meu dentro da cabeça! — elas riram.

As semanas se passaram, e pela primeira vez em 17 anos, eu estava me sentindo em um lar. Tudo estava bem. 

Oscar Wide uma vez escreveu "Perder um pai pode ser considerado um infortúnio. Mas perder ambos parece descuido." Eu acho que ele tinha razão. Eu nunca senti falta do meu pai porque nunca realmente o conheci. Mas eu sabia que ele tinha sido um bom homem. E apesar dele ter feito o que fez, eu o amava. E agora, oito semanas depois de tudo, eu aprende a ver Karen como minha mãe. Ainda não a chamo de mãe, mas isso é forçar demais. E eu amava meus avós. E eu comecei a desejar um dia estar na vida que eles estava hoje. Mas isso só de vez em quando. Vitor assumiu um namoro sério comigo, e muitas vezes, ele nos divertia contando histórias engraças da prisão. Eu o amava também. Eu não sabia se ele me amava. Mas ele estava lá comigo, todos os dias, todas as horas, e nunca me deixava sozinha. E depois de alguns meses, ele estava lá todas as noites.  Mas o que acontecia nessas noites depende da sua imaginação.

Eu ainda tinha uma fixação por aquele mar. Eu queria nadar afundar... No ultimo dia de verão, meus avós tinham ido fazer compras com minha mãe e Vitor estava trabalhando. Ninguém estava comigo. Aproveitei a chance e me livrei do meu diário, e junto com ele, toda aquela lista, deixei tudo no fundo do mar. Eu poderia ter me afogado ali mesmo... Mas mais uma vez, eu tinha coisas pra esperar e pra viver antes de morrer. Eu tinha pessoas para cuidar, e eu tinha uma vida. Ainda não é a minha hora.

Aqui não é tão ruim. Sério... Não é tão ruim quanto você pensa. O lugar só é ruim se você o faz ruim. Passe a chamar o lugar de lar e ele se tornará tudo o que você sempre precisou. E lá era meu lugar. Era onde eu pertencia, e onde eu deveria ficar. Não pra sempre, mas pelo tempo que eu estivesse viva. Minha vida não teria fim enquanto o que eu amava estivesse aqui. 

Desejo a todos vocês uma vida longa... e feliz! : )


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Notas finais do capítulo

Comentem, compartilhem, recomendem TUDO! Espero que tenham gostado, e em breve estarei aqui com mais histórias pra vocês!!
Até mais xxxx



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