Me deito na cama e suspiro. Fico alguns segundos apenas encarando o teto, perdida em meus pensamentos, quando sou interrompida pelo barulho brusco da porta abrindo. 

- Cassie... - Ashley fala, ofegante. 

- Eu... - ela fecha a porta e se joga no chão, ainda respirando com dificuldade. 

Acredito que seja apenas mais uma das artimanhas de Ashley para eu ficar com peninha dela, então apenas me sento na cama, a encarando seriamente. 

- Fala, Ashley - reviro os olhos. 

- Ah.... eu.... o que eu ia falar? - ela diz, batendo a cabeça no chão. Solto um riso sarcástico. 

- Pelo visto não é só no pulmão que tá faltando oxigênio... 

- Lembrei! - Ashley se levanta e senta do meu lado, completamente descabelada. - Eu vim te pedir.. desculpa. 

-Desculpa? Lá vem... 

- Por favor! Eu achava que estava fazendo algo bom, os dois estavam tristes e obviamente sentindo falta um do outro. De sua parte eu tenho certeza, e pra ser bem sincera, do Daniel não. Mas acredito que sim. Ele tinha meio que uma "crush" em você, então... Sei lá. Você sabe como eu sou! Me desculpa? 

- Santo Deus, Ashley! Como você pôde achar que isso era uma boa ideia? Passei praticamente um ano inteiro tentando superar isso e, quando estou quase conseguindo, BOOM! Ele aparece de novo! 

- Desculpaaaaaaaaaa! Eu sei que sou idiota e muitas vezes ajo sem pensar, mas eu posso tentar mudar! Eu preciso de ti, Cass. Paro para pensar sobre isso durante um segundo, encarando minhas mãos. 

- É, você é idiota - sorrio de canto, enquanto a expressão desesperada de Ashley se transforma em uma de decepção. - E você realmente age sem pensar. Você precisa começar a agir racionalmente, Ash. Senão você vai não só prejudicar à você, mas sim a todos a sua volta. 

- Então... você me desculpa? 

- Ash, eu te amo até do avesso! Eu preciso de você, eu amo suas maluquices e não consigo viver sem elas. Óbvio que eu te desculpo! Mas por favor, comece a pensar um pouco mais nas suas ações. 

- SIM SIM SIM! TE AMO SUA LINDA! 

Ela me abraça forte, nos derrubando e deitando na cama. Essa garota é completamente maluca! 

- Ashley, sai de cima de mim! - falo, com o que me resta de voz, já que ela está me sufocando. 

- Beleza - ela se levanta, parando na minha frente e colocando as mãos nos quadris. - Agora me diz o que foi aquilo lá na cafeteria. 

- Ah eu... Explodi? 

- ALELUIA, SENHOR! CRENDEUSPAI TODO PODEROSO! BORA REZAR AVE MARIA! - ela joga as mãos pro alto e depois junta-as, formando mãos em prece. 

- Que isso?! Virou religiosa agora? Daqui a pouco vira testemunha de Jeová - rio de sua reação. 

- Fiiiiinalmente um pouco de atitude saiu desse corpitchu. Timidez de lado, please. 

- Como assim? 

- Cassie, por favor, você sempre foi dessas meninas quietinhas que não gosta de chamar atenção. E há alguns minutos atrás você praticamente ameaçou todo mundo à sua volta dizendo que ia enfiar café dentro do nariz deles. Não podemos ignorar isso, né? 

- Bom.. é. Sei lá. 

- "Bom... é. Sei lá" - Ashley me imita, debochada. - Amore mio, cê tá de parabéns. Agora é só "explodir" de uma maneira positiva e beeeem menos agressiva! Não tenha medo de viver, baby! 

- Tá bom Ashley, tá bom. 

- AI DEUS, QUASE ESQUECI! Bora planejar tudo o que precisa acontecer amanhã. 

- Ah sim - respondo meio desanimada. Lá vem mais um plano... 

Ela começa pedindo desculpas, dizendo que a culpa é toda dela, e digo que não foi mas, sim, do Daniel. Ashley começa a planejar todos os detalhes, e diz que é pra eu provocar mais do que nunca amanhã. Não sei se estou exatamente preparada pra tudo isso, mas depois da explosão de antes, acredito que esteja mais solta. Assim espero, também. Passamos a tarde planejando tudo, contra a minha vontade, mas sim. Vamos dormir lá pelas 22h, praticamente mortas de sono. 

No dia seguinte, acordo de mau humor, querendo que o dia passe o mais rápido o possível. Ashley e eu nos aprontamos e vamos direto para a sala. Me sinto desconfortável com essa roupa, mas fui obrigada por Ashley à usar. Nunca usei salto na minha vida pra ir na escola, e nem quero usar agora na faculdade também. Mas Ash já se acostumou, é uma patricinha! Sem ofensas, ela não é fresca nem nada, mas o estilo dela é meio assim. Enfim, o caso é que ela me obrigou a usar salto alto, blusa cropped e um sutiã push-up com enchimento. Pra quem não sabe, isso serve pra parecer que tenho mais peito. Ela tá tentando de tudo para eu conseguir meus objetivos hoje quando for limpar a sala de química com Daniel. 

A aula passa extremamente devagar. Parece que o relógio resolveu desacelerar o ritmo por hoje. Quando o sinal finalmente bate para a saída, estou na sala de matemática. Pego minhas coisas e me retiro. Ashley está me esperando do lado de fora. 

- Pronta? - ela pergunta. 

- Ahm... - hesito. - Sim? Eu acho. 

- Mais confiança, por favor! Você está linda, só... - ela procura em sua bolsa alguma coisa, e tira um batom vermelho de dentro. - Bota isso. 

- Nope. Sem chance. Já to toda embonecada, mais o batom vermelho e eu viro você! 

- Táááá, beleza. Então bota esse - ela guarda o vermelho e tira da bolsa um coral. Passo o batom, ela dá mais uma checada em mim, me abraça e me libera. 

Sinto meu coração batendo cada vez mais rápido enquanto vou me aproximando do laboratório. Chego perto e vejo que a porta está aberta. Entro e me deparo com Daniel sentado na mesa lendo um bilhete. Parece que ele ainda não percebeu que eu cheguei, então solto minhas coisas em cima de uma outra mesa, fazendo um barulho proposital. Aquilo o chamou a atenção, pelo visto o pegou desprevenido. Ele prende o olhar em mim, passando os olhos por todo meu corpo. Isso me deixa um pouco sem jeito e começo a sentir minhas bochechas ficando extremamente quentes. Recupero o foco, enquanto ele continua me encarando de boca aberta. 

- Encantado? - coloco uma mão na cintura e me escoro na mesa, rindo. 

- Ãhn? - ele volta pra realidade, enquanto reviro os olhos, ainda rindo. 

- Que você tá lendo? - me aproximo, ficando frente a frente com ele. 

- Err... Deixaram um bilhete pra gente. 

- Tá... - dou uma pausa para que ele continue, mas ele permanece quieto. - E eu posso ler? 

- Ah sim! Claro. 

Ele me entrega o bilhete. O papel está um pouco amassado, e está escrito à mão. 

"Sr. Harris e Srt. Jones 

Por favor, limpem todos os tubos de ensaio, copos de Bécker e tudo o que está na pia. Separei alguns frascos que tem misturas dentro. Não despejem na pia, pode entupir os canos. Passem tudo o que tem dentro para um copo que está no segundo armário, primeira estante. Limpem muito bem, e não esqueçam de esterilizar e guardar tudo depois. Obrigada. 

Atenciosamente, Christina Clarke" 

Srt. Clarke é a professora de química. Dou uma olhada à minha volta e percebo a bagunça. Vários recipientes na pia, uma sujeira nas mesas (graças à Deus não sentei em nada), tudo uma bagunça. 

- Pelo visto temos muito o que fazer... - falo. 

Me viro de costas e vou em direção a pia, porém deixo o bilhete cair. Foi realmente sem querer, mas me aproveitei da situação. Me agachei suavemente para pegar o papel, enquanto Daniel apenas me observava com atenção. Me levanto e, quando me viro, dou de cara com ele, extremamente perto de mim. Recuo, mas não dou nem um passo e já estou escorada na mesa. Ele chega mais perto, me encarando nos olhos. 

- Continua com esse joguinho? - ele pergunta. 

- Que joguinho? - inclino a cabeça para o lado, sorrindo. 

- Ah... - ele solta uma risada e olha para baixo, rapidamente reconectando o olhar. - Você sabe. 

- Uhm... - coloco a mão no queixo, fingindo estar pensativa. - Acho que não, hein. 

- Boa piada. Mas saiba que dois podem jogar esse jogo. 

Ele se afasta com um sorriso malicioso no rosto. Se dirige até o armário e pega o frasco que estava sendo referido no bilhete, colocando-o em cima da mesa. Ele se vira e nota que continuo parada no mesmo lugar. 

- Vai ficar aí ou vai me ajudar? - ele ri. 

- Vou lavar o que está na pia. Vai colocando as misturas aí - digo, indo em direção a pia. 

Vou até lá e começo a lavar os tubos de ensaio. Tem bastante coisa, então vou começar pelos menores. O silêncio plana entre nós enquanto fazemos nossas tarefas. Depois de mais ou menos um minuto, ele derruba um pouco de uma substância no balcão, e vai em direção ao armário (no caso, em minha direção) para pegar um pano. Então é aí que tenho uma ideia. Pego um frasco que tem um pouco de água dentro e ando em direção ao mesmo armário. "Sem querer", tropeço, nos pechamos e "acidentalmente" derrubo água em sua camisa.

- Ah meu Deus, me desculpa! - me aproximo e começo a passar os dedos em seu abdômen, onde caiu a água, suavemente. - Ainda bem que é só água.

Ele olha para meus dedos, praticamente o acariciando e me encara nos olhos. Então ele dá um sorriso suave.

- Sem problemas - ele diz, ainda sorrindo.

Ele se vira e simplesmente... tira a camisa. Sim, isso mesmo. Não consigo evitar e fico olhando para aqueles músculos definidos. Sua calça é bem larga, fica caída na cintura, deixando a mostra parte de sua boxer. Meu bom Deus.

Fico paralisada no mesmo lugar, apenas apreciando a vista. É simplesmente inevitável.

- Encantada? - ele repete a mesma coisa que eu disse quando entrei nessa sala, me fazendo ficar completamente vermelha. 

- Ha. Ha. Ha. Muito engraçado - digo, com irritação. - Bota essa camisa de volta e faz seu trabalho, por favor.

- Por quê? Vai me obrigar? - ele caçoa.

- Se for preciso.

- Ah é? Então vem.

Daniel faz um sinal com os dedos para eu ir para cima. Arqueio uma sobrancelha e ajo sem pensar: parto para cima dele, tentando pegar sua camisa, porém ele é muito alto. E ainda esticando o braço em que a segura-a. fica impossível de pegar. Tento de tudo, até que ele simplesmente me pega no colo e me coloca sobre o ombro.

- Me solta! - quase grito, dando soquinhos em suas costas.

- No way - Daniel ri.

Protesto até que ele me coloca em cima de uma mesa, lenta e levemente. Ele se coloca entre as minhas pernas, com as mãos em minha cintura. Daniel se aproxima, nossos lábios praticamente se tocando, quando me aproveito e retiro a camisa de sua mão e coloco em seu pescoço, o forçando a botar de volta. Ele ri e acaba cedendo, enquanto abro um sorriso vitorioso. Depois que a coloca, retoma a mesma distância de alguns segundos atrás, me olhando nos olhos.

- Você é muito confusa, Cassidy Jones - ele diz, me fazendo rir. - Eu gosto disso.

Dito isso, Daniel se afasta, voltando à seu trabalho. Não evito e começo a sorrir como uma boba. Para não parecer mais idiota ainda, retorno ao meu trabalho, sem conseguir parar de sorrir.

Terminamos nossas tarefas em silêncio, ajudando e respeitando um ao outro, às vezes trocando uma palavra e outra. Pode parecer que a situação ficou esquisita, mas na verdade não. Até que não foi tão ruim quanto eu pensei. Foi... legal? Eu acho. Também, nem sei o que pensar.  

Retorno para meu quarto sorrindo o caminho todo e, quando chego lá, me deparo com uma situação um tanto quanto imprópria.