Ela estava tentando, com todas as suas forças. Estava tentando ser uma versão mais suave de si mesma, ainda que mordida como antes, apenas mais suave.

Ela já leu muito, sobre muitas coisas, entre elas sobre o amor. Ela ouviu músicas e assistiu filmes também, mas ela não sabia o que era este sentimento, ela não o sentiu. Não sobre o amor apaixonado pelo menos, correspondido, caloroso, que a faria sorrir por nada ou por algo bobo... não, esse ela não viveu.

Ela sabe que ama aqueles que deixou para trás, ou que agora estavam distantes, disso ela tinha certeza.

Mas aquele outro amor, aquele que estava nos livros que leu, nas músicas que ouviu, nos filmes que assistiu... esse ela não conhecia.

E por isso ela estava tentando, pelo menos, ser mais suave, mesmo que fosse apenas uma casca mais suave, pois ela entendeu que toda sua fúria, arrogância, orgulho e agressividade precisavam ser escondidas, lá no fundo, e assim seu exterior seria mais brando, mais amigável, mais amável talvez.

Então, com essa decisão tomada, ela deixou sua hipocrisia de lado e se dirigiu ao trem que a levaria a pessoa que fervorosamente lutou pela sua amizade, por anos. E lembrar disso, a fez pensar que ela valia alguma coisa. Pois quando a pessoa mais forte, corajosa e talentosa que você já conheceu e que você mais machucou, quer sua amizade, tem que significar algo.

Ela sabia que era uma tentativa, nada muito concreto ou definitivo, mas como sua idéia inicial em ser mais suave, esse seria um dos passos mais importantes: Encontrar a pessoa que ela mais machucou e secretamente admirou durante tanto tempo, fora do território que marcou ambas, mas que também permitiu que se conhecessem.

Então quando ela desembarcou e pousou seus olhos avelãs nos olhos chocolates, cuja dona lhe sorriu animada e verdadeiramente, ela se permitiu ser o que propôs e sorriu de volta.

O que você não sabia, e que só descobriria depois de muito tempo, é que seu sorriso não fora por causa de sua decisão, mas uma resposta automática ao que lhe fora dirigido. Que ali, em um lugar novo para ambas, seriam verdadeiras pela primeira vez, pois é claro para quem quisesse ver, que a outra também tinha suas máscaras no colégio e você não seria mais capaz de julgá-la por isso, não você, não agora.

O que eram visitas mensais, se tornaram quinzenais e quando elas se tornaram semanais, você entendeu que algo tinha mudado, ou despertado. E como pessoa atenta que sempre fora, começou a observar o que era essa mudança, o que te levava a ir para a estação de trem a cada semana, para tomar o trem ou esperar a dona da voz mais forte que já ouvira. Você observou suas reações a cada sorriso, toque ou olhar recebido da outra, e quando era possível, observava sua próprias ações em torno da morena.

Você já havia lido, ouvido e assistido muitas coisas, mas ainda não sabia nomear o que estava acontecendo.

Até que em uma de suas idas à estação, já no fim do domingo, quando a outra estava indo embora, você viu, ouviu e sentiu seu mundo girar.

“Tive um final de semana ótimo com você.”. Começou a outra, encarando seus olhos avelãs, enquanto os dela começavam a marejar.

“Mas não sei se existirão outros... Se você ainda vai querer...”. Você ameaça interromper o que sabe que seria um monólogo, mas qualquer manifestação é interrompida pela boca carnuda que toma a sua sem perguntas ou hesitação, mas de modo tão suave que você nem tem tempo de acreditar, mas também não afasta a outra.

Então quando os lábios vermelhos se afastam ligeiramente dos seus, você sabe que tudo que havia antes acabou e que você poderá seguir novamente, recomeçar...

“Eu estou apaixonada por você. Talvez sempre estivesse e nunca tenha me dado conta disso. Mas agora eu tenho certeza.”. Disse a dona daquela voz que a fazia chorar de emoção.

Então a outra se afasta e você só pode olhar confusa enquanto ela entra no trem. Você sabe que deve fazer algo, mas seu corpo está imóvel e sua voz não existe.

“E tenho certeza também que não podemos mais manter essa amizade. Então adeus Quinn.” A outra disse, a logo em seguida as portas se fecharam e o trem partiu.

Você não conseguiu se mover até que o guarda da estação veio falar com você, ele perguntou se você estava bem e você só pode olhar para ele, com lágrimas banhando seu rosto e dizer tudo o que sabia.

“Eu a amo.”

Ele lhe sorri doce e informa o horário do próximo trem.

Você sabe, sem sombra de dúvidas, o que significa tudo o que leu, viu ou ouviu. Tudo se resume a ela. A forma como ela lhe olha, lhe sorri, lhe abraça, lhe beija...

Você sabe que não haveria sensação mais poderosa. Você foi vazia por tanto tempo, que teria certeza do que lhe faltava no momento em que encontrasse, ou neste caso, que lhe fosse mostrado, entregue com tanto carinho que você duvidava que fosse real. Foi por isso que você pegou aquele trem. Foi por isso que você praticamente expulsou Santana e Kurt do apartamento, antes de entrar e encontrar a outra chorando copiosamente na cama. Foi por isso que você trancou a porta e delicadamente se aproximou sem que ela notasse. Foi por tudo isso, que você descobriu durante todo esse tempo, com seus livros, músicas, filmes e principalmente com a presença dela, que você se deitou e a abraçou e disse tudo o que você sabia.

"Eu também estou apaixonada por você. E eu tenho certeza que poderemos continuar com as viagens semanais...”.

Ela se vira e tenta sorrir por entre as lágrimas, que você gentilmente seca com os dedos. Então você sabe que precisa daquela sensação novamente, que você também precisa mostrar a ela, por isso você a beija. E você sabe, mais uma vez, que tudo o que leu, viu e ouviu estava correto, mas ainda sim incompleto. Só ela poderia lhe dar o que faltava.

“E eu também tenho certeza que te amo.”. Você diz para a dona do seu coração, mirando aquele mar chocolate.

E quando ela lhe sorri, o mais lindo dos sorrisos, você sabe que fez a coisa certa, que todos os anos de dor e solidão, de vazio, de fúria e medo, valeriam a pena se ela lhe sorrisse daquela forma, se ela aceitasse continuar juntando os seus pedaços, como ela fez desde que vocês se conheceram, mesmo que você não notasse.

E quando ela lhe olha novamente, após lhe dar um abraço apertado e um beijo doce, você sabe que ela aceita.

“Eu também te amo.”.

–----

Há uma manhã que você acorda antes que ela. Ela é linda e você não consegue evitar sorrir, na verdade você nem tenta. Você deixou de precisar se esconder a muito tempo. Pois quando ela lhe aceitou, ela aceitou tudo, sua fúria, seu orgulho, seus medos, seus beijos, seu carinho, seu amor sem limites...

Então você já sabe como vai acordá-la essa manhã, além dos beijos e declarações. E ainda sim, será verdade, como todas as outras vezes.

I know that the bridges that I've burned
Along the way
Have left me with these walls and these scars
That won't go away
And opening up has always been the hardest thing
Until you came

So lay here beside me just hold me and don't let go
This feelin' I'm feelin'
Is somethin' I've never known
And I just can't take my eyes off you
And I just can't take my eyes off you

I love when you tell me that I'm pretty
When I just wake up
And I love how you tease me when I'm moody
But it's always enough
I'm falling fast but the truth is
I'm not scared at all
You climbed my walls

So lay here beside me just hold me and don't let go
This feelin' I'm feelin'
Is somethin' I've never known
And I just can't take my eyes off you
And I just can't take my eyes off you

Off you
Off you

So lay here beside me just hold me and don't let go
This feelin' I'm feelin'
Is somethin' I've never known
And I just can't take my eyes off you
And I just can't take my eyes off you

“Eu não te provoco quando você está de mal humor.” Diz a voz sonolenta próximo ao seu ouvido, enquanto a dona dela lhe abraça por trás e encosta o queixo no seu ombro.

Você sabe que é mentira, que ela está fazendo drama, o que lhe faz gargalhar enquanto larga o violão e a joga sobre a cama.

“Claro que você faz. E não faça beicinho Berry.” Você diz brincalhona, e quando ela faz o tal beicinho, você resmunga. “É mais difícil resistir quando você faz beicinho”.

O que a faz sorrir e lhe dar um beijo, lento e doce, antes de lhe encarar.

“Obrigada pela música. Ainda que muita coisa tenha se acertado, me deixa tão feliz quando você me mostra como se sente.”.

Você sabe que se continuar nessa linha ela vai chorar, e lhe parte o coração vê-la chorar, mesmo que seja por algo bom, então você a beija novamente para depois encarar o farol da sua vida.

“Eu te amo. Todos os dias e cada dia mais...”.

Ela lhe sorri, eliminando a cara de choro e você pode continuar.

“E eu tenho me esforçado, para não me trancar novamente, mesmo que desde que estamos juntas eu só tenho motivos para sorrir e me alegrar.”.

Ela grita de excitação e lhe puxa, até que esteja confortavelmente deitada sobre seu peito, o que você pensa que é perfeito.

“E eu decidi escrever e contar como me sinto. Como um dia eu fui salva da dor, tristeza e solidão, de como tudo que eu já conhecia, nos livros, músicas e filmes representaram quando eu conheci e pude sentir o amor. E isso Rach, sempre será sobre e para você.”.

E quando ela lhe olha, você pode ver o amor e o orgulho em seu rosto, e você sabe, que não poderia fugir disso, que você seria sempre dela, mesmo que ela não a quisesse mais. Que você a amaria por toda sua vida, e seria sua melhor amiga, sua confidente, sua amante e companheira. Você tinha certeza de tudo, você finalmente sabia o que era sentir sobre tudo o que conhecia. Então você soube que não era mais necessário uma casca suave, você só precisava da pessoa certa para se tornar o que ela precisava e sentir o que lhe faltava.

Então você sabe que um dos seus autores favoritos estava certo, mas assim como outros, também incompleto.

“It takes courage to grow up and become who you really are.” (e. e. cummings)

Mas agora você sabe que para crescer também é necessário amor. Pois agora você o sente, finalmente.