O Sol Negro E A Lua Branca escrita por Gabby


Capítulo 25
Invasão


Notas iniciais do capítulo

Oie! Queria agradecer infinitivamente pela recomendação da Byakuya Manêro, e por isso escrevi logo o capítulo dessa fic (devia ter att minha outra fic antes, mas paciência...) Vocês também já devem ter reparado que eu postei o link da playist das notas iniciais, e que a capa mudou! Paint já era, agora é photoshop! Também queria recomendar uma page no face, a Fanfiction's Universe, principalmente para quem quer capas divosas para as fics e/ou trailer, e não sabe mexer com edição (eu).
Os leitores que deixaram review no capítulo anterior foram: Kevyn, Néphély, Riven, Byakuya e Firefly. Imensamente grata por eles!
PS: Dei uma pista do passado da Yoruichi no capítulo anterior, mas acho que ninguém sacou.



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Grimmjow levantou a calça, incomodado com tanto barulho nos corredores do castelo. Uma jovem estava na frente dele, nua, a pele morena como canela. Ela dirigiu um olhar por dentro de seus cabelos cacheados.

—Não consegue terminar seu trabalho? —ela indagou, o olhar selvagem e os lábios grossos em um pequeno sorriso irônico.

—Cale a boca, sua putinha mestiça. —Grimmjow a empurrou até a cama, onde a mulher caiu, mostrando as presas e franzindo o nariz. Ele lhe dirigiu um olhar demorado, como que pensando o que faria com ela. Ela era linda, o corpo com várias curvas bastante formosas. E o satisfazia como nenhuma outra empregada; elas eram medrosas, fracas. Apenas ficavam caladas enquanto Grimmjow as estuprava. Já a mulata, Bonni, era indolente —o que, consequentemente, a tornava perigosa. Toda cheio de desejo, e de nenhuma vergonha, o sexo que tinham era quase consensual. —Você não ouve todo esse alvoroço, não?

Percebendo o olhar de Grimmjow, ela abriu as pernas e jogou a cabeça para trás, junto com seu cabelo revolto.

—Ouço sim, mas não ligo.

Nos corredores do castelo, ecoavam passos de pessoas correndo e berros. Grimmjow não podia dizer que aquilo era raro —afinal, seu pai adorava caçar no castelo, assim como vários de seus protegidos e até mesmo ele —mas os sons pareciam mais altos naquela noite.

—Há algo de errado. —Grimmjow comentou.

—Com você, é claro. Quando enfim conformo-me com você me comendo, nem isso consegue fazer.

Grimmjow a ignorou e mirou a porta, aguçando sua audição para filtrar algo importante.

Que merda é essa?! —ele ouviu um lobisomem dizer. —São invencíveis!

—São demônios, isso sim. E dane-se a ordem de Barragan; vamos fugir enquanto ainda temos chance. —o homem arfava, correndo. —Ele pensa que pode derrotar o próprio Satã.

Grimmjow colocou sua camisa, apressado em sair do quarto.

—O que aconteceu? —Bonni perguntou, subitamente alarmada.

—Demônios estão invadindo o Hueco Mundo.

Grimmjow correu até a porta, sem se dar o trabalho de fechá-la, deixando Bonni lá sozinha.

—Como se este reino não estivesse cheio deles. —ela retrucou, se esparramando na cama.

///

O sangue de Hiyori ainda estava viscoso na mão de Yoruichi. Ela já conseguira estancar o sangramento, mas temia que a menina houvesse perdido sangue demais enquanto tentava cura-la. A verdade é que Yoruichi nunca fora muito boa em curar pessoas, e sim em machucá-las.

Enquanto a carruagem corria, o cocheiro se esforçando o máximo, Yoruichi repassou todas as vezes que teve sangue nas mãos. Ficou ainda mais triste ao perceber que eram muitas.

Hitsugaya olhava para o corpo quase inerte de Hiyori, manchando os assentos de vermelho escuro. Quando ela chegara dessa forma na carruagem, ele questionara e muito. Yoruichi estava cansada demais para responder-lhe as perguntas, então pediu a Halibel que contasse uma mentira qualquer, sobre ladrões de estrada. Toushiro, obviamente, ficou demasiado preocupado —mas não tanto quanto se dissessem que a família estava sendo atacada por demônios.

Halibel estava quase impassível, ao lado de Toushiro, cuidando dele. Só era preciso olhar para os olhos da licantrope para notar que não era a primeira vez que acontecia algo parecido com ela. Havia acontecido alguma coisa em sua vida, que fez com que ela se fechasse para sempre. Para proteger-se de futuras mágoas.

O cérebro de Yoruichi não conhecia esse sistema.

Embora soubesse que seus amores iriam morrer, tanto de velhice quanto de maldição —alguma coisa sempre tornava a acontecer com seus amores —Yoruichi não conseguia parar de se apaixonar. Por homens e mulheres. Lobisomens, vampiros, elfos e magos. Com centenas de anos de idade, era impossível ter apenas um tipo.

Ainda haviam os amigos, que em sua maioria também eram imortais —feiticeiros—ou quase imortais —fadas. Tinha alguns que ela não via havia séculos, mas isso não importava. Medida de tempo não era algo nada importante para seres que não respeitavam o tempo nem um pouquinho. Cedo ou tarde, eles se encontrariam novamente —afinal, o mundo não era algo tão grande quando você tinha milhares de anos para percorrê-lo.

A carruagem, de súbito, parou. Yoruichi ouvia alguns barulhos, mas nada que fosse muito significante para a parada. Olhando para a janela, percebeu que já estava no Hueco Mundo —a imagem da miséria era inconfundível. Halibel parecia estar escutando alguma coisa, captando algo com sua audição de lobo, e seu rosto estava em uma mistura de confusão e alarme.

Yoruichi ouviu os passos de seu familiar, Hisagi, antes de ele enfim abrir a porta. Um familiar era um ser que os feiticeiros poderiam invocar quando precisassem de proteção. O familiar de Yoruichi tinha uma aparência forte, cabelos tão arrepiados quanto os de Ichigo, pele branca —embora bronzeada —e várias cicatrizes que ele havia ganhado por causa de Yoruichi.

—O que houve? —perguntou Yoruichi, sendo acompanhada por um burburinho incompreensível de Toushiro.

Hisagi inclinou a cabeça. Tinha audição, força e visão superiores a de Yoruichi, embora a feiticeira o superasse em muitas outras coisas. Parecia um lobisomem, embora não tivesse presas nem garras.

—Há algum problema no Hueco Mundo. O castelo... Recomendo que a senhora não vá lá.

—Ele foi invadido. —explicou Halibel.

Os burburinhos de Toushiro estavam compreensíveis agora.

—Invadido? Não pode ser! —ele saiu da carruagem, sendo acompanhadas por Halibel, sua reação retardada por causa da surpresa —Eu prometi a ela... Hinamori!

Ele correu pelas ruas rumo ao castelo, que não estava tão longe assim.

Yoruichi olhou para Hiyori e Hisagi, tentando tomar uma rápida decisão. Ela não podia fazer nada significativo à Hiyori, mas as pessoas do castelo ela ainda poderia salvar.

—Vamos, Hisagi! —ela saiu da carruagem. —Precisamos matar uns demônios.

///

Dentro do castelo, estava um caos. Pessoas corriam por toda parte; Yoruichi precisou até mesmo usar magia para não ser empurrada junto com a multidão. Todos estavam desesperados, fugindo de algo, e ela não duvidava que, se alguém caísse, seria atropelado sem dó pela multidão.

Ela não via nem Halibel nem Toushiro na multidão; também não notava nenhum demônio, embora a energia demoníaca fosse aterradora. Sabendo que os demônios estavam possuindo pessoas, seria difícil de reconhecê-los no meio da multidão.

Ela apertou o braço de Hisagi.

—Concentre-se na multidão! —ela berrou para ser escutada no barulho, enquanto eles iam vagarosamente avançando. Parecia que atravessam um rio de correnteza fortíssima. —No sangue, nos berros e nos olhos das pessoas!

Ele apertou os olhos.

—Sinto muito, minha ama. Eu não consigo.

Yoruichi respirou fundo. Sua mente foi invadida por imagens de relógios, gelos e galáxias. Logo ela estava sozinha em meio a um mar de estrelas, sentindo-se poderosíssima. Poderia controlar tudo, até mesmo o tempo.

E foi o que fez.

Quando Yoruichi abriu os olhos, a confusão estava congelada, e o tempo estava parado. Era uma das mágicas mais poderosas de um feiticeiro, e exigia enorme poder. E a magia não era ilimitada, por isso eles tinham que localizar os demônios logo.

Yoruichi ficou parada, respirando com dificuldade, todos os eventos que deveriam ocorrer pesando sobre seus ombros, a sobrecarregando. Eram muitos passos, muitos berros, muitas mortes, para adiar.

Hisagi rapidamente correu entre a multidão, observando aqui e ali um demônio. A única maneira de se matar um, tirando as laminas abençoadas, era cortar as cabeças. Hisagi rapidamente desembainhou sua espada e foi decapitando vários corpos possuídos, que tinham uma vida antes da possessão. Porém, não era hora para remorso. Era hora para a morte.

—Hisagi, —choramingou Yoruichi —é o máximo que consigo aguentar.

Tendo morto sete demônios —provavelmente havia centenas deles —Hisagi caminhou até Yoruichi, que mordia os lábios, aguentando todo o peso dos eventos. Quando perto dela chegou, todos os eventos voltaram a acontecer normalmente —uma enxurrada de pessoas, vindo em direção a eles. Hisagi protegeu Yoruichi com seu corpo, aguentando toda a selvageria das pessoas fugindo, como animais encurralados.

Segurou a moça no colo, enquanto ela abria espaço em meio as pessoas, como Moisés uma vez fez no Mar Vermelho. A feiticeira fornecia um escudo em volta deles, usando a magia poderosíssima que obteu ao longo dos anos.

De súbito, avistou uma cabeleira azul. O príncipe do Hueco Mundo: Grimmjow, correndo para o lado contrário da multidão.

Yoruichi se fortaleceu, usando uma magia ainda mais poderosa. O escudo agora não só bloqueava as pessoas, mas as jogava para longe. Yoruichi não olhava para o que acontecia com elas, porque se não temia que tivesse pesadelos de noite, provenientes do remorso.

Era uma guerra, afinal de contas. E Yoruichi não sobreviveu até hoje por ser boazinha nelas.

///

Hitsugaya já havia passado da parte da multidão, e agora trilhava caminhos pelos corredores menos utilizados. Ele sabia que Momo era inteligente, e, com sorte, teria se escondido em algum desses corredores.

Ele ouvia o ruído da batalha nos corredores mais utilizados, inclusive uivos desumanos, mas fora isso os corredores por quais passava estavam silenciosos. Avistara alguns corpos estirados no chão, estraçalhados, que sabiamente decidiu ignorar.

Estava com mais medo do que gostaria de estar. Às vezes, imaginava pessoas nos corredores, sombras, que nada mais passavam do que sua imaginação. Pensava em Rukia, Byakuya —atacados por ladrões de estradas— e pensava em Hinamori —seu reino invadido por bárbaros. E quanto mais pensava nisso, mais notava que era coincidência demais os dois fatos ocorreram simultaneamente. Estavam mentindo para ele, e Hitsugaya certamente descobriria a verdade —se saísse vivo daqui.

Quanto mais caminhava, mais preocupação o atingia. Mais arrependimento de ter saído daquela carruagem.

E se ele morresse?

E se Momo já estivesse morta?

E se Toushiro apenas havia atraído todos para cá, para a morte iminente?

Balançou a cabeça, convencido de que pensar apenas piorava a situação.

Foi quando escutou um barulho de passos e uma sombra surgiu pelo corredor. Convencido que era mais uma vez a sua imaginação o pregando peças, murmurou para si mesmo:

—Fique calmo, Toushiro. Isso nada passa de uma alucinação.

Ele ficou surpreso ao ouvir a resposta da sombra.

—Não uma alucinação, mas um pesadelo. Eu sou o seu pesadelo, criança.

A sombra chegou mais perto, revelando-se ser na verdade uma mulher. O cabelo castanho preso em um coque, o vestido dourado manchado de sangue, assim como os lábios, com caninos afiados como pinças. Os olhos tão negros quanto os de um tubarão.

—Uma vampira. —ele concluiu, recuando.

—A casca certamente era de uma. —o ser zombou. —Mas eu sou o que habita nela.

—D-demônio?

O ser arreganhou um sorriso, mostrando as presas, enrugando sua pele como se estivesse usando uma máscara.

—Espertindo, para quem ninguém nunca lhe contou nada. —o ser se aproximou de Hitsugaya com passos elegantes. —Seu pai já caçava minha espécie, assim como essa sua familiazinha adotiva. E a sua preceptora, Halibel, que na verdade é uma guardiã. Além da sua namoradinha vampira. Nenhuma dessas pessoas lhe contou nada. São falsas. Você sabe que são, Hitsugaya. —o demônio pronunciou seu nome muito lentamente, aplicando uma mistura de charme com deboche.

— “Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte... —Hitsugaya recitou, fazendo o demônio sibilar.

—Você realmente acha que vai adiantar alguma coisa? —o demônio riu, de modo exasperado. —É melhor calar essa boca e...

—... não temerei mal algum, pois tu estás comigo;

O demônio fez caretas, irritado com as palavras. Parecia que havia uma formiga dentro de sua pele.

—Cale a boca! —sua voz se desfilou, ficando rouca e metálica, como se estivesse perdendo o controle do corpo.

—... a tua vara e o teu cajado me protegem.”¹ —Hitsugaya finalizou, logo em seguida sendo empurrado para a parede por uma força invisível.

O demônio caminhou até ele, gargalhando. Sua mão estava levantada, como que controlando a força que estava suspendendo Hitsugaya.

—Você pensou que um versinho da bíblia iria de proteger? —o demônio debochou, gargalhando em seguida.

A entidade foi fechando a mão de forma vagarosíssima, apertando o peito de Hitsugaya, privando-o de ar, pressionando suas costelas para que quebrassem. O menino mal podia gritar, pois ar lhe faltava pelos pulmões.

E então, como um anjo vingador, Hinamori Momo apareceu. Veloz como nenhum outro humano conseguiria, ela cortou a cabeça do demônio com um rápido movimento com a mão e com as unhas. A cabeça caiu um pouco antes de Hitsugaya cair, os dois fazendo barulho. Ignorando o sangue vermelho escuro do demônio no chão, ela correu até Toushiro, o levantando.

—Hinamori! —ele a abraçou, gostando da sensação de enfim vê-la, de enfim tocá-la com ternura. Sentia-se, mais do que nunca, salvo.

Hitsugaya se surpreendeu quando ela não retribuiu o abraço, apenas se afastou. Seu vestido de empregada estava rasgado, sujo de sangue, assim como suas mãos e seu rosto, que não estava assustado ou doce —estava duro.

—O que você está fazendo aqui?

—Eu estou... Estava pretendendo te salvar. —ele respondeu, de modo hesitante.

—Eu não posso ser salva, Toushiro. Não tenho alma. —ela respondeu, virando-se de costas para ele, pegando sua mão. —Já você, pode. —um sorriso afetado iluminou sua face. —Venha. Achei Halibel.

///

Toushiro nem ao menos sabia que as duas sabiam o nome da outra, mas levou em conta que costumava não prestar atenção na relação das outras pessoas. Rukia dizia que isso era egocentrismo, mas só agora levava em conta que ela podia estar falando sério.

Afinal de contas, Halibel nem estava tão longe assim. Ela esperava, encostada em uma parede, os braços cruzados e o olhar atento. Tinha um arranhão aqui e ali, mas não parecia muito machucada, embora tivesse sangue em suas mãos.

—Graças a Deus! —ela exclamou. —Você está bem, Hitsugaya?

Ele assentiu, sorrindo para ela de forma fraca. Ainda respirava com um pouco de dificuldade por causa da prensa na parede, mas as seqüelas de verdade haviam ficado em sua mente.

—Me desculpe por fazê-la vir até aqui, Halibel. —a intenção de Toushiro era apenas fazer uma afirmação clara, porque realmente estava arrependido, mas assim que ele abriu a boca sua voz fraquejou, ficou embargada. Halibel já havia corrido até ele e o abraçado quando as lágrimas correram.

—Shi, shi. —ela tranquilizou, afagando seus cabelos. —Está tudo bem, Toushiro. Você tem um coração nobre, minha criança, não podia ficar olhando sem fazer nada.

Ele fungou, libertando-se do abraço dela.

—Eu sou um inútil. Sou um fraco.

—Isso não é importante. —cortou Hinamori. —O importante é a sua intenção, Toushiro. E a sua intenção foi de ajudar. —a doçura da voz de Momo evaporou as lágrimas de Hitsugaya. —Você é puro; realmente não deveria saber agir em uma situação dessa.

—Não deveria precisar agir. —falou Halibel, em um tom amargo. —O mundo é um show de horrores, mas pessoas como você não deveriam precisar vê-lo.

—Pessoas como vocês também não deveriam precisar. —ele afirmou, tristonho.

—Engana-se sobre a nossa inocência, Toushiro. —Momo replicou. —Tenho sangue nas mãos; sou amaldiçoada. Sou uma aberração.

Hitsugaya olhou para ela, a face jovem cheia de ternura e medo.

—Eu não acredito nisso. Não consigo e nem quero.

Escutaram um barulho de passos no corredor.

—Rápido. Precisamos sair daqui. —alertou Halibel.

Ela segurou a mão de Toushiro e correu, o puxando consigo. Hinamori acompanhou, com os passos tão leves quanto os de um fantasma. —Rápido! Eu conheço um esconderijo! —anunciou Momo, ficando na frente de Halibel.

Ela a seguiu, puxando Hitsugaya. Após alguns minutos de corrida, sem nem ao menos olhar para trás, os três foram parar debaixo de uma escada, em um quartinho pequeno e abafado para guardar tralhas.

—Podemos nos esconder aqui até a legião passar. —falou Hinamori.

—Temo que não. —Halibel olhava pela fechadura. —Eles sabem que estamos aqui.

///

—Pai, precisamos sair daqui! —Grimmjow avisou. —Eles vão invadir tudo, matar todos, inclusive o senhor!

Barragan olhou para Grimmjow como se ele tivesse falado alguma loucura. O homem estava sentado em seu trono de ouro, quase soldado a ele, com uma feição rigorosa.

—Esse é o meu castelo e ninguém me tirará dele!

—Mas, pai...!

—Mas nada, Grimmjow! Este reino me pertence, e para governá-lo eu enfrento o próprio Diabo.

—É exatamente o que o senhor está fazendo. —ele replicou. —Pai, pai, eu te imploro! —Grimmjow ajoelhou-se aos pés do pai. —Deixe esse trono e venha comigo. Podemos conquistar o reino de volta, eu te prometo!

Barragan suavizou sua expressão e, por um momento, ele pensou que o pai viria com ele. Tocou o rosto de Grimmjow com a mão, com suavidade, o repousando em seus joelhos.

—Grimmjow, eu lhe amo. Você sabe disso, não?

—Claro que sei, meu pai. E eu também lhe amo, mais que tudo e que todos.

—Pois então prove esse seu amor. Fique aqui com seu pai.

Grimmjow desvencilhou-se de seu pai, das mãos já velhas e calejadas dele. Olhou para seus olhos com desespero.

—O senhor está perdendo a lucidez. Iremos morrer se ficarmos aqui.

Ele afagou os cabelos azuis do filho.

—Lembra-se o que eu disse sobre o amor, Grimmjow?

Grimmjow foi iluminado com compreensão e colocou sua cabeça no colo do pai.

—O amor machuca.

—E também mata. —uma voz interrompeu o momento dos dois, melodiosa e suave, seguida por uma risadinha aguda.

Grimmjow levantou a cabeça para saber quem lhe dirigiu a palavra. Eram três homens, todos vestindo branco. Um era negro, com cabelos compridos e olhos de um branco leitoso. O outro era um homem com aspecto doente, esquelético porém elegante, com cabelos prateados e pele pálida, portando um sorriso afetado, que ia de orelha a orelha. Parecia divertir-se com a situação, como se fosse uma grande piada. E o terceiro, que aparentava ser o líder, era um homem elegante e esbelto, com cabelos castanhos presos para trás, e um rosto sereno.

—Q-quem são vocês? —Grimmjow indagou, se levantando. Seu objetivo era que sua voz soasse firme, porém esta tremeu.

—O Príncipe das Moscas, o Príncipe da Luxúria, o Rei dos Shekmitas². —respondeu o homem negro. —Os arqui-demônios, emissários do Caído...

—Temos muitos nomes. —interrompeu o de cabelos prateados. —Mas isso não importa. Os nomes de nossos receptáculos também não são importantes. Dominamos Ciel e logo dominaremos Hueco Mundo também.

—Ciel³? —Barragan riu. —Engraçado demônios comandarem um reino com esse nome.

O de cabelos prateados inclinou a cabeça.

—Você gostou? Fui eu mesmo que escolhi.

O que parecia o chefe dispensou o comentário do outro com um aceno de mão.

—Gin, é melhor que fique quieto. Tem uma língua grande demais para deixar-lhe que fale. —a voz aveludada que falara com Grimmjow era desse homem, com ar de realeza e elegância. Ele virou-se para trás, mirando uma coluna de pedra, sorrindo. —Shihouin Yoruichi, peço que saia dessa coluna e traga seu familiar. Decepciona-me que uma feiticeira tão poderosa, filha de um dos meus mais queridos amigos, use um truque tão amador. Realmente esperava mais de você.

A imagem da coluna de pedra tremulou e dela saiu Yoruichi e Hisagi, com passos cautelosos. Yoruichi encarava os três demônios com ódio, enquanto desviava por alguns segundos o olhar para Barragan e Grimmjow.

—O que é isso? Feitiço de camaleão? —comentou Gin, o demônio de cabelos prateados. —Me parece mágica de mago. Ei, Sousuke —ele se dirigiu ao chefe—, a filha de Leviathan não está dormindo com um mago? Se me lembro bem, sim.

Yoruichi tremeu de raiva, porém se controlou.

—Por que vocês usam o nome dos seus receptáculos, hem? —ela se esforçou para colocar o mesmo tom de deboche na voz quanto a de Gin tinha. —Por que não diz logo para todos os seus nomes? A-za...

Yoruichi não conseguiu completar o nome, pois Gin a levitou e a pressionou na parede, arrancando seu ar. Ele começou a falar rápido demais, em uma língua demoníaca. Yoruichi sufocava, seus pulmões pressionados pelas costelas.

Hisagi não podia deixar que isso ocorresse. Lançou-se, de supetão, em cima de Gin. Concentrado em Yoruichi, ele não viu o ataque. Caiu junto com ele e juntos os dois rolaram.

O ataque deu brecha para várias outras coisas, que ocorreram muito rápido. Grimmjow e Barragan atacaram os dois demônios restantes, que estavam distraídos com Gin e Hisagi. Yoruichi libertou-se, lançando o feitiço mais poderoso que podia invocar no momento.

Dentro do castelo, na sala do trono, ela fez chover água benta por um breve momento. Os demônios arderam como vampiros no sol, porém eram muito poderosos para morrer só com aquilo.

E Yoruichi sabia disso.

Vendo que Gin ainda mantia Hisagi ocupado —mesmo queimando, o demônio continuava a lutar com ele —e o mesmo se seguia entre Barragan e o outro demônio; Grimmjow era a única companhia de fuga. Ele havia atacado Sousuke, mas o demônio desviara. Sousuke não parecia tentado em atacá-lo de volta, nem em ajudar seus amigos. Estava apenas parado, a água benta derretendo partes de seu rosto como se fosse cera, olhando para Yoruichi e sorrindo. Não berrava como os seus companheiros, estava sereno e disposto a deixá-los ir. Não achava que eram ameaça para ele e nem para seus planos.

Mesmo relutante em aceitar a piedade de um demônio —mesmo seu pai sendo um, isso nunca se mostrou muito inteligente— ela segurou Grimmjow pela mão e o levou, correndo com ele.

O tempo todo o garoto esperneava, chamando pelo pai. Quando ele urrava em meio à multidão e usava a força bruta, era necessário que Yoruichi usasse sua pouca magia que ainda restava e o deixasse mais dócil.

Ela estava quase desmaiando quando enfim chegou à carruagem e utilizou sua magia para tocá-la, fazendo-a andar em um ritmo gradual, fugindo daquele reino imundo. Esparramou-se em uma poltrona e fechou os olhos —havia usado magia demais naquele dia, e podia morrer de exaustão se não dormisse—, achando que seu trabalho estava finalizado, quando ouviu um ruído de confusão de Grimmjow. Levantou a cabeça e notou Hiyori ainda desmaiada na carruagem.

—Está viva. —anunciou ele.

—Mas não por muito tempo. —ela encostou a cabeça no vidro da carruagem, vendo o Hueco Mundo se distanciar. Suas pálpebras estavam pesadas, e tanto sua mente quanto seu corpo ansiavam por descanso.

—Você não vai curá-la?

—Não. —Yoruichi respondeu simplesmente. Mesmo se quisesse morrer, usando uma magia já no negativo, esta não seria suficiente. Hiyori iria morrer, de um jeito ou de outro. Assim como Hisagi, que com certeza morreu em sua fuga; pois a dor de perder um familiar é incomparável, é como perder uma parte grande de seu ser, e era exatamente o que Yoruichi sentia no momento.

—Acho que irei transformá-la.

—Para ela morrer de vez? Está muito fraca para a transformação em licantrope.

—Vai morrer de qualquer jeito. —retrucou Grimmjow. —Vou Transformá-la.

Grimmjow segurou o corpinho flácido de Hiyori no colo, mordendo-lhe com uma delicadeza espantosa no ombro. Ela tremeu, como se estivesse tendo um ataque epilético, mas no fim ficou imóvel novamente.

Então Grimmjow fez algo ainda mais espantoso: ele chorou. Não apenas uma lágrima ou duas, mas um choro de verdade, cheio de soluços e água salgada. Yoruichi percebeu, então, que Grimmjow não estava tentando reviver Hiyori —estava tentando reviver seu pai.

Com um soluço sanguinolento, Hiyori acordou. Ela abriu os olhos por um breve momento antes de desmaiar novamente —eles estavam dourados, feito olhos de lobo.

///

O próprio Diabo estava batendo na porta de Toushiro, Halibel e Hinamori. A porta pulsava, os demônios sibilavam. Eles haviam colocado todos os móveis pesados frente à porta, para conter a invasão. Porém, tanto Toushiro quanto Hinamori e Halibel sabiam que aquilo não ia durar para sempre; apenas para conseguir tempo para formular um plano.

—Talvez possamos berrar rezes, e isso os incomode. Vai dar tempo o suficiente para fugir. —sugeriu Toushiro.

—Não, não vai. —Halibel discordou. —Há dezenas de demônios à nossa porta; nem todos irão ouvir as rezes, nem mesmo se gritarmos tanto que nossas cordas vocais explodam. —ela olhou para Hinamori, que se encolheu. Se de fato tivesse que rezar, suas cordas vocais explodiriam mesmo.

—Acho que nossa decisão é óbvia. —disse Momo, em voz baixa. Relutante. —Devemos entrar na batalha, esgueirar-nos pelos demônios e lutar. Nem todos irão sobreviver, mas pelo menos um deverá conseguir fugir. —Ficou implícito, para Halibel, que quem deveria fugir era Toushiro. O único puro, o único que não tinha sangue nas mãos.

—Concordo. —falou Halibel. —Eu retirarei os móveis. Hinamori abrirá a porta —será o primeiro obstáculo entre os demônios e Toushiro— e então correremos.

Toushiro engoliu em seco. Parecia um péssimo plano, mas ele não queria ser covarde.

—Preparados? —Halibel perguntou, posicionando-se na retirada dos móveis.

Hinamori assentiu.

—Sim.

Toushiro não viu alternativa se não o fazer também.

—Sim.

Halibel tirou todos os móveis e Hinamori adiantou-se para abrir a porta. Os urros demoníacos ficaram ainda mais poderosos depois disso, e o cérebro de Toushiro ainda mais nebuloso.

Ele se viu em uma espécie de túnel, um tipo de casulo, protegido pelos corpos de Hinamori e Halibel. Ele via algumas partes dos rostos horrendos dos demônios, tentando ataca-lo. Ouvia gritos de dor, urros, mas não sabia de quem eram. Sangue esguichava nele —quente, nojento— e ele novamente não fazia ideia de a quem o sangue pertencia.

Sentiu Halibel fraquejar cada vez mais, assim como Hinamori, mas enfim Halibel tombou. Ele olhou para trás, para o corpo mutilado de Halibel, e não pôde fazer nada mais que chorar e gritar, chamando-a pelo nome. Mas, obviamente, ela não o respondeu.

Estava morta, afinal de contas.

Momo o puxou pelo caminho, protegendo o que conseguia dele com seu corpo, arrancando cabeças de demônios.

—Falta pouco. —falou ela, embora Hitsugaya nem mesmo visse luz. Não via nada, para falar a verdade.

Sentiu criaturas o arranhando, até mesmo o mordendo, e gritou de dor. Logo depois se arrependeu, pois a condição que Halibel se encontrava era muito pior.

Enfim a luz da lua surgiu, e eles saíram do castelo. Rolaram pelo morro íngrime, que dificilmente podia ser escalado sem uma corda. Deveriam ter morrido na queda, mas de certa forma Hitsugaya sentia que Halibel ainda o protegia.

Toushiro e Momo desapareceram da vista dos demônios quando entraram na Floresta Proibida, proibida até mesmo para eles por ser território de outro povo mítico: o Povo das Fadas.


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Notas finais do capítulo

1- Salmos 23:4
2-Raça de demônios meio humanos meio cabras.
3-Céu, em francês.

Capítulo imensamente grande e porcariamente revisado, porque tô escrevendo por cinco horas direto e tô cansada. Queria tê-lo postado antes, mas acabou que eu tive uma crise de fata de criatividade, mas acho que agora a danada já tá voltando.
Tem essa leitora, a Ray Shimizu, que tá começando a fic agora e já deixa comentários enormes. Ela gosta muito do Hisagi, e por isso eu o botei na fic. Mas daí eu matei ele '0' Não sei como ela vai reagir quando chegar aqui.
Quem descobrir o nome verdadeiro dos três demônios, ganha a pergunta que quiser.
Feliz ano novo adiantado, aliás!