Antes Que Seja Tarde escrita por Mi Freire


Capítulo 11
Desentendimentos.


Notas iniciais do capítulo

Coisas não muito boas estão por vir, preparem-se. Nem tudo é um mar de rosas, nem mesmo para aqueles que se amam.



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Meu orgulho era tão grande que eu não a procurei. Enganei Malu dizendo estava ocupado só para não ter que conversar com ela e a ouvir falar do priminho irritante. Evitava-a de todas as formas possíveis, até me sentir confortável para dizer que aquilo já havia passado e eu estava bem.

Na faculdade as coisas estavam ficando corridas com tantos trabalhos e deveres. Já nem tinha tanto tempo para me irritar com os outros que não tinham nada a ver com o meu mau humor.

O dia 23 de fevereiro chegou marcando um ano de namoro. Passamos o dia juntos, fazendo de tudo um pouco, tudo que sentíamos falta. Comprei para Malu um colar banhado a ouro. Ela agradeceu, ficou maravilhada. Abraçou-me tão forte que eu lamentei ter evitando-a durante dias, quando o que mais queria era estar em seus braços.

— O que você tem? Vamos, desembuche – ela ordenou. — Lembra quando eu disse que já te conhecia mesmo em tão pouco tempo? Sei que tem algo a me dizer.

— Não é nada. Só estava com muita saudade. Estive tão ocupado, mal tive tempo de lhe telefonar.

— É. Mas o que importa é que nessa data especial estamos bem juntinhos, certo?

Mas era bom demais para ser verdade, logo as coisas voltariam a ficar sem brilho. O tal priminho, Fernando, estava no meio sempre que tentávamos ficar juntos.

Ele tagarelava do novo emprego, do cursinho na mesma faculdade de Malu, dos novos amigos, das roupas de marca, das notas altas. Ou seja, coisas que só Malu achava graça, para mim não passavam de assuntos chatos e indesejáveis.

— Conte-nos as viagens que vez pelo mundo. Aquela pela Europa no verão passado – pediu Beatriz agarrada ao imbecil do namorado, provocando-me com seu olhar de insuportável.

Eu só sabia de uma coisa: aquilo só me afastava cada vez mais de Maria Luíza e eu gostaria que ela soubesse disso também.

Não posso dizer que não tentei ser amigável, pois tentei criar certa intimidade. Tentei. Eu juro que tentei. Do meu jeito, mas tentei. Mas aquele sujeito não facilitava as coisas. Vivia se gabando para as meninas, tentando se mostrar melhor, tentando fazer piada de tudo.

Quantas vezes eu liguei para Malu no meio da noite e ouvi suas gargalhadas enquanto ela tentava dizer que estava curtindo o final do dia com os amigos no shopping.

Sim, eles tinham um plano. Queriam acabar comigo e com a história que construí com ela. Tentei me mostrar forte, deixei meus amigos de lado para ir atrás dela do outro lado da cidade, mas não foi fácil.  

Era cansativo demais e parecia estúpido da minha parte. Ela não reconhecia meus esforços. Não percebia o medo que havia estampado em meus olhos. E eles riam. Riam na minha frente do quanto eu era um tolo.

Nossa intimidade acabou se perdendo, vivíamos mais longe um do outro do que perto e, na maioria das vezes, brigávamos. Sem ela ao menos saber o porquê, como se não pudesse adivinhar, como se eu tivesse que dizer que estava errado sempre.

Passei a dedicar meu tempo ao trabalho e as horas extras, chegando em casa cansado, sem nem tempo para comer. Minha vida? Não era nada fácil, ficara ainda mais difícil desde que aquele ser apareceu.

Maria Luíza também já não era mais a mesma. Ela não fazia ideia do que se passava aqui dentro de mim, o medo, o desespero, as tentativas de ser alguém melhor a cada dia.

Para ela a vida era um mar de rosas. Malu não trabalhava, só ia para a faculdade à noite. Durante a tarde fazia o cabelo ou as unhas e já saia com eles para zanzar no shopping.

Nada era como antes. Passamos a nos ver uma vez ou outra no mês e era como se aquilo bastasse para ela. Mas para mim nada bastava. Claro que eu sentia sua falta, queria seu corpo no meu, ouvir sua voz antes de dormir. Apesar de tudo eu ainda era apaixonado por Maria Luíza de Andrade.

— Nossa, você está com uma cara horrível – comentou Guilherme durante o intervalo na faculdade.

— Eu sei – dei de ombros, tomando ao meu guaraná gelado. — Estou dando muito de mim nos últimos tempos.

— É deve ser, mas sei que anda está brigado com a namoradinha, não é? – perguntou ele.

 — Sim, mais ou menos. Estamos brigados da minha parte, porque para ela tudo é tão normal sempre.

— Só pode ser aquele magrela do primo dela que veio de Curitiba, não é? – ele disse alterado. — Amanda quando me liga fala o tempo todo dele.

Ri da situação, não tinha o que dizer, nem se quer estava com saco para discutir com Guilherme sobre Fernando.

Em casa, minha mãe já sabia o porquê de minhas mudanças de comportamento, já que antes eu nunca havia sido tão ridículo, tão ignorante e exagerado. Tentávamos conversar de uma forma amigável, mas Pedro ainda era o único que ainda conseguia me tirar da lama.

— Mãe, estive pensando em ir morar perto da faculdade, com os meninos. Seria tão mais fácil para mim e tão menos cansativo. O que você acha?

Foi uma ideia que tive durante uma conversa com Bruno, um dos amigos de classe de Guilherme. Eles tinham uma república que ficava atrás da faculdade.

Ele dividia o aluguel com mais um amigo, Lucas, e também com Guilherme que havia se mudado para lá nos últimos dias. Só restava uma vaga, que certamente seria preenchida por mim.

Não tinha o que perder, só tempo a ganhar. Simplesmente ia ser muito bom, até demais. Sabia que sentiria falta da arrumação de mamãe, sua comida maravilhosa e companhia de Pedrinho, mas lhe garanti que viria aos finais de semana para dormir com ele.

Ainda devia satisfações para Malu, mesmo sabendo que a nossa relação não estava muito bem. Contei a ela sobre os novos planos, ela pareceu contente e concordou que seria melhor para mim como eu já havia imaginado.

Cansado daquela situação, após a minha mudança resolvi deixar as birras de lado, jogar fora o orgulho e tirei um dos finais de semana para ir com ela a casa dos pais. Infelizmente, o primo ainda estava por lá. O orgulho da família. Tentei parecer o mais natural possível e até que me dei bem.

Durante o jantar, conversávamos quando o senhor Mateus elogiou meu desempenho em sua empresa e disse o que os seus funcionários diziam sobre mim.

— Como retribuição, estou disposto a transferi-lo para a central da construtora pertinho da sua faculdade. O que acha? Lá você passará por um novo estágio e terá um novo aumento de salário – ele dizia sorrindo.

Todos saldaram a minha importância, inclusive Fernando que não me pareceu nem um pouco forçado ou irônico.

Eu dormiria lá naquela noite. Estava tão feliz. Tinha uma nova casa, um novo emprego e a namorada de volta. A mesma Malu carinhosa e prestativa de outros tempos.

Fizemos amor por toda a noite. Ah, como eu gostava daquilo. Como se a qualquer momento eu pudesse explodir pela felicidade transbordando dentro de mim.

— Diz que me ama – sussurrei baixinho.

— Eu te amo, Daniel – ela sussurrou no meu ouvindo, fazendo-me estremecer enquanto acariciava meu corpo nu.

Voltei para casa no domingo à noite, ainda muito feliz por todos os acontecimentos. Tudo tão normal. Até o céu voltara a fazer sentindo com as nossas pazes. Dormi tranquilamente aquela noite, pronto para uma nova maratona.  

— Onde está o colar que lhe dei aquela noite no hotel? – perguntei dias antes de Malu partir em uma viagem ao Nordeste a trabalho da faculdade.

— Ah, eu me esqueci – ela deu de ombros. — Deixei em casa, acho que no banheiro. Tirei quando tomava banho.

Aquilo me incomodou, pois gostava de ver Malu usando as coisas que eu dava a ela com tanto carinho.

Maria passou uma semana fora. Uma semana que me deixou cheio de saudade, principalmente porque ela não cumpriu com a promessa e deixou de ligar algumas vezes. Mas tudo bem, eu aguardaria ansioso para revê-la.

Eu estava gostando muito de morar na república. Os garotos eram legais e cada um respeitava o espaço do outro. Às vezes, a casa ficava bagunçada pela ausência de uma faxineira, mas limpávamos sempre que possível.

A geladeira vivia vazia, já que costumávamos comer em restaurantes, barzinhos ou lanchonetes. Uma amizade surgiu rapidamente entre nós, fazendo com que saíssemos muitas noites para aproveitar. A mudança de emprego me ajudou na organização das coisas que eram minha responsabilidade.  

Quando Malu voltou, levei-a para passar uma noite conosco. Ela adorou conhecer todos e logo se tornou amiga deles, que sempre a tratavam com respeito.

Ainda com altos e baixos, nosso relacionamento voltou a ser firme e estável. Ultimamente, ela gostava de contar como vivia do outro lado da cidade e, mais uma vez, digo: como é bom poder ouvir sua voz.

— Quero te ver – disse ao telefone. — Ainda hoje.

— Venha se divertir conosco. Estamos em um barzinho perto de casa.

Cheguei em casa, tomei um banho e troquei-me em questão de segundos. Lá estava eu pegando outra lotação só para matar a saudade da minha princesa, mesmo sabendo que ela estava acompanha de suas amigas. Mas ainda assim, quem mais me incomodavam eram Fernando e Beatriz, a insuportável.

Liguei novamente para garantir que estava indo na direção certa. Aquelas ruas eram de paralelepípedos, prédios altos, lojas de luxo e todas as decorações clássicas. Nada que se comparasse onde eu costumava frequentar.

Avistei-os de longe, era um barzinho grande com luzes fluorescentes, música ambiente ao fundo, mesas de madeira e janelas de vidro. Para uma sexta-feira à noite, a rua estava pouco movimentada.

Lá estava ela! Usava um vestidinho preto de seda com um salto alto. Estava de deixar qualquer um de queixo caído. Ao seu lado estavam algumas amigas que eu nunca tinha visto e um dos únicos garotos, além de Murilo, era Fernando que estava agarrado à mão de minha namorada.

Não entendia o porquê de tanta intimidade. Sim, eram primos. Mas não precisa ir tão longe. Era meu ciúmes de novo?

Quem deveria estar em seu lugar era eu. Nada justificava aquela cena patética. O sangue quente me subiu a cabeça. Não era algo que alguém havia me dito, eu mesmo observava de longe a intensidade daquela situação.

Bufei furioso, minha maior vontade era quebrar tudo ali. Por sorte, nunca fui de brigas. Afastei-me sentindo os olhos se encherem de água. Como se eu acabasse de saltar dentro de um buraco negro.

Já não bastavam todas as minhas suspeitas, todo meu sofrimento e pensamentos contraditórios? Agora mais essa!

— Você está demorando – ela disse assim que lhe atendi, ao fundo ouvia a risada das amiguinhas. Grande bosta! Como se a minha presença fosse mudar alguma coisa.

— Não me faça de trouxa Maria Luíza – disse em meio a tanta fúria. A face queimava. Eu nunca havia sentindo tanto ódio dela em tanto tempo de namoro. — Resolvo aparecer depois de um longo dia cansativo e me deparo com o seu priminho querido segurando a sua mão como se vocês fossem um casal.

— Do que você está falando, Daniel? – perguntou ela, como se não soubesse. Se fazendo de desentendida. Tola.

— Não me enrole, Maria. Decidi ir embora ao me deparar com essa maldição. Já não bastava toda a raiva que eu sentia dele em ver vocês para cima e para baixo juntos? Agora a certeza de que não eram coisas da minha cabeça – soltei.

Feito um bebê caminhava até em casa chorando, sem me importar com a distância. Nada importava. A cena era a única coisa que ainda me incomodava. Esfregava as mãos no rosto tentando não parecer tão estúpido na frente das pessoas que passavam ao meu lado. Chutei algumas pedras pelo caminho. Queria mais é que todos se explodissem. Fossem para a puta que pariu. Não tinha amor, não tinha sentimento. Só ódio.

E me peguei pensando se era a primeira vez que Malu dava dessas comigo. Ou foi apenas mais uma de tantas? Se meus pensamentos fossem mesmo verdadeiros, estava decidido a terminar nosso relacionamento. Não iria suportar a ideia de que outros a tocavam com tanta intimidade.

Chegando em casa, bati a porta do quarto com força, deixando todos espantados com tamanha estupidez. Enfiei algumas roupas dentro da mochila e sai rumo à casa da minha mãe.

Tudo o que eu mais queria era alguém para poder contar naquele momento, alguém que me compreendesse acima de tudo e me fizesse um carinho que tanto sentia falta.

Para minha sorte, Pedro já dormia. Quando vi mamãe, abracei-a com força e chorei mais. Só depois de um grande esforço, consegui dizer a minha mãe o que estava entalado na garganta. Ela ouvia-me com atenção, os olhos tristes em me ver chorar por uma menina estúpida.

— Quando estiver mais calmo, procure Malu para conversar e diga tudo o que sente. Seja forte e corajoso para dizer o quanto as coisas mudaram no seu ponto de vista. Sei que ela irá entender e tentar melhorar. Vocês se amam acima de qualquer desentendimento.

— Não, mãe! – disse indignado. — Maria tem que crescer para perceber coisas que não precisam ser ditas. Ela tem que correr um pouco atrás de mim. Quantas vezes eu fui atrás dela em busca de um perdão quando ela menos esperava? E ao contrário? Quantas vezes isso aconteceu? Nenhuma! Chega! Chega de bancar o idiota. Eu sempre estou lutando para o melhor do nosso relacionamento. E ela? O que está fazendo? Nada! Tudo que faz é estragar dia após dia.

Bati a porta desejando não ter acordado Pedro. Tranquei as janelas sem dar nenhuma importância para a lua cheia. Fechei os olhos desejando dormir sem ter que pensar nela ou em nada do que nos tinha acontecido naquele dia.


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Notas finais do capítulo

É muito chato que o nosso casal esteja passando por desentendimentos, não acha?
Agora me dê a sua opinião: Quem está com a razão? Daniel com seu ciumes básico? Malu que quer aproveitar a nova fase de sua vida? Ou nenhum dos dois?
Tem mais sugestões? Deixe seu comentário! Participe!



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