Arremedo escrita por magalud


Capítulo 4
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Aquele que tem guacamole



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/3583/chapter/4

Capítulo 3

Quando Harry desceu rumo às masmorras, viu Madame Pomfrey subindo pela escada adiante, e ela trazia uma expressão de tristeza no rosto. Harry não parou para questioná-la e, em questão de minutos, viu que tinha tomado a decisão certa. No corredor, ele ouviu barulho de vidro quebrado, e correu para o laboratório, cuja porta estava escancarada.

 

Sev estava com as mãos apoiadas no balcão, os olhos fechados, e no ar havia um cheiro acre de vinagre. Ele parecia ter uns 30 anos.

 

– Você se machucou? – Harry entrou, preocupado. Havia cacos de vidro em vários lugares, como se vários potes de ingredientes tivessem caído no chão. – Ouvi o barulho de vidro quebrando!

 

– Você quer dizer, como isso? – Num gesto rápido, ele arremessou um grande jarro com conserva de folhas de figueira-brava contra a parede. O vidro se espatifou espetacularmente.

 

– Sev! – Harry usou a varinha para limpar a sujeira, alarmado. – O que está fazendo? O que aconteceu?

 

O arremedo estava pálido, trêmulo, dentes cerrados numa ira incontida.

 

– Nada aconteceu, Potter – rosnou entre os dentes. – Pode voltar a seus afazeres.

 

– Não até me dizer o que aconteceu. – Ele olhou o caldeirão, do qual saía uma fumaça muito preta. – E não me diga que nada aconteceu, porque você arruinou uma poção, e um Mestre em Poções não costuma...

 

– "Ah, eis o embaraço!" – citou Shakespeare, interrompendo Harry furiosamente. – Pois eu não sou um mestre de Poções, não é verdade? Ele é quem é.

 

– Mas é como se fosse, Sev. Você é...

 

– Eu não sou ele! – punhos cerrados – Nunca fui! Não precisa me tratar como um velho conhecido, porque eu não sou! Tenho exatos 11 dias de vida, completando quase 30 anos! Sou apenas uma coisa passageira, um hortifrutigranjeiro exótico de prazo de validade extremamente limitado! Descartável, é isso que sou! Uma cópia, e, como toda cópia, barata e ruim! QUE VAI MORRER!

 

O gritou ecoou pela masmorra. Fez-se silêncio por vários minutos, muitas batidas de coração.

 

Então era isso. Harry compreendeu num átimo e perguntou, quebrando o silêncio:

 

– Foi Madame Pomfrey, não foi?

 

O homem de quase 30 anos olhou para ele, os olhos brilhando, e assentiu sem uma palavra. Sua respiração era rápida.

 

Depois ele confirmou, em voz baixa:

 

– Eu só tenho mais alguns dias de vida, ela disse. Talvez três. Quando eu atingir a idade que ele tem hoje, eu vou... expirar. Ela quer me operar antes disso.

 – Sev – Harry estava de coração partido. – Sev, eu sinto muito, muito mesmo. 

– Não há nada que possa fazer.

 

– Talvez haja – o Gryffindor sugeriu. – Quem sabe se pesquisarmos algum feitiço... Hermione pode ajudar. Sim, isso, Hermione vai saber o que fazer e...

 

– Harry – o voz de Sev era suave e o rosto era cheio de gratidão. – Obrigado, mas é inútil. E isso pode condenar Severus à morte.

 

Era a primeira vez que Sev usava o nome de seu original. Harry o encarou, cheio de emoções muito misturadas. De repente...

 

– Já sei o que vamos fazer: vamos encher a cara!

 

– O quê?

 

– Você me ouviu: essa noite, eu e você vamos nos sentar num bar em Hogsmeade e tomar o maior pifão dos últimos tempos. Aposto como o seu original nunca se embebedou antes, não é verdade?

 

– Não tenho lembrança de um... pifão, como você diz. Ele raramente perdia o controle.

 

– Pois hoje eu e você vamos beber até cair. Vamos ao Três Vassouras, porque lá Madame Rosmerta pode avisar aqui em Hogwarts se não conseguirmos voltar.

 

– Harry, você não tem nem 18 anos. Não pode comprar álcool.

 

– Oh. Tudo bem, eu tomo Butterbeer. E melhor: fico encarregado de trazer você de volta e cuidar de sua ressaca. Pode tomar seu porre sossegado que eu cuido de você.

 

– E por que você quer me embebedar?

 

– Porque eu acho que você merece um momento de descontração. Todo mundo precisa tomar todas de vez em quando, essa é sua chance.

 

– Celebrar a minha morte?

 

– Não, vamos celebrar a sua vida, Sev. Além do mais, vou aproveitar seu momento de fraqueza e fazê-lo confessar as tais histórias embaraçosas que Remus mencionou – Harry viu um sorrisinho nos lábios do arremedo – Vá preparando as poções contra ressaca! Hoje nós vamos estourar a boca do balão!

 

o 0 o

 

Nenhum dos dois soube exatamente se "arrebentou a boca do balão", mas era inegável que a carraspana foi feia. A princípio, Sev demorou a relaxar, e Harry teve que incentivá-lo a bebericar o firewhiskey enquanto eles abriam o apetite com batatinhas com guacamole, mas Sev logo pegou o embalo. Harry riu ao descobrir algumas das peças que Severus Snape pregava em seu pai e os demais Marauders. Por exemplo, Sirius andou durante uma semana com um cabelo verde muito Slyhterin depois de ter sabotado uma poção de Severus. James também amargou passar dois dias vendo tudo que ele tocava adquirir uma cor prateada – incluindo Lily. Peter Pettigrew geralmente era considerado pelos Slytherins pouco importante, e o animago roedor raramente aplicava uma peça pessoalmente, mas sempre instigava James a fazê-lo. Um dia Peter fez isso com tanta insistência que Mcnair fez todo seu cabelo louro cair no chão. Harry riu alto em pleno bar. Para seu deleite, Sev também.

 

Contudo, risadas e divertimento não eram o usual para Severus Snape – e sua cópia não seria diferente.

 

– Eu devo estar fora de mim para ter deixado você celebrar minha morte de forma tão... etílica. – A voz era arrastada, mas continuava rica e sedosa.

 

– Você ainda tem mais alguns dias. Podemos aproveitar ao máximo! Que tal ir a Londres Muggle? Podemos comprar umas roupas fashion e virar clubbers!

 

– Não tenho idade para isso, Potter – literalmente. Além do mais, Madame Pomfrey pediu que eu não arriscasse minha saúde nos próximos dias.

 

– E você veio encher a cara?

 

– Confio nas minhas poções.

 

Harry caiu na gargalhada, e viu Sev também rindo alto – fato raro nele, inédito no seu original. Eles recuperaram o fôlego, e Harry mergulhou uma batatinha no guacamole, apreciando o sabor exótico. De repente Sev disse em voz baixa:

 

– Eu não estou pronto para morrer, Harry.

 

– Droga, Sev – Harry tinha um nó na garganta que nada tinha a ver com o guacamole. – Por que você tem que morrer? Já é o segundo amigo que eu perco! Primeiro Ron, de quem eu sinto falta como se tivessem arrancado meu braço... Agora você.

 

– Não está me comparando a Weasley, está?

 

– Vocês dois são meus amigos.

 

– Eu... – Sev parecia espantado e receoso – Eu... sou seu amigo?

 

– Meu melhor amigo – Harry corrigiu. – Merda. Eu vou sentir sua falta. Nunca tive um momento assim com ele. Seu original, quero dizer. Ele me odeia.

 

– Não, isso não é totalmente verdade. Ele não odeia você. Mas você provoca nele alguns sentimentos muito ruins. Você o faz se lembrar de James, e há também sua vida, sua atenção, sua fama... Ele nunca teve nada disso.

 

– Ele sabe que eu não quero nada disso. Que eu nunca quis. Durante as aulas de Oclumência, lembra?

 

– Sim, eu lembro. Ele... é uma pessoa difícil. Se ele tivesse tido alguém como você por perto, como eu tive... Talvez fosse diferente.

 

– Olhe, eu sei que você tem razões para odiá-lo, mas acredite, ele não é de todo mau só porque me trata feito um cachorro. Eu já estou até acostumado.

 

– Eu não o odeio – Sev tomou um gole grande do uísque. – É que agora está um pouco confuso saber até onde eu termino e ele começa. Afinal, eu sou ele, até um ponto... Mas não exatamente. De uma maneira, eu nem posso odiá-lo, já que somos tecnicamente a mesma pessoa. Ainda assim, ele é como... como se fosse meu criador. Isso é bastante perturbador, para não dizer herético. Eu... acho que estou tendo problemas de identidade.

 

– Por isso eu não vou te chamar de qualquer outro nome que não Sev. É um nome só seu. Ele jamais iria permitir que alguém fosse tão íntimo.

 

– Bom, talvez ele permita a partir de agora – risinho sarcástico.

 

– O que quer dizer?

 

– Bom, Pomfrey não queria que eu repetisse, porque ela mesma não tem certeza. Mas parece que, da mesma maneira que eu tenho as lembranças dele, ele vai passar a ter as minhas depois que eu me for.

 

– Sério? – Harry arregalou os olhos. – Tipo assim, um pedaço de você?

 

– Ao que tudo indica. Portanto, Mr. Potter – ele riu sarcasticamente –, as histórias embaraçosas que Lupin tanto queria podem estar aqui mesmo, durante esse seu tufão!

 

– Pifão – corrigiu Harry.

 

– Que seja – Sev ergueu o copo, saudou-o e esvaziou seu conteúdo num gole só. Ele pousou o copo ruidosamente na mesa, fazendo a tigelinha de guacamole dançar pela superfície lisa.

 

Harry empurrou a tigelinha, fazendo-a virar e retorcer-se, usando a varinha como batuta. Sev o observou e usou a varinha para fazer o pratinho também dançar. Logo os dois estavam fazendo o prato de guacamole dançar freneticamente, um vendo quem fazia o outro espirrar o molho de abacate primeiro. Uma idiotice.

 

Sev nunca se divertira tanto como com a dança do guacamole.

 

– Olhe, se você quiser fazer outra coisa – sugeriu Harry – ao invés de beber, podemos fazer isso. Fazer você aproveitar seu tempo. Londres tem muitos museus interessantes. Ah, e os Muggles têm uma invenção fantástica, chamada cinema. Quem sabe você prefira passar um tempo com garotas? – Nesse ponto Harry arregalou os olhos. – Oh, não. Eu nem sei se ele tem namorada. Eu nem sei se ele gosta de garotas! – Sev baixou a cabeça. – Ele... Você... quer dizer, vocês... Eu nunca soube se... Você não, mas ele já...?

 

– Harry – Sev tentou dizer –, ele não é virgem. Eu tenho lembranças.

 

– Hum, e... por um acaso... ele tem namorada?

 

 Sev o encarou, desconfiado:

 

– Está tentando descobrir se ele é gay, não está?

 

– Não! – Harry ficou vermelho. – Quero dizer, sim. Não que eu seja, não, eu não sou. Só porque no momento eu estou entre namoradas não quer dizer que eu... sabe... Mas não tem problemas se ele for, Sev. E aí? Ele é?

 

– Não sei – foi a resposta. – A verdade, Harry, é que ele não teve muitas experiências. Mas foram com ambos os sexos.

 

– Ele é bi, então? Isso não é nenhum crime.

 

– Eu não iria tão longe – Sev estava sério. – Parece que... ele sempre teve auto-estima baixa, Harry. Seus encontros sexuais tiveram motivação muito simples.

 

– Que quer dizer?

 

– Ele basicamente não recusou ninguém que se dispôs a dormir com ele porque... – ele corou – ele não sabia se mais alguém iria oferecer. Basicamente, ele dormiria com qualquer um que o tivesse porque ele não se sentia digno de ser escolhido. Ele não tem sequer orientação sexual.

 

Aquilo entristeceu Harry sobremaneira. Ele sabia que Snape tinha problemas em demonstrar sentimentos, mas não imaginava que fossem desse tamanho. Procurou dizer:

 

– Bom, isso definitivamente não faz parte das histórias embaraçosas que vão ser espalhadas por aí.

 

– Obrigado – Sev o encarou, olhos expressivos. – Por nós dois.

 

– É, Sev, eu vou sentir muito sua falta, cara.

 

– Eu também, Harry – ele riu, e bebeu mais uísque. – E eu acho que você vai sentir menos minha falta porque eu não sei se vou ficar consciente por mais tempo.

 

Harry riu-se gostosamente ao vê-lo cambaleando mesmo sentado, sem perder a carranca. De repente, ele simplesmente tombou para o lado, feito fruta madura. Harry achou melhor encerrar a noite e tentou ajudá-lo a erguer-se.

 

– Sev. Sev – puxou-o pelas vestes. – Vamos, agora temos que ir.

 

– Hum.

 

– Vamos – ergueu-o até ele ficar sentado de novo. – Agora de pé.

 

Cambaleando, Sev foi se apoiar na mesa e enfiou a mão na tigela com o molho à base de abacate. O rosto se encrespou numa expressão de nojo, e ele disse, arrastado:

 

– Cara, eu espero que isso seja o guacamole.

 

Harry não sabia se ria ou se gemia e puxou a varinha:

 

Mobilicorpus!

 

Foi a única maneira de levar um arremedo muito, muito bêbado de volta a Hogwarts. O problema, Harry percebeu, é que ele mesmo tinha tomado tantas Butterbeers que ele também estava na maior água. Portanto, ele deu a um alcoolizado Sev uma Poção da Sobriedade e o colocou na cama dos aposentos do Mestre de Poções. Cansado demais para subir até a Torre de Gryffindor, Harry resolveu se abancar no sofá de Snape, ignorando os sonoros roncos que vinham do quarto de dormir.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Arremedo" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.