O Último Chamado escrita por Guido


Capítulo 6
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

Postando mais um capítulo! As coisas estão acontecendo na história.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/357127/chapter/6

Guido ainda sentia alguns arrepios percorrendo sua espinha e eriçando os pelos de seu corpo quando deixou o quarto onde estava a avó. Depois do suposto surto, e de sua respiração arquejante, parecia que algo havia deixado seu corpo e ela voltara a penetrar no transe profundo na qual estava quando Guido a encontrou.

Fora do quarto, o arquiteto não soube para qual direção virar primeiro. Seu coração estava em choque, ele ainda não havia conseguido distinguir uma palavra da outra, mas a frase – mesmo que dita em voz quebrada – voltava constantemente a sua mente. Você é o sétimo filho.

Dando passos incertos, Guido chegou a voltar para o quarto onde minutos antes estivera dormindo com Thomas. E ao se aproximar da soleira da porta, vislumbrou o namorado deitado na cama, da mesma forma que o deixara. Mas Guido não entrou. Em vez disso, deu meia volta e seguiu para o primeiro andar. Você é o sétimo filho. A frase ia e voltava como uma nuvem enquanto descia os degraus lustrados.

Guido foi para a cozinha, e no piloto automático de si mesmo, se serviu de café. Enquanto tomava a bebida quente, sua mente vagava por seus últimos pesadelos. E de repente, ele se pegou pensando no motivo pelo qual sua memória voltara naquilo. Seria possível que houvesse algum tipo de ligação entre “Você é o sétimo filho”, e os tais pesadelos? A analogia parecia estranha. Não. Estranha, não. Absurda! Mas Guido sentiu medo. Ele sempre soube que sua avó era médium. Era comum que ela e sua mãe frequentassem a Casa da Mesa Branca, um local meio reservado em Hither Hills. Dizia-se que lá pessoas sensitivas e outros médiuns faziam contato com espíritos, rodas de oração e caridades. Mas sua avó nunca conversava com Guido sobre essas coisas. Era algo muito secreto dela, e de sua mãe. Guido não desacreditava em nada daquilo, dado a natureza estranha de seus pesadelos. Mas seria possível que o tal surto de sua avó pudesse ser algum tipo de manifestação espiritual? Se fosse esse o caso, aquilo havia sido um aviso? Mas como eu poderia ser o sétimo filho? Eu só tenho dois irmãos... refletiu, e tomou mais um gole de café. Pelos minutos que se seguiram, a imagem dos vidrados olhos cinzentos de sua avó e de sua boca tentando, com muita dificuldade, se comunicar, voltou a sua cabeça. Automaticamente, olhou seu braço no local onde sua avó o segurou, e havia marcas de dedos, como contornos avermelhados.

Você é o sétimo filho martelava sua cabeça pela milésima vez. Enquanto lavava a caneca que usara, ouviu a porta da frente se abrindo, depois passos e algumas vozes. Eles voltaram do enterro, pensou. Guardou a caneca e foi para sala. Lá, encontrou os pais, e alguns de seus familiares. Cumprimentou mais alguns tios e primos. E todos estavam muito tristes. O rosto de sua mãe estava inchado e o nariz vermelho. Ela ainda chorava um pouco. Guido a abraçou fortemente.

— Como foi? — perguntou ele, se dirigindo ao pai. Eliot contraiu a sobrancelha.

— Triste, filho. — disse, sentando-se no sofá da sala. Outros sentavam também, mas a maioria foi para cozinha.

— Entendo. — disse Guido.

— Seus lábios melhoraram, ? — observou sua mãe, enxugando os olhos. Guido sentiu piedade dela.

— Devem ter melhorado enquanto eu dormia. Acordei há pouco tempo. — respondeu ele.

— E o Thomas? — ela quis saber.

— Dormindo.

— Vocês dormem naquele quarto hoje, tá? Não vão embora, não. — disse seu pai, e Guido acatou. Fizeram silêncio. E esse silêncio foi pesado, porque o clima estava muito carregado de tensão e tristeza. Guido pensou novamente em sua avó, que dormia lá em cima. E sentiu que precisava conversar com sua mãe sobre o ocorrido.

Olhou-a, e Carrie, mesmo profundamente triste, percebeu que havia algo errado.

— O que aconteceu, filho? — perguntou. Eliot a abraçava, os dois sentados no sofá em frente ao outro em que Guido sentava. Ao seu lado, em outro sofá, tia Anne conversava com o marido, tio Klaus, os dois muito afundados em seus assuntos.

Guido voltou a olhar os pais.

— Eu vi minha avó. — disse. Mas não prosseguiu.

— E como ela está? — perguntou Eliot.

Guido suspirou.

— Dormindo... — disse, mas interrompeu a si mesmo quando viu Thomas descendo a escada. O jovem veio se aproximando de Guido. Tocou suavemente sua nuca, e sentou-se ao seu lado.

— Faz muito tempo que você acordou? — perguntou ele.

Guido balançou a cabeça, negando.

— Não muito. — respondeu, em seguida.

— Vocês estão com fome, meninos? — perguntou Carrie, tentando um sorriso por cima de toda a sua tristeza.

— Não precisa se preocupar, Carrie. Depois nos viramos. — disse Thomas, e com um aceno, Guido concordou prontamente.

— Thomas, como estão as coisas com o Ronald? — quis saber Eliot.

Thomas respirou fundo antes de responder. Recostou-se no sofá.

— Tudo na mesma. Ele continua me perseguindo. — disse, por fim. Guido olhava para o chão.

— Ele pode denunciar você a qualquer momento, Thomas. Não tem medo? — questionou Carrie, olhos vermelhos de choro.

Thomas assentiu.

— Tenho medo sim, é claro. Mas tenho mais medo de ficar sem o seu filho. — disse ele, sincero. Guido sentiu seu rosto corar, mas continuou observando o tapete. Thomas prosseguiu: — Pode parecer absurdo, mas é como eu me sinto.

Os quatro ficaram calados por um momento. Então Eliot disse:

— Eu acredito que o Ronald não consiga tirar sua licença, Thomas. De acordo com o que eu fiquei sabendo, depois que vocês começaram a se relacionar, romperam o vínculo profissional de médico e paciente, não foi?

— No mesmo mês. Ele não queria, foi mais por pressão minha. — disse Thomas.

— Mas a Ellen, advogada do Thomas, disse que as quatro gravações que o Ronald tem podem servir para que uma investigação seja aberta, e isso pode comprometer a integridade profissional do Thomas. — interpôs Guido, agora olhando o pai.

Thomas pegou a mão de Guido, com carinho.

 — É, pode sim. — começou a dizer. — Mas caso haja uma investigação, eles vão ver que minha relação com os meus outros pacientes é apenas profissional. Não existem conexões pessoais com eles, fora do escritório nem ao menos somos amigos. Isso está na nossa ética. Portanto, não mancharia minha reputação. Além disso, eu tenho o direito de pedir que as investigações sigam em sigilo, caso eu julgue que tudo isso pode me prejudicar profissionalmente...

— E o que você realmente acha? Pode ser obrigado a parar de exercer a função? — questionou tia Anne, de repente. Thomas a olhou.

— Para ser honesto, eu não sei. — disse, com um suspiro. — O Ronald era meu paciente quando começamos a namorar, mas logo eu percebi que seria muito ruim se levássemos isso para dentro das consultas. Então eu pedi que ele procurasse outro psicólogo, até indiquei um amigo. E três semanas depois, ele foi, e nós rompemos essa relação profissional, mantendo só a pessoal. — ouvir aquilo provocou certo ciúme em Guido, mas o arquiteto permaneceu quieto, escutando Thomas. — Nos quatro registros que fiz das consultas, não conversamos sobre nós dois. Ele falava mais sobre a infância dele e a relação complicada que sempre teve com os pais. Portanto não posso apostar que eu perderia ou não a minha licença. O fato é que, até agora, o Ronald continua me ameaçando e rondando minha casa. — e aqui, Thomas chegou a lembrar-se de que Ronald também rondava Guido, sem que este soubesse. Mas evitou falar para não causar alardes em Carrie ou Eliot. Eles já estavam sofrendo demais.

A conversa se estendeu, mas os assuntos foram mudando. Carrie perguntou a Thomas como estavam os pais dele, e o psicólogo lhe respondeu que estes estavam bem, vivendo em New Jersey. Nesse ínterim, Eliot recebeu uma ligação de John, filho do meio, e este lhe disse que o voo fora cancelado na última hora. Ele não viria naquele dia, mas provavelmente visitaria a família na mesma semana. O dia já estava quase escurecendo quando muitos parentes começaram a ir embora. Guido e Thomas passariam a noite em Hither Hills.

Por volta das dezoito e trinta, Carrie já não conseguia mais conter o cansaço, e foi se deitar. Seu semblante demonstrava seu sofrimento. Eliot subira com ela. Na casa restavam, além da avó Eve, Giulia e o namorado Erick, Guido e Thomas, e a tia Olivia com o tio Gabe, que era o irmão mais velho de Carrie. Como os dois moravam em Connecticut, passariam a noite em Hither Hills. Mas o tio Gabe estava muito abalado com a morte do pai, e resolveu se recolher mais cedo. A esposa o acompanhou.

À noite a temperatura parecia mais baixa do que nunca. O vento gelado se misturou a uma chuva torrencial, que quebrava de contra a casa tendo como companhia o som de trovões e o clarão de relâmpagos. Guido e Thomas conversavam com Giulia e Erick, sobre os assuntos mais variados. Estavam reunidos na sala. Ficaram falando até quase onze da noite, quando Guido e Thomas resolveram subir.

Sozinhos na suíte, eles chegaram à conclusão de que não tomariam banho juntos, pois Guido não queria fazer amor naquela noite. Thomas foi de acordo, mas não deixou de agarrar Guido e lhe dar um beijo cheio de desejo, paixão e eletricidade. Foi difícil para ambos segurar a vontade, a excitação. Por isso trataram de adormecer rápido. O som da chuva contribuiu para o sono. E a noite passou tranquila. Guido abraçado a Thomas, os dois sob um grosso edredom de lã. Não houve pesadelos, tampouco sobressaltos. E na manhã seguinte, levantaram cedo. Na cozinha, tia Olivia ajudava Carrie a pôr a mesa. A mãe de Guido ainda estava abatida e um pouco pálida, mas parecia mais serena. E para surpresa do arquiteto, sua avó encontrava-se atrás da bancada de granito, cortando bisnagas para fazer torrada. Quando viu o neto, um sorriso se abriu em seu rosto. Era como se ela não estivesse triste, e parecia mais forte do que nunca. Vestia uma camisa de manga cumprida, preta, e uma calça da mesma cor, como forma de luto pelo marido.

Eve largou a faca e o pão, e caminhou até Guido.

— Meu filho! — saldou amorosamente. Abraçou Guido, apertado. E o abraço foi longo. Quando se afastaram, ela acariciou sua face. — você está bem? — seus olhos cinza miraram bem dentro dos olhos castanho mel de Guido. Ele anuiu.

— Sim. E a senhora?

— Eu também. — respondeu Eve, e seus olhos se voltaram para Thomas. — e você, meu anjo? — Eve o abraçou fortemente também, e depois que o soltou, olhou dentro de seus olhos. — é um menino tão bonito e tão bom, você. E ama tanto o meu neto...

Thomas corou, e Guido achou aquilo lindo. Sorriu.

— Eu não sei se sou bom, mas realmente amo muito o seu neto. — disse ele. Eve soltou um pequeno sorriso. Ela era assim. Ela era essa pessoa. Olhava nos olhos querendo enxergar a alma. Sorria sem exigir um sorriso de volta, mas normalmente o conseguia. E podia sentir o coração das pessoas, com tanta facilidade que era fácil que a amassem.

— Você é bom. Sim. Por isso gosto tanto de você. — disse ela. E novamente olhou para Guido. — nós precisamos conversar, querido. E você sabe sobre que precisamos falar.

E nesse momento, o coração de Guido disparou.

— Tudo bem. Quando?

— Depois do café. — ela respondeu. Acariciou mais uma vez o maxilar de Guido, e virou-se para voltar a cortar pão. Os olhos de Guido encontraram os de sua mãe. Ela sorriu.

— Não se assuste — disse, com ternura. Thomas passou o braço pelo ombro de Guido, abraçando-o, e foram se sentar.

O café da manhã passou normalmente. E depois, Eliot se juntou a família, a mesa. Quando já tinham acabado de comer, em meio a conversas paralelas, Eve se levantou e chamou pelo neto. Thomas o olhou, e lhe deu um beijo no rosto. Eles nunca se beijavam na boca em frente aos familiares, mas por respeito. Nem mesmo Giulia beijava seu namorado na frente dos pais.

Antes de saírem, Eve mirou seu olhar sereno em Carrie.

— Filha, vou conversar um pouco com o Guido, agora.

— Tudo bem, mãe. — disse ela, sorrindo.

Guido se levantou, e deixou a cozinha com sua avó ao lado. Eles foram para o quarto dela, no segundo andar. Quando Guido entrou, Eve fechou a porta atrás dele.

— E então? Como a senhora está realmente? — disparou ele, sentando-se em uma poltrona ao lado da cama. Sua avó soltou uma risada suave.

— Eu estou triste, confesso. Eu o amava muito, tal como você ama seu Thomas. Tal como sua mãe ama seu pai. — ela respondeu, enquanto se recostava no espaldar da cama. Estava próxima do neto. Olhou-o, como um ar examinador.

— Está muito bonito, sabia? — observou Eve. O rosto de Guido ruborizou-se.

— Obrigado, . — respondeu ele, e ela sorriu.

— Sabe por que eu chamei você? — perguntou sua avó. Guido não respondeu. De nenhuma forma. Ela assentiu, em seguida pigarreou. Então prosseguiu: — Guido, você é médium. E você sabe disso desde criança, ou esqueceu?

Guido balançou a cabeça, negando.

— Não esqueci.

— E é bom que não esqueça. Você tem a escolha de desenvolver sua mediunidade, ou apenas deixá-la guardada.

— Eu sei...

— Que bom, meu filho. É bom que se lembre sempre disso.

— Uhum...

— Quer me dizer alguma coisa?

— Não, não na verdade. Mas eu acho que a senhora tem alguma coisa para me dizer. Ou explicar.

Eve deu uma risada curta, como se aquilo a tivesse divertido. Guido também sorriu.

— Você é tão perspicaz, Guido...

— Somos dois, então.

— Será? Será que sou perspicaz também? — divertiu-se ela. — Guido, o que lhe disseram ontem?

Você é o sétimo filho. Mesmo sabendo do que se tratava, foi como se uma seta atingisse o peito de Guido. Não pela situação, mas pela confirmação. Você é o sétimo filho. Foi um aviso.

— Você... quero dizer, eu. Eu sou o sétimo filho. — sentiu o coração apertando no momento em que dizia.

O olhar de Eve voou para além do vidro da janela. O céu estava pálido, branco. E poderia chover outra vez. Por um instante, ela não respondeu. E pareceu distraída. Mas Guido sabia que ela estava pensando. Pensando no que acabara de ouvir dele. Você é o sétimo filho.

O silêncio pareceu uma eternidade. Guido apenas observava a avó. Então ela se remexeu, e voltou a olhá-lo.

— Guido — a voz saiu rouca. E o arquiteto enxergou algo diferente no rosto dela. Mas não disse nada. — você continua tendo seus pesadelos?

Ele assentiu com um aceno.

— Acha que tem alguma coisa a ver? — questionou, mas sua avó não lhe respondeu. Em lugar disso, ela apenas fechou os olhos, e parecia pensativa. Muito pensativa. Um tempo depois, olhou-o novamente.

— Eu não sei. Mas o que você viu ontem em mim, foi realmente uma manifestação...

— A senhora estava consciente?

— Não, tenha calma... — ela juntou as mãos sob o nariz, como se fosse rezar. — Guido, quando uma coisa assim acontece, uma manifestação como essa, é um espírito de luz que se apossa de nós para deixar uma mensagem importante. É muito rápido, normalmente, e apenas os espíritos evoluídos e bastante iluminados têm permissão para utilizar esse canal, mas isso só acontece se nós permitirmos. Eu fui avisada, em um sonho, e permiti. Era para ajudar você, meu filho. — Eve falava com muita calma, e prestando muita atenção em Guido, que a ouvia e quase não piscava. Ela prosseguiu: — Mas, quando eles vão embora, nós voltamos à consciência. No meu caso, eu estava sedada devido aos calmantes que o Richard me deu. E não voltei a mim justamente por isso. Embora eu tenha plena consciência de que incorporei. Mas quando o fazemos, nós não ouvimos a mensagem que é passada, e por isso quem a ouve normalmente nos conta. Só isso que foi dito?

— Sim, vó. Apenas isso. Você é o sétimo filho. — disse ele, suspirando. Sentiu-se exausto naquele momento. Era a tensão de todas aquelas informações.

— Hmm... entenda Guido, esse tipo de manifestação assim, como foi, é muito rara. Na Casa da Mesa Branca, nós psicografamos. Sabe o que é isso?

— São mensagens deixadas por espíritos, estou certo?

Eve assentiu.

— Sim, está. Mas essas mensagens podem ser deixadas por todos os tipos de espíritos. Eles falam conosco no momento em que abrimos o canal. Entretanto, é como eu disse. Para que um espírito incorpore em nós e deixe outra mensagem, ele precisa ser evoluído. Não é o caso de muitos. Muitos espíritos são confusos, tristes. Muitos não estão preparados, e muito menos evoluídos. O que estou querendo dizer é que você teve uma benção muito grande ontem, e se isso aconteceu, é porque a mensagem que lhe foi passada era muito importante. Guido, você precisa entender que... — ela fez uma pausa, como se medisse suas palavras.

— O que vó? — Guido tentava não demonstrar, mas estava assustado.

Eve suspirou.

— Filho, eu sei que você está assustado. Eu entendo isso. É compreensível. Mas eu peço que tenha calma, e não se precipite. Pode fazer isso pela sua avó? — perguntou Eve, olhando-o dentro dos olhos.

— Posso. — respondeu ele.

Eve abanou a cabeça, contraindo as bochecha. Seus olhos miravam fixamente em algum lugar do chão, e ela parecia estudar uma forma de dizer qualquer coisa.

— Guido, é muito difícil acontecer esse tipo de manifestação que você presenciou, aqui. É raro demais. Normalmente ouvimos as palavras e as escrevemos. Psicografamos. Mas o que aconteceu ontem foi um caso muito especial. E foi, com toda certeza, um espírito de luz, bastante evoluído no plano. Isso me leva a crer que algo está acontecendo, e talvez grave. Fale-me sobre seus últimos pesadelos.

Guido sabia que aquele momento chegaria entre ele e sua avó. Não que nunca tivessem conversado sobre aquilo antes, mas é que dessa vez era diferente: os pesadelos estavam sendo trazidos pra “fora”. E pela primeira vez sentiu verdadeira corajem para falar sobre aquilo. E, com muita calma, ele pôs-se a contar desde o dia em que sofreu um pequeno corte em seu braço, na última terça feira, até o pesadelo mais ressente, de quinta-feira, quando acordou de madrugada com sangue pingando da boca e do nariz. E enquanto contava, sua avó o ouvia com os olhos atentos, mas sem esboçar qualquer reação. Ao fim, Guido, mesmo que involuntariamente, questionou-se em pensamentos se ela teria acreditado em sua história. Já estavam conversando a porta fechada por quase uma hora.

Eve limpou a garganta, e baixou o olhar para as próprias mãos, uma sobre a outra, viradas com a palma para cima.

— É assombroso. — soltou, muito séria, e em seguida encarou o olhar do neto. — Mas eu acredito em você. Embora, nesse momento, não saiba como lidar com essa situação. Quem mais sabe?

— Só o Thomas, como eu disse. Eu fui correndo contar a ele, eu estava desesperado naquele dia.

Eve assentiu.

— Não é para menos. — disse ela. — Eu vou tentar ajudar você, Guido. Mas antes eu preciso consultar um amigo, e é claro, conversar com a sua mãe.

— Porque conversar com a minha mãe? — quis saber ele.

— Ela é sua mãe, e precisa saber do que está acontecendo. Mas eu quero contar a ela. Tenho certeza que isso que está acontecendo com você, é algo que a chocaria muito. Imagine só! Seus pesadelos estão passando para esfera real, e estão ferindo você. Tem noção do que significa isso tudo, meu filho? — Eve, que até então estivera recostada no espaldar da cama, se posicionou de forma a sentar de frente para Guido. Segurou as mãos do neto nas suas, e olhou tão profundamente em seus olhos que Guido se sentiu milimetricamente esquadrinhado. — eu, sua avó, estou apavorada. Apavorada porque isso está machucando você. E o Thomas ainda não se deu conta disso, mas no momento em que ele perceber que é real, ele vai surtar, Guido. Não pense que é algo fácil de acreditar, porque não é. Mas eu tenho uma doutrina espiritual e sua mãe também a tem e, portanto, para nós isso é perfeitamente aceitável. Embora não deixe de ser assustador, compreende?

— Compreendo, sim. — respondeu, e seus olhos encheram de lágrimas. Mas ele não as derramou.

— Guido, eu poderia pedir que você dormisse com o Thomas todas as noites, como forma de proteção. Ele, por algum motivo, impede que essas coisas o machuquem. Mas eu não posso exigir isso de você, porque sei que não quer prejudicá-lo e fazê-lo perder a licença para exercer sua profissão, porque esse Ronald não vai desistir tão fácil. Entende que estou realmente apavorada, meu filho? Eu vou conversar com a sua mãe hoje, quando todos forem embora.

— Mas não deixa meu pai ficar sabendo, vó. Por favor...

— Não precisa se preocupar. Só eu e ela. Mais ninguém.

— Obrigado — disse ele, e parecia novamente a criança que fora vinte anos antes. Eve o abraçou, ternamente, afagando seus cabelos castanhos. Guido sentiu-se reconfortado e protegido. Ficaram assim por um tempo, até que Guido se lembrou de algo. Então a olhou novamente.

— Vó, ontem algo muito estranho aconteceu comigo, aqui em casa. Meus lábios ficaram roxos, e minha pele, gelada. Mas eu não estava sentindo frio, não mesmo. O Richard me examinou, logo depois de dar os calmantes a senhora, mas não achou nada de errado em mim. Acha que isso pode ter alguma ligação com...

— Eu não sei, pode ser que sim. Sua mãe me falou ontem à noite sobre isso. Ela também achou muito estranho. — disse Eve, com o cenho franzido.

— Hmmm...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo


Bem, gente, Guido conversou com sua avó. Eve sabe de algo que não contou ao neto, mas isso é algo para o próximo capítulo. Não sei se gostaram desse capítulo, mas ele é MUITO IMPORTANTE, porque nele uma parte do mistério começa a ser descoberto. Há algo querendo proteger Guido, e foi isso que lhe deu o aviso "Você é o sétimo filho".

Eu espero que vocês tenham gostado. Minhas histórias costumam ser assim, detalhadas, mas digo que não vão se decepcionar. Postarei o próximo capítulo em breve, talvez hoje ainda! Preparem-se para uma reviravolta, será grande! Espero que gostem!

Obrigado por ler! Se gostou, deixa uma review? Motivação é sempre bom! :]



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Último Chamado" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.