Encarei o longo corredor do terceiro andar,onde as salas dos professores ficavam.O colégio central de Konoha era grande o suficiente para que cada professor do colégio pudesse ter uma sala só pra si.Uma certa maioria dividia a sala,tendo dois professores em cada,mas existiam suas exceções.Como Orochimaru e Kakashi.Foram obrigados a dividir a mesma sala por dois anos mas Orochimaru abandonou-a e arranjou uma nova pra só pra ele.Mesmo assim algumas de suas coisas permaneciam na sala de Kakashi.Tudo isso por uma briga de decorações,e Tsunade era nesse estilo: Se é seu,faça o que quiser.Então os professores tinham o costume de deixar a sala do seu jeito.Um problema gigante para Orochimaru,que tinha a porta toda coberta de plumas roxas e cobras de serpentina entrelaçadas nas dobradiças.

A porta de madeira rústica com um olho mágico no centro era a de Kakashi.Com uma pequena plaquinha de bronze ao lado da maçaneta,na parede,dizendo "HATAKE KAKASHI".

Abri a porta e encontrei a sala vazia,como Kakashi avisou que estaria.Ao adentrar a mesma,foi como entrar em um museu.Uma longa mesa de madeira com livros e papéis empilhados tinha no lugar dos quatro pés,dois anjos erguendo a mesa,sendo intercalados por dois demônios.Todos parecendo crianças,mas uns tinha uma cauda pontuda e chifres,e um sorriso maldoso,e os outros dois tinham cabelos enrolados e asas longas e abertas.Fiquei surpreendida por tudo ser esculpido em madeira.Nas paredes haviam varias cópias de Da Vince,como qualquer fanático por arte teria,e isso não me surpreendeu por ser a sala de Kakashi.Duas poltronas carmim estavam de frente para a mesa.No fundo da sala,perto de uma lareira falsa,havia algumas caixas das quais brotavam plumas e tecidos de cor roxa e rosa.As coisas de Orochimaru.

Segurei o riso quando notei melhor a sala,tudo era um tanto clássico,mas Kakashi tinha quebrado todo o encanto do lugar com uma cadeira de computador, que tinha um porta-copos nos braços,do outro lado da mesa

–Sakura? -Dei um salto pra trás,batendo o quadril na mesa-

Kakashi saiu de um canto mais escuro da sala,onde o sol que entrava pela janela não chegava.

–Hatake. -Falei assentindo- O que gostaria de falar comigo?

–Sakura,você...Tem notícias do seu pais? -Ele disse ainda escorado nas sombras.O seu tom era direto e firme.-

–Meu...p-pai?

Pensei por um segundo na situação.Era verdade,meu pai e Kakashi eram amigos de faculdade,Kakashi sempre ia nas festas idiotas de minha mãe mas sempre se mantinha num canto conversando com meu pai ou até mesmo observando os quadros da casa,mas nunca pensei realmente em meu pai e Kakashi.Ele havia sumido depois do coma de minha mãe,e eu também não tive interesse em procurá-lo...Mas agora,falar nele ainda doía muito,saber que no pior momento da minha vida e da vida de minha mãe ele sumiu.Não deu notícias,não passava tempo nenhum em casa e nada comparado a distância nos separava mais.Eu não queria pensar que o mesmo homem que me escondia quando haviam brigas em casa,o mesmo homem que me tratava como sua protegida,era o mesmo homem que tinha me abandonado pra sofrer sozinha,que esse homem era meu pai.

Mas eu tinha o magoado,tinha fugido de casa sem explicações,ele era protetor,me amava incondicionalmente...Talvez eu devesse ter procurado-o e pedido desculpas...Mas não o fiz,estava cega pelo medo de perder minha mãe.

–Sakura? -Kakashi deu um passo a frente enquanto eu me apoiava na poltrona,o estomago doía como se acabasse de levar um soco.Talvez fosse mesmo culpa minha.-

–E-eu...Não,não tenho notícias do meu pai. -Engoli em seco- Nem ao menos sei se ele esta vivo. -Sussurrei pra mim mesma,uma observação que eu não deveria,ou melhor,não precisava ter feito em voz alta-

–Descuido seu,afinal você é filha dele. -Ele soltou o ar e andou em minha direção,as mãos no bolso do terno preto que usava.Ele parecia tão desinteressado quanto maldoso daquele jeito.- Mas não vou interferir minha opinião pessoal com nossas atividades e nossos conceitos acadêmicos.Isso é pra você.

Ergueu a mão para dentro do paletó e retirou um envelope branco de dentro dele.

–Como disse? -Falei me encolhendo contra a poltrona.-

–Uma carta. -Ele sorriu,verdadeiramente,nada de maldoso.- Pra você.

–Uma carta? -Apanhei o papel,atônita- Do meu pai?

–Não,Sakura,não é do seu pai.É só a passagem pra você chegar até ele. -Arqueei uma sobrancelha e abri o envelope-

"Para: Família Haruno 18:43

É com grande honra que solicitamos a presença da família Haruno,desejamos que disponham dos serviços do Museu Ars por uma noite no anual leilão de literatura e artes.

Com o encontro dos grandes de Konoha,agradecemos a presença e atenção.

Família Yamanaka"

Dobrei o papel ao meio.

–Como e porque arranjou e me entregou isso,Kakashi?

–Sakura,seu pai comparece nesse evento todos os anos. -Ele abaixou a cabeça- Não vejo o velho Haruno a tempos,sinto falta das conversas e de tudo mais.Sakura,sabe me dizer se ele irá? Sabe ao menos me dizer se seu pai é o mesmo homem de dois anos atrás?

–Não sei,como você mesmo fez questão de dizer,Kakashi,não cumpri meu papel como filha.

–Não quis ser rude,Sakura.Mas acho que isso pode ser a chave para você encontrar seu pai.

–É você quem quer encontra-lo,eu nunca disse isso.Nem sei porque me chamou aqui.

–Sakura...Preciso de uma acompanhante para entrar no leilão. -Ele disse a última parte da frase como se tirasse um peso enorme das costas.As salas são reservadas,seu pai se afastou de tudo,só poderia entrar na sala Haruno com um parente,com um membro legítimo da família.Com a sua mãe nas condições que se encontra...Pensei talvez que...

–Quer que eu vá com você nesse leilão,Kakashi? Quer me usar para chegar ao meu pai? -Falei sentindo cada vez mais agulhadas no estomago,não era possível.Todos em minha volta resolveram me testar?- O que quer com ele,afinal?

–Sakura,não posso contar pra você o que é. -Ele colocou as mãos no bolso e abaixou a cabeça- Só imploro a você,vá no evento.Me permita falar com seu pai,é urgente.

Encarei Kakashi,duas bolsas azuis pendiam de seus olhos,olheiras de dias sem dormir.Parecia cansado e pálido,conforme a luz se encontrava com sua pele ele parecia mais vulnerável.Os cabelos brancos bagunçados e as mãos no bolso pareciam tremer.Ele era o melhor professor,o melhor amigo do meu pai,o meu melhor conselheiro.Era como da minha família,certamente tinha seus motivos.

–Vou pensar,Kakashi. -Ele sorriu- Mas terá que me contar o porque disso. -O sorriso se desfez como pó dissolvido em água-

–Eu...-Ele suspirou- Prometo lhe contar se conseguir falar com seu pai.Minha única condição é que me dê tempo,tenho vergonha de mim mesmo por isso,Sakura.E te enxergo como uma sobrinha,tenho medo de perder o olhar de admiração que você usa comigo.Não quero que descubra tão cedo o lixo que realmente sou.

–...Esta bem,Kakashi. -Suspirei- Eu irei no evento.

~*~*~*~*

Andei pelo pátio,o sinal havia batido e todos já caminhavam para suas salas.Eu ajeitei a saia do colégio e a camisa branca com o logo azul de Konoha enquanto caminhava até o banheiro.Sentia as juntas doerem e sensação ardente nas veias,como a sensação de ácido da noite anterior.Eu não sabia como reagir,quer dizer Kakashi estava falando do meu pai,e falando também que odiava a pessoa que ele realmente era por precisar tanto falar com o meu pai.Falando que só me contaria depois porque tinha medo de eu odiá-lo por causa disso.E então eu pensei que realmente tinha que ser algo muito grave pra acabar me fazendo ter ódio dele,porque ele era como Tsunade pra mim.Ele e Tsunade eram a minha família,a minha família que realmente se importava comigo.Eu estava falando do Kakashi que me levava livros de história e poesia nos finais de semana,estava falando do mesmo Kakashi que brincava comigo nas reuniões do meu pai,eu estava falando do mesmo Kakashi que era um exemplo que eu queria seguir.Era o mesmo Kakashi que eu amava como um parente.

Soltei o ar,sentindo todo o meu corpo suar frio,sentindo minhas juntas doerem como se o ar fosse um taco de beisebol contra os músculos do meu corpo.Adentrei o banheiro do primeiro andar e me dirigi até a pia,minha pele estava branca e meus cabelos grudados na testa e na nuca,eu estava suando muito,suando frio.Mas não era por sensações térmicas,era diferente disso,era desespero,era aflição,era medo.Joguei um pouco d'água no rosto e então a porta da última cabine se abriu bruscamente atrás de mim,revelando uma Ino que soluçava alto e se soltava contra a parede,deslisando até o chão.

–Ino? -Falei pasma e ela arregalou os olhos assustada,a face em um misto de raiva e espanto-

Os cabelos estavam soltos e completamente bagunçados e não perfeitamente presos no topo da cabeça em um longo rabo de cavalo loiro e sedoso.Os olhos azuis estavam borrados assim como as bochechas pela maquiagem preta e envolta dos olhos podia se ver linhas vermelhas,como quando se chora mais do que deveria.A saia azul do uniforme estava amassada,o casaco rosa estava caído nos cotovelos e a regata azul marinho que ela usava estava amarrotada.

Ela se encolheu contra a parede,passando a mão no rosto tentando secar as lágrimas mas só bagunçou ainda mais a maquiagem,ela abaixou as mãos para arrumar a saia e ao ver a maquiagem preta manchando sua mão ela tornou a soluçar,estava tão indefesa quanto uma criança,e chorava mais ainda agora por saber que naquele momento tão inofensivo da Ino Rainha de Konoha alguém a assistia.Eu me perguntei por um instante o que estava fazendo ali,porque estava observando Ino aos prantos por um motivo desconhecido enquanto eu poderia simplesmente rir da cara dela e chamar a escola inteira pra ver Ino Yamanaka caindo em pedaços,como ela faria se fosse eu ali jogada no chão.

Pense por um segundo que ninguém jamais havia visto Ino naquele estado,nem Karin que era sua melhor amiga ,ou seus pais,e lá estava eu a simples Sakura Haruno,talvez a maior inimiga de Ino,observando-a querendo ajudar ela.O porque de querer ajuda-la eu não sabia,mas queria,talvez porque em certo momento da minha infância eu e ela fomos amigas de parquinho, e só, ou talvez porque, o meu lado humano era maior que o meu lado arrogante.

Me ajoelhei de frente pra ela e Ino só começou a chorar mais.

–Ino,o que aconteceu? -Eu perguntei esticando a mão para tocar seu braço mas ela me segurou pelo pulso-

–Não encoste em mim,Haruno,e saia imediatamente de perto de mim -Ela disse tentando fazer uma voz firme,mas a cada sílaba sua voz dava um falsete- Eu não quero ter justo você tirando uma com a minha situação.Pode rir e contar pra todos se quiser mas se prepare pra ter sua vida destruída amanhã. -Ela disse cuspindo as palavras enquanto se encolhia cada vez mais contra o azulejo branco do banheiro-

Puxei minha mão de volta e neguei com a cabeça,me sentando no chão.

–Não sou você,Ino,não uso a fragilidade dos outros pra me gabar nem pra me sentir superior. -Ela me encarou com os olhos arregalados- Estou perguntando o que aconteceu porque quero te ajudar,e não porque quero me aproveitar disso.

Ela soluçou uma, duas, três vezes, e então me observou por um instante,balançou a cabeça em sinal de negação enquanto mexia os lábios em palavras mudas.

–Ino,pode falar pra mim. -Suspirei me xingando mentalmente- Acha mesmo que eu contaria algo depois de tudo o que você já me fez? Eu sei como é sofrer na mão de alguém,não faria esse tipo de coisa nem com a pior pessoa do mundo,nem com você.

Ela soluçou mais forte e riu,de forma sarcástica.

–A última coisa que eu preciso agora é escutar de você a pessoa horrível que eu sou. -Ela falou e secou as lágrimas debilmente porque logo elas voltaram a escorrer novamente.Observei a mão de Ino,com as longas unhas sem esmalte,sujas de maquiagem e...sangue?- Saía imediatamente daqui,Haruno, se você se aproximar mais uma vez de mim eu juro por Kami que destruo a sua vida e essa sua cara de imbecil,sua aberração rosa.

–Ino...isso é sangue? -Falei ignorando a ameaça e puxando a mão dela, ela puxou a mão de volta no mesmo instante.Basicamente como se ela fosse feita de gelo e eu fosse fogo derretendo-a cada vez que me aproximava.-

–Não,claro que não. -Ela disse puxando as mangas do casaco- E eu não te devo satisfações,aberração!SAI DE PERTO DE MIM,SAKURA,SAI! -Ela berrou/gritou/esperneou entre soluços enquanto tentava praticamente se fundir com o azulejo.-

–Ino -Falei espantada- Você não fez o que estou pensando,fez? -Ela mordeu o lábio negando enquanto continuava chorando- Vamos lá,Ino,pode me contar o que quiser.Não vou tentar mais uma vez. -Soltei o ar- Me deixa te ajudar ou vou sair imediatamente daqui e vou te deixar berrando feito uma criancinha!Acredite,você quer que eu esteja aqui,porque sou a única pessoa nesse colégio inteiro que não vau tentar usar isso como vingança de todas as maldades que você já fez!

–EU NÃO ME IMPORTO COM VOCÊ NEM COM NENHUMA DESSAS BESTAS NESSE COLÉGIO! -Ela gritou me empurrando,eu basicamente não sentia nenhum empurrão,além de frágil ela estava fraca- EU NÃO QUERO A SUA AJUDA,NÃO QUERO A AJUDA DE NINGUÉM.

–Tudo bem,Ino. -Eu me ajoelhei no chão,me levantando- Se você quer se fundir com os azulejos e chorar até encher o banheiro então faça-o,mas não atormente ninguém com esses gritos estéricos.

Ela respirou fundo e depois de me olhar com puro ódio nos olhos ela simplesmente me puxou pelo pulso,quando fui levantar,e assentiu tirando o casaco rosa e o jogado ao seu lado no chão.Ela abraçou o próprio corpo e fechou os olhos com força quando me estendeu um dos braços.O pulso estava arranhado fortemente e sangue escarlate pulsava sobre a pele branca,não de maneira exagerada.

Eu pensei em falar "Ino,porque você fez isso?" ou algo do tipo,mas imaginei que ela não iria querer escutar isso,se fosse eu ali eu não gostaria.E eu nem arriscaria dizer a coisa errada,ela se negava tanto em aceitar minha ajuda que se eu cometesse qualquer deslize ela iria surtar novamente.

–Bom...-Prendi o ar- Temos que limpar isso aí,não é?

Ela me olhou espantada e algumas lágrimas rolaram levemente,ela já não soluçava mais.As secou rapidamente,entre um sorriso e uma expressão séria e se levantou,assentindo.

A porta do banheiro se abriu levemente e uma das faxineiras do colégio adentrou.

–Ah,não sabia que tinha alguém. -Ela disse envergonhada e saiu-

Encarei Ino por cima do ombro e ela estava com a mão na boca,assustada.

–Droga,pensei que fosse alguém do colégio. -Ela disse colocando a mão no coração-

–Nesse caso é melhor garantir. -Eu disse sorrindo enquanto empurrava o lixinho do banheiro com o pé,até ele ficar na frente a porta,impedindo que a mesma pudesse ser aberta-

–Porque esta sendo tão legal comigo? -Ela disse num tom calmo,não com raiva como antes.Mas do jeito que eu imaginei que nem com Karin ela deveria falar.- Eu sempre fui tão...

–Cruel? -Ela piscou enquanto abria a torneira- É,sempre foi.Mas em uma certa época nós fomos amigas,certo? E sei lá,acho que você vai ficar umas noites com a consciência pesada,vai fazer bem pra você. -Eu ri baixinho fazendo ela fazer o mesmo-

Ela colocou o braço embaixo d'água tirando o sangue dos arranhões,e então não parecia tão grave assim,só alguns arranhões mas não era nada desesperador.Em seguida ela jogou água no rosto,tirando toda a maquiagem borrada,eu não disse nada e ela também não,só a ajudei uma hora ou outra e não me senti desconfortável por isso.

Ino secou o rosto e se observou no espelho.Tudo aconteceu rápido demais e eu estava absurdamente assustada por conta do sonho anterior,ela estava tão nervosa antes e do nado se tornou tão dócil quanto um filhote de gato.Ela ficava mais bonita sem toda aquelas camadas e mais camadas de maquiagem,os olhos azuis ficavam mais brilhantes e davam mais atenção para o rosto em forma de coração,mas naquele momento eu só podia imaginar isso porque os olhos estavam vermelhos e levemente inchados.Ela ajeitou a saia e a regata e por fim o cabelo,sem o prender e então me encarou.

–Eu não sou louca. -Ela disse séria- Eu estava com raiva e sem querer...-Ela olhou para o próprio pulso- Não pense em contar isso pra ninguém,e não pense que vou fazer você virar a nova rainha de Konoha só porque foi legal comigo,e eu não aceito ameaças então é melhor nem tentar. -Ela disse,então,quase implorando com o olhar- Tudo bem,por favor só não conte tudo isso pra ninguém,por favor.

–Não vou contar,Ino,mas precisa me dizer porque fez isso. -Minha voz saía calma e eu não acreditava que conseguia manter uma aparência calma quando na verdade eu estava mais confusa do que qualquer outra coisa que eu poderia estar.Ela colocou a franja atrás da orelha e então olhou para as próprias mãos- O que te fez ficar tão nervosa ao ponto de fazer algo como isso?

–Você já teve problemas com aceitação,Sakura? -Ela se encarou no espelho,os olhos ainda estavam vermelhos- Já teve problema com seus pais? Tipo,problemas como eles não aceitarem você.

–Já,eu acho...-Lembrei das brigas com a minha mãe,das discussões em casa entre ela e meu pai,as vezes em que me tranquei no escritório com Gaara só pra fugir dos convidados e dos comentários maldosos deles- Já,já tive esses problemas.

–Sakura...-Ela se encarou no espelho novamente e então me encarou- Meus pais me odeiam,minha mãe não fala comigo e meu pai disse que tem nojo de mim. -Ela passou as costas da mão nos olhos rapidamente-

–Você,Ino? -Eu ri,não acreditando muito- Você é bonita,popular,tira notas boas...Porque eles te odiariam?

–Porque eu sou diferente,Sakura. -Ela abaixou a cabeça- Porque eu sou diferente,só por causa disso.Porque gosto de...algo diferente do que todo mundo espera que eu goste.Sabe aquela história de amores diferentes?

–Isso tudo por causa de um amor perdido?

–Não exatamente,eu não sei como contar isso mas é diferente do que os outros esperam,a pessoa que eu gosto não é como todos esperam que ela seja...Por isso meu pai tem nojo de mim,porque ele não vai ter o genro dos sonhos e porque eu gosto de algo diferente do que ele espera,e minha mãe me odeia por isso.

–Você não se envolveu com drogas,né? -Perguntei apreensiva e ela riu-

–Não,Sakura,não me envolvi com drogas nem nada do tipo.Posso te contar depois?

–Depois? -Falei espantada quando me lembrei de Kakashi e ela assentiu de forma curiosa-

–É,depois.Porque o espanto?

–Não vai voltar a ser a Ino patricinha de sempre quando sairmos desse banheiro? -Menti,arranjando a primeira desculpa que me veio na cabeça.Ino suspirou e me encarou pelo espelho.-

–Eu não vou voltar a ser a Ino patricinha,a gente desconta nos outros quando temos problemas as vezes,não era culpa minha.

–Tenho que discordar,sempre tive problemas e nunca descontei em ninguém. -Ela não riu dessa vez e me encarou-

–Não descontou nos outros mas descontou em você mesma. -Ela falou batendo com a ponta do dedo no meu nariz e em seguida no meu ombro- Tatuagens,piercings.

–Não exatamente. -Ela sorriu e então puxou uma presilha azul do bolso da saia,prendendo a franja pra trás enquanto o resto do cabelo continuava lhe caíndo sobre os ombros- Acho que você tem que tampar isso aí.

Ela assentiu e quando se virou para o casaco no chão,levemente sujo de vermelho e preto nas mangas,fez uma careta e em seguida me encarou.

–Não tem uma jaqueta aí,tem? -Ri balançando a cabeça-

–Nenhuma que Ino Yamanaka usaria. -Encarei as pulseiras de couro em meu braço e as retirei- Pode usar elas.

Ino sorriu pra mim,um sorriso de orelha a orelha que incendiou seu rosto,e me perguntei porque ela preferia sempre ser tão séria em vez de sorrir as vezes,com certeza as pessoas fariam mais coisas em troca daquele sorriso do que por chantagem emocional.Mesmo naquele momento tão sentimental eu sentia que um lado meu me dizia pra sair gritando no colégio o estado de Ino Yamanaka e como eu tinha visto ela cair em pedaço durante 10 minutos no banheiro feminino do primeiro andar.Ela colocou as pulseiras e se ajeitou na frente do espelho,os saltos de veludo preto ecoaram no chão quando ela caminhou para pegar o casaco.

–Pode guardar isso pra mim? Trocamos depois.Vou ter problemas se alguém me ver com esse casaco. -Ela balançou o braço fazendo os pingentes tinirem e eu guardei o casaco na mochila- Eu agradeço de verdade por ter...me ajudado,Sakura.E acho que realmente vou ficar com peso na consciência essa noite. -Ela disse num tom de brincadeira,e não com o tom superior de sempre-

–Claro...Amigas? -Eu ousei perguntar,obviamente eu não era a melhor pessoa pra arranjar amizades mas ao me lembrar dos dias do parquinho senti uma magoa gigantesca por não ser mais amiga de Ino.Ela sorriu novamente quando estendi a mão-

–Amigas. -E então ela me abraçou,e eu lembrei da pequena Ino no parquinho do infantil,com os cabelos loiros e curtinhos,sempre com um laço de cada cor no cabelo- Vou precisar de uma amiga agora.

–Porque? -Falei quando ela se afastou-

–Eu não reajo bem a ameaças. -Ela disse e então sorriu,da maneira maldosa de sempre- Fiz uma besteira,contei algo pra Karin e ela achou que poderia usar isso contra mim.Mas ela se esqueceu que antes de Karin Uzumaki nascer,Ino Yamanaka já mandava nesse colégio.

–Pela primeira vez eu fico feliz em ver esse sorriso. -Falei ajeitando a bolsa no ombro enquanto chutava o lixinho e saía do banheiro-

Ino piscou algumas vezes e respirou fundo enquanto passava as mãos pela saia.Se virou pra mim rapidamente e ajeitou as alças da regata.

–Tchau,Haruno. -E por fim falou mais baixinho- Preciso ser a Yamanaka de sempre até o último segundo.

–Até o último segundo?

–Karin vai me detonar e só depois isso vai acontecer com ela.Eu não vou perder esse reinado sozinha. -E então ela jogou os cabelos pra trás,andando sobre os saltos altos ao longo do corredor vazio- Ino Yamanka não tira a coroa enquanto Konoha não jogar a tolha.

Suspirei ajeitando a franja e então caminhei em direção a minha sala.

Primeiro Kakashi e agora Ino,com toda certeza Konoha estava virando de cabeça pra baixo.Exatamente do jeitinho que eu sempre sonhei ou não.

Eu estava com a mente tão perturbada que nem poderia explicar em palavras,estava ansiosa por causa de Kakashi,estava ansiosa por causa do segredo de Ino,estava ansiosa pra saber o que Gaara estava me escondendo e mais ansiosa ainda pra saber se todo aquele jeito cuidadoso de Sasuke era real comigo.

Por fim,eu estava tão desesperada que nem conseguia pensar direito no que fazer.Só o fato de ter que explicar a história de Ino e Kakashi para Gaara e Sasuke já me deixava louca.

E me deixava mais louca ainda saber que eu teria uma semana pra saber e resolver tudo isso.

Com toda certeza,seria uma longa semana.