O Último Ato escrita por Liv Marie


Capítulo 9
Parte 9


Notas iniciais do capítulo

FYI: A última frase desse capítulo estava programada desde o principio dos tempos.



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Era de se pensar que a Terra fosse tremer, que haveria tempestades de raios e trovoadas ou talvez uma nuvem de fumaça roxa se espalhando por Storybrooke – não seria a primeira vez.

O que realmente acontece é menos poético e romântico do que qualquer conto de fadas ou história.

Há o encontro de dois corpos. Suor e gemidos, roupas demais e eventualmente roupas de menos. Os cabelos de Emma espalhados sobre os travesseiros em um emaranhado de fios loiros e Regina por cima – claro – o dorso estendido e os olhos fechados, toda a sua concentração residindo na sensação dos menores toques.

É uma visão e tanto, a imponente rainha entregue ao mais puro frenesi. A figura eternamente composta, agora em completo desalinho, o peito arfante, as faces em chamas e o menor dos suspiros escapando entre seus lábios partidos. Mais do que admiração, é com uma arrebatadora surpresa que Emma percebe que quer mais, a impetuosidade de seu desejo quase exacerbante.

Ela quer olhos de Regina ancorados junto aos seus e a certeza imperturbável de que a mulher que tem diante de si está mais do que ciente de quem está compartilhando sua cama, de quem está tocando partes que são só suas. De quem a tem em suas mãos.

Ela quer seu nome na boca dela, de novo e de novo, até que as palavras percam completamente o sentido e tudo o que reste seja apenas a rouquidão da voz de Regina junto ao seu ouvido.

Mais que tudo, Emma deseja ver Regina sucumbir inteiramente ao seu toque e cada gesto seu é guiado por uma incandescente necessidade de sublimação.

Assim, Emma impulsiona o corpo contra a cama, uma das mãos oferecendo-lhe apoio enquanto a outra se perde entre as pernas de Regina, lutando para controlar seu fôlego e o compasso de seu coração enquanto seus dedos trabalham com destreza e precisão.

Então acontece rápido demais, Emma encontra o que estava procurando e Regina abre os olhos, surpresa com a intensidade da onda de prazer que se espalha pelo seu corpo de uma só vez, quase sem aviso, sua expressão se contraindo e sua voz sendo engolida quando os lábios da loira capturam os seus com possessividade.

Quando o corpo de Regina tomba sobre o seu, sem forças e sem fôlego, Emma se permite saborear os pequenos detalhes desse momento como o contato de suas peles, o gosto de seus beijos e a sensação de seus corações batendo em ritmos desencontrados. Regina fecha os olhos imediatamente, o corpo rolando preguiçosamente contra os lençóis, mas sem nunca quebrar contato realmente, apenas se moldando à presença de Emma em sua cama.

Antes que qualquer palavra possa ser dita, sua respiração ganha uma cadência familiar e Emma não precisa abrir os olhos para saber que o sono finalmente rendeu a rainha. O mesmo não pode ser dito a seu respeito e por uma infinidade de minutos que lhe escapam, seus olhos verdes e vivos encaram fixamente as sombras desenhadas junto ao teto e a enormidade do que acabou de acontecer.

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Emma não sabe ao certo quando o sono venceu seus sentidos, mas quando abre os olhos novamente, os raios de Sol invadem o quarto sem pedir licença enquanto uma mão insistentemente a cutuca com uma sutileza inexistente.

"Acorde Xerife!" Emma esfrega os olhos com uma das mãos e mesmo que a figura diante de si não ganhasse foco em questão de segundos, sua voz é inconfundível.

"Bom dia para você também Regina." A loira balbucia se espreguiçando languidamente, sem entender a urgência no tom da ex-prefeita embora o franzir de testa de inquestionável censura estampado em seu rosto dificilmente possa ser considerado novidade.

"Você precisa ir." Regina insiste com veemência e empurra um embolado de roupas na direção de Emma que não pode deixar notar que a ex-prefeita já se encontra devidamente vestida, pronta para mais um dia.

"Você realmente sabe como fazer uma garota se sentir especial." Emma resmunga sonolenta enquanto veste a camiseta que usava na noite anterior. Mesmo com seu campo de visão coberto pela peça de roupa ela é capaz de identificar o revirar de olhos oferecido por Regina.

Com um suspiro impaciente, a ex-prefeita elabora. "Você precisa ir antes que o Henry acorde e perceba que você passou a noite aqui."

"Ah." Emma arregala os olhos, a súbita compreensão aguçando seus sentidos enquanto suas mãos liberam os fios de cabelos loiros que ficaram presos sob a gola de sua camiseta. "Certo."

Com premente destreza Emma rola sobre a cama e a abandona em um pulo, imediatamente se dirigindo à porta, mas não sem antes ser impedida pela voz de Regina que, do lado oposto do quarto, coloca uma mão contra a cintura e adota uma postura de indisputável superioridade. "Xerife, você não está se esquecendo de nada?"

Emma congela onde está por um breve instante, como um cervo capturado em um cruzamento por um carro e seu farol alto. Sem saber ao que Regina está se referindo exatamente, mas com uma leve suspeita nascida de seus mais íntimos temores, Emma oscila, a interrogação inadvertidamente presente em suas palavras. "Obrigada pela noite?"

Desta vez, o revirar de olhos de Regina é deliberado e inevitável. "Sinceramente Miss Swan..."

Em um gesto rápido, a ex-prefeita joga algo em sua direção que Emma captura sem titubear. E é com um abrupto rubor cobrindo suas faces que a loira percebe que o item em questão se trata de uma calcinha. A sua, para ser exata.

Com toda dignidade que lhe resta, Emma ergue o queixo, evocando o máximo de descaso que a situação lhe permite. "Er, valeu."

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Após certificar-se de que Emma já achou o caminho para o próprio quarto, Regina se dirige à cozinha com a intenção de dar início aos preparativos para o café da manhã. O que ela não espera é se deparar com a presença de Henry, inteiramente desperto e ocupado entre vasilhas e algo que seus sentidos informam estar prestes a queimar sobre o fogão.

"Henry?" A expressão no rosto de Regina reflete sua indisfarçada confusão.

Com olhos arregalados, o garoto congela onde está por um instante, em seu rosto uma expressão idêntica à oferecida por Emma ainda há pouco. Normalmente tal ocorrência serviria apenas para atiçar antigas feridas, conjurando dolorosamente as palavras de Henry no dia em que Emma entrou em suas vidas.

Eu achei minha mãe de verdade.

Mas não hoje. Neste momento a semelhança é quase reconfortante, de uma forma que Regina não compreende e tampouco consegue explicar para si mesma.

"Você está acordada." O menino parece desapontado com a noção e nem ao menos passa pela cabeça de Regina o motivo para tanto.

"Esse é o horário que sempre acordo. Você, por outro lado..." Regina refuta, embora não seja censura e sim uma vaga suspeita que se manifeste em suas palavras.

"Era para ser uma surpresa." Henry admite embaraçado. A espátula com que mexia os ovos na frigideira, pingando sobre o balcão.

"Tenho certeza de que Emma ficará surpresa ao acordar e se deparar com a cozinha em chamas." Regina suspira e se dirige ao fogão, tirando a frigideira do fogo. Ante a súbita aproximação de sua mãe, Henry hesita por um momento, somente para recuar em seguida, cedendo o espaço.

"Não era para a Emma." Ele responde em voz baixa e não de imediato, o que torna sua admissão ainda mais inquietante. Não fosse pela proximidade, talvez Regina sequer tivesse ouvido.

"Oh." Ela não consegue sequer improvisar uma reação, o choque blindando suas emoções.

"Eu ouvi você ontem à noite." O menino elabora nervosamente, o que apenas serve para deixar a ex-prefeita mais apreensiva.

"Você ouviu?"

"Emma disse que você estava tendo pesadelos." Ele explica e Regina mal consegue conter a onda de alívio que inunda seu corpo. Henry nada parece perceber. "Então... Eu lembrei que você costumava preparar um café da manhã especial quando eu ficava doente. E eu sei que você não está doente, não mais, mas..."

Em algum momento as palavras de Henry se perdem completamente e é possível que seja pelo fato de Regina ter se voltado em sua direção, os olhos escuros e familiares que ele conhece desde sempre completamente focados em sua figura e Henry quase consegue ver, em um efêmero vislumbre, a afeição que sempre esteve ali, ainda que Regina nunca tenha encontrado formas de expressá-la devidamente.

"Eu..." Regina não sabe o que dizer, suas feridas perigosamente expostas diante de seu filho.

Então, em um piscar de olhos, qualquer indício de sua existência desaparece e mais uma vez Henry se depara com o mais absoluto vazio. Nenhum sentimento. Nenhuma empatia. Nada. Apenas um impessoal senso de diplomacia. "Eu aprecio a intenção do gesto, Henry. Mas realmente, não era necessário."

Henry não responde, contendo seu desapontamento e percebendo seus esforços, Regina oferece uma mínima indulgência. O máximo que ela se permite, ainda que intimamente a voz de Cora se manifeste cortante, condenando seus esforços.

Amor é fraqueza.

"Acho que é bastante claro de quem você herdou os dotes culinários. Mas se quiser, você pode ficar e observar."

Parte de Henry quer correr sem olhar para trás. Mas outra parte, uma que ele se envergonha em admitir, apenas sente falta de sua mãe.

A mãe que lhe preparava cafés da manhã especiais quando ele estava doente. A que cortava seu cabelo, preparava seu lanche, reclamava quando ele deixava os sapatos jogados no corredor. Mais do que tudo, ele sente falta da mãe que não sabia amar muito bem, mas que o amava mesmo assim.

Em momentos como esse Henry não tem certeza de que jamais a verá de novo. Mas então ela lhe oferece um descuidado sorriso, sua concentração inteiramente focada nos preparativos do café da manhã. E ele fica.

E espera.

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O café da manhã compartilhado em família é, no mínimo, desconfortável. Não no que depende de Regina. Contra todas as expectativas de Emma, a ex-prefeita se move pela cozinha com a mesma destreza usual, como se absolutamente nada tivesse acontecido na noite anterior – sejam os pesadelos debilitantes que lhe acometeram ou as atividades indecorosas compartilhadas entre ela e a xerife em questão.

Por outro lado Emma, não consegue funcionar direito, o que acontece em parte devido ao fato de ela não ter dormido o suficiente para descansar - mais uma vez - mas também porque ocasionalmente, contra a sua vontade e sem o seu controle, lampejos da noite anterior invadem sua mente sem qualquer aviso.

A primeira vez que acontece é quando Emma pede pelo bule de café. Estando o objeto ao lado de Regina, ela lhe estende o mesmo sobre a mesa, seus dedos se tocando brevemente pelo gesto. O mais leve dos toques, no entanto, desencadeia uma série de lembranças, todas com uma riqueza de detalhes, cores e sons, suficiente para que, em choque, Emma deixe o bule escapar por entre seus dedos, seu conteúdo sendo derramado sobre a toalha.

"Emma, cuidado!" Henry reage diante do acidente, empurrando a cadeira na qual está sentado para trás ao se levantar, buscando desviar ileso da bagunça provocada.

"Desculpa--" Emma gagueja, se levantando da cadeira em seguida, mas Regina é mais rápida e antes que a loira possa reagir, a situação já foi contida. Com um guardanapo de pano, Regina enxuga o líquido escuro que se esparramou sobre a toalha deixando uma mancha úmida em seu caminho.

"Tudo bem, foi apenas um acidente." Regina assegura ao filho, embora seus olhos se mantenham firmes sobre a figura da xerife.

"O que há de errado com você?" Henry se dirige à Emma, não com censura, mas desconfiança, olhos semicerrados em evidente sinal de suspeita e a testa franzida em uma expressão que é um espelho a de sua mãe biológica.

"Do que você tá falando?" Emma rebate defensivamente.

"Sei lá." Henry coça a cabeça e retorna ao seu assento. "Você está esquisita desde que acordou."

Antes que Emma tenha a chance de responder, ou mesmo de pensar em uma resposta, Regina intervém. Para sua surpresa e alívio. "Henry, termine de comer suas torradas ou você vai se atrasar."

A atenção oferecida por Regina é o suficiente para conter as inquisições do garoto que obedientemente atende ao seu pedido. Emma não chega a agradecer Regina, embora o alívio seja evidente em suas feições.

Do outro lado da mesa, os olhos de Regina encontram os seus por um breve instante e Emma é capaz de enxergar um vislumbre de qualquer coisa ali presente. Não é nada que ela consiga identificar precisamente e existe uma chance de que mesmo Regina não saiba do que se trate.

Evitando que mais uma onda de recordações inusitadas se manifeste, Emma desvia os olhos, optando pela rota de escape mais rápida.

"Vamos garoto, tá na hora." Henry aceita sua intimação sem hesitar, correndo para o andar de cima para escovar os dentes antes de sair e deixando as duas sozinhas pelo mais constrangedor dos instantes.

Brincando com as chaves do fusca, Emma centra toda sua atenção no objeto que tem em mãos, ignorando deliberadamente a presença de Regina, bem como o olhar inquisidor que descende sobre sua figura.

"Desculpe pela..." Emma enuncia inarticuladamente, os dedos passeando pelas endentações do objeto metálico.

"Acidentes acontecem." A morena responde com descaso, observando a figura da xerife com cautela.

Então, Regina está prestes a dizer algo, após um longo e incomum silêncio de sua parte, quando Henry retorna interrompendo o momento.

"Tô pronto." O menino anuncia, mochila nas costas e um sorriso cuidadosamente estampado rosto, a energia que reverbera de seus menores gestos preenchendo o ambiente no qual antes havia apenas estranheza.

"Vamos então." Emma deixa escapar um suspiro que não havia percebido estar contendo até então e se dirige à saída parando junto à porta ao perceber que não está sendo seguida. Ao se voltar para trás, a cena capturada por seus olhos a pega de surpresa.

Com exagerada formalidade Regina estende uma lancheira na direção do garoto. Emma ergue uma sobrancelha ao reconhecer o objeto, lembrando que, aos doze anos, mesmo garotas não usavam mais semelhante utensílio, um alvo certo de troças por parte dos outros colegas de escola. Entretanto Henry não faz qualquer objeção ao receber o objeto. Pelo contrário, o sorriso em seu rosto é algo que Emma não se lembra de ter visto em muito, muito tempo.

"Obrigada mãe." Ele agradece, seu tom suave denunciando sua comoção. E por um momento Regina ergue uma das mãos, em um gesto instintivo de carinho que perde a força antes de ser concretizado.

Emma não sabe o que a detém, mas seja qual for o pensamento que atravessa a cabeça de Regina, é o suficiente para devolver sua sobriedade. Como se subitamente ela estivesse ciente de suas ações. Como se o gesto de carinho fosse um delito.

Henry, por sua vez, aguarda esperançoso. Com o coração apertado Emma chama o seu nome antes que a decepção chegue ao seu encontro. E pela expressão do garoto quando os dois estão sozinhos no carro, o gesto de Emma, ainda que bem intencionado, revela-se tardio.

.::.

Acontece de novo no horário de almoço, quando Emma tenta tirar um cochilo em uma das celas e acorda com a voz de seu pai.

"Ela não tá aqui Emma." Ele responde com naturalidade e o som de seu nome é o suficiente para que a xerife desperte de seu sono leve.

"Quem?" Ela pergunta sem entender e pela expressão de seu pai, não é ele quem vai saber explicar.

"Regina?" David responde mais uma vez, a testa franzida. "Você estava chamando o nome dela."

"Ah." Fragmentos dos sonhos de Emma retornam com desconcertante nitidez. O suficiente para que ela sinta o rubor lhe cobrir as faces. "Eu tava falando com ela no celular."

É a desculpa infame que Emma tem a oferecer e graças a Deus que é David quem trabalha com ela na delegacia e não Mary Margaret, caso contrário Emma jamais seria capaz de escapar dessa ilesa.

.::.

"Aqui está o seu bagel, Doc." Ruby informa colocando o prato na mesa, diante de Archie. Com um ganido, Pongo se manifesta debaixo da mesa, onde está preso pela coleira, recebendo uma piscadela compadecida por parte da garçonete.

"Obrigada Ruby." Archie sorri amistoso e está prestes a dar uma dentada no bagel quando uma cortina de cabelos loiros se acomoda bruscamente em sua mesa, no banco oposto ao seu.

"Archie, eu preciso da sua ajuda. De novo." Emma enuncia de forma conspiratória, o corpo debruçado sobre a mesa e suas palavras sussurradas. Seu comportamento apenas serve para intrigar o psiquiatra.

"Está tudo bem?" Archie se aproxima olhando para os lados conspicuamente.

"Claro que não! Por isso preciso da sua ajuda!" Emma justifica impacientemente.

"Mas é claro. Eu presumo que o problema seja com a Srta. Mills."

"Por que você diz isso?" Emma ergue uma sobrancelha, sem conter sua paranoia.

"Porque esse foi o motivo do nosso último encontro." Archie aponta de forma óbvia, estreitando os olhos por trás de sua armação. Sua resposta parece ser a certa, pois Emma relaxa visivelmente embora o nível de tensão em sua figura ainda seja mais que expressivo.

"O que eu te falar, você não pode falar com ninguém. Certo? Por conta daqueles pactos que rolam entre médicos e pacientes."

"Bem, tecnicamente você não está me pagando, então..." O que quer que Archie enxergue nos olhos de Emma é o suficiente para compeli-lo a mudar sua abordagem. "Eu quis dizer que sim. Absolutamente."

"Bem," Emma olha para os dois lados, certificando-se de que ninguém mais está ouvindo sua conversa. "lembra quando eu falei que a Regina estava passando as noites em claro?"

"Sim. De acordo com o seu relato Regina estava apresentando um quadro de insônia."

"Pois é, eu descobri o motivo." Emma atropela as palavras do médico. "Ela estava tendo pesadelos. Com a Cora, o cara do estábulo e o Henry. Na noite passada ela acordou gritando. Deu um baita susto no garoto."

"Isso certamente indica um elevado grau de perturbação. Eu posso receitar alguns remédios se ela aceitar fazer uma visita ao meu consultório." Archie oferece prestativamente, o que apenas aumenta a exasperação de Emma.

"Obrigada, eu vou sugerir isso a ela. Mas essa não é a razão pela qual eu te procurei."

"Então me diga. Sou todo ouvidos." Ele reafirma, os olhos fixos na figura de Emma enquanto uma das mãos busca a xícara de café sobre a mesa e a leva até seus lábios.

"Então, lembra que você disse para eu me aproximar dela, para ouvir o que ela tinha a dizer... Pois é, eu acho que fiz alguma coisa errada porque nós acabamos passando a noite juntas."

Archie quase cospe o café sobre a mesa, completamente despreparado para a confissão oferecida por Emma. "Vocês o que?"

"Você sabe... huh... Dormimos juntas? Uma expressão para quando você faz sexo com outra pessoa." Emma responde com ironia. "Eu estou bastante certa de que contos de fada ou não você está familiarizado com o conceito."

Com o rubor lhe subindo pelo colarinho da camisa, Archie procura recuperar sua postura profissional.

"Sim, é claro. É só que..." Ele tira os óculos e aperta a ponte do nariz procurando se concentrar. "Emma, como isso aconteceu?"

"Eu não tenho certeza. Em um instante nós estávamos ali sentadas super perto uma da outra, e ela estava chorando e tudo o que eu queria era fazê-la se sentir melhor."

"E?"

"E aí eu fiz." Emma dá de ombros.

"Emma, isso é altamente inapropriado. Regina está em um momento muito vulnerável. Você sabe disso melhor que ninguém. Qualquer envolvimento emocional pode representar..."

"Hey hey hey! Quem falou qualquer coisa de envolvimento emocional? Eu posso te garantir que foi só sexo. Bastante intenso e tudo mais, mas não mais que isso, ok?" Emma justifica imediatamente, temendo as implicações sugeridas pelo psiquiatra.

"Talvez, em outro contexto isso fosse possível. Mas ante as atuais circunstâncias, eu não teria tanta certeza. Regina está no meio de uma recuperação bastante trabalhosa de um terrível trauma. Ela precisa de todo apoio emocional possível, não alguém que tire vantagem da situação."

"Olha só: Se tem alguém tirando vantagem, esse alguém é ela. Eu estava ocupada demais fazendo todo o trabalho." As imagens da noite anterior a visitam, mais uma vez, lembrando Emma dos motivos que a levaram a procurar o Dr. Hopper. "Olha Archie, eu posso te garantir: o que aconteceu ontem a noite foi inteiramente consensual. Pro diabo, era Regina quem estava no comando. O que foi super--" Emma engole as palavras que estão prestes a lhe escapar, as recordações mais uma vez nublando seu foco.

Com algum esforço, ela procura se ater ao tópico em questão. "Bem, o problema é que agora eu estou meio que sendo assombrada."

"Assombrada?" Archie repete, tentando compreender, mas sem grande sucesso.

"Sim! Pelas lembranças da noite passada. Lembranças muito vivas e inoportunas. E eu não quero que as coisas fiquem estranhas em casa e principalmente eu não quero que o Henry perceba nada, entende?"

"Bem, você poderia ter pensado nisso antes de agir, não?" As palavras de Archie são recebidas por Emma com afetado desdém e ela sequer tenta conter o sarcasmo em sua resposta.

"Obrigada Dr. Óbvio, mas agora é meio que tarde pra essa opção."

"Você está certa. Sinto muito. Eu apenas não estou certo de como posso ser de alguma ajuda." Archie admite resignado.

"Do que você tá falando? Você tem que me dizer o que fazer!" Emma suplica, desesperada e algo em seu tom comove o psiquiatra.

"O ideal seria que vocês conversassem a respeito. Talvez tentar entender o que levou cada uma até essa situação." Emma faz uma careta, incrivelmente avessa à mera noção.

"Qual a outra opção?" Emma pergunta sem hesitar e Archie responde conformado. Conhecendo Emma, semelhante reação não é nada surpreendente.

"Tente voltar à normalidade. Deixe esse acontecimento no passado. Acidentes acontecem, embora eu não esteja inteiramente certo de que a presente situação possa ser classificada como tal." Ajustando os óculos, sua última sugestão é direta e clara, sem deixar brechas para dúvidas. "E o que quer que você faça: não deixe acontecer novamente."

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Emma sabe que Archie está certo.

Ela já sabia antes mesmo que ele dissesse.

O que aconteceu entre ela e Regina não pode acontecer novamente. E não é só por causa da frágil harmonia que finalmente parece ter se estabelecido sob o teto da mansão Mills, ou o fato de que elas nem mesmo se suportam na maior parte dos dias. Também não é necessariamente pelo fato de Emma estar certa que Snow teria um ataque fulminante se descobrisse o ocorrido (embora esse seja um fato de bastante peso) ou porque ela não faz ideia de qual seria a reação de seu filho se ele se deparasse com semelhante informação.

A razão pela qual Emma não pode deixar que aconteça de novo é bem mais simples e ao mesmo tempo, muito mais complexa do que tudo isso.

É porque ela gostou. Mais do que jamais ousaria admitir para qualquer pessoa mesmo sob os mais excruciantes métodos tortura.

Não foi apenas bom, foi muito além do que palavras podem explicar.

E isso simplesmente não pode estar certo.

E, portanto, não pode se repetir.

Então, à noite, ao voltar do trabalho, Emma fica na sua. Nada de discussões que possam ser confundidas com flerte ou preliminares – o que, pensando bem, acontece com alarmante frequência entre as duas. Não. Ao invés disso, Emma se ocupa em comer seu jantar, ouvir as histórias que Henry tem a compartilhar sobre seu dia e pela primeira vez em semanas, ela se dispõe encerrar a noite cedo, indo direto para cama.

Ou pelo menos era essa a ideia.

Mas então Henry pede ajuda com a maquete que ele tem que preparar para o dia seguinte – e o garoto é inegavelmente seu filho, por que é claro que ele deixou o trabalho todo para o último dia antes do prazo final de entrega – o que resulta em uma explosão de isopor, papéis picados e tinta sobre a mesinha da sala de televisão.

Então, antes que Emma dê por si, já passou muito do horário de dormir do moleque, e Regina o manda direto para a cama, sem qualquer espaço para discussão, cabendo a Emma limpar e organizar a bagunça deixada no cômodo.

Em um minuto, ali está ela, rezando para que a aquarela não manche o sofá e no minuto seguinte ela levanta os olhos e se depara com Regina junto a porta, vestindo trajes muito diferentes dos que estava usando durante o jantar.

Emma sabe disso porque ela certamente se lembraria desse négligée preto se já o tivesse visto antes. Ainda mais quando ele abraça assim tão impecavelmente cada curva do corpo de Regina.

Ela está encarando. E ao perceber isso, é com igual desconforto que Emma percebe que Regina está mais do que ciente do efeito provocado na xerife.

É claro que ela estaria. Nada que Regina faz é acidental.

"Vocês dois certamente se superaram com esse projeto. Temo que meu sofá jamais volte a ser o mesmo."

"É..." Emma responde sem graça, as palavras tendo dificuldade para escapar de sua boca seca. "Foi mal."

"Tudo bem. Não é nada que não possa ser consertado." A resposta de Regina, quase descontraída, é o suficiente para deixar Emma mais do que alerta.

"Pelo menos a gente conseguiu terminar tudo." Emma oferece a justificativa sem convicção.

"Bem, já é tarde." Regina aperta o hobby de seda sobre o corpo, cobrindo o négligée.

"É..." Com os olhos fixos em sua figura, Emma sequer consegue articular um 'boa noite' enquanto a ex-prefeita lhe dá as costas com o intuito de subir as escadas de volta aos seus aposentos.

Assim Emma ainda está mentalmente admoestando sua própria estupidez quando a voz de Regina a encontra mais uma vez.

"Xerife, você vem ou não?"

.::.

Continua...


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