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É estranho morrer. Não sentir mais a vida correndo nas veias. Mas o mais estranho de tudo é que quando se está morrendo, não é na morte que você pensa.

À princípio, me senti abatida como um porco no matadouro. Caída sobre meu próprio sangue, com uma faca presa ao peito; A faca com a qual Aimée me golpeara sem pensar duas vezes. No fundo, eu pressenti algo ruim. Só não quis acreditar de verdade. E depois disso veio a música e as lembranças do piano, das tardes que havíamos passado juntos, do cheiro da grama quente, do chá de maçã, do toque macio de suas mãos, dos lábios em minha pele.

-Emi!!!

Eu pisquei, incapaz de discernir a realidade do sonho. Minha língua envolveu-se em sangue e o gosto de ferro desceu-me pela garganta. De onde estava podia ver o céu límpido, rosa-alaranjado do fim de tarde, e me senti grata por poder vê-lo uma última vez.

-Emi, Emi!

Um vulto preto envolto em luz avançou em minha direção, os passos abafados pela grama do jardim. Ele caiu ao meu lado, chamou meu nome e repousou minha cabeça em seu colo. Eu sorri com dificuldade. Se aquele era o anjo que viera levar minha alma, bem, eu estava pronta.

As mãos do anjo seguraram meu rosto e suas lágrimas pingaram em minhas bochechas. Mesmo que desfocado aos meus olhos, eu podia ver que ele falava comigo. Eu queria responder, eu tentei responder, dizer que ele tinha meu total apoio para me levar embora, mas não havia voz e nem força em mim. Eu era uma grande posta de carne se desintegrando ao sol.

“Não vá...”, o vento sussurrou em meu ouvido, fraco e cálido.

Mas aquele destino já tinha sido traçado para mim. Fechei meus olhos e me deixei preencher pela música que o anjo tocava ao piano.

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