No dia seguinte, o clube de futebol parecia morto.

Todos estavam realmente tristes por Kudou ter sido demitido, e o sentimento de culpa voltou a pesar sobre mim. Mesmo que certa parte de mim estava animada, ainda havia aquela que amava futebol acima de qualquer outra coisa.

Havia poucos membros no clube daquele ano, e a razão disso era Tsurugi Kyousuke, mas ele não parecia se importar nenhum pouco com o fato de o odiarem. Ele não parecia se importar com nada com nada, na verdade.

Mas eu ainda não o conhecia realmente.

– O que vamos fazer agora, sem o treinador Kudou? – perguntava Hayame, um dos membros do clube.

– Aposto que o Quinto Setor ira mandar um cara para cá – falou Kurama, irritado – estamos realmente ferrados.

– Bom, não importa, contando que não atrapalhe minhas notas – comentou Minamisawa Atsuishi, indiferente.

– Você realmente não se importa com mais nada, não é? – perguntou Kurama, franzindo a testa.

– O que? Com o futebol, você quer dizer? Faça-me o favor...

Kurama se voltou para mim. Seu rosto mostrava uma certa quantia de raiva que me vez recuar um pouco.

– Isso tudo é culpa sua – falou ele, apontando para mim – se não fosse por esse cara ter entrado no time e vindo com aquela historia de “vamos jogar futebol corretamente” e blablabla, o técnico Kudou ainda estaria com a gente!

Todos olharam para mim. Senti uma atmosfera pesada em torno de mim, como se todo o sentimento de culpa e raiva de todos ali estivesse tomando forma em cima de mim. Baixei a cabeça e o silencio só era quebrando pelo som da respiração alta de Kurama.

– Você diz que quer jogar futebol com todos nós, mas o que você esta fazendo é tentar acabar com nossa ultima esperança de jogar! Não é o Quinto Setor o nosso problema, e nem Tsurugi, é você! Pare de tentar roubar nosso futebol!

Suas palavras chegavam até mim como se fossem pedradas. Senti minhas pernas ficarem bambas com o impacto que eles surtiam em mim.

– M-mas..eu só queria...

– Você é um egoísta! Por sua culpa perdemos Kudou! Por sua culpa não vamos poder mais jogar, nem mesmo partidas manipuladas..!

Kurama foi interrompido por uma voz mais alta.

– Eu não que vocês têm preocupações maiores do que brigar com o calouro do time.

Todos desviaram o olhar para a pessoa que havia parado ao meu lado. Tsurugi deu um sorriso maligno para todos.

– O que você... ?

– Vocês realmente acham que brigar com essa criança vai ajudar vocês? Hunf, vocês são mais estúpidos do que eu imaginei. Logo o Quinto Setor mandara outro treinar para vocês, um mais adequado, acho que é com isso que vocês deviam se preocupar.

Todos se entreolharam de cabeça baixa. A verdade é que ninguém realmente encarava Tsurugi nos olhos, apenas eu.

Ao ver que ninguém responderia nada, o mais alto deu de ombros e saiu, tranquilamente, de volta a escadaria. Me virei para vê-lo ir, tão despreocupadamente.

Naquele momento, eu tentava controlar a mim mesmo e meus pensamentos. “Tsurugi me ajudou?” eu me perguntava.

Era um tanto difícil para mim pensar direito naquele momento. Minha cabeça estava entre Tsurugi ter-me “salvado”, de alguma forma, e o time de futebol, que agora provavelmente me odiava.

Pouco a pouco todos foram deixando o campo. Shinsuke passou por mim um tanto abatido. Sinto que ele teria colocado a mão em meu ombro para tentar me confortar, mas ele não o alcançava. Saiu me deixando sozinho no campo. Meu olhar provavelmente o dizia que eu precisava de um tempo.

Me sentei no gramado por um tempo e observei a paisagem. Eu amava aquele campo. Mesmo que os momentos em que passei lá não fossem como eu costumava sonhar que seriam. Naquele campo, todos pareciam estar acorrentados ao seu amor por futebol. Todos eram incapazes de realmente se divertir. Jogar de verdade havia se tornado um pecado. E eu não podia aceitar isso.

O tempo foi-se passando e eu não tinha animo para levantar dali. Eu havia me distraído olhando para a paisagem logo a frente, até que vi Tsurugi passando.

Por impulso, ou talvez por muita vontade mesmo, me ergui num pulo e corri até as escadas para tentar alcança-lo.

Ele andava devagar e pensativo, e só percebeu minha presença a seu lado depois de um tempo. E então, olhou para mim um pouco bravo, com ar de desaprovação.

– O que você quer? – perguntou.

– Obrigado por ter-me... “salvado”, digamos assim – falei, um pouco tímido.

Tsurugi fez uma careta e ergueu as sobrancelhas.

– Eu não “salvei” você...

– Talvez não tenha sido realmente sua intenção – falei um pouco triste – mas não deixa de ter me ajudado. Eu realmente não sei o que teria feito se aquilo continuasse.

– Oh, sim, Matsukaze, eu só não sei como você planeja salvar o futebol com suas atitudes.

Arregalei os olhos para ele.

– Eu...

Ele deu um sorriso um tanto provocador, e se abaixou um pouco em minha direção. Senti meu rosto arder e provavelmente fiquei corado com tal situação. E alguma coisa me diz que o azulado havia notado isso.

– Como você vai me provar alguma coisa sendo tão fraco? – ele cochichou para mim.

Sua voz fez-me estremecer.

–E-eu vou!

– Não sei não...

– Vou-te mostrar.

Tsurugi levantou a cabeça e assumiu seu ar arrogante, dando de ombros para minhas ultimas palavras e se distanciando.

Eu não podia segui-lo, pois me sentia travado. “Porque eu estou tão nervoso? Só porque Tsurugi se aproximou de mim? O que é isso?”

Coloquei as mãos sobre o peito. Meu coração batia tão forte que chegava a ser um incomodo.

No dia seguinte, o clima do clube de futebol continuava tenso. Tsurugi havia parecido, o que para muitos indicava que o novo treinador mandando pelo Quinto Setor chegaria a qualquer momento.

Eu o observei de uma distancia longa o bastante para convencer a mim mesmo de que ele não perceberia meu olhar. Coisa que eu estava completamente errado. Tsurugi me encarava da mesma forma, só que parecia apenas zombar de mim com os olhos. Fiz uma careta ao pensar sobre isso.

– O que será que aconteceu com o capitão? – perguntou Shinsuke, se aproximando de mim.

Olhei a minha volta tentando enxergar Shindou Takuto. Ele não havia aparecido.

“ Com certeza tem algo a ver com a demissão de Kudou” Pensei comigo mesmo.

As palavras de Kurama voltaram a ecoar em minha cabeça.

“– Você diz que quer jogar futebol com todos nós, mas o que você esta fazendo é tentar acabar com nossa ultima esperança de jogar! Não é o Quinto Setor o nosso problema, e nem Tsurugi, é você! Pare de tentar roubar nosso futebol!”

Senti um enorme desconforto ao lembrar disso. Para mim, carregar um sentimento de culpa por algo que tivesse prejudicado alguém era quase insuportável, mas se este estivesse ligado ao futebol, era como carregar um crucifixo.

– O que é isso, pessoal? Se concentrem! – gritou um membro do clube.

Ninguém estava conseguindo treinar aquele dia.

Quando me dei conta, todos haviam sentado no gramado, desanimados.

– Esse é o fim do clube...

– Até mesmo o técnico Kudou...

– Ele sempre reconheceu que queríamos jogar livremente, não é mesmo?

– Eu duvido que conseguiremos jogar qualquer coisa agora.

Todos pareciam abatidos.

Minamisawa deu um sorrisinho desdenhoso para todos e passou a mão em seus cabelos, num ato um tanto atraente, porem, muito arrogante.

– De qualquer forma, é só obedecermos o novo técnico que o Quinto Setor nos mandara, e nossas notas do boletim serão salvas – falou ele.

Todos o olharam.

– Isso esta bom para você? – perguntou Kurumada.

– É claro, afinal é para isso que serve um clube, certo?

Houve uma pequena pausa, em que todos ficaram calados.

Senti meu coração sendo esmagado por tais palavras. Onde estava a paixão pelo futebol?

– No final das coisas, nada vai mudar, não importa quem venha – concluiu Atsuishi.

– Isso não é verdade.

Uma voz desconhecida ecoou por todo o campo e despertou todos os jogadores. Até mesmo Tsurugi olhou assustado em direção a figura que se aproximava do campo.

Ele era um homem que passava tanta confiança, que eu podia sentir toda a motivação e minha alegria pelo futebol voltando apenas de olhar para ele.

Endou Mamoru apareceu pela primeira vez em minha frente, e suava uma bandana laranja na cabeça. Seu sorriso parecia me arrancar de um abismo profundo de culpa e remorso. Todos pareciam impressionados, menos Tsurugi.

Não, Kyousuke o olhou indiferente. Eu tinha certeza de que ele sabia quem Endou era, mas ele não demonstrou se importar nenhum pouco com o fato dele ser um ídolo para todos que amassem futebol. Ele estava bravo, eu podia ver sua raiva em seus olhos.