O Anjo escrita por Babs


Capítulo 1
Capítulo 1




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    Não sabia há quanto tempo vagava pelas ruas desertas de Londres. Também pouco me importava. O magnífico tapete branco, que se estendia por toda a cidade, tentava, em vão, criar obstáculos à fina saia de tafetá que trajava.

    Embora exausta, continuava a caminhar. Minhas pernas falhavam a cada passo que dava enquanto meus lábios tremiam em resposta ao vento gélido que chicoteava meus ombros nus.

   Longe em pensamento, não me importei quando tropecei, apenas permiti que meu corpo, já sem forças, continuasse sua trajetória até o chão.

–Maldito! – Praguejei ao vazio, enquanto permitia que lágrimas manchassem meu rosto pálido.

    Sabia que a culpa era minha afinal, ninguém mandara acreditar em palavras bonitas e juramentos falsos.

- Tola – Disse a mim mesmo.

    Ali, sozinha na escura rua, apoiei minha cabeça em um poste de luz, abraçando meus joelhos na inútil tentativa de dissipar o frio enquanto minha mente percorria os destroços de minhas lembranças.

    Lembrei-me da primeira vez que caminhei por aquelas ruas; filha de camponeses, aceitei ainda jovem, a oportunidade de trabalhar como empregada em uma renomada casa de família.

    Foi assim que conheci Benjamim.

    Não pude deixar de sorrir quando sua imagem formou-se em minha mente. Alto, possuía corpo atlético e cabelo curto, sempre minuciosamente alinhado.

    Eu era a babá dos filhos de meu patrão, e ele, seu braço direito.

    Recordo a primeira vez que nos beijamos; Claro que já trocávamos olhares, mas somente com a ausência de meus senhores tivemos a oportunidade de nos aproximar.

   Os lábios dele eram tão macios e percorriam minha boca com delicadeza, ao mesmo tempo em que me ensinava às sutilezas do prazer.

    Tão logo nosso romance aflorou minhas preocupações começaram. Nossos encontros passaram a ser frequentes, e a cada fez ele transpunha mais as barreiras da sanidade.

    Finalmente, a noite fatídica chegou; mas rápida do que esperei. Completamente cega pela paixão, me entreguei por completo a suas carícias.

    Agora, um mês e meio após aquela noite lasciva, recebo, enfim, o castigo por meu pecado. Em meu ventre, carregava o fruto daquele amor insano.

    Ainda sob o efeito da paixão, contei a boa nova à Benjamim. Todavia, não esperava por sua reação; Com agressividade, atirou-me no chão com um tapa, xingando-me por minha burrice.

    Só assim entendi a real natureza daquele rapaz. Eu era bonita, tinha cabelos negros e um corpo bem modelado; ele um rapaz que possuía tudo o quisesse; inclusive eu.

    Não satisfeito em me humilhar, convenceu meu senhor de que eu era má influência para suas crianças, mandando-me para a rua.

    Rua essa que me encontro agora.

    Não podia voltar para casa, o que meus pais e toda a cidade diriam da mãe solteira?

    Tampouco tinha para onde ir, pois Benjamim tomou o cuidado de me deixar sem nada; Não sei como não me tirou o filho.

    Afastei a nefasta possibilidade de minha mente. Nunca me desfaria da criança. Ela era minha e se esse era meu destino, cuidaria dele da melhor forma que me fosse possível.

    Mas seria mentira se não confessasse que esperava morrer. O inverno parecia mais gelado esse ano, e eu tinha esperanças de não sobreviver a uma noite ao relento.

    Demorei para voltar a realidade e compreender que alguém falava comigo. Com dificuldade, elevei a cabeça, me surpreendendo ao ver um homem em minha frente.

    O cansaço e o frio me impediam de entender suas palavras. Sem saber ao certo suas intenções, aceitei a mão que ele me oferecia.

    Estava tão cansada e totalmente sem rumo que nada que ele fizesse me deixaria pior.

    Agradeci com o olhar quando o estranho me ajudou a entrar em um coche, não sem antes depositar um grosso casaco em minhas costas. Não conseguia falar, talvez fosse o frio, talvez o desespero que me dominava.

    Perdi momentaneamente a consciência durante a viagem. Mas acordei a tempo de ver para onde ele me levava.

    Descobri-me em um bairro residencial afastado da correria do centro Londrino. O estranho me ajudou a descer e me levou até uma casa de esquina.

–Sei que está confusa – Começou. – Mas tenho a melhor das intenções. – Me disse.

    Foi a primeira vez que consegui distinguir o que falava. Não sabia quem era, mas tinha uma voz linda.

    Com um sorriso forçado, tentei expressar minha gratidão. Fosse ele quem fosse, estava me abrigando. Fiquei grata por isso.

    A casa não era repleta em requintes, mas tinha sua beleza. Logo que adentrei percebi a temperatura agradável que a envolvia.

    Ainda sem saber quem era meu salvador, continuei a seguir seus passos, enquanto ele me mostrava a casa. Levou-me até um quarto, no andar superior. E enquanto eu me acostumava com a mudança de cenário, ele preparou um banho.

–Acredito que esteja cansada. – Falou. – Estarei lá em baixo. Desça quando achar que está bem. – Terminou com um sorriso.

    Notei que antes de se retirar deixou uma muda de roupa ao pé da cama.

    Com sua saída, me despi e entrei na banheira branca disposta ao canto do cômodo. Tão logo me ajeitei, pude sentir a água quente espantando o frio de minha pele e de minha alma. Demorei mais que o necessário, mas a sensação de calor me circundava de tal forma que fui incapaz de sair.

    Aproveitei para pensar no homem que me estendera à mão. Quem seria ele? O que queria? E o que ganharia me colocando, aparentemente, dentro de sua própria casa.

    Já fora enganada de mais para suportar outra surpresa. E mesmo assim, aceitava a generosidade de um estranho.

    Quando sai do banho e me aproximei da cama encontrei um bonito vestido na cor azul. Senti o tecido, constatando que era de qualidade superior aos trapos de segunda mão que costumava usar.

    Vesti-me e arrumei o cabelo antes de descer as escadas, tendo o cuidado de não anunciar minha chegada.

    Encontrei-o, de costas para a entrada, na sala de jantar.

    Percebendo minha chegada, ele se virou e indicou uma cadeira na farta mesa que preparara.

    Sentei-me, ainda em silêncio. Observando que ele me copiava.

–Sou Gabriel Foster– Apresentou-se com um sorriso sincero.

–Isabella Carter. – Respondi.

–Por favor, sinta-se a vontade. – Disse referindo-se a comida. – Deve estar com fome, não.

    De fato.

    Não querendo ser indiscreta, coloquei uma pequena porção de batatas no meu prato, não deixando de observar a louça que enfeitava a mesa.

–Obrigada... por tudo. – Disse antes de levar o garfo à boca. – Mas não posso deixar de me perguntar o por que. – terminei, com cautela.

–Imagino. – Respondeu sorrindo.

    Reparei no sorriso sincero que ele me dirigia, e na melodia agradável que sua risada produzia.

–Peço desculpas, senhorita, por minha indiscrição. – Trabalho no banco e estava a caminho da casa de um cliente quando a vi sendo demitida. – Explicou-se. – Agora a noite, a encontrei enquanto caminhava, quase congelada, na rua.

–O que quer de mim? – Questionei

–Juro que só quero ajudar. – Disse sério. – Vivo sozinho nessa casa desde que minha mãe morreu e acredito que você não tenha para onde ir.

–Não quis lhe ofender. – Respondi. – É que, depois de hoje, acho difícil confiar em alguém.

    Não sei ao certo o porque, mas contei toda a minha trajetória aquele homem que conhecia a poucos minutos. Contei-lhe de minha sina e a triste situação em que me encontrava.

    Para minha surpresa, ele me contou sua história e embora não me devesse nada, fiquei feliz em ouvi-la.

    Descobri que sua mãe biológica morrera no parto e que passara parte da vida em um orfanato até ser adotado pela família Foster. Por alguma razão, me senti calma e em casa.

–Acho que este foi o motivo de tê-la ajudado. – Concluiu. – Sei como é não ter nada nem ninguém.

–Obrigada. – Agradeci sincera, pousando minha mão sobre a sua.

–Pode ficar se quiser. – Ofertou, olhando-me.

–Parece que esta casa precisa de cuidados femininos. – Brinquei.

    Ele riu novamente, me fazendo perder naquele gesto.

–Teve um longo dia. – Começou. – Deve estar cansada. Amanhã é domingo. –Anunciou. – Descanse, e conversaremos mais de manhã.

–Farei isso. – Consenti, me levantando.

–Boa noite Srta Carter.

–Isabella – Corrigi-o.

–Boa noite Bela. – Desejou sorrindo.

–Boa noite. – Retribui.

    Subi as escadas para meu quarto. Meu quarto. Era difícil de acreditar, depois de tanta turbulência não imaginava que um anjo fosse me ofertar seu lar e sua atenção.

    Deitei-me na cama, sentindo o quão confortável era. Agradeci a Deus.

–Achamos um anjo, pequenino. – Disse à minha barriga. – Um anjo. – Repeti antes de cair no sono.

    Aquele fora um longo dia, e embora a esperança de morrer ainda parecesse ser a solução, a sensação de recomeçar me inundou por completo naquela madrugada fria. Enquanto a neve caia lá fora, descansei minha mente, sabendo que o amanha seria melhor que o hoje.


Fim



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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado!



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