Forever Charmed escrita por Bella P


Capítulo 12
Trinta e Uma Semanas - Parte 3




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Ryuichi

Desespero não era uma palavra boa o suficiente para definir o que eu sentia. Pânico mais desespero talvez chegasse perto. Pavor era uma opção. Mas por que eu sentia isso?

Porque Tatsuha estava desmaiado dentro daquela gaiola estúpida, e estava sangrando, enquanto Mika gritava feito uma hiena, Shuichi chorava e Eiri tentava reanimar o irmão caçula.

Ayaka já foi mais prática, correu até a gaiola e arrancou a porta desta com um puxão poderoso. E o som do metal contra o chão me acordou do meu torpor e fez o meu corpo inteiro reagir por instinto.

Senti a minha transformação retroceder com tamanha rapidez, que acho que fiquei até zonzo. Kitazawa agora nada mais era do que um monte de cinzas no chão, e passei por cima dos seus restos mortais em minha corrida frenética até a gaiola.

– Ayaka! - chamei assim que cheguei até os irmãos e sem nenhum esforço ergui Tatsuha no colo. - Mika e você se certifiquem de que aquele idiota está realmente morto. - porque Mika estava histérica e isto estava acabando com os meus nervos. Não precisava dela no momento para piorar a situação. - Eiri, Shuichi, comigo! - Eiri e Shuichi foram rápidos e cada um segurou em cada ombro meu e assim desaparecemos daquela caverna com um bruxulear, e reaparecemos no meio da sala de espera da clínica do dr. Sakamoto.

A recepcionista atrás do balcão, uma leprechaun que sempre sorria extasiada quando via Tatsuha, soltou um grito e pulou fora de sua cadeira, correndo o mais rápido que as suas pequenas pernas permitiram, na direção dos consultórios.

Um minuto depois dr. Sakamoto apareceu, flanqueado por uma equipe de três enfermeiras que já rolavam uma maca em nossa direção.

– Ryuichi. - ouvi a voz do doutor dizer calmamente perto do meu ouvido. - Coloque Tatsuha na maca. - o quê?

E então eu percebi, ao olhar ao meu redor, que as outras pacientes me miravam com olhos largos. E, ao ver brevemente o meu reflexo na porta de vidro que levava ao corredor com o centro cirúrgico, percebi o por quê.

Meus olhos estavam dourados, meus dentes arreganhados em ameaça para o médico, com os caninos mais salientes, eu apertava Tatsuha contra o meu corpo como se ele fosse a coisa mais preciosa da existência, o que realmente ele era, e o ressoar que eu ouvia, como sangue correndo com toda a pressa em minhas veias, na verdade era eu rosnando.

– Ryuichi. - Eiri juntou-se ao coro e segurou o meu pulso e eu senti uma estranha calma tomar conta do meu corpo, fazendo com que a minha pseudo transformação retrocedesse. Não sei se o agradecia por usar a sua empatia em mim, ou o socava. De qualquer modo, com muita hesitação, coloquei Tatsuha na maca. E a calma que Eiri me transmitiu desapareceu em um sopro quando vi a expressão do dr. Sakamoto.

– O levem para o centro cirúrgico dois. - ele ordenou as enfermeiras que correram com Tatsuha dali, sumindo por detrás das portas de vidro. Me movi, na intenção de segui-las, mas a mão de Sakamoto em meu peito me parou. - Não Ryuichi. Eu sei que combinamos de você estar lá no parto, mas não vai dar.

Rosnei para ele.

– Como assim? - Shuichi perguntou ao meu lado.

– Complicações. - foi a única explicação que ele me deu antes de também desaparecer atrás das portas de vidro.

As próximas duas horas foram as mais longas e agonizantes horas de toda a minha vida. Por momentos eu quis acelerar o tempo, saber logo o desfecho daquela história, mas o medo que me consumia somente ao pensar que o final poderia não ser feliz me paralisava de imediato.

Depois da primeira meia hora de espera, Mika e Ayaka apareceram na clínica e confirmaram que Kitazawa estava bem morto. Elas garantiram isto ao enterrarem as cinzas dele em solo sagrado, sob proteção de amuletos e muita magia. Bom, porque se ele não estiver morto de vez, eu irei garantir que ele esteja, depois de torturá-lo por horas e horas a fio.

Mika estava mais calma e agora sentava junto a Eiri em um dos bancos acolchoados. Ao nosso redor, as outras pacientes foram gradualmente atendidas por outros médicos mágicos que trabalhavam com o dr. Sakamoto, e ao partirem sempre passavam por mim e me desejavam boa sorte. Eu era agradecido pela consideração delas mas, no momento, eu queria mais do que sorte. Eu queria um milagre.

Quando o relógio soou sete horas da noite, e o chão sob os meus pés já estava marcado de tanto que eu perambulava, o dr. Sakamoto reapareceu na sala.

Eu praticamente voei para cima dele e quis sacudi-lo pelo colarinho de suas roupas cirúrgicas ensanguentadas. Mas o sangue foi o que me fez congelar no lugar. Porque o sangue era de Tatsuha.

Quando ele tirou a máscara do rosto, eu desmontei. A expressão dele era das piores e eu não sabia se caía, sem forças, como um saco de batatas no chão, começava a chorar desesperadamente ou fazia os dois ao mesmo tempo.

– O sangramento foi causado porque o bebê rompeu a parede do útero e atingiu o intestino. Conseguimos reparar o estrago. A pressão de Tatsuha chegou a vinte, e por pouco ele não sofreu um ataque cardíaco. Conseguimos estabilizar a pressão e agora ele está sedado e em recuperação.

Isso era ótimo, embora ao mesmo tempo não. Tatsuha quase morreu e o irônico que foi mais por estresse do que por causa de demônios. Se bem que os demônios causaram o estresse, então...

– Mas e o bebê? - ah, a pergunta de um milhão de dólares, não é mesmo? Obrigado Mika, por expressar aquilo que a minha garganta entalada pelo bolo de pavor não foi capaz de falar.

Desta vez o dr. Sakamoto sorriu e olhou por cima do ombro. E então eu percebi uma enfermeira cruzando as portas de vidro, trazendo um pequeno embrulho nos braços.

– Três quilos e trezentos gramas, quarenta e dois centímetros. Ela é perfeita e absurdamente saudável, para um bebê prematuro. É a magia, mais uma vez, fazendo o impossível, possível.

E aí estava o meu milagre.

Ofeguei quando a enfermeira se aproximou, com um sorriso enorme no rosto, e me estendeu o bolo de mantas que eu segurei de forma automática.

Então os meus olhos encontraram o par de olhos mais lindos que eu já vi.

Eles era castanhos, da cor de chocolate derretido, e piscavam repetidamente por causa da luz artificial. As bochechas eram redondas e rosadas. Havia uma quantidade absurda de cabelo negro em sua cabeça pequena e a boca era rosada e na forma de um coração, causando um equilíbrio perfeito com o nariz pequeno.

Ela era perfeita, completamente perfeita.

E ela era nossa.

E foi aí que eu comecei a chorar.

Chorar feito uma criança, com os ombros sacudindo, com soluços, e um sorriso idiota no rosto enquanto segurava aquela criaturinha em meus braços.

– Qual vai ser o nome dela? - ouvi Eiri perguntar.

– Ryuuzaki. - respondi a primeira coisa que me veio à mente. Ryuuzaki era um nome que Tatsuha e eu havíamos pensado por causa das várias opções de escrita. E uma delas era que os kanjis usados formavam a simples frase: O Dragão do Tempo. Ryuuzaki. - Ryuuzaki Uesugi.

– Uesugi? Por que não Sakuma? Ou Sakuma-Uesugi ou vice-versa? - Shuichi pôs-se nas pontas dos pés para vê-la sobre o meu ombro.

Pensamos nisto, Tatsuha e eu, mas as chances eram que Ryuuzaki seria um dragão do tempo, como eu. Foi por isso que passamos por essa loucura toda, para que a minha linhagem não acabasse. Por mais poderoso que Tatsuha fosse, o meu clã era mais ainda. Os meus poderes iriam se sobrepor aos dele. Então ao menos algo ela herdaria do outro pai.

E embora em questão mágica eu fosse mais poderoso, o nome Uesugi era mais. Eles eram conhecidos e respeitados em toda a comunidade mágica. Era juntar o útil ao agradável. A benção do bom karma da família Uesugi com o poder do milenar clã do tempo.

Ninguém jamais iria se meter com a nossa Ryuuzaki. Não porque ela era poderosa, mas porque, se tentasse, iriam ter que lidar comigo e com Tatsuha. Porque ela era a nossa joia e ninguém mexeria com a nossa joia.

Tatsuha

Eu não queria abrir os olhos, porque tudo doía. O meu abdômen, a minha perna mas, principalmente, a minha cabeça. Mas acho que também não havia mais como ficar dormindo. Então, sem opção, pisquei lentamente para me acostumar com a claridade e abri os olhos vagarosamente.

A primeira coisa que vi foi um teto branco e o que ouvi foi um bipe vindo do meu lado esquerdo. Senti algo pinicar e coçar na dobra do cotovelo do braço direito e levei a minha mão até onde me incomodava, muito vagarosamente diga-se de passagem, mas, antes que pudesse fazer alguma coisa, uma outra mão pousou sobre a minha.

– Não mexa. É remédio e soro. - franzi a testa, ainda confuso, porque eu reconhecia a voz, mas não conseguia associá-la a ninguém. A minha mente era apenas uma enorme e confusa névoa.

Um rosto surgiu na minha frente. Olhos azuis com olheiras sob eles, cabelo castanho despenteado, pele pálida e o sujeito tinha um ar cansado. Pisquei uma, duas, três, quatro vezes, e então a lembrança foi transpassando a névoa e eu me recordei.

– Ryui... - tentei dizer o nome, mas a minha garganta estava absurdamente seca e arranhava horrivelmente. Ryuichi sorriu fracamente para mim e pegou algo além do meu campo de visão. Algo que era um copo com um canudo que ele encostou nos meus lábios também secos. Com muita força consegui sugar um pouco de água fresca, o que aliviou a ranhura em minha garganta.

Ryuichi afastou o copo cedo demais em minha opinião. Eu ainda estava com sede.

– Goles pequenos e de tempos em tempos. - ele me explicou. Com certeza deve ter visto a minha cara de desagrado. E então eu senti dedos em meu cabelo, acariciando o couro cabeludo e deslizando pela minha testa, até a minha bochecha. Ryuichi se aproximou e os lábios mornos e úmidos dele tocaram os meus de forma tão breve, que eu fiz um bico de desagrado quando ele se afastou.

Ryuichi apenas riu.

– Desculpe, mas o dr. Sakamoto falou que você não podia se esforçar. - esforçar? Eu estava em uma cama de hospital, porque agora eu conseguia pensar de maneira clara o suficiente para lembrar o que aconteceu...

E então o desespero desceu sobre mim como um carro batendo a toda velocidade contra o meu corpo, me tirando todo o ar.

– O bebê! - tentei me sentar, ouvi a máquina ao meu lado apitar de maneira ensurdecedora, e Ryuichi me segurou pelos ombros e me empurrou contra a cama antes que eu saísse dali correndo atrás do meu bebê.

Porque eu não o sentia mais dentro de mim. A minha barriga não era mais um monte enorme que bloqueava a minha visão das minhas pernas. Ela estava absurdamente menor, um pouco inchada, mas mostrava claramente que não havia mais criança alguma ali.

– Ryuichi! Nosso filho! Cadê o nosso filho?! - me debati contra ele, o bipe ficando mais alto, e o ar começando a me faltar porque eu estava hiperventilando devido ao pânico. Ryuichi dizia alguma coisa, mas o sangue latejava em minhas orelhas. O mesmo sangue que eu lembro de ter visto escorrendo pelas minhas pernas, manchando a minha calça, enquanto tentávamos evitar que Kitazawa se tornasse a nova Fonte.

A porta do quarto se abriu com um estrondo e o dr. Sakamoto entrou com uma enfermeira a tira colo. Ele trazia algo na mão, uma seringa, e o meu desespero aumentou.

– Não! Não! - eles iam me dopar.

– Tatsuha, você precisa se acalmar. - Ryuichi me implorava e me segurava ao mesmo tempo. De rabo de olho vi, Sakamoto injetar a seringa no soro e o calmante era absurdamente potente, porque assim que ele entrou no meu organismo, eu rapidamente senti a névoa voltar, vi Ryuichi ficar cada vez mais embaçado, e então veio a escuridão.

Quando abri os olhos de novo, Ryuichi ainda estava ali. Mas, diferente da primeira vez, a lucidez me veio mais rápido do que antes.

– Tatsuha! - ele estava sobre mim e me segurava pelos ombros antes mesmo que eu pensasse em me mexer. - Ryuuzaki está bem. - Ryuu...?

Meu corpo inteiro relaxou.

Se havia um nome, é porque havia uma criança. Uma criança saudável.

– Uma menina? - sorri. Ryuuzaki era o nome que pensamos caso fosse uma menina.

Não tínhamos tanta certeza, era meio a meio. Mas descobrimos, no tempo em que estamos juntos, que o clã Sakuma era o inverso do Uesugi. Os Sakuma só geravam dragões machos, enquanto os Uesugi só geravam bruxas, isto até Eiri nascer. E achávamos ser um menino já que, na hierarquia mágica, Ryuichi estava bem acima de mim.

Mas parecia que, neste caso, a tradição Uesugi prevaleceu.

– Ela é linda. - Ryuichi sorriu feito uma besta para mim. - Ela se parece com você.

É bom ela se parecer comigo, porque fui eu a carregá-la por meses e sofrer com os seus chutes e brincadeiras mágicas. Mas, onde ela estava? Eu queria ver o meu bebê.

Ryuichi pareceu ler os meus pensamentos, porque ele riu e saiu de cima de mim, indo até a porta do quarto e a abriu. Ele falou com alguém no corredor e voltou um minuto depois, sentou ao meu lado e segurou uma das minhas mãos na dele, com o sorriso ainda intacto em seu rosto.

Três minutos depois uma enfermeira passou pela porta, mas ela não vinha acompanhada do dr. Sakamoto e não carregava nenhuma seringa. Na verdade, ela tinha um embrulho em uma manta branca, que ela colocou em meus braços já estendidos.

Ryuuzaki.

Ryuichi estava certo. Ela era linda. Ela era perfeita.

Ao correr a ponta do meu dedo pela sua bochecha macia, ela piscou e me olhou com grandes e perfeitos olhos castanhos. Por um momento, pude jurar que ela sorriu para mim, mas poderia ser apenas a minha imaginação de pai babão me pregando peças. Ela bocejou e então se aconchegou contra o meu peito e encolheu-se em meus braços, os considerando seguros e confortáveis o suficiente para um cochilo.

Eu não queria soltá-la. Eu jamais queria soltá-la. Queria segurá-la contra o meu peito, em meus braços, para sempre.

– Eu não acredito que eles estavam certos. - murmurei.

– Quem?

– O Conselho dos Dragões. - Ryuichi segurou a risada para não acordar Ryuuzaki. - Eu não acredito que eles tinham razão. Que ela precisava estar aqui, que ela precisava existir.

– Você vai dizer isso a eles?

– Nunca! - só porque eu estava agradecido por eles terem nos dado essa dádiva, não queria dizer que iria admitir isto na cara deles.

– Bem... Que bom que você está agradecido. - Ryuichi me olhou de uma maneira muito suspeita e eu estreitei os olhos para ele. - Porque isto significa que podemos tentar outros?

Eu queria explodi-lo, mas o barulho acordaria Ryuuzaki e eu também não queria assustá-la ao ver Ryuichi virar confete de escamas.

– Qual é Tatsuha. Vai me dizer que você nunca considerou a ideia? Nunca considerou mesmo? - mordi o lábio inferior. Considerar a ideia eu considerei. Eu cresci com dois irmãos que, embora me irritassem, ainda sim eram o meu alicerce, os meus melhores amigos, aqueles com quem eu sempre poderia contar. E eu queria isto para Ryuuzaki.

Amigos e amores iam e vinham. Família era para sempre.

Suspirei.

– Espere Ryuuzaki crescer mais um pouco. - Ryuichi abriu um largo sorriso. - E só depois do casamento. - o interrompi antes que ele dissesse qualquer coisa.

Poderia ser piegas, mas desta vez eu queria fazer as coisas da forma certa.

Ryuichi me deu um beijo estalado e ainda sorrindo disse:

– Prometo esperar.

Mas eu deveria saber que as promessas de Ryuichi sempre seriam vazias.

Porque quando Ryuuzaki fez nove meses e dez dias, e Ryuichi e eu completamos três semanas de casados, eu me descobri grávido. De novo.

Minha reação?

Explodi Ryuichi em um monte de confetes de escamas.

A reação de Ryuuzaki ao ver o pai explodir?

Ela apenas riu e bateu palmas.

Essa era a minha garota.

FIM


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