O Filho Do Olimpo E A Faca Da Noite escrita por Castebulos Snape


Capítulo 16
Descubro O Maior Sonho De Um Cavalo


Notas iniciais do capítulo

obrigado pelos comentarios, bi. obrigado também para quem favoritou.
esse aqui tem quiron



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Já estava ficando chato sair do elevador, entrar em um dormitório falar com alguém e ir embora, mas aparentemente nós não precisaríamos nos preocupar em entrar em um dormitório para encontrar alguém.

Quando as portas do elevador abriram, meu rosto ficou a centímetros do rosto de uma menina morena, da minha altura e de olhos impressionantemente azuis.

Ela sorriu e deu um passo para trás.

– O Filho do Olimpo – afirmou ela – Já estava na hora..., priminho. Estava ficando preocupada.    

– Jane – disse Marcus sorrindo para a menina – Jack, essa é nossa prima, filha de Apolo, Jane Élan.

– Oi – murmurei sem saber muito que fazer.

– E eu achando que meus irmãos são tapados – comentou. Ela pegou minha mão e me levou pelo corredor prata e dourado.

Não era exatamente prata e dourado, parecia uma mistura dos dois. O lado esquerdo era dourado, vermelho e laranja, parecia estar minguando para o oeste enquanto o outro lado era prateado, verde-água e azul-marinho e parecia estar crescendo do lado direito e ficando mais escuro. 

Marcus nos seguia com a coluna ereta e alerta como se esperasse alguma armadilha. Jane parecia bem calma quando me guiou para o dormitório dourado à esquerda.

Ele era idêntico aos outros a não ser pelo fato de que estava abarrotado de vários tipos de flechas, arcos, instrumentos musicais e acompanhava o padrão de fora, mas parecia mais com o lado esquerdo, as paredes estavam laranja-arroxeado como o céu de um belo pôr-do-sol o que dava um brilho bonito a tudo, até às estranhas cobertas amarelo queimado.

As mais diferentes crianças que conversavam nas camas olharam para nós.

– Pessoal – chamou Jane – Eu chamei todo mundo aqui para apresentar nosso novo visinho. O Filho do Olimpo, filho do nosso pai e filho de Ártemis, nossa tia, Jack.                            

Todos se apresentaram e nós conversamos sobre as vezes em que as Caçadoras ocuparam o dormitório. Achei que os meninos sofreriam mais, mas aparentemente nenhuma menina suportava minhas irmãs por consideração.

– Por que elas vieram para cá? – perguntei com medo de ter que chegar perto de Zoë de novo.

– Ninguém sabe – respondeu Marcus encostado na parede do meu lado, seus olhos corriam de um lado para o outro como se procurasse alguém. Qual era o problema desse garoto? – Talvez Ártemis tivesse algum motivo para pensar que elas estavam em perigo ou algo do gênero. Elas não vêm muitas vezes e são um pouco anti-sociais.

 – É, só um pouquinho – ironizei.

Jane fez questão de me mostrar o dormitório de Ártemis. Sou suspeito ao dizer isso, mas o lugar era simplesmente perfeito. As paredes acompanhavam o lado direito do corredor, eram de um azul noturno muito escuro, mas tinham, lá no fundo, um brilho prateado que dava ao aposento um ar misterioso e calmo.

As camas estavam bem arrumadas e empoeiradas, os baús na frente dos beliches pareciam não ser usados há anos, estavam enferrujados. No chão e cobrindo as camas eu reconheci algumas peles de animais: lobos, ursos, leões e muitos outros que eu nunca reconheceria. Parecia solitário e quieto, mas extremamente aconchegante. Sinto falta de lá.

– Uau – arfei – É perfeito.

– Não é? – concordou Jane olhando as paredes – Me tornaria uma Caçadora para dormir aqui de vez em quando, parece tão tranqüilo. Bem, minha opinião não importa nesse caso, mas acho que agora vai mesmo decidir ficar nesse dormitório, né?

Olhei-a com uma sobrancelha levantada depois olhei para Marcus que parecia ter visto uma coisa muito interessante no chão, mas eu percebi que estava apurando os ouvido para saber se alguém se aproximava.

– Do que esta falando?

– Jack, você é filho de todo o Olimpo – disse Marcus. Ele ergueu a cabeça – você pode escolher qualquer dormitório no prédio inteiro – ele girou o dedo indicado para cima como se englobando tudo à sua volta – Qual vai escolher? 

Pensei nos Olimpianos, em Ártemis, em tudo o que ela fez por mim, basicamente eu estava vivo por causa dela. Ela desejou ter uma filha e não me matou quando eu nasci menino. Ela era minha mãe original, me parecia bem justo eu ficar em seu dormitório.

– Vou ficar por aqui mesmo – falei decidido.

Os dois murmuraram em concordância, Marcus me deu meu horário e foi para sua aula de esgrima, sem muita animação. Jane me deixou para arrumar minhas coisas, ela disse que, quando eu terminasse, fosse ao dormitório de Apolo e pedisse ajuda a alguém.

Depois que ela foi embora fechei a porta do dormitório e olhei em volta sem saber exatamente o que fazer.

Hora da ação, disse Vox, O que esta esperando?

– Ah, Vox! Por que isso parece tão errado? Por que parece que estou violando algum lugar sagrado?

É, eu também senti, será que a mamãe não quer a gente aqui?

­– Também não exagera, é claro que não é isso. Ártemis..., a mamãe – sorri sem graça – gosta de nós, senão ela mesma teria feito com que as Parcas nos matassem. É só que... Esqueça, estou errado mesmo.

No final do corredor de beliches, no qual, assim como o de Atena, havia uma mesa empoeirada, tinha uma janela grande e antiga que parecia não ser aberta há anos. Não vi porque não abri-la; provavelmente iria morar ali por um ano.

O sol já estava atrás do prédio então nada me atrapalhou de ver tudo o que cercava o prédio. Varias construções de estilo grego rodeavam o lugar, a terra molhada parecia dificultar as lutas dos internos, um riacho cortava o terreno, Quíron arrumava o ângulo de inclinação do arco de um menino que parecia não se importar muito com o arco ou com as flechas e bem longe eu pude ver, não era impossível, não podia ser o Estreito de Long Island.

A janela dava para o Leste onde a Lua e o Sol nasciam, perecia uma estranha ironia, mas também parecia certo.

Abri o baú que ficava aos pés da cama que ficava embaixo da janela. Estava empoeirado como tudo naquele lugar e tinha algumas teias de aranhas. Nada que não pudesse ser limpo.No canto do baú tinha uma arainha pequena debaixo de uma teia que tinha caído quando eu abri o baú. Era bem pequena e não parecia perigosa.

Eu sempre me dei bem com aranhas e com outros animais estranhos. Depois de algumas semanas sem uso o sitio da minha tia ficava cheio de bichinhos indesejados e as aranhas eram os mais amigáveis comigo. Escorpiões não, só aí entendi o porque: eu era filho de Ártemis. Mais tarde eu explico.

Coloquei minha mão no fundo do baú e esperei que ela subisse, mas ela me atacou. Eu sei que um cara que enfrentou uma cobra gigantesca não devia ter medo de uma arainha menor que sua unha, mas vou ser sincero: eu gritei. E muito. Existem os mais diferentes tipos de gritos e eu gritei rouco. É uma mistura de exclamação de surpresa, nojo e agonia. Depois de dar um ou dois pulinhos vergonhosos enquanto sacudia a mão consegui lançá-la longe.

– Meu mundo virou de cabeça para baixo – murmurei enquanto sentia uma sequência de arrepios cruzarem minhas pernas.

Adorei o pulinho, faz de novo!

– Ah, cale a boca, as aranhas deram para me odiar, tem alguma coisa mais triste que isso? Aposta quanto que é a genética de Atena? Aracne deve mandar seus filhos. Não sei se eu fico orgulhoso ou nervoso.

Voto para nervoso.

Eu vi arainha sair por debaixo da porta e tentei esquecer aquilo, acredite não foi fácil. Voltei a me concentrar no baú sujo e em minhas coisas.

Coloquei meus livros sobre a cama ao lado da que eu escolhi, podia achar um lugar para eles mais tarde. Arrumei minhas roupas no baú que limpei com uma camiseta velha. Tive o estranho pressentimento de que devia deixar a mochila ao alcance da mão só para garantir, o mesmo pressentimento me dizia que isso não era bom.

Ao lado da mesa encostada na parede estava uma estante de madeira que ia até o teto, estava empoeira como tudo ali, mas me encantou mais do que tudo; sempre quis uma daquelas no meu quarto, mas tudo o que consegui foi uma mesa onde empilhava meus tesouros. 

Coloquei as dezenas de livros na estante organizando de acordo com o assunto. Os de mitologia me atraíram por um segundo, era tentador ficar ali com a cara nos livros imaginando historias antigas e encerradas.

Sempre tive esse problema com coisas encerradas. Eu sempre me apeguei a historias elas tinham um fim, sendo bons ou maus, elas tinham um fim. Imaginava quando seria o fim da minha confusão com Martins, o fim do meu medo de perder quem eu amava, da minha fascinação por coisas antigas. Por isso minha fascinação por morte: era o fim definitivo, o jeito mais eficiente de encerrar problemas, principalmente meus problemas. Sei que parece egoísmo, mas todo mundo pensa nisso pelo menos uma vez na vida. O problema é que ninguém quer realmente acabar com tudo, para isso serve a vida após a morte; tudo encerrado, mas nem tanto, as coisas boas ficam para depois da vida. Ou não, depende de cada um.

Eu era tão jovem tudo parecia tão interminável. Estava apenas começando, minha vida estava começando. O fim estava tão longe que parecia impossível.

– Esse lugar precisa ser limpo, muito bem limpo – disse uma voz rouca atrás de mim.

Me virei de supetão e dei de cara com Quíron olhando em volta. Ele parecia maior de perto e de frente.

Ele me lembra um professor, mas não um professor meu. Os professores que eu imaginava, os bons professores, eram inteligentes, legais, compreensíveis e não queriam que os alunos fossem iguais a eles. Ele parecia um desses professores.

– Olá – murmurei convencendo a mim mesmo que ele era realmente um centauro – A aula de arco e flecha já terminou, senhor?

– Ah, sim, terminou. Por favor, não me chame de senhor, Jack. Não sou seu chefe ou dono, sou, espero, um amigo. E vou cuidar de você – senti um sorriso bobo surgir em meu rosto. Você não faz idéia de quando é bom ouvir isso quando se é uma criança assustada e sozinha em um lugar completamente estranho – Então, gostou daqui?

– É muito legal e bonito. Quanto à limpeza eu posso dar um jeito mais tarde – revezei o peso do meu corpo ora num pé ora no outro; inseguro – O que eu faço agora?

– Nós vamos descer, vou mostrar a área exterior do colégio e espero poder explicar alguma coisa.

Ele me pediu para acompanhá-lo, antes de passar pela porta eu pensei em uma coisa muito inusitada.

– Espere – murmurei.

Antes que ele pudesse me perguntar o que tinha acontecido, eu corri de volta para a mochila e tirei o dente do Píton do bolso da frente. Não queria aquilo comigo e achei que Quíron pudesse arrumar um lugar para aquela coisa.

Ele examinou o dente por alguns segundos. Eu pude ver que seus olhos brilhavam, não entendi por que, mas se ele tinha gostado podia tirar de perto de mim.

– Seu primeiro troféu – disse ele parecendo realmente orgulhoso de mim, e era o único – Os troféus são objetos muito importantes. Principalmente os conquistado a duras penas – o encarei; é, o centauro assistia a TV Hefesto, provavelmente comendo salgadinhos – O que vai fazer com ele?

– Estava pensando em mandar para o Japão. O lugar mais longe em que eu consegui pensar– fingi uma expressão de alegria – Será que Hermes podia fazer isso por mim?

Ele riu jogando a presa de uma mão para outra como se a pesasse.

– Eu entendo. Nem todo o herói gosta do troféu. Em muitos casos são apenas uma lembrança de sofrimentos – meu caso – Posso guardar para você. Tenho um lugar especial para isso. Um dia ainda vai me pedir isso de volta.

– Posso apostar que não.

Ele me levou para baixo e me mostrou tudo o que eu tinha visto da janela: anfiteatro, em forma de meia lua como os antigos; estábulos, por trás do colégio; pista de corrida, estranhei o fato de estar tão perto da floresta, mas Quíron disse que as dríades davam as aulas, não vou nem dizer minha reação; e uma arena de batalha enorme.

Minha curiosidade foi tamanha que Quíron me levou para ver a luta que estava acontecendo dentro da arena. Marcus lutava com uma menina alta, morena e de olhos cinza como Karl. Não pude deixar de reparar no equilíbrio clássico entre Ares e Atena; os dois eram ótimos guerreiros, mas estava equilibrado demais. A filha Atena devia estar dando uma baita surra nele com seus truques estratégicos.

As espadas se encontraram algumas vezes e a menina pareceu não conseguir se equilibrar com o pé direito. Marcus olhou para o chão e sorriu.  

Em um movimento rápido Marcus se abaixou levantando a espada para evitar um golpe e puxou o pé esquerdo da menina. Ela se desequilibrou e caiu sentada no chão, a espada voando longe. Marcus ficou de pé em um salto e encostou a ponta da espada no queixo dela, ofegante.

A sala ficou em suspenso, mas logo todos romperam em aplausos. Quíron sorriu enquanto eu acompanhei animadamente o resto do pessoal gritando: “Esse é meu irmãozinho!”

– Isso foi trapaça! – protestou a menina sem se mexer – Você sabia que meu pé estava machucado.

 Marcus abaixou a espada, mas não moveu o resto do corpo. Sua respiração ainda não desacelerara e seu rosto estava brilhando de suor, estava rígido, mais adulto do que antes, mais maduro. Eu pude ver lá no fundo o filho de Ares que ele era; elegante, esperto e calmo. 

Isso, filha de Atena, foi estratégia – respondeu erguendo o queixo com arrogância. Sua voz também mudara estava mais firme e fria como se, com a espada na mão, ele fosse uma pessoa completamente diferente – E, sim, trapaça, mas uma trapaça tão bem feita só pode ser chamada de estratégia. Não é assim?

Achei que a menina iria arrancar a cabeça dele, mas apenas riu e estendeu a mão para que ele a levantasse.

– Bruna, você devia ficar feliz por seu primo – disse um homem saído das sombras – Marcus está muito melhor que muitos filhos de Ares mais velhos do que eu. Para se vencer de um monstro é preciso muita inteligência e isso ele tem – Marcus sorriu orgulhoso para ele e ajudou, com muito esforço, Bruna a se levantar – Mas ainda te acho muito magro.

“César e Diogo, entrem, espadas. Diogo põe o elmo. E sim, vocês vão precisar usar trapaça quando enfrentarem um inimigo de verdade. A maioria dos monstros só tem músculos, afinal, qualquer um pode ter isso, mas poucos, muito poucos, têm habilidade e inteligência.”

– Ei, é o cara da TV Hefesto! – disse o menino que entrou na arena com César.

Todos se viram para mim e começaram a fazer comentários sobre minha luta com Ares. O interessante é que só me chamaram de “o cara da TV Hefesto” como se isso fosse, sei lá, meu codinome.

– Poxa – reclamei –, assim fica parecendo que eu sou um tipo de justiceiro mascarado. Meu nome é Jack.

– É, eles sabem – disse o homem que elogiou Marcus antes – Voltem para onde não deviam ter saído. E César, vá com calma.

Ele era alto, magro, mas musculoso, tinha cabelos pretos, usava uma armadura grega de batalha que parecia realmente antiga e não devia ter menos de vinte e cinco anos. Seja lá quem fosse parecia ter entrado em muitas brigas; seu rosto e pescoço estavam marcados por cicatrizes de todos os tamanhos. Mesmo assim seu sorriso era tão caloroso e sincero que não pude deixar de gostar dele, mas por trás do sorriso, nos olhos cor de oliva, tinha alguma coisa a mais, uma coisa não tão boa. Algo... infeliz, mas ignorei aquilo. 

– Zackary Crane, filho de Ares – ele estendeu a mão e eu a apertei – É um prazer, gostei do seu estilo com a espada. Foi uma boa luta. Então; um ano. Não é muito tempo para aprender. Acho que vou ter que ensinar o básico nesses meses, não vai ser fácil, mas você já sabe o básico do básico.

– Que básico do básico? – perguntei soltando sua mão.

Ele puxou a espada e a colocou na vertical.

– Uma espada se segura pelo cabo e não pela lamina – falou bem devagar e observando a lamina com um olhar serio, então me olhou de soslaio sorriu, como Quíron, da minha expressão decepcionada e incrédula e piscou um olho para mim.    

– Isso eu sei – murmurei mal-humorado – Obrigado, cara.

Ele voltou a rir, voltou a colocar a espada na bainha e cruzou os braços musculosos.

– Estou só brincando. Vai ser divertido treinar você, gosto de gente que leva tudo a serio – eu não levo tudo à serio! – Mas nós só vamos começar amanhã e hoje eu vou zoar com um centauro – Quíron e eu franzimos as testas. Ele se inclinou para a frente e disse em um falso sussurro – Peça para ele te mostrar o outro lado do riacho. Pergunte sobre o Acampamento Caminho aos Elíseos.

– Zack... – murmurou Quíron procurando repreende-lo.

– Ah, qual é, Quíron? Ele vai gostar. Mostre e veja o que acontece. Agora – ele olhou para dentro da arena e fez uma careta – eu vou impedir que César mate Diogo. Com licença.

Ele voltou para a arena, deu alguns gritos que desaceleraram a luta e se encostou rindo na parede de antes. Quíron suspirou e me levou embora dali sem dizer uma palavra. Eu cocei meu rosto por alguns segundos pensado no que dizer.

– Sabe – comecei –, você não precisa explicar o que Zackary disse. Não é importante.

– É claro que é. Sempre achei que estávamos distanciando as crianças de seus pais mortais e isso é um erro grave. A parte mais valiosa de um semideus é ser apenas semideus, mesmo que os deuses não concordem com isso. Você já deve imaginar por que.

“E eu também sinto que eles estão apenas treinando e não estão praticando. Não que eu queira que eles se arrisquem lutando contra monstros por aí, mas se um dia eles estiverem em um perigo mais grave não vão saber como suceder. É preciso experiência e isso eles teriam passando o ano letivo longe daqui.

“Há poucos meses dois meninos, filhos de Ares, e uma menina, filha de Hermes, pediram para sair em uma missão e eu permiti. Eles nunca tinham lutado contra um monstro de verdade e só a pratica aperfeiçoa sua técnica. Eles encontraram no Texas o Touro de Creta e depois um dragão tentando voltar para casa.

“Apenas um deles chegou aqui.”

Nós tínhamos, eu percebi, entrado na mata de verdade. No meu lado direito estava a praia e no esquerdo uma selva assustadora.

Ficamos em silencio por alguns instantes, eu fiquei pensando naqueles semideuses, eles lutaram juntos, eram irmãos, provavelmente amigos e viram seus companheiros morrerem, me pareceu horrível. Como Ares e Hermes puderam permitir aquilo?

Enquanto eu pensava nisso meu celebro percebia o mundo à minha volta. Era um lugar bonito, mas achei que estávamos indo longe demais. Não que eu não confiasse em Quíron, mas era estranho andar por aí com um centauro. Não que eu tivesse vergonha, mas o que as pessoa iam pensar? “Ah! Eu conheço aquele ali: estava andando com um centauro.”

Depois de andar por um tempo me encostei numa árvore enorme, ofegante.

– Hummm... Você não devia ter feito isso – murmurou Quíron com cara de que eu apertara o botão que explodiria o mundo. Lá no fundo eu tinha.

 – Feito o que?

Nesse momento a árvore tentou me matar. É, você entendeu direto. A árvore me estrangulou. Quando percebi tinha um braço comprimindo meu pescoço e uma mão puxando minha orelha.  Deve ter sido uma coisa bem estranha de assistir.

– Frísia! – exclamou Quíron muito calmo, calmo demais – Solte o menino; ele não sabia.

– Mesmo assim fez – disse uma voz atrás de mim.

Não prestei muita atenção naquilo, afinal, estava com pouco oxigênio no celebro e minha orelha estava sendo arrancada. Quanto mais eu tentava puxar seu braço para longe do meu pescoço mais ela apertava.

– Frísia, estou falando serio – agora a voz de Quíron parecia até ameaçadora – Solte-o – Seja lá quem fosse me soltou.

Eu cai de joelhos abraçando meu peito ainda respirando com dificuldade. Uma garotinha mal-humorada saiu da árvore e me olhou com desprezo.

– Fique longe da minha árvore, seu... seu... seu folgado! – e voltou para dentro do tronco.

Me arrastei para longe da árvore e fiquei bem próximo das patas de Quíron. Minha vontade foi de correr o mais rápido possível para longe daquela... Doida. Eu, ainda boquiaberto, nervoso e olhando para a árvore, me levantei, limpei parte da minha roupa e acompanhei Quíron para longe dali.

– É impressão minha ou uma ninfa me marcou como o malfeitor do ano? – perguntei ainda nervoso e tremendo com a adrenalina de quase ser morto por uma árvore depois de andarmos um pouco.

Ele sorriu.

– Frísia tem uma tendência à violência, mas no fundo é boa pessoa.

– Fico emocionado com a bondade dela. Por que todo o lugar que eu vou tem uma maluca para me marcar?

Ele riu.   

Depois de uns minutos de silencio nos paramos à margem de um riacho que desembocava no mar, por alguns segundos achei que iríamos dar à volta, não era muito largo e a nascente não devia ficar longe, mas Quíron parecia ter outros planos e, aparentemente, não gostava deles.

– Jack, suba aqui.

Eu olhei para ele com os olhos arregalados. Eu não podia montar em um centauro devia até ser contra a lei. 

– Subir em você? Quer dizer... Não mesmo, Quíron. Deve ter outro jeito. Tem que ter outro jeito.

Olhei em volta, para cima e vi o outro jeito, afinal, eu era ou não era um filho de Ártemis?

– Não tem outro jeito – murmurou como se querendo acabar logo com aquela tortura– Suba logo. Não vou derrubá-lo, prometo

–É claro que tem outro jeito – retruquei com os olhos ainda nas árvores – Não estou com medo de montar, só não acho certo – achei a árvore perfeita– Sempre tem outro jeito.

Caminhei até um carvalho e acariciei sua casca.

– Posso subir? Prometo que tomarei cuidado.

– Claro! – respondeu uma voz de dentro da árvore, parecia bem mais amável que Frísia.                            

Escalei, com muito cuidado e sem muito esforço, a árvore. E pulei do galho mais próximo da margem e o mais alto também. Quando cai no chão me desequilibrei e rolei, o que por sorte amorteceu mais ainda minha queda.

Quando percebi estava tonto e sentado no chão úmido.

– Por que eu não consigo ficar de pé nesse lugar? – resmunguei chacoalhando a cabeça.

Levantei-me sem entender muito que tinha acontecido e quase esbarro com Quíron que já tinha cruzado o riacho e estava bem atrás de mim.

Nós continuamos a andar e de repente Quíron parou.

– Acho que aqui já está bom. Sabe, muitos estudantes sabem do que vou contar, principalmente os mais velhos como Zackary, mas ainda sim fico um pouco encabulado com o que vou dizer, mas acho que você entre todos, é o que deve saber...

– Quíron – interrompi – serio não precisa falar nada. Eu não sou importante e se você se sente mal em falar não precisa. É sério, não precisa contar.

– Sim, eu preciso. Acontece, Jack, que os deuses construíram o colégio para seus filhos. Nós temos um bom sistema de segurança e é um bom espaço, boa estrutura, mas eu tinha um sonho bobo.

“Como Zackary disse: meu sonho era o Acampamento Caminho aos Elísios. Seria um acampamento com tudo que temos aqui até mais. Os semideuses ficariam em chalés e poderia passar o ano escolar com sua família, ou não, para voltar durante as férias.

“Por isso falei que o ano letivo fora era melhor. Três meses não proporcionam muito desafio, alguns dos alunos nunca encontraram monstros de verdade. Não que eu queira isso, não, mas pratica sempre é bom

“Sempre achei que, no momento certo, a oportunidade viria, mas ela nunca veio e meus alunos continuam morrendo sem que eu possa fazer alguma coisa para impedir.

“Jack, eu sinceramente não sei por que sinto que te contar isso é importante, simplesmente não sei explicar, mas seja lá a razão não quero que você se preocupe com isso ou tente mudar, me entendeu? Na verdade não sei nem por que te contei. Vamos embora.”

– Por que exatamente a gente veio aqui?

– Eu gosto de caminhar. E porque aqui seria nosso acampamento.

– Oh!

 Caminhamos em silencio de volta cada um mais perdido em seus pensamentos do que o outro. Quando estávamos quase lá, ouvi um barulho no mato perto.

Parei.

– Ouviu isso?

Ele parou colocando o braço na frente do meu peito e me empurrando para trás em atitude protetora. Uma moita se moveu a menos de dois metros de nós. Coloquei a mão no bolso pronto para puxar Kroboros e Quíron preparou o arco que surgira ali do nada. De trás da moita saiu um cara loiro, alto, musculoso, sem camisa (apesar do frio), com shorts de surfista e um monte de olhos. Quando eu digo um monte eu quero dizer que ele tinha olhos por todo o corpo não só no rosto, e não eram simples tatuagens, eram alhos de verdade, que se mexiam, e encaravam. Ele teria fácil... Cem.

–Argos – censurou Quíron – Quer nos matar do coração?

– Você é Argos Panoptes – eu disse. Ele me olhou (cem olhos te encarando... terrível) como se dissesse: “Dã”. – Legal. É um prazer – estendi a mão e ele sorriu apertando-a, mas não disse nada e foi embora.

Olhei magoado para Quíron e ele sorriu.

– Não leve para o lado pessoal. Argos é nosso chefe da segurança há anos e não fala com ninguém.

– Por quê?

 – Ninguém sabe, mas tenho certeza que, se perguntar a alguém, vai descobrir que existem teorias muito criativas. Vamos.


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Notas finais do capítulo

comentem por tudo que é mais sagrado! o próximo tem treinamento



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