Olvidado escrita por jlucas


Capítulo 1
Capítulo 1




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Olvidado

por: jlucas

revisão: Yami

 

 

 

Olhava a lua, escondida entre as nuvens, pairando naquela imensidão azul-escura de desconhecimento. Como gostava da lua, aquela lua tão meiga e tímida, que não se revelava por completa, apenas deixava transparecer um pouco de si, nunca tudo, nunca toda, sempre ocultado uma parte de si...

 

Fechou os olhos e permaneceu contemplando a imagem permeada em sua própria imaginação, continuando a iluminação no vácuo escuro da mente, eternamente ali, como uma fotografia resguardada em si, lá estava a noite, a lua e as estrelas, em sua memória, na eternidade dos pensamentos.

 

Aquele miúdo espaço de silêncio era seu, completamente seu, longe dos outros, os outros que o olhavam, afastavam-no, repudiavam-no; todos estranhos, tão amargos que ele amargara por culpa deles; outros que tantas vezes queria ser, sem poder sê-los, pois jamais esses outros permitiriam.

 

Era um desejo, quase mudo, silencioso, passivo, interno e latente, que pulsava em si tão desconhecidamente que passava desapercebido. Talvez rondasse sonhos que afastava de si com um simples não, talvez ora sim, ora não, ficasse visível, tornasse claro a existência daquilo que julgava impossível.

 

Não, não era possível — na recusa, tudo aquilo permanecia oculto, nublado por desculpas que julgava necessárias. Simplesmente saiam de mansinho, sem ronronar, sem miar, sem qualquer prova da sua existência, tais idéias simplesmente evaporavam-se aquecidas pelo furor daquelas meia verdades, as quais bastaram até aqueles dias para enganar-se, esquecer-se, mentir-se.

 

Quando as pálpebras foram levemente se abrindo, deixando aparecer a íris castanho-avermelhada, a lua desaparecera, sumira de vista, fora nublada em algum instante perdido, e já não se encontrava mais ali, perante sua vista.

 

O que era aquilo?, perguntou a si, necessitava tanto daquela pergunta, mas não queria tanto assim ouvir a resposta, cuja a verdade parecia ser clara, uma evidência tão cabal...

 

O silêncio da madrugada era a melodia suave da sua aflição, acompanhada pela opereta do leve sussurrar dos grilos, o farfalhar suave do vento e o som, momentânea e repentinamente, de algum animal que por ali passava, deixando ecoar sua presença no meio da noite. Ele não deixava provas de que ali estava, ia taciturnamente, sem incomodar ninguém, ia em passos silenciosos e gatunos, pé ante pé, chegava ao seu recanto de contemplação e ali, agora, permanecia em sua pura agonia não sabia de quê, de quem, nem porquê, apenas na espera de uma resposta que já veio e já tinha ido com o passar do tempo.

 

Respirou profundamente, respirou e o ar da madrugada encheu seus pulmões, seu sangue, seu corpo, inflou seu peito inflamado por aqueles desatinos tão conhecidos, mas ignorados. Até quando? Até quando iria se ignorar como um ser estranho, obtusamente posto naquele destino que julgava fatídico e ridículo, vivenciando a crueldade que era ser ele próprio e os doloridos e sôfregos momentos em que desejava não ser mais si mesmo...

 

Fosse necessário alguém, alguma coisa para lhe apontar as dissimulações descabidas, as verdades enfeitadas, as desculpas paliativas; entretanto, estava tão cheio daquilo, tão cheio de se enganar pelo simples desejo de não transparecer pelos poros o que sentia, tão cheio que desejou gritar e gritar e gritar no mais romântico dos momentos, apenas gritar.

 

Não gritou.

 

Os grilos continuaram a cricrilar.

 

O vento continuou a farfalhar.

 

Os animais continuaram a zunir.

 

Ele permaneceu mudo, quase atônito de medo que escurecera por tanto tempo o que já sabia. A sua respiração, num estrépito, num instante secular, acelerou-se naquela tensão andrenalítica que ia acelerando o simples pulsar cardíaco e, cada vez mais, os pensamentos iam correndo num fluxo inconstante e descontrolado, já não cabendo mais nada para encobri-los, já não suportando mais o tempo passado, as horas perdidas, os minutos rasgados em nada...

 

Era apenas temor. Temor de suas ações emotivas, temor de sua palpitação latente que se esvaziava em êxtase. Sabia o que era necessário, era tão necessário, quase como um vômito, era tão carnal e, ao mesmo tempo, metafísico, que se perdia qualquer sentido naquilo que fazia.

 

Os pés iam sozinhos a respiração desenfreada e tudo parecia tão perdido no tempo-espaço tão veloz e tão desencontrado que ele nem sabia onde estava apenas estava ali perante o rato para dizer-lhe...

 

Não disse.

 

Perdeu-se no tempo. Perdeu-se na áurea de fúria.

 

A casa estava quieta. Yuki olhava impacientemente àquele Kyo que julgava conhecer, julgava saber quem era, mas, naquele instante, era completamente alheio de seu conhecimento, um forasteiro, um estranho, um desconhecido perante sua vista que ofegava, parecia querer gritar, parecia querer dizer alguma coisa, mas o rato não perguntou o quê...

 

Olhou-o. Já não sabia onde estava, perdido em si e naquele olhar purpúreo que o fitava. As palavras já não eram mais palavras e sim grunhidos que se prendiam na garganta seca, não existindo som mais gutural e não identificável...

 

Não disse nada.

 

Descontroladamente, na perdição lenta dos passos, aproximou-se.

 

Era aquilo. Encontrara aquela verdade tão sublevada que havia prendido. Era uma verdade dilatada, que explodia em mil, talvez em milhões...

 

Sentiu em tão aquele frenesi descompassado, que ia, pouco a pouco, controlando. Um êxtase insano que parecia tomar conta de cada músculo seu, cada pensamento, cada ação miúda, cada movimento. Por fim soube, soube de todas as verdades, todas que foram vindo, todas...

 

Afastou-se aturdido.

 

Era demais. Temia agora o outro, não um qualquer, mas aquele que estava ali, na sua frente, que acabara de beijar, aquele outro que pareceu sentir o seu pulsar tépido. Fora quase insano, perdidamente insano e desencontrado, mas, na verdade, necessitava daquilo...

 

E agora, temia novamente, queria correr, correr na velocidade que viera, correr e sumir como um gatuno fugitivo, novamente a verdade estarrecedora socava-lhe a cara com a crueldade do real...

 

Seus passos foram silenciosos, deixando um rato aturdido e sem ações na sala, correu da realidade, correu daquilo que novamente era torturante, correu do que correra todo esse tempo.

 

Covarde! Queria gritar, enquanto observava o céu, novamente. Covarde, covarde, covarde!

 

Não havia lua, estava sumida, raptada pelas nuvens, seqüestrada pela escuridão, desaparecida, ou simplesmente coberta, não havia mais lua, havia apenas aquele vazio, aquela imensidão que antes ela estivera ocupando tão majestosamente. A lua se fora, se fora até do seu pensamento, nublara-se eternamente em seu coração.


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