Todas As Escolhas Erradas escrita por Tay


Capítulo 2
Suns & Vicodins




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Ainda importava? Ela pensou após outro gole.

Não, não exatamente. Nada mais importava.

O som do móbile na varanda. As gotas de chuva reminiscentes descendo o vidro da janela. A quantidade de raios solares formando desenhos abstratos no chão de madeira. Sim. Nada daquilo importava.

Outro gole, e foi como sentir todo aquele sol descer pela garganta.

Estava ela engolindo o sol? Teria comprado por acidente uma garrafa diferente de álcool, feito de luz do sol e calor? Não. Impossível. Aquela coisa tinha mesmo gosto de vodka. Nada a ver com o sol.

Ela lembrava o quão doce era o sol. Lembrava-se de deitar-se no tapete verde que era o gramado do quintal, embaixo do enorme carvalho, e rir tanto que não sentia apenas a luz solar na boca, mas também o gosto da brisa leve.

Como alguém pode sentir o gosto do sol? Da brisa? Quando foi que ela havia se tornado tão poética?

"Você começou a beber há meia hora, querida."

Oh.

O álcool realmente faz coisas com seu cérebro. Faz você pensar que pode provar de uma estrela, alcançá-la com a ponta da língua como se fosse um grão de açúcar. Coisa estúpida.

Gulp.

A tontura já estava lá, dizendo oi como uma velha amiga. Ela a recebeu de braços abertos. Estava esperando, na verdade, aquela sensação de entorpecimento, a falta de preocupações por ser tão responsável, não, irresponsável como ser humano. Ela era a rainha das decisões erradas. A rainha de fazer todos se afastarem dela. Um desastre. Uma bagunça completa. O princípio do caos de duas pernas e olhar vagante.

Seria melhor pra todo mundo se apenas ficasse lá pensando em engolir sóis doces.

Gulp.

E aproveitando a companhia de sua sombra. Linda sombra, pensou, vendo-a projetada no chão e em parte da parede. Naw, não era linda. Atraente. Essa era a palavra. Aquela mancha nem tinha rosto, só uma forma bem construída e atraente. E o que parecia um cabelo legal.

Deus. Agora estava elogiando a própria sombra. Ela riu de como estava parecendo particularmente retardada.

Gulp.

Sua visão turva avisou que era hora de parar, mas tudo o que fez foi tirar um pote de Vicodin do bolso. O tempo quente finalmente a assolou e ela tirou a jaqueta de couro. E a jaqueta de couro estúpida decidiu se prender em seu pulso direito por quase um minuto antes de ir encontrar o chão, tendo enfim sido jogada não tão gentilmente.

Ainda estava quente, e o jeans justo pareceu apertar suas pernas.

Era início da primavera, droga. Não era pra estar tão quente.

Mas a verdade era que não queria admitir o que estava para fazer em seguida. E o breve pensamento inconsciente fez suas palmas ficarem suadas, e ela alcançou a garrafa com líquido transparente, buscando um refresco.

Gulp.

Mas queimou. Queimou o caminho todo garganta abaixo e de nada adiantou para aliviar a quentura excessiva que tomou seu corpo.

E de repente ela sentiu uma vontade imensa de fazer sexo. Com o cara gostoso que morava no fim da rua, ou o gringo de olhos azuis que havia se mudado não fazia muito tempo. Nunca havia pensado em fazer com outra mulher, mas, no momento, estava aceitando até a
jardineira que de vez em quando entrava em seu campo de visão ali na janela...

Pare com isso.

Gulp.

Você está tentando se matar. Chega de fantasias.

O cheiro delicioso de pão fresco tomou seu nariz ao que respirou fundo. Era um belíssimo domingo, devaneou enquanto brincava com o Vicodin. Belíssima, belíssima manhã de domingo, cheia de flores coloridas vindas de sabe-se lá de onde. Todas as janelas estavam abertas, assim como a porta do quintal, e de onde estava sentada podia ver o carvalho com seus galhos balançando com o vento.

Gulp.

Havia chegado a hora. O móbile já havia anunciado. Um adeus silencioso.

Quatro cápsulas foram engolidas junto com o sol, não, vodka, antes de perceber o que estava fazendo.

Gulp. Gulp, gulp, gulp.

Pronto. Estava feito, mas instantaneamente se arrependeu quando a estranha e assustadora sensação de tontura, torpor e mais alguma coisa absorveram seus sentidos. Sua cabeça, sua visão ia e vinha em um borrão tão rápido que sentiu vontade de vomitar, e tudo o que conseguiu pensar foi que existiam outras maneiras menos apavorantes de se matar. E o fato de ter feito uma decisão errada até enquanto tirava a própria vida a confortou, porque pelo menos estaria morrendo fazendo o que mais fazia. Achou que era justo.

Seu corpo escorregou da cadeira e alcançou o chão.

Não havia mais o que fazer agora, apenas esperar até que a morte reivindicasse sua alma. Não demoraria muito porque não conseguia ver mais nada. Era como desmaiar. A diferença era que não acordaria.

O último pensamento que cruzou sua mente foi que os estampidos dos passos apressados estavam perturbando seu silêncio.


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Notas finais do capítulo

Obrigada pela leitura :)



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