Na Trilha Da Esperança escrita por Larissa


Capítulo 4
Surpresas.


Notas iniciais do capítulo

Hey hey heeeey! (Então né, uns 2 meses sem postar, vocês devem estar querendo me matar :o).
É que eu andava meio sem criatividade...
Maaas enfim, pra compensar vai um capítulo bem grandinho ai :)
Vejo vocês lá em baixo, meus doces (assistindo muito novela das 9 rs rs, eita Félix).



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Ilusão. É a primeira palavra que vem a minha cabeça quando eu acordo do que presumo foi um sono profundo. Acho que deve ser um novo dia. Definitivamente é um novo dia. O sol já avança para o quarto e tenta penetrar por entre as cortinas, as janelas abertas. O vento frio sopra e eu me levanto querendo acabar logo com mais um dia estupido da minha vida estupida.

Um novo dia...

Não. Eu não me levanto, pelo contrario, me jogo na cama novamente sem me importar. Com medo de quais as decepções que terei que enfrentar hoje. Novo dia, novas decepções. Enfio a cabeça no travesseiro nunca mais querendo sair de lá. Não vou chorar... Não vou me render, mas também não posso mais criar falsas esperanças em vão.

Meu nome é Ariana Caitlin, e sou uma inútil, um perfeito fardo na vida de todos que eu conheço. Não sou amada por ninguém. Nunca me senti amada por ninguém. Ninguém me ama. Por outro lado, eu também não amo ninguém. Mas não há a quem amar. Não tenho ninguém que conheça de minha família. Moro em um orfanato. É assim que as coisas são. Acostumar-se é a melhor solução.

-Levanta. Caitlin! – uma voz me desperta. É Molly. Provavelmente quer que eu me apresse logo para minhas tarefas. Ela me sacode porque eu não respondo. Levanto meu rosto queimando por causa de tanta força que coloquei, o esmagando contra o travesseiro. – levanta.

-O que foi? – pergunto. A voz mole. – Se me atrasei e seu turno era comigo, pode deixar que eu limpo tudo sozinha...

Ela revira os olhos como se eu estivesse falando uma das maiores besteiras do mundo.

-Não é isso Caitlin, ainda são sete horas, você não está atrasada.

-Então me deixa dormir...

-Não. Não deixo. Tenho uma coisa pra te contar – seja o que for será que não poderia esperar mais algum tempo? Não digo isso a ela. Só deixo que ela continue a falar. – Acharam os culpados pela destruição do quarto.

Dou um salto. Limparam o quarto ontem. Eu não participei da faxina porque fui suspensa. Mas eu tinha me esquecido um pouco deste incidente maluco.

Rapidamente me levanto da cama e começo a rotina matinal: arrumo minha cama e logo depois já estou escovando os dentes; colocando a mesma roupa de sempre – claro que é mais de uma, mas são quase sempre iguais – e depois amarrando o cabelo que mais parece uma vassoura hoje.

Admito que esteja um pouco agradecida por terem achado o culpado, ou os culpados, e ao mesmo tempo também um pouco efusiva, porque agora Vivian vai poder ter certeza absoluta de que não fui eu quem fez tudo aquilo.

Quando chego ao escritório, Vivian faz sinal para nós duas entrarmos. Ficamos de pé ao lado de quem presumo sejam os culpados. Quem eu nunca imaginaria. Meus outros dois colegas de quarto.

Jessie e David, esses são os nomes deles. Eu nunca realmente conversei com os dois, mas não achava que fossem assim, e a grande questão: por que fizeram isso?

Vivian, como se lesse minha mente, diz:

-Por quê? Digam, vamos lá. E não se esqueçam de que dizer mais mentiras vai ser pior para vocês.

Eles me olham com um olhar mortal. Como se tivesse sido eu a incrimina-los. Jessie tem uma aparência grotesca, agora olhando bem, e David não é tão diferente.

-Ora vamos. Na hora de fazer o que fizeram não hesitaram, imagino eu, certo? – Vivian pressiona-os. – sabia Aria, que foram eles a te incriminar?

Não. Eu não sabia. Ela me pegou de surpresa e agora estou parecendo uma idiota com um olhar de susto.

-Ela é estranha. Nunca fala nada. E além do mais... Bem, foi só uma brincadeira – Jessie finalmente se pronuncia.

Vivian suaviza a expressão. Quase acredito que ela vai perdoa-los quando ela começa a falar com uma voz irônica:

-Ah! Claro, que gracinha crianças, claro têm toda a razão. – ela contorna a mesa e fica cara a cara com eles. Dessa vez ela fala em um tom mais gritante. – agora eu vou começar a fazer coisas também, e incriminar os outros só porque não gosto deles, fácil assim, não? Afinal, só se trata de uma brincadeira!

Eles abaixam a cabeça.

Na verdade não são crianças, são mais velhos do que eu, não sei a idade certa, mas são. Acredito que Vivian pensou que, pelo modo que agiram devem ser tratados como crianças. Crianças mimadas.

-Molly, tem certeza de que não teve nada a ver com isso? – pergunta ela desconfiada.

-Com certeza, nunca faria nada a Aria, ela é... Minha colega.

A palavra colega me pega de surpresa. Molly nunca disse algo assim de mim. Mas fico agradecida por ser considerada sua colega.

Vivian chega à conclusão que Jessie e David vão ter que lavar a louça, limpar o porão e a frente do orfanato até o final das férias todos os dias. Justo. É talvez... Mas não há mais nada que fazer. Então é justo.

Depois que Vivian e os “delinquentes” saem, ficamos apenas eu e Molly na sala.

-Obrigada – digo espontaneamente.

-Pelo que?

-Foi você que conseguiu descobrir não foi? Que foram eles?

-É... De certa forma, com a ajuda de um gravador de voz que Vivian me emprestou e um pouco de vontade de justiça.

Estou prestes a sair, quando me lembro de que mais uma coisa precisa ser dita. Viro-me já na porta e digo:

-Obrigada mesmo, colega.

Ela me devolve como resposta um meio sorriso e eu o retribuo. Logo depois saindo do escritório.

Estou a ponto de me dirigir às tarefas do dia quando me lembro de que não tem tarefas. Não havia nenhuma folha hoje de manhã na minha cama. Ou estou liberada hoje – às vezes somos liberados um dia na semana, mas isso é o máximo de tempo – ou esqueceram-se de me entregar a folha, a possibilidade numero dois é a mais provável.

Já subindo a escada em direção a escada, Vivian me para no primeiro degrau e me puxa para conversar.

-Te trago noticias Aria.

Noticias. O que isso significa. Depende. Boas ou ruins? Se forem ruins, não obrigada, não quero saber. Já se forem boas acho que isto faria boa parte do meu dia – dependendo da noticia, até da minha vida – valer a pena.

-Antes que pergunte, são extremamente boas – ela dá um sorriso. Não que Vivian seja a pior pessoa do mundo. Mas ela se importa comigo. Ela às vezes é um pouco dura de mais, talvez.

-Pode falar – digo não muito ansiosa. Nada me impressiona muito mais. Criar muitas esperanças depois é decepcionante.

-Digamos que você vai se mudar.

O bastante para me deixar pasma e sem saber o que fazer, sim isso foi o bastante. A minha boca aberta por mais ou menos algumas hora – sério – não é só para parecer dramática, é a mais pura reação mesmo.

-E-eu fui a-adotada? – gaguejo, não consigo acreditar.

Ai meu santo Deus. Se estiver sonhando, por favor, não me deixe acordar. Porque a sensação é boa demais e é como se eu estivesse flutuando nas nuvens, apesar de eu não escutar as palavras que Vivian diz em seguida, tenho certeza de que meu cérebro as conseguiu processar como se elas tivessem entrado pelo meu ouvido.

Fui adotada. Conclusão essa que eu achava que nunca na vida iria tomar por dada. Mas agora eu cheguei a isso. Mas ao mesmo tempo em que a palavra adotada é processada, milhões de medos me atingem em cheio. Medos que no passado achei que nunca me atingiriam. Ao mesmo passo que no passado achei que ser adotada era uma simples metáfora no meu caso.

-Sim, anjo. Seus novos pais vêm te buscar segunda-feira que vem.

Seus novos pais. Meus novos pais. Novos pais. Pais... Pais! Sem acento nem nada. Não é país de Estados Unidos, México ou Brasil. A palavra é Pais. De progenitores. De... Oh meu Deus!

Nunca achei que um dia iria poder colocar na mesma frase estas duas palavras, Meus e pais. Não. Isso era simplesmente incogitável. Era...

Não me importo se o que faço a seguir não seja uma coisa exatamente digna a se fazer, apenas faço. Abraço Vivian com toda a força que tenho, como forma de agradecimento, ou como um adeus mais cedo... Só sei que ela no começo se assusta com o abraço, porque isso a pegou de surpresa, mas depois corresponde um pouco perplexa. Ainda assim sei que ela não está fazendo isso só por educação, porque sinto a ternura que ela tem.

-Obrigada – sussurro ainda abraçada a ela.

Ela não diz nada. Mas sei que ela quer o meu bem e que no final, acabamos sendo como amigas.

***

Enfim, hoje é o grande dia. Finalmente. Após quase uma longa semana de espera hoje finalmente chegou. E a aflição, agonia, ou qualquer coisa assim também tomam conta do meu corpo. A expectativa ou o medo. Muitos sentimentos misturados para poder distinguir cada um. Alguns bons. Alguns que me deixam assustada.

“E se eles não gostarem de mim” “Posso ser muito menos do que eles imaginam” “Nunca vão gostar de mim”. São pensamentos que frequentemente perturbam minha mente nestes dias, além de outros muito piores.

Não que tudo isso pudesse esconder toda a minha alegria. Porque eu sinto que algo vibra e também uma coisa estranha dentro de mim. Deve ser isso que chamam de felicidade.

  Fecho o zíper da “mala” surrada vagarosamente, esperando que Vivian venha me chamar. Esperando que finalmente chegue a minha hora. Hora de partir enfim.

Então é isso. Impreterivelmente Vivian aparece a porta e ela não precisa dizer nada para que eu entenda. Só pego a mala e sigo em frente, em silêncio e ainda pensando. Pensamentos espinhosos que querem perfurar meu cérebro e me confundir.

Estou lá. Na escada, respirando o ar puro de fora. Os Hale estão me esperando no carro super-ultra-mega-hiper gigante deles. Tá eu exagerei. Mas vamos combinar que nunca vi muitos carros antes. Mas ele é grande o suficiente para caber pelo menos sete pessoas lá dentro, de modo que todos estão posicionados assim: Ryan dirige e Maya está ao seu lado; Christopher “o mimado” está na segunda coluna de bancos com Mia; e por fim na última coluna está Olive. E lá vamos nós!

Dou um ultimo abraço em Vivian. Talvez eu vá sentir falta dela. Talvez...

-Obrigada. Por tudo – digo. Lágrimas brotam de meus olhos. Ela apenas assente com a cabeça.

Estou tentando me lembrar de se há mais alguma pessoa de quem devo me despedir. Acho que não... não que eu me lembre.

A ponto de seguir para o carro ouço uma voz que me faz parar.

-Ei Caitlin!

É Molly. Era dela de quem eu estava me esquecendo.

Corro até ela, e sem medo a abraço. Talvez eu também sinta a falta dela também. Mas são as duas e únicas pessoas de quem provavelmente eu não irei esquecer.

-Obrigada – digo. – diria colega?

Ela ri e me abraça novamente, de um jeito brincalhão.

-Obrigada Aria – diz. – sério. Você foi à única pessoa que eu realmente não odiei nesse orfanato.

-Ora, que honra.

Nós duas rimos e depois nos despedimos de verdade. Maya indica humildemente a porta do carro para que eu entre. Logo depois estou sentada ao lado de Olive, na última fileira de bancos do carro.

Estou envergonhada, acanhada, com medo e ao mesmo tempo frenética. Na verdade acho que ambos estamos, eu e todos comigo presentes no carro. Talvez até Christopher esteja. Pois há um clima de receio no ar.

Click. Alguém liga o radio e o silêncio é quebrado. Mas a musica fica pairando no ar, e ninguém mais fala. A única coisa que é ouvida é o radio.

Para-Para-Paradise...

Conheço a musica, mas não começo a cantar, o que faço é apenas mexer a boca conforme a letra. Fecho os olhos e estou flutuando, escutando a melodia e oscilando junto a ela.

Mas isso não dura por muito tempo. Olive aparentemente percebeu que eu estava viajando na musica e começou a cantar. Abro os olhos e a visualizo. Parece agitada, animada, tentando querer fazer-me sentir a vontade.

Sorrio com a cena dela cantando loucamente.

- When she was just a girl, she expected the world... – agora não só Olive como também quase todos no carro estão cantando.  A exceção é Christopher, como sempre. Ele está mexendo no celular como se não ouvisse nada, como se não ligasse para nada. Até Mia entra na canção. Mas é sempre ele que faz tudo virar melancólico.

Sem hesitar começo a cantar também. Ainda um pouco envergonhada, mas também animada, porque talvez esta seja a primeira vez na vida que realmente me sinta entusiasmada.

- And dreams of para-para-paradise. Para-para-paradise. Para-para-paradise Whoa-oh-oh oh-oooh oh-oh-oh – agora estamos gritando e cantando. Sinto que talvez possa um dia ser amiga deles. Companheira de verdade.

Quando a musica termina eu respiro fundo e rio, acompanhada de Olive, que me olha com um brilho pungente nos olhos.

No resto da jornada o silencio predomina. Mas agora há mais um ar de conforto e alívio no ambiente.

Não demora tanto até chegarmos à casa. A enorme e maravilhosa casa dos Hale. Minha nova casa. Ou que talvez agora eu possa chamar de minha.

Acho que descrever a mansão a minha frente não é tão fácil, mas posso tentar. É realmente grande demais. Tem uns dois andares. A sacada é a coisa mais formosa já vista.

Abro a porta do carro com todo o cuidado, como se ela pudesse quebrar ao menor movimento. Saio perplexa e não consigo parar de olhar. Só desperto do meu lindo sonho com flores e sabores diferentes, nuvens de algodão e chocolate quando sinto uma mão ao meu ombro. Viro-me e encontro Ryan.

-Eu sei, mas bens materiais não valem tanto a pena.

É a primeira vez que o ouço falar algo. Mas não entendo muito bem a frase. Deixo para lá, porque a magnificência da casa me faz querer flutuar.

Outro detalhe: a casa é de frente para o mar. A vista mais linda. Os sons das ondas batendo na areia a cada manha. Acordando com o cheirinho de praia... Já posso até sentir, vivenciar tudo isso.

Começo a andar em direção à entrada da casa, Olive ao meu lado. Minha “mala” não é muito grande – se é que pode se chamar de mala – é apenas uma bolsa acabada de ombro na qual contem meus poucos pertences e roupas.

Sinto meu coração bater mais rápido a cada passo.

 -Bem vinda a sua nova casa Aria – Maya diz já na porta, ela faz sinais para que eu entre.

É real. Eu estou aqui. E esta seria realmente a minha nova casa? Nossa casa? Família? Parece impossível, mas talvez possa ser verdade...

Posso jurar que ouço Christopher arquejar, começo a achar que talvez tenha sido apenas imaginação, mas tiro minhas imprecisão antes de ter que argumentar isto comigo mesma.

-Já chega de piegas por hoje, ok?! – e é apenas isso que ele diz. Ora, quem diria, o mimadinho anda frequentando as aulas de português, ou tem um dicionário.

Não. Talvez ele esteja certo. Talvez eu seja a errada. Talvez não... Sou a errada. Não tenho o direito de julga-lo, não tenho o direito de nada. Mas ele sim, porque ele já é desta família, talvez se eu me colocasse no seu lugar...

Eu sou a intrusa. Ele está obviamente correto por não me querer aqui. Ora, imagina. Uma garota estranha que você nem conhece na sua casa, e ainda por cima você ter que chama-la de irmã?

Não tiro sua razão. Não sei como ele está se sentindo. Sou uma idiota. Uma intrometida. Uma juíza, que não gosta de julgamentos, mas mesmo assim julga aos outros. De repente me sinto mal, realmente uma garota estupida e mesquinha da sociedade.

-Será que eu posso ir para... Hã... Eu não sei o quartinho ou algo assim?

Maya me olha com compaixão e diz:

-Querida, Olive lhe mostrará o seu quarto.

Olive indica a escada e nós subimos juntas. Preciso segurar as lagrimas, não posso me dar ao luxo de deixar alguém me ver sendo fraca, me ver chorando.

-Não se preocupe – ela se pronuncia. – Christopher é um verdadeiro idiota, eu sei muito bem disso, convivo com ele desde que nasci.

Chegamos ao quarto, ou melhor, O Quarto. É uma coisa perfeita, linda e que realmente não se pode ser comparada com aquilo de que dispunha no orfanato.

São duas camas, imagino que dormirei com alguém, possivelmente Olive.

O quarto é pintado de cor neutra, há apenas uma única parede cor verde-água, que é a parede central, onde ficam as camas. O quarto é bem grande, enorme, gigantesco na verdade. Na parede defronte a cama existe uma porta. Na parede ao lado há a porta que imagino levar a um closet – grande closet penso eu.

 -Bem, acomode-se. Esse é nosso quarto. Meu e seu de agora em diante – Olive diz e eu sorrio para ela. Os olhos brilhando com certeza. Tudo bem, nunca tive um quarto só meu, poderia reclamar, mas pra que? Se esse quarto seria suficiente para umas cinco pessoas. Não, reclamar de tudo o que Deus está me proporcionando jamais passou pela minha cabeça.

-Eu nem sei como agradecer, isso tudo é mais do que eu poderia imaginar.

-Não precisa agradecer – ela sorri e vem até mim. – você é da família agora.

Tiro a bolsa do ombro e a coloco na cama que esta vazia. Sento-me e me lembro de qual era o motivo por eu querer vir para o quarto. Ficar sozinha. Pensar. Mas não posso exigir isso dela.

-Tudo bem. Eu vou estar lá embaixo se precisar – ela sai do quarto e a agradeço mentalmente.

Lanço-me na cama. Posso sentir algo novo dentro de mim. Porque a minha vida nunca mais vai ser a mesma. Isso é bom. Bom até demais.

Mas o que mais me inquieta é o comportamento de Christopher. E em como eu sou realmente um estorvo para ele. Não posso dizer que tanto faz, porque é a vida de uma pessoa que está mudando por minha causa. E isso me perturba, pois nunca quis fazer mal a ninguém, e se vou realmente fazer parte desta família de agora em diante, queria que todos me aceitassem como sou e que eu não me sentisse mal por estar aqui e saber que ele está assim por isso. Mas nem tudo é como queremos, não podemos controlar os sentimentos das outras pessoas, e se ele se sente assim, o que posso fazer para impedir?

Sento-me. Não há realmente nada que possa fazer em relação a isto. Mas o anelo não se renova assim, de uma hora pra outra.

Ouço a porta se abrir. Quem entra é Maya, que vem até mim. Ela se senta ao meu lado e por um instante creio que ela está tendo um devaneio. Então ela me fita e segura minha mão.

-Aria, eu quero que saiba que é da família agora, e qualquer coisa, qualquer uma, você pode falar conosco. Quanto a Christopher, não se preocupe, ele sempre foi mesmo meio assim, bem resistente, áspero. Confie em mim. Um dia ele vai abrandar. Com o tempo você verá.

Ela estende os braços e sem medo eu a abraço. É tão bom pela primeira vez sentir proteção, carinho. Vejo que é real, ela não está mentindo para mim. E digo também em relação ao abraço.

-Eu te prometo – ela me solta e fita-me novamente. – que você agora é oficialmente parte da família. Prometo que vamos te amar como a qualquer outro filho. Porque você é a nossa filha.

Filha. Família. Amada.

Há tempos que estas palavras estavam extintas do meu dicionário. Mas agora posso presenciar. É real. E talvez eu possa ser amada mais do que um dia esperei. E isso me trás uma sensação agradável por dentro.

Quando ela vê que não digo nada – exatamente, as palavras me faltam – Maya por fim me deposita um beijo carinhoso na testa e depois sai. Quando ela abre a porta, eu finalmente tomo coragem o suficiente e digo:

-Obrigada – ela me olha surpresa. – de verdade. Nunca algum dia alguém me disse algo tão doce.

Maya sorri.

-Imagino que as pessoas encontrem alguma dificuldade em encontrar palavras mais doces do que você. É por isso que não dizem. Porque a competição é acirrada.

Eu sorrio. Mas o sorriso mais sincero que já dei um dia. Ela é realmente muito terna. E nunca, digo nunca mesmo, alguém me tratou assim antes.

-Aproposito. Acho que você e Olive deveriam dar um passeio no shopping um dia destes – ela pisca e depois finalmente sai.

Depois de algum tempo acabo descendo para com a família. Mas o que me para é uma vontade repentina de explorar a casa. Quando chego lá em baixo, não sigo em direção à sala, mas sim a uma porta que leva a um cômodo vazio.

Vazio a não ser pelo grande piano que lá se encontra. É lindo. E eu sou bem suspeita, porque sempre tive uma paixão secreta por piano, é um instrumento lindo, de ser tocado e ouvido.

Sento-me no banquinho em frente a ele. Toco suas teclas com delicadeza. Não sei tocar, mas bem que gostaria. Fecho os olhos, me imagino tocando, viajo na minha própria ilusão e suspiro. É tão lindo...

Abro os olhos. Por um momento acho que vislumbro alguém na porta, mas acho que imaginei coisas, pois não há ninguém lá. Depois quem aparece lá é Mia, e pequena garotinha que me encantou desde que eu a vi pela primeira vez. Com miseras palavras ela já cativou meu coração.

Talvez tenha sido dela o primeiro vulto.

Levanto-me levanto e depois vou me abaixar perto dela.

-Oi princesinha – digo ainda um pouco acanhada.

Ela aponta o dedo para o piano e depois para mim. Um sorriso brincalhão se forma em seus lábios.

Sorrio também e inesperadamente ela me dá um abraço. Foi uma surpresa, mas eu correspondo e sinto que pela primeira vez talvez eu esteja tendo uma sugestão do que é amor.

Mia me solta e puxa meu braço de leve como se quisesse me guiar. Eu levanto-me e a sigo.

Ela me leva para a sala – grande sala – onde estão Christopher e Olive. Mas não estão conversando, Christopher está mexendo no celular, como sempre, e está sentado desajeitadamente em uma poltrona. Olive assiste Bob Esponja na televisão sentada no maior sofá.

Mia chega fazendo barulho e pula direto ao lado de Olive, que se assusta e finalmente tira os olhos da TV. Ela me olha e indica o sofá para sentar-me. Christopher está me olhando torto, mas bem por isso vou até lá e me sento alegremente.

 Ele se levanta saindo imediatamente da sala. Tento não ligar, mas não consigo, não quando é tão obvio que ele já fez sua conclusão sobre mim. E quando é tão obvio que ele preferiria que eu não existisse, pelo menos não nesta casa.

Olive percebe minha reação e se inclina, me olhando.

-Você está bem?

Faço que sim com a cabeça. Sei o que deve estar pensando, que estou mentindo e que não deveria fazer isso, porque Olive é uma das poucas pessoas que creio realmente me querer bem. Mas não quero que ela se preocupe em vão.

Ela me olha com cara de quem não acreditou, mas não protesta.

-Gosta de Bob Esponja? – diz ela.

-“Vive em um abacaxi e mora no mar?”

Olive ri.

-“Bob Esponja, calça quadrada!”

Então gargalhamos juntas e depois ficamos ali, assistindo o desenho como crianças. Mas vamos admitir que Bob Esponja é irresistível para qualquer um.

Algum tempo depois de uma grande maratona Bob-esponja, risadas e discussões sobre quem era o nosso personagem favorito, conclusão: Aria: Patrick Estrela; Olive – Bob Esponja. Tomamos banho e depois Maya anunciou que o jantar estava pronto, percebi que estava mesmo com fome e meu estomago iniciou o protesto por comida.

A mesa de jantar era grande, mas não demais, apenas grande na media certa.

-Oi meninas, podem se sentar só estou terminando aqui e... – diz Maya colocando a mesma.

Eu institivamente começo a ajuda-la, pegando garfos e facas e colocando-os sobre a mesa.

-Aria, tudo bem, eu me viro, pode deixar – protesta ela.

- Eu não me importo, sério.

Então Olive também começa a ajudar-nos, colocando cuidadosamente a comida na mesa, como se ela pudesse sair correndo ou escorregar ao mínimo descuido, como respirar.

Dou um pequeno riso abafado, ela percebe e olha para mim.

-Desculpe – seguro a risada.

-Tudo bem – ela cede e também ri – eu nunca fiz isso mesmo.

Sei que agora eu poderia pensar: nossa que menina mimada, nunca nem colocou a mesa, ou ajudou a mãe. Mas não é certo julga-la por isso, e, de qualquer forma, ela foi criada assim.

-Dispensou * querida? – vejo Ryan entrar na sala de jantar quando já terminamos de colocar a mesa. Ele vai até Maya e lhe deposita um carinhoso beijo na testa.

-Sim, ela pediu um dia de folga e eu não poderia ter negado – responde ela.

-Fez bem.

Christopher também chega, e surpreendentemente ele não está mexendo em nenhum aparelho eletrônico. É a primeira vez que o vejo conversar com a família sem ser para protestar sobre mim.

-O cheiro está bom – comenta e Mia chega de surpresa atrás dele, o abraçando por trás. – tudo bem Mia, eu me rendo, você me pegou.

Christopher se vira e antes que Mia possa reagir ele a pega de sobressalto no colo e a gira, sorrindo. E sinto que é a primeira vez que Christopher me faz achar que ele tem algum sentimento, porque quando sorri e brinca com sua irmãzinha, parece tão feliz e tem um brilho nos olhos que não dá pra deixar de reparar...

Mia está rindo e sorrindo, e antes que eu mesma possa perceber eu também estou, e sorrindo até demais. Me pego assustada e desmancho um pouco o sorriso, mas todos se revezam entre me olhar e olhar para Christopher, que já colocou Mia no chão e está se sentando.

Eu me sento, e por ventura bem na frente de Christopher, que está me olhando estranhamente, até me assustando.

Todos os outros se sentam e fica para cada um servir a si mesmo, a não ser Mia é claro, que é servida por Olive, que está sentada ao meu lado.

Veja bem como estamos posicionados: Eu, Olive e Mia em um lado; a nossa frente Christopher, Maya e Ryan, na mesma posição.

A mesa contém um prato e talheres para cada um de nós e ao meio os pratos – que parecem extremamente deliciosos – de Maya.

-Não sei se sou tão boa cozinheira quanto advogada pessoal, mas espero que vocês pelo menos tentem não fazer cara feia – brinca Maya.

Começo a tirar a comida: Arroz temperado, frango assado, salada de maionese, lasanha e salada. Tiro apenas um pouquinho de tudo, sem exceção, posso parecer gulosa, mas meu prato até que não ficou tão cheio. São apenas pequenas porções porque quero de tudo um pouco experimentar.

Entre uma garfada e outra a comida foi desaparecendo do prato, até que ele ficou completamente vazio, sem nenhum vestígio de que já houvera algo ali. A comida estava excepcional, nunca havia provado nada igual antes. Mas temos que levar em consideração que quando se mora em um Orfanato qualquer comida é melhor, não que a de lá não era boa, mas sem comparações com uma comida como esta.

-Aria, sinta-se a vontade para repetir se quiser – diz Ryan quando todos acabam de comer. – não se esqueça de que é da família agora.

-É, e não ouse ter vergonha da gente – diz Olive me cutucando com o cotovelo.

Tenho que dizer a verdade, eu gostaria de repetir mais uma vez, mas considerei esta ação maus modos e decidi não a fazer.

-Na verdade eu já estou satisfeita, obrigada – digo um pouco envergonhada.

-Também não precisa ser tão educada – tenho um sobressalto quando ouço a voz de Christopher, porque acho que ele já vai começar a me caçoar, mas o que faz é efetivamente inesperado de sua parte. – não somos uma família de riquinhos esnobes, ou somos? – ele se vira para todos que estavam o olhando surpresos, até Mia entra na lista, não sei se ela entendeu alguma coisa ou se está apenas copiando os outros.

Isso soou um pouco irônico vindo de Christopher, principalmente a palavra “esnobar”, porque há praticamente duas horas ele mesmo estava me esnobando, me gozando.

-Sério? – não consigo conter um riso abafado, e ao mesmo tempo irônico.

-O que? – diz ele.

-Não sei, há algumas horas estava sendo totalmente um ignorante comigo, desculpando a palavra, mas agora diz isso? – digo, depois me arrependo um pouco das minhas palavras, não sei se fui direta demais ou rápida demais levando em consideração que acabei de chegar nesta casa, mas o que sei é que Christopher se levanta da mesa logo após minhas palavras.

-Com licença.

Direciono meu olhar para baixo sem saber o que fazer, em parte envergonhada pelo que fiz.

-Desculpe, eu... Com licença.

Levanto-me da mesa também em direção ao quarto de Olive, ou meu quarto... É difícil me acostumar ainda.

Talvez ele só estivesse tentando ser gentil comigo, desculpar-se pelo que fez, e eu disse aquilo, e eu o retruquei, sou uma burra. Eu me mataria agora, porque não... Acabei de praticamente estragar tudo...

Estou com a cabeça baixa então não vejo que quando estou no meio do corredor Christopher quase colide comigo. Levanto a cabeça e ele também. Acho que também não estava prestando muita atenção aonde ia.

-Desculpe-me, eu não tive a intenção de...

-Você está certa, talvez eu seja um ignorante mesmo.

-Não eu...

A atitude dele me surpreendeu, eu não esperava aquelas palavras, desvio o olhar e continuo andando até chegar ao quarto.

Jogo-me na cama na esperança de que só acorde amanhã e que o amanhã seja melhor do que o hoje.


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Notas finais do capítulo

Heeeeeeeey! E ai, o que acharam? bom? ruim? péssimo? posso jogar fora a história e desistir de uma vez? :P
Por favooooor comentem, porque me motiva a escrever! haha :D
Beijooooooooos meus doces!



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